Tereza Campello e Marcelo Neri
Ilustração: Visca |
A última década testemunhou queda inédita na desigualdade de renda
brasileira, que atingiu o menor nível da série histórica, iniciada em 1960.
Neste ínterim, houve conquistas em várias dimensões do desenvolvimento
humano, como queda de 47% da mortalidade infantil, três anos mais de
expectativa de vida, aceleração da escolaridade com ganhos de qualidade a
partir de 2005, geração de duas vezes mais empregos formais a partir de
2004.
A pobreza caiu 58% de 2003 a 2011, velocidade três vezes superior àquela
prevista no primeiro e principal objetivo do desenvolvimento do milênio da
ONU.
A queda da pobreza foi propulsionada pela criação do Bolsa Família, em 2003.
Mesmo sendo um dos mais bem focalizados no mundo, o programa teve de se
reinventar para fazer frente aos desafios do Brasil Sem Miséria. A superação
da extrema pobreza até 2014 constitui o lema e a principal meta do governo
federal.
O primeiro passo nessa direção foi a definição de uma linha de extrema
pobreza. O parâmetro usado foi a linha da ONU, de US$ 1,25, correspondendo a
renda mensal de R$ 70 por pessoa em junho de 2011, quando o Brasil Sem
Miséria foi lançado. O desafio brasileiro é, em quatro anos, superar a
miséria em termos de renda, enquanto a ONU propõe a cada país percorrer a
metade desse trajeto em 25 anos.
Desde 2011, aperfeiçoamentos no Bolsa Família reforçaram as transferências,
especialmente com o novo benefício cujo valor varia de acordo com o déficit
de renda de cada família. Quem tem menos renda recebe mais, possibilitando
superar a extrema pobreza ao menor custo fiscal possível. Não há caminho
mais curto para o fim da miséria no que diz respeito à renda.
Estudos do Ipea mostram que, a despeito das características que diferenciam
censo, PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) e Cadastro Único,
todos eles mostrarão uma diminuição vigorosa da pobreza extrema a partir da
instituição do Brasil Sem Miséria.
A estruturação do Cadastro Único para Programas Sociais, ocorrida entre 2003
e 2011, com a inclusão de 70 milhões de pessoas, permitiu ao poder público
não só implementar o Bolsa Família mas saber quem são, como vivem e onde
moram os mais pobres dentre os brasileiros.
Além de abrir caminho para que recebessem transferências de renda, o
cadastro permitiu priorizá-los no acesso a serviços públicos como creches,
cursos profissionalizantes, serviços de assistência técnica e extensão
rural, cobertura de água e tarifas reduzidas de energia elétrica, entre
outros. Mais do que contar pobres, os pobres passaram a contar mais no
desenho das políticas públicas brasileiras.
Além de usar o Cadastro Único como via expressa para levar políticas
públicas aos mais pobres, houve empenho redobrado em incluir as famílias
que, tendo o perfil requerido, ainda não faziam parte dele. Desde junho de
2011, a busca ativa possibilitou a entrada de 791 mil famílias extremamente
pobres no Bolsa Família. Estima-se ser necessário encontrar mais 700 mil
para atingir plena cobertura.
No próximo mês, alcançaremos um objetivo que já pareceu impossível. O Bolsa
Família vai garantir a todos os seus beneficiários renda de pelo menos R$
70. Com mais essa medida, 22 milhões de pessoas terão saído da extrema
pobreza desde o lançamento do Plano Brasil Sem Miséria. Do ponto de vista da
renda, não haverá mais pobreza extrema no universo do Bolsa Família.
Mas ainda há muito por fazer nos campos da própria renda, do trabalho, da
saúde, da educação, da infraestrutura e da moradia, entre outros desafios. O
que está acontecendo agora é apenas um começo.
Sobre os autores
Tereza Campello, 50, é ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome
Marcelo Neri, 49, é presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
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