Ben Tarnoff
Tradução / O Vale do Silício se orgulha de resolver problemas. Quer se trate de colonizar Marte ou encontrar uma vaga de estacionamento em São Francisco, a indústria da tecnologia promete lidar com os maiores desafios da humanidade. No entanto, no desafio mais urgente de todos – como parar as mudanças climáticas antes que elas tornem grandes porções do planeta inabitáveis – seus progressos têm sido quase invisíveis.
E não é por falta de tentar: Ansiosos para aproveitar o que o capitalista de risco John Doerr chamou de “a maior oportunidade econômica do século XXI”, de 2006 a 2011, investidores despejaram impressionantes $ 25 bilhões em empresas que se comprometeram em reduzir radicalmente nossa dependência de combustíveis fósseis. Parecia o encaixe perfeito: o Vale do Silício poderia cumprir sua visão de si mesmo como um instrumento de salvação humana, ao literalmente salvar o mundo – enquanto coletaria os vastos lucros que presumivelmente fluiriam de sua posição como cabeça-de-lança de uma transformação energética global.
O resultado foi um desastre. Em 2011, os capitalistas de risco tinham perdido mais da metade do dinheiro que investiram nos cinco anos anteriores. Quase todas as startups de energia limpa do Vale do Silício haviam falido ou estavam prestes a isso. Com exceção de alguns pontos-fora-da-curva de alto perfil como a Tesla, o Vale do Silício fugiu do setor e “’tecnologia limpa’ se tornou um palavrão”, segundo a TechCrunch. A aversão persistiu desde então, embora em dezembro de 2016, Bill Gates tenha anunciado um novo fundo de bilhões de dólares chamado Breakthrough Energy Ventures, que pretende reavivar o entusiasmo do capital de risco pela energia limpa.
Mas o Breakthrough Energy Ventures provavelmente deve sofrer o mesmo destino que seus predecessores, pelo simples motivo de que o capital de risco é um modelo terrível para financiar a inovação. Se o objetivo é um grande avanço na forma como geramos, armazenamos e distribuímos energia limpa, bem como a maneira como removeremos grandes quantidades de dióxido de carbono da atmosfera – tudo o que é crítico para mantermos o aquecimento global abaixo do limite de 2°C, amplamente visto por cientistas como catastrófico – então o capital de risco é a pior maneira possível de chegarmos lá.
O capital de risco foi projetado para exigir grandes retornos no curto prazo. Isso torna improvável que as empresas de capital de risco possam suportar o tipo de pesquisa que produz avanços tecnológicos, que requer um financiamento generoso por longos períodos de tempo. A ciência opera com um calendário diferente do capitalismo.
A maioria dos fundos de capital de risco são estruturados como parcerias de dez anos. Isso geralmente significa que eles estão procurando por startupscaminhando para uma “saída” – uma IPO [3] ou uma aquisição por uma empresa maior – dentro de três a cinco anos. O Breakthrough Energy Ventures de Gates está organizado como um fundo de vinte anos, na esperança de oferecer aos fundadores um pouco mais de espaço para respirar. Mas isso ainda estabelece um ritmo implacável para as startups alcançar crescimento exponencial. Como a maioria das startups fracassará, os fundos de capital de risco precisam selecionar empresas que eles acreditem que podem escalar rápido o bastante para pagar entre dez e cem vezes seu investimento. Uma ou duas superestrelas compensarão os muitos fiascos, permitindo que o fundo ofereça um retorno competitivo.
Empresas de capital de risco são impacientes e gananciosas porque o mercado exige isso. Não importa o que está no seu coração [4]: mesmo investidores filantrópicos como Gates precisam trabalhar sob essas restrições. Fundos de capital de risco simplesmente não podem bancar projetos de alto risco e intensivos em capital que não ofereçam a possibilidade de um pagamento rápido e considerável. Como resultado, eles são bons para financiar o próximo Tinder ou Snapchat, mas péssimos no financiamento das tecnologias mais ambiciosas necessárias para purgar o carbono da nossa energia e do nosso ar.
Então, se o capital de risco não é capaz de financiar a inovação de que precisamos, quem seria? A mesma entidade que tem financiado todas as principais inovações desde a Segunda Guerra Mundial: o Estado. [5] É um artigo de fé no Vale do Silício, e no ambiente corporativo estadunidense em geral [6], que o setor privado é empreendedor e adora assumir riscos, enquanto o setor público seria estagnado e avessos ao risco. A verdade é quase exatamente o oposto.
Em um campo após o outro, a pesquisa financiada publicamente tem fornecido ao setor privado suas invenções mais pioneiras e lucrativas. Isso porque o setor público pode se dar ao luxo de ser tudo o que o setor privado não pode: paciente, generoso e isolado da disciplina de ferro do mercado. Isso é mais poderosamente verdadeiro no caso da indústria que proclama mais alto o seu empreendedorismo – o Vale do Silício. O computador, a Internet, o smartphone – estas são apenas algumas das tecnologias que não existiriam sem montanhas de dinheiro público. O Estado assume o risco da inovação radical para que as empresas e seus investidores possam colher as recompensas.
Quando se trata de energia limpa, outros países entendem essa dinâmica muito melhor do que os Estados Unidos. Na verdade, como a economista Mariana Mazzucato tem apontado, uma das razões pelas quais os EUA têm ficado para trás de outros países em energias renováveis é sua “dependência pesada do capital de risco para dar um ‘empurrãozinho’ no desenvolvimento de tecnologias verdes.” A China, ao contrário, tem optado por um forte “impulso” do Estado. Em 2015, a China instalou uma turbina eólica e um campo de futebol em painéis solares a cada hora. Seu generoso financiamento público de fabricantes de painéis solares ajudou a produzir uma queda de 80% nos preços mundiais, reduzindo o custo das energias renováveis em todos os lugares. E investimentos maiores estão no horizonte: no início deste ano, a Administração Nacional de Energia da China anunciou que o governo planejava investir mais de $ 360 bilhões em energias renováveis até 2020.
A China pode ser especialmente agressiva, mas não está sozinha em sua dependência de instituições públicas. Em todo o mundo, o Estado está liderando a iniciativa em energia limpa. O maior ator da paisagem do “financiamento climático” são os bancos estatais de investimentos, que investiram $ 131 bilhões em energias renováveis em 2014 – em comparação com os $ 46 bilhões dos bancos comerciais e os míseros $ 1,7 bilhão dos capitais de risco e participações privadas.
E não é por falta de tentar: Ansiosos para aproveitar o que o capitalista de risco John Doerr chamou de “a maior oportunidade econômica do século XXI”, de 2006 a 2011, investidores despejaram impressionantes $ 25 bilhões em empresas que se comprometeram em reduzir radicalmente nossa dependência de combustíveis fósseis. Parecia o encaixe perfeito: o Vale do Silício poderia cumprir sua visão de si mesmo como um instrumento de salvação humana, ao literalmente salvar o mundo – enquanto coletaria os vastos lucros que presumivelmente fluiriam de sua posição como cabeça-de-lança de uma transformação energética global.
O resultado foi um desastre. Em 2011, os capitalistas de risco tinham perdido mais da metade do dinheiro que investiram nos cinco anos anteriores. Quase todas as startups de energia limpa do Vale do Silício haviam falido ou estavam prestes a isso. Com exceção de alguns pontos-fora-da-curva de alto perfil como a Tesla, o Vale do Silício fugiu do setor e “’tecnologia limpa’ se tornou um palavrão”, segundo a TechCrunch. A aversão persistiu desde então, embora em dezembro de 2016, Bill Gates tenha anunciado um novo fundo de bilhões de dólares chamado Breakthrough Energy Ventures, que pretende reavivar o entusiasmo do capital de risco pela energia limpa.
Mas o Breakthrough Energy Ventures provavelmente deve sofrer o mesmo destino que seus predecessores, pelo simples motivo de que o capital de risco é um modelo terrível para financiar a inovação. Se o objetivo é um grande avanço na forma como geramos, armazenamos e distribuímos energia limpa, bem como a maneira como removeremos grandes quantidades de dióxido de carbono da atmosfera – tudo o que é crítico para mantermos o aquecimento global abaixo do limite de 2°C, amplamente visto por cientistas como catastrófico – então o capital de risco é a pior maneira possível de chegarmos lá.
O capital de risco foi projetado para exigir grandes retornos no curto prazo. Isso torna improvável que as empresas de capital de risco possam suportar o tipo de pesquisa que produz avanços tecnológicos, que requer um financiamento generoso por longos períodos de tempo. A ciência opera com um calendário diferente do capitalismo.
A maioria dos fundos de capital de risco são estruturados como parcerias de dez anos. Isso geralmente significa que eles estão procurando por startupscaminhando para uma “saída” – uma IPO [3] ou uma aquisição por uma empresa maior – dentro de três a cinco anos. O Breakthrough Energy Ventures de Gates está organizado como um fundo de vinte anos, na esperança de oferecer aos fundadores um pouco mais de espaço para respirar. Mas isso ainda estabelece um ritmo implacável para as startups alcançar crescimento exponencial. Como a maioria das startups fracassará, os fundos de capital de risco precisam selecionar empresas que eles acreditem que podem escalar rápido o bastante para pagar entre dez e cem vezes seu investimento. Uma ou duas superestrelas compensarão os muitos fiascos, permitindo que o fundo ofereça um retorno competitivo.
Empresas de capital de risco são impacientes e gananciosas porque o mercado exige isso. Não importa o que está no seu coração [4]: mesmo investidores filantrópicos como Gates precisam trabalhar sob essas restrições. Fundos de capital de risco simplesmente não podem bancar projetos de alto risco e intensivos em capital que não ofereçam a possibilidade de um pagamento rápido e considerável. Como resultado, eles são bons para financiar o próximo Tinder ou Snapchat, mas péssimos no financiamento das tecnologias mais ambiciosas necessárias para purgar o carbono da nossa energia e do nosso ar.
Então, se o capital de risco não é capaz de financiar a inovação de que precisamos, quem seria? A mesma entidade que tem financiado todas as principais inovações desde a Segunda Guerra Mundial: o Estado. [5] É um artigo de fé no Vale do Silício, e no ambiente corporativo estadunidense em geral [6], que o setor privado é empreendedor e adora assumir riscos, enquanto o setor público seria estagnado e avessos ao risco. A verdade é quase exatamente o oposto.
Em um campo após o outro, a pesquisa financiada publicamente tem fornecido ao setor privado suas invenções mais pioneiras e lucrativas. Isso porque o setor público pode se dar ao luxo de ser tudo o que o setor privado não pode: paciente, generoso e isolado da disciplina de ferro do mercado. Isso é mais poderosamente verdadeiro no caso da indústria que proclama mais alto o seu empreendedorismo – o Vale do Silício. O computador, a Internet, o smartphone – estas são apenas algumas das tecnologias que não existiriam sem montanhas de dinheiro público. O Estado assume o risco da inovação radical para que as empresas e seus investidores possam colher as recompensas.
Quando se trata de energia limpa, outros países entendem essa dinâmica muito melhor do que os Estados Unidos. Na verdade, como a economista Mariana Mazzucato tem apontado, uma das razões pelas quais os EUA têm ficado para trás de outros países em energias renováveis é sua “dependência pesada do capital de risco para dar um ‘empurrãozinho’ no desenvolvimento de tecnologias verdes.” A China, ao contrário, tem optado por um forte “impulso” do Estado. Em 2015, a China instalou uma turbina eólica e um campo de futebol em painéis solares a cada hora. Seu generoso financiamento público de fabricantes de painéis solares ajudou a produzir uma queda de 80% nos preços mundiais, reduzindo o custo das energias renováveis em todos os lugares. E investimentos maiores estão no horizonte: no início deste ano, a Administração Nacional de Energia da China anunciou que o governo planejava investir mais de $ 360 bilhões em energias renováveis até 2020.
A China pode ser especialmente agressiva, mas não está sozinha em sua dependência de instituições públicas. Em todo o mundo, o Estado está liderando a iniciativa em energia limpa. O maior ator da paisagem do “financiamento climático” são os bancos estatais de investimentos, que investiram $ 131 bilhões em energias renováveis em 2014 – em comparação com os $ 46 bilhões dos bancos comerciais e os míseros $ 1,7 bilhão dos capitais de risco e participações privadas.
Instituições públicas não estão apenas financiando pesquisas sobre novas tecnologias – também estão financiando a descarbonização usando tecnologias já existentes. Este é um ponto crítico muitas vezes obscurecido por Bill Gates e outros capitalistas da energia limpa: já temos a tecnologia para a transição para um sistema de energia de zero-carbono. Nós temos [para os Estados Unidos] até mesmo um roteiro detalhado sobre como a transição pode ocorrer, graças ao cientista de Stanford, Mark Z. Jacobson e seus colegas, que mapearam como converter todos os cinquenta estados [dos EUA] para 100% de energia limpa até 2050.
É claro, a inovação pode ajudar a facilitar e acelerar esse processo – também pode descobrir maneiras de esfregar séculos de emissões de carbono para fora da nossa atmosfera. Na verdade, sem grandes avanços tecnológicos, é improvável que consigamos manter o aquecimento global dentro do limite de 2°C. Mas nunca geraremos esses avanços se renunciarmos às decisões de investimento mais importantes da nossa sociedade para bilionários como Gates [ou Musk].
É claro, a inovação pode ajudar a facilitar e acelerar esse processo – também pode descobrir maneiras de esfregar séculos de emissões de carbono para fora da nossa atmosfera. Na verdade, sem grandes avanços tecnológicos, é improvável que consigamos manter o aquecimento global dentro do limite de 2°C. Mas nunca geraremos esses avanços se renunciarmos às decisões de investimento mais importantes da nossa sociedade para bilionários como Gates [ou Musk].
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