Nelson Barbosa
Fátima Meira/Futura Press/Folhapress |
O Banco Central finalmente se moveu! A Selic caiu de 6,5% para 6% nesta semana, e a redução deve continuar nos próximos meses.
O corte da Selic encerrou 16 meses de taxa constante em 6,5%, quando o BC rasgou todos os manuais de política monetária e inventou desculpas para evitar cortar juros em uma economia em risco de recessão.
A parada técnica da taxa básica de juros foi até justificada no início de 2018, pois o efeito da greve dos caminhoneiros sobre os preços e o nível de atividade era bastante incerto.
Porém, no fim do ano passado, após as eleições e com sinais claros de que a economia voltava a patinar, a decisão de manter a Selic constante se revelou uma grande barbeiragem.
Para colocar a questão em perspectiva, recorro a um texto recente de meus colegas do Ibre Manoel Pires e Bráulio Borges, escrito em conjunto com Gilberto Borça Jr, do BNDES.
Segundo os três autores, a economia brasileira está hoje 6% abaixo do seu potencial produtivo.
Traduzindo do economês, há recursos ociosos suficientes para aumentar a produção sem gerar pressões de demanda sobre a inflação.
No caso da política monetária, Pires, Borges e Borça estimam que a Selic já poderia estar entre 3% e 5% com base no que recomenda o sistema de metas de inflação.
Como sou conservador, fico com a estimativa superior dos meus colegas, de que a Selic deveria estar em 5%. Em termos práticos, isso significa que, mesmo após o corte desta semana, nossa política monetária ainda não é suficientemente expansionista diante da baixa inflação da economia.
Diminuir a Selic obviamente não resolve todos os problemas, pois já tivemos redução da taxa básica de juro real desde 2016, de 9% para 3% ao ano, e ainda assim a economia não se recuperou de modo adequado.
Hoje, o corte da Selic ajuda mais no reequilíbrio fiscal, pois há grande correlação entre o custo da dívida bruta do governo e a taxa de juro fixada pelo BC.
Com Selic mais baixa, é preciso um resultado primário menor para estabilizar o endividamento público, o que, por sua vez, permite preservar programas sociais e investimentos de cortes orçamentários.
A Selic menor também diminui a apreciação do real, sobretudo no atual contexto internacional de redução de juros nos EUA e na Europa. Diante do atual nível de atividade econômica no Brasil, mais apreciação cambial seria negativo para a recuperação do crescimento.
Em terceiro lugar, a redução do juro básico ajuda na desalavancagem de quem está endividado, famílias e empresas, desde que isso se transmita para as taxas de mercado, o que não necessariamente acontece.
Mas, se a Selic poderia estar mais baixa, por que o BC ficou tão atrás da curva? Por dois motivos.
Primeiro, a política monetária foi excessivamente expansionista em 2013-14, e isso exigiu o movimento oposto em 2015-16, ainda no governo Dilma, para controlar a inflação.
Segundo, há uma assimetria na política monetária brasileira, pois errar a Selic para cima é tolerado e até elogiado pelo mercado, porque isso eleva o rendimento real das aplicações financeiras. Já errar a Selic para baixo é pecado mortal exatamente pelo motivo oposto.
Se o BC fosse independente do mercado financeiro, um erro compensaria o outro, e a Selic estaria próxima de 5% hoje. Como nosso BC é muito influenciado pela Faria Lima, tivemos erros sistemáticos para mais desde meados de 2016.
Mas antes tarde do que nunca! Agora, o BC de Campos Neto pode se mostrar independente, corrigir o erro de seu antecessor e colocar a Selic abaixo de 5% no final deste ano.
Sobre o autor
Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.
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