Laura Carvalho
Folha de S.Paulo
Na coluna de sábado (23) nesta Folha, o professor André Singer chamou a atenção para um aspecto importante revelado pela pesquisa Ibope que apontou perda de 15 pontos percentuais na avaliação positiva do governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL).
A queda na aprovação foi ainda maior, de 18 pontos percentuais (p.p.), entre os eleitores cuja renda familiar mensal encontra-se entre dois e cinco salários mínimos (S.M.).
Conforme destaquei em coluna de 1º de novembro de 2018, com base nos dados da pesquisa Datafolha sobre intenções de voto realizada na véspera do segundo turno das eleições, foi exatamente nessa faixa de renda que o PT mais perdeu participação nos votos válidos entre 2014 e 2018.
Entre eleitores com renda familiar mensal inferior a dois salários mínimos e com mais de dez salários mínimos, a transferência de votos foi menor do que na média da população.
Conforme apontaram Marc Morgan e Amory Gethin no Issue Brief que discutiu a relação entre a desigualdade e as eleições brasileiras, as faixas intermediárias de renda foram as que menos ganharam com o processo de crescimento observado entre 2002 e 2014, que beneficiou sobretudo a base —por meio de programas de transferências de renda e da valorização do salário mínimo— e o topo da distribuição.
Professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, autora de "Valsa Brasileira: do Boom ao Caos Econômico".
Manifestantes na entrada da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo, que receberia a visita do presidente Jair Bolsonaro nesta quarta (27). Carolina Linhares/Folhapress |
Na coluna de sábado (23) nesta Folha, o professor André Singer chamou a atenção para um aspecto importante revelado pela pesquisa Ibope que apontou perda de 15 pontos percentuais na avaliação positiva do governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL).
A queda na aprovação foi ainda maior, de 18 pontos percentuais (p.p.), entre os eleitores cuja renda familiar mensal encontra-se entre dois e cinco salários mínimos (S.M.).
Conforme destaquei em coluna de 1º de novembro de 2018, com base nos dados da pesquisa Datafolha sobre intenções de voto realizada na véspera do segundo turno das eleições, foi exatamente nessa faixa de renda que o PT mais perdeu participação nos votos válidos entre 2014 e 2018.
Entre eleitores com renda familiar mensal inferior a dois salários mínimos e com mais de dez salários mínimos, a transferência de votos foi menor do que na média da população.
Conforme apontaram Marc Morgan e Amory Gethin no Issue Brief que discutiu a relação entre a desigualdade e as eleições brasileiras, as faixas intermediárias de renda foram as que menos ganharam com o processo de crescimento observado entre 2002 e 2014, que beneficiou sobretudo a base —por meio de programas de transferências de renda e da valorização do salário mínimo— e o topo da distribuição.
Além disso, os autores observaram que entre os eleitores que estão na faixa dos 40% do meio da distribuição —acima dos 50% mais pobres e abaixo dos 10% mais ricos—, a proporção dos que dizem ter escolhido o candidato em 2018 por uma preocupação com emprego e saúde é maior do que a parcela que apontou a corrupção e a segurança como principais razões para a escolha.
Cabe ressaltar, nesse contexto, que os eleitores com renda familiar mensal entre dois e cinco S.M. estão situados entre os domicílios 40% mais pobres e os 20% mais ricos, segundo dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Em boa medida, o "miolo espremido" de Morgan e Gethin coincide portanto com a faixa em que o PT perdeu mais votos desde 2014 e, vemos agora, também com a que desembarcou mais rápido do governo Bolsonaro.
A comparação dos dados de votação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) com os da pesquisa Ibope revela mais uma informação importante: tanto a perda de votos do PT entre 2014 e 2018 quanto o aumento da avaliação negativa de Bolsonaro deram-se de forma mais expressiva nas cidades com mais de 500 mil habitantes.
Nas periferias das cidades brasileiras, em particular, a avaliação negativa do governo subiu 21 p.p. desde janeiro, segundo o Ibope.
Tais evidências parecem reforçar a hipótese que levantei na coluna de 8 de novembro de 2018, qual seja, de que tal como apontaram diversos estudos realizados para explicar a eleição de Trump nos EUA ou o crescimento da extrema-direita na Europa, a insegurança econômica pesou mais para a eleição de Bolsonaro do que o conservadorismo moral, por exemplo —ainda que a busca por culpados possa ser direcionada contra imigrantes, minorias e, no caso brasileiro, contra "a roubalheira do PT", tornando difícil dissociar esses fatores.
A má notícia para o governo, que continua concentrando seus esforços em contemplar a ala mais fanática de sua base, é que para boa parte dos seus eleitores só mesmo o crescimento econômico, a geração de empregos e a melhora na provisão de serviços públicos seriam capazes de ampliar sua aprovação.
Assuntos que não parecem entusiasmar a família Bolsonaro.
Sobre o autor
Cabe ressaltar, nesse contexto, que os eleitores com renda familiar mensal entre dois e cinco S.M. estão situados entre os domicílios 40% mais pobres e os 20% mais ricos, segundo dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Em boa medida, o "miolo espremido" de Morgan e Gethin coincide portanto com a faixa em que o PT perdeu mais votos desde 2014 e, vemos agora, também com a que desembarcou mais rápido do governo Bolsonaro.
A comparação dos dados de votação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) com os da pesquisa Ibope revela mais uma informação importante: tanto a perda de votos do PT entre 2014 e 2018 quanto o aumento da avaliação negativa de Bolsonaro deram-se de forma mais expressiva nas cidades com mais de 500 mil habitantes.
Nas periferias das cidades brasileiras, em particular, a avaliação negativa do governo subiu 21 p.p. desde janeiro, segundo o Ibope.
Tais evidências parecem reforçar a hipótese que levantei na coluna de 8 de novembro de 2018, qual seja, de que tal como apontaram diversos estudos realizados para explicar a eleição de Trump nos EUA ou o crescimento da extrema-direita na Europa, a insegurança econômica pesou mais para a eleição de Bolsonaro do que o conservadorismo moral, por exemplo —ainda que a busca por culpados possa ser direcionada contra imigrantes, minorias e, no caso brasileiro, contra "a roubalheira do PT", tornando difícil dissociar esses fatores.
A má notícia para o governo, que continua concentrando seus esforços em contemplar a ala mais fanática de sua base, é que para boa parte dos seus eleitores só mesmo o crescimento econômico, a geração de empregos e a melhora na provisão de serviços públicos seriam capazes de ampliar sua aprovação.
Assuntos que não parecem entusiasmar a família Bolsonaro.
Sobre o autor
Professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, autora de "Valsa Brasileira: do Boom ao Caos Econômico".
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