André Singer
Folha de S.Paulo
O presidente da República, Jair Bolsonaro, participa de cerimônia no Palácio do Planalto, em Brasília. Adriano Machado/Reuters |
Na quinta-feira (4), ao receber Geraldo Alckmin (PSDB), Romero Jucá (MDB), Gilberto Kassab (PSD), Ciro Nogueira (PP), Marcos Pereira (PRB) e ACM Neto (DEM), Jair Bolsonaro encenou o episódio número um da série “a volta do parlamentarismo”.
Nele, o presidente da República foi obrigado a engolir seis presidentes de siglas congressuais da “velha política”. Um adversário eleitoral direto (Alckmin), outro que, na sua opinião, encarna o toma lá dá cá (Nogueira) e um terceiro que foi atacado na campanha (Jucá).
Pior: no encontro a personagem encarnada por Messias teve que fingir a defesa de um projeto previdenciário ao qual, no fundo, não adere. E a desconformidade com o texto encaminhado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, ficou explícita logo no dia seguinte.
Confrontado com a proposta de capitalização, cereja ultraliberal do bolo previdenciário, o capitão reformado foi claro. “Se tiver reação grande, tira da proposta”, afirmou como quem joga papel usado no cesto de lixo.
O corpo mole de Bolsonaro se explica. A ida do vice Hamilton Mourão à Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), no último dia 26, marcou uma virada.
Depois de ser aplaudido seis vezes em meia hora de fala ao apresentar-se para 700 industriais no Teatro Popular do SESI, o general da reserva foi recebido em jantar seleto na casa de Paulo Skaf, o presidente da entidade. Lá, a hipótese da adoção do parlamentarismo teria sido bastante comentada, com suposta anuência do ex-comandante da região Sul.
Desde então, próceres do capital e congressistas influentes puseram-se em campo para agenciar, de um lado, que a reforma da Previdência ande e, de outro, que a perspectiva parlamentarista se espraie.
Por enquanto, a repórter Raquel Landim, desta Folha, dá conta de que a articulação de grandes empresários é em favor de “um parlamentarismo informal” (5/4). Mas o jornalista Tales Faria (UOL, 5/4) apurou que Davi Alcolumbre, presidente do Senado, assim como os senadores Simone Tebet (MDB-MS) e Tasso Jereissati (PSDB-CE) “passaram a incentivar o senador José Serra (PSDB-SP) a apresentar um projeto de adoção do parlamentarismo” tout court.
O núcleo familiar e ideológico do bolsonarismo deve ter percebido que o seu chefe está sendo usado para fazer o serviço impopular de tirar renda dos trabalhadores e depois ser escanteado. A dura declaração de Steve Bannon, o homem que elegeu Trump com uma proposta populista, dizendo que Mourão deveria renunciar e ir para a oposição, reflete o verdadeiro sentimento da cozinha planaltina.
Os próximos capítulos prometem ser eletrizantes.
Sobre o autor
Professor de ciência política da USP, ex-secretário de Imprensa da Presidência (2003-2007). É autor de “O Lulismo em Crise”.
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