Mauro Zafalon
Folha de S.Paulo
Motivo de embates políticos, a agricultura familiar nem sempre é compreendida dentro do sistema produtivo agrícola brasileiro. O próprio termo transita no campo dos pequenos produtores, que não têm, necessariamente, os mesmos critérios de classificação dos da agricultura familiar.
O conceito de agricultura familiar remonta ao Estatuto da Terra, de 1964. Suas diretrizes básicas, ainda vigentes, foram estabelecidas em 2006, segundo Elisio Contini, ex-pesquisador da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e consultor de agronegócio.
O agricultor familiar tem de ter uma porção de terra de até quatro módulos fiscais. Estes variam conforme a região e vão de 5 a 110 hectares (um hectare equivale a 10 mil m²).
Ao menos a metade da mão de obra utilizada na atividade da propriedade deve ser familiar, e a renda tem de vir predominantemente da atividade rural. A gestão deve ser estritamente familiar.
Dentro desses parâmetros, o Censo Agropecuário de 2017, o mais recente disponível, enquadra 3,9 milhões de estabelecimentos dos 5,1 milhões existentes à época no país, ou seja, 77% do total. Hoje, estima-se em quase 7 milhões as propriedades rurais.
Os números do último censo registraram um encolhimento da atividade familiar, em relação a 2010. Houve queda de 9,5% nos estabelecimentos; redução de 2,2 milhões no número de trabalhadores e a área cultivada ficou 0,5% menor no período.
Segundo o IBGE, responsável pelo censo, a agricultura familiar ocupa 23% da área total cultivada no país.
Motivo de embates políticos, a agricultura familiar nem sempre é compreendida dentro do sistema produtivo agrícola brasileiro. O próprio termo transita no campo dos pequenos produtores, que não têm, necessariamente, os mesmos critérios de classificação dos da agricultura familiar.
O conceito de agricultura familiar remonta ao Estatuto da Terra, de 1964. Suas diretrizes básicas, ainda vigentes, foram estabelecidas em 2006, segundo Elisio Contini, ex-pesquisador da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e consultor de agronegócio.
O agricultor familiar tem de ter uma porção de terra de até quatro módulos fiscais. Estes variam conforme a região e vão de 5 a 110 hectares (um hectare equivale a 10 mil m²).
Assentamento de agricultura familiar da Cootap (Cooperativa dos Trabalhadores Assentados da região de Porto Alegre), em Eldorado do Sul, no Rio Grande do Sul - Arquivo pessoal/30.set.21 |
Ao menos a metade da mão de obra utilizada na atividade da propriedade deve ser familiar, e a renda tem de vir predominantemente da atividade rural. A gestão deve ser estritamente familiar.
Dentro desses parâmetros, o Censo Agropecuário de 2017, o mais recente disponível, enquadra 3,9 milhões de estabelecimentos dos 5,1 milhões existentes à época no país, ou seja, 77% do total. Hoje, estima-se em quase 7 milhões as propriedades rurais.
Os números do último censo registraram um encolhimento da atividade familiar, em relação a 2010. Houve queda de 9,5% nos estabelecimentos; redução de 2,2 milhões no número de trabalhadores e a área cultivada ficou 0,5% menor no período.
Segundo o IBGE, responsável pelo censo, a agricultura familiar ocupa 23% da área total cultivada no país.
Aristides Veras dos Santos, presidente da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares) destaca a quantidade de áreas pequenas entre as ocupadas pela agricultura familiar.
Dos 3,9 milhões de estabelecimentos, 1,8 milhão tem menos do que cinco hectares, o correspondente a 4,6 campos de futebol. A dificuldade é grande para se produzir em áreas tão pequenas, diz Santos.
Com relação a quanto o setor produz, há divergências. O número que circula atribui à agricultura familiar a produção de 70% dos alimentos que vão para a mesa do consumidor.
Santos diz que é um número difícil de ser contabilizado, mas que "a maioria dos alimentos consumidos sai da agricultura familiar".
Contini afirma que o volume de 70% de fornecimento total de alimentos pela agricultura familiar é discutível. Ele cita, por exemplo, que boa parte do arroz produzido atualmente vem de grandes produtores do Rio Grande do Sul.
Dos 3,9 milhões de estabelecimentos, 1,8 milhão tem menos do que cinco hectares, o correspondente a 4,6 campos de futebol. A dificuldade é grande para se produzir em áreas tão pequenas, diz Santos.
Com relação a quanto o setor produz, há divergências. O número que circula atribui à agricultura familiar a produção de 70% dos alimentos que vão para a mesa do consumidor.
Santos diz que é um número difícil de ser contabilizado, mas que "a maioria dos alimentos consumidos sai da agricultura familiar".
Contini afirma que o volume de 70% de fornecimento total de alimentos pela agricultura familiar é discutível. Ele cita, por exemplo, que boa parte do arroz produzido atualmente vem de grandes produtores do Rio Grande do Sul.
O ex-ministro da Agricultura Luis Carlos Guedes Pinto destaca a importância dos produtores familiares no abastecimento nacional. A renda, no entanto, é pequena. Dos 5,1 milhões dos estabelecimentos relatados pelo censo do setor de 2017, 4,75 milhões declararam alguma renda.
Entre eles, 10% ficaram com apenas 0,06% do VBP (Valor Bruto de Produção), um indicador de receitas dos produtores com base nos preços recebidos dentro da propriedade e volumes produzidos.
Se for considerada a metade desses estabelecimentos, a renda total deles é de apenas 1,54% no VBP. Nos cálculos do ex-ministro, 90% desses estabelecimentos ficaram com apenas 12,95% do VBP.
Na outra ponta, apenas 10% dos médios e grandes estabelecimentos obtiveram 87% das receitas do indicador.
A importância da agricultura familiar fica evidente em frutas, hortaliças e em alguns produtos básicos. Pelo menos 80% da produção de mandioca provem desses produtores, que são responsáveis também pelo fornecimento de 69% da oferta de abacaxi e de 42% do feijão consumido.
Apesar da pujança do agronegócio brasileiro e de saltos na produtividade, 33 milhões de pessoas passavam fome no país em 2022, segundo a Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional), com base em pesquisa Vox Populi.
Contini diz que tem uma visão otimista e esperançosa sobre o setor, embora a atividade tenha vários gargalos. O setor sofre das imperfeições do mercado, mas os governos fazem grandes esforços, desde os anos 2000.
Há soluções criativas e a área tem senso empresarial. O maior problema está no Nordeste, onde se concentram 47,2% dos estabelecimentos da agricultura familiar. A participação do governo nos programas básicos de auxílio, principalmente no de água e no Bolsa Família são fundamentais, afirma Contini.
Ele alerta, no entanto, de que essa situação não pode perdurar por 50 anos. É preciso desenvolver formas para que esses produtores possam caminhar com as próprias pernas.
O desenvolvimento da agricultura familiar poderá vir até do setor externo, via cooperativismo, que ajuda a superar as imperfeições de mercado. A globalização e a demanda maior por alimentos podem auxiliar no desenvolvimento.
O consultor em agronegócio diz, no entanto, que vários problemas persistem. Entre eles, a titulação da terra, assentamentos distantes de mercados consumidores, deficiência de infraestrutura, falta de conectividade e de educação de qualidade, além de outros.
Para Santos, da Contag, um dos grandes problemas é a dificuldade de acesso ao crédito, principalmente por falta de titularidade da terra.
A infraestrutura precária dificulta o escoamento da produção e há entraves na comercialização, uma vez que nem todos os municípios dispõem de feiras para a agricultura familiar ou estão com os sistemas de aquisição pública de alimentos funcionando.
Santos acredita que está em curso um processo que vai avançar. O Plano Safra da Agricultura Familiar foi positivo, diante das restrições do orçamento governamental, mas o dinheiro precisa ser disponibilizado pelos bancos. Para ele, o Plano Safra de 2024/25 será mais eficiente.
Apesar da pujança do agronegócio brasileiro e de saltos na produtividade, 33 milhões de pessoas passavam fome no país em 2022, segundo a Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional), com base em pesquisa Vox Populi.
Contini diz que tem uma visão otimista e esperançosa sobre o setor, embora a atividade tenha vários gargalos. O setor sofre das imperfeições do mercado, mas os governos fazem grandes esforços, desde os anos 2000.
Há soluções criativas e a área tem senso empresarial. O maior problema está no Nordeste, onde se concentram 47,2% dos estabelecimentos da agricultura familiar. A participação do governo nos programas básicos de auxílio, principalmente no de água e no Bolsa Família são fundamentais, afirma Contini.
Ele alerta, no entanto, de que essa situação não pode perdurar por 50 anos. É preciso desenvolver formas para que esses produtores possam caminhar com as próprias pernas.
O desenvolvimento da agricultura familiar poderá vir até do setor externo, via cooperativismo, que ajuda a superar as imperfeições de mercado. A globalização e a demanda maior por alimentos podem auxiliar no desenvolvimento.
O consultor em agronegócio diz, no entanto, que vários problemas persistem. Entre eles, a titulação da terra, assentamentos distantes de mercados consumidores, deficiência de infraestrutura, falta de conectividade e de educação de qualidade, além de outros.
Para Santos, da Contag, um dos grandes problemas é a dificuldade de acesso ao crédito, principalmente por falta de titularidade da terra.
A infraestrutura precária dificulta o escoamento da produção e há entraves na comercialização, uma vez que nem todos os municípios dispõem de feiras para a agricultura familiar ou estão com os sistemas de aquisição pública de alimentos funcionando.
Santos acredita que está em curso um processo que vai avançar. O Plano Safra da Agricultura Familiar foi positivo, diante das restrições do orçamento governamental, mas o dinheiro precisa ser disponibilizado pelos bancos. Para ele, o Plano Safra de 2024/25 será mais eficiente.
Os incentivos às mulheres, aos jovens, à agroecologia e novas tecnologias, principalmente das pequenas máquinas vindas da China, poderão dar um impulso ao setor.
A falta de tecnologia e inovação faz com que boa parte dos jovens deixe o campo em busca de trabalho fora da propriedade. Nos últimos seis anos, 300 mil deles saíram da agricultura, segundo Santos.
Uso da tecnologia é um passo importante, afirma Contini. A agricultura se transformou nas últimas décadas, com muita inovação e novas tecnologias, mas boa parte dos produtores ficou à margem desse processo.
Nos anos recentes, a agricultura familiar, voltada para o mercado interno, não foi beneficiada pela evolução dos preços internacionais dos alimentos e pela alta do dólar.
Ao contrário, sofreu os efeitos da alta dos insumos provocados pela desvalorização do real. Contini diz que o pequeno produtor, sem escala, compra os insumos mais caros e vende seus produtos em condições mais desvantajosas.
A restrição de terras, de capital, de água e a ausência da mecanização levam ainda mais esses produtores a serem vítimas das imperfeições do mercado.
A falta de tecnologia e inovação faz com que boa parte dos jovens deixe o campo em busca de trabalho fora da propriedade. Nos últimos seis anos, 300 mil deles saíram da agricultura, segundo Santos.
Uso da tecnologia é um passo importante, afirma Contini. A agricultura se transformou nas últimas décadas, com muita inovação e novas tecnologias, mas boa parte dos produtores ficou à margem desse processo.
Nos anos recentes, a agricultura familiar, voltada para o mercado interno, não foi beneficiada pela evolução dos preços internacionais dos alimentos e pela alta do dólar.
Ao contrário, sofreu os efeitos da alta dos insumos provocados pela desvalorização do real. Contini diz que o pequeno produtor, sem escala, compra os insumos mais caros e vende seus produtos em condições mais desvantajosas.
A restrição de terras, de capital, de água e a ausência da mecanização levam ainda mais esses produtores a serem vítimas das imperfeições do mercado.
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