7 de julho de 2013

Qualquer que seja o cenário, a Irmandade já não é a solução

Salem H. Nasser

Folha de S.Paulo

Desde o início das revoltas árabes, todos os atores interessados tentaram controlar o curso dos eventos e determinar suas resultantes.

Seria a queda da Irmandade Muçulmana e de seu presidente no Egito, Mohammed Mursi, obra de outros que não a própria Irmandade? E a quem, exatamente, interessaria a sua queda?

Sempre se poderá dizer que a Irmandade chegou ao poder por causa de sua extensa e profunda penetração no tecido social egípcio e também devido à sua organização, que contrastava bastante com o cenário das oposições ao regime anterior, de Hosni Mubarak ­­estas, inexistentes ou desarticuladas.

Também se pode dizer que a Irmandade caiu por causa de sua incapacidade de governar de outro modo que não fosse autoritário, centralizador e ineficiente.

No entanto, a partir de sua chegada ao poder no Egito e na Tunísia, e até estes últimos dias, a Irmandade parecia ter sido a escolhida, por várias potências relevantes, da região e de fora dela, como a melhor sucessora para os regimes que caíam, corroídos por seus próprios males.

O movimento surgia, então, como um sucessor que garantiria a estabilidade dos jogos de poder regional e preservaria alguns interesses vitais dos Estados Unidos e de seus aliados.

Diante do fracasso da experiência no Egito, o mais relevante entre os países árabes, perguntam­se alguns: o projeto que colocou ou permitiu a chegada da Irmandade ao poder fazia realmente essa aposta?

Ou se tratou apenas de permitir que a experiência, fadada desde o início à falência, queimasse para sempre a ideia de um governo do islã político nesses moldes?

Ainda que a incógnita continue sem resposta, um olhar mais detido sobre alguns fatos ocorridos nos últimos dias talvez possa nos oferecer alguma luz.

É incontestável que os militares afirmaram novamente seu poder no cenário egípcio ­ ­um poder, aliás, que sempre esteve lá. Fizeram­no, desta vez, de um modo muito mais hábil, carregados pela vontade popular dos milhões de manifestantes que enchiam as ruas e praças das cidades.

O que ocorre agora é algo muito diferente da imagem da junta militar que toscamente, e diretamente, assumiu o poder enquanto dava adeus a Mubarak.

Não devem restar dúvidas de que os militares mantêm íntimas relações com o establishment político e militar norte­americano.

Por isso, não há como conceber que o golpe não tenha sido discutido entre eles.

A Arábia Saudita recebeu muito bem a mudança no Egito. Já o Qatar, sob novo comando, foi mais comedido. Essas reações dizem muito sobre cada um.

Os sauditas são mais próximos de outros grupos islamistas. Por sua vez, o Qatar, sob o emir Hamad bin Khalifa al Thani e seu chanceler, Hamad bin Jassim al­Thani, que há pouco saíram de suas posições de poder, vinha investindo fortemente na aproximação e no sustento da Irmandade no Egito, além de dar apoio à oposição síria.

E, nestes dias, justamente a oposição síria, enfraquecida, lutava para encontrar alguma unidade em meio a dúvidas sobre que lugar deve caber à Irmandade em seu seio.

Qualquer que seja o resultado vindouro das revoltas árabes, ao que parece, a Irmandade já não é a solução.

SALEM H. NASSER é professor de direito internacional da Direito GV

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