Boris Johnson, um amigo de Steve Bannon e um inimigo autodeclarado do "socialismo de garras vermelhas" de Jeremy Corbyn, será um desastre para os trabalhadores.
Lauren Townsend
Jacobin
Tradução / Numa série de eventos digna de uma comédia pastelão, o tosco ex-prefeito de Londres, Boris Johnson, tornou-se o primeiro-ministro do Reino Unido. Amplamente visto como um excêntrico cativante, Johnson tem moldado cuidadosamente sua imagem com a mídia.Quem poderia esquecer como ele reagiu à controvérsia que se seguiu quando chamou as mulheres muçulmanas de “caixas de correio” e “ladras de bancos”? Logo em seguida, ele apareceu na televisão usando bermudas havaianas e oferecendo chá aos jornalistas em canecas caprichosamente incompatíveis ao invés de respostas ou um pedido de desculpas.
Johnson é um ex-aluno de Eton e Oxford, duas das instituições de ensino mais elitistas no Reino Unido, e fez parte da notória sociedade exclusivamente masculina “Bullingdon Club” – cuja cerimônia de iniciação incluía queimar uma nota de 50 libras na frente de um morador de rua. Mas isso não impedirá seus amigos na mídia de reformulá-lo como um homem do povo durante as próximas semanas. Mais de cinco milhões de pessoas no Reino Unido estão atualmente lutando para sobreviver, como resultado de empregos mal-remunerados e inseguros, juntamente com o aumento constante dos custos de vida. E o melhor que os conservadores podem lhes oferecer é a promessa de um belo corte de impostos para os ricos.
Um político de carreira cuja hipocrisia conhece poucos limites, pode ser fácil esquecer que o “herói do Brexit” de hoje disse certa vez que o único benefício de deixar a União Européia seria “nos fazer reconhecer que a maioria dos nossos problemas não são causados por Bruxelas, mas pela visão de curto prazo, gestão inadequada, indolência, baixas qualificações, uma cultura de recompensa fácil e subinvestimento tanto em capital humano quanto em capital físico e infra-estrutura, que são crônicos na Grã-Bretanha.”
Qualquer pessoa que tenha lido a coluna de Johnson no Telegraph em abril de 2016 poderia ser perdoada por confundí-lo com um defensor da permanência na UE, ao delinear os benefícios da União Européia e afirmar que “o custo da filiação parece pequeno perto de todo o acesso ao mercado”. Ainda assim, naquele mesmo dia ele se viu no topo de uma campanha muito bem financiada em nome da saída.
Boris Johnson simboliza tudo o que o Partido Conservador representa. Um racista que já chamou os negros de “piccaninnies” e “sorrisos de melancia” (duas ofensas historicamente racistas nos EUA) e disse que Barack Obama tinha uma “aversão ancestral” à Grã-Bretanha por causa de sua herança queniana. Ele também já afirmou que o problema com os países colonizados “não é que nós já estivemos no comando, mas o fato de que já não estamos mais”.
Essa peça tem seguido por muitos anos – descrever o povo de Papua Nova Guiné como “canibais”; dizer que as mulheres só vão para a faculdade para “encontrar homens para se casar”; descrever homens gays como “passivos de regatas”. Um histórico bem controverso para um homem que prometeu, no lançamento de sua campanha, “unir o país”.
No entanto, com todas essas discussões durante as últimas semanas, uma parte da história sórdida de Boris Johnson tem sido deixada de fora: seu registro com relação aos trabalhadores. Johnson passou quase toda a sua carreira atacando sindicatos. Nos anos 2000, ele foi um dos mais proeminentes inimigos do salário mínimo, dizendo que ele iria “destruir os empregos”; e como prefeito de Londres, ele regularmente agredia os trabalhadores do sindicato RMT, que organiza trabalhadores do transporte ferroviário e marítimo.
Vale a pena lembrar por que isso aconteceu. Boris Johnson fez campanha para prefeito com a promessa de não fechar as bilheterias do metrô de Londres. Ele até chamou os fotógrafos da imprensa para assinar um contrato sobre isso. “A resposta para o número de fechamentos de bilheteria”, disse ele, “é nenhuma”. Quando Johnson renegou essa promessa, o RMT entrou em greve. Em vez de manter sua palavra, ele começou uma campanha para banir a greve. Ele exigiu um mínimo de 50% de participação nos votos dos sindicatos antes que qualquer greve pudesse ser convocada. Isso foi a base para as reformas anti-sindicais que foram introduzidas pelo Partido Conservador em 2016.
O ódio de Boris Johnson por pessoas da classe trabalhadora é profundo. Imagine, depois de tudo o que já se descobriu ao longo de tantos anos sobre o desastre de Hillsborough, em que morreram 96 pessoas e mais de 700 ficaram feridas, escrever que o povo de Liverpool estava “chafurdando” em “vitimismo”? Ou que eles precisavam reconhecer o papel desempenhado “por fãs bêbados no fundo da multidão que, sem pensar, tentaram abrir caminho para o chão”?
Hoje, 130.000 membros do Partido Conservador (em grande parte, ricos) catapultaram Boris Johnson para o número 10 da Downing Street. Eles não ligam para o seu histórico de apoio à austeridade, à privatização ou à desregulamentação. Na verdade, muitos deles aplaudiram quando ele disse em uma entrevista recente que “não conseguia pensar em ninguém que tivesse defendido os banqueiros” mais do que ele, na sequência da crise de 2008. “Eu os defendi”, ele nos lembrou, “dia após dia”.
Talvez seja por isso que ele está tão determinado a se opor ao “socialismo de presas e garras vermelhas” do Partido Trabalhista. Mas as apostas para os trabalhadores em qualquer eleição futura contra Boris Johnson serão duras. Isso deveria ficar claro, com sua amizade com Donald Trump e Steve Bannon – abutres que, podemos esperar, devem estraçalhar o setor público da Grã-Bretanha após um Brexit sem acordo com a União Europeia.
Conforme Boris Johnson leva o Reino Unido na direção de um precipício em 31 de outubro, quando se encerra o prazo para o Brexit, vale lembrar o que ele disse quando foi rebaixado da linha de frente do Partido Conservador em 2004. “Meus amigos, como eu mesmo descobri, não existem desastres, apenas oportunidades. E, de fato, oportunidades para novos desastres.” Quando se é tão rico quanto Boris, não há desastre tão grande a ponto de não ser possível se beneficiar dele.
Sobre a autora
Lauren Townsend é garçonete do TGI Fridays e ativista do sindicato Unite the union.
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