David Rosnick
Jacobin
O ex-presidente boliviano Evo Morales em entrevista coletiva em 19 de janeiro de 2020 em Buenos Aires, na Argentina. Ricardo Ceppi / Getty. |
Tradução / O dia 20 de agosto agitou um pequeno grupo de cientistas que não tinham desistido – apesar das ameaças legais – de analisar os dados e métodos por trás da análise que derrubou o governo boliviano. Apesar de dificuldades como obstruções e desvios de foco, pesquisadores conseguiram recriar alguns resultados – mas não todos – apresentados pela Organização dos Estados Americanos (OEA) contra a legitimidade da reeleição de Evo Morales, em 20 de outubro de 2019.
A OEA alegou, no dia após a votação, que a contagem preliminar continha uma “mudança inexplicável de tendência” nos resultados preliminares – por conta de uma inclinação drástica a favor de Morales. Mas sua alegação era duvidosa desde o princípio. Tão cedo quanto dia 22 de outubro, começamos a levantar sérias questões sugerindo que a “alteração inexplicável” era bem previsível.
A OEA iria, posteriormente apoiar sua alegação afirmando que a contagem oficial também continha um rompimento tardio em favor de Morales que “não pode ser facilmente explicado” pelo apoio geralmente recebido de áreas rurais, especificamente por conta da contagem oficial cujos “dados não refletem o momento em que o resultado foi reportado ao TSE [Tribunal Supremo Eleitoral]”. Esta premissa está totalmente errada; votos das principais cidades tendem a ser contados muito mais cedo, pois, a contagem oficial requer a entrega em mãos (em vez de transmissão eletrônica) dos materiais eleitorais aos escritórios do TSE.
Raciocínios falhos à parte, os resultados da OEA são irreproduzíveis.
Dez meses depois chegou a revelação de que algumas das desconcertantes conclusões previstas pela OEA são explicadas por um erro de codificação. Ela ordenou os carimbos de horário nas fichas de registro [N.T. Fichas de votação manual] alfabeticamente em vez de cronologicamente – e, portanto, destruindo sua narrativa de uma mudança repentina na contagem oficial.
Afastado injustamente
Oestrago, obviamente, já estava feito. Em 11 de novembro de 2019, o presidente da Bolívia, Evo Morales – com seu mandato incompleto – se afastou da presidência em meio às alegações de fraudes. O relatório da OEA foi decisivo para o afastamento ao apresentar seus resultados preliminares em uma auditoria da eleição de 20 de outubro. Estas “descobertas” não eram favoráveis à Morales, questionando sua vitória oficial em primeiro turno.
Membros da oposição, que já vinham falando que Morales e seu partido Movimento ao Socialismo (MAS) tentariam fraudar a eleição para seguir no poder, foram às ruas para organizar violentos protestos. Apesar de Morales ter concordado em refazer a eleição, o líder dos militares disse que ele deveria se afastar do cargo. Ele renunciou e embarcou em um dramático vôo da Bolívia para o México – quase não escapando vivo, de acordo com o ministro mexicano de relações exteriores.
Esta não é a primeira vez que a OEA utilizou estatísticas falsas para invalidar resultados eleitorais. Em 2010, a OEA interviu no Haiti, demandando que o candidato posicionado no terceiro lugar participasse do segundo turno da eleição, junto ao candidato que ficou em primeiro lugar – deixando o segundo classificado, por acaso o único candidato que não era de direita, de fora.
Para ter certeza, a segurança na eleição na Bolívia era insuficiente. Sob o risco de ficar no “e o outro?”, o mesmo poderia ser dito de qualquer eleição nos EUA. Entretanto, as descobertas da OEA apresentadas em novembro eram, na realidade, cheias de insinuações e pouco detalhadas. A OEA não apresentou evidências reais de que mesmo um único voto tenha sido alterado. Em vez disso, oferecia uma análise que o estatístico Andrew Gelman, caracteriza como “uma piada”.
Conclusões convenientes, presunções duvidosas
Mesmo se a abordagem fosse discutível e os resultados impossíveis de reproduzir, poderiam ao menos apresentar algo. O informe da OEA à imprensa, no dia seguinte ao da votação, não apresentou nenhuma análise – ainda que certamente tenha aumentado o volume de protestos da oposição. Entre gritos de “fraude”, membros proeminentes do partido de Morales e seus familiares foram agredidos ou ameaçados de morte. O governo “interino” de Jeanine Áñez – ainda hoje no poder, tendo adiado as eleições três vezes – posteriormente citaria os relatórios da OEA como evidências quase exclusivas em sua campanha para desmantelar o MAS.
Apesar de diversos pedidos, a OEA não ofereceu justificativas à suas alegações. E isso, mesmo que os resultados parecessem alinhados às pesquisas eleitorais. Com a apuração preliminar 84% completa, Morales havia recebido mais de 45% dos votos válidos na corrida eleitoral. Mesmo sob a legislação eleitoral boliviana, isso não seria o suficiente para ganhar a corrida imediatamente: apenas se obtivesse maioria absoluta ou estivesse à frente por 10 pontos do segundo colocado, Carlos Mesa, Morales conseguiria evitar um segundo turno.
A liderança de Morales aumentou consistentemente conforme progredia a contagem preliminar. Fato que não oferecia nenhum motivo em especial para achar que havia algo de estranho ali. Em vez disso, fichas de registro das regiões apoiadoras de Morales geralmente são contadas mais tarde, em relação às áreas favoráveis à oposição e foi esse o caso nesta eleição. Imagine primeiro contar os votos de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Brasília, antes de considerar estados do Nordeste, como Piauí, Paraíba, Sergipe, ou Bahia. Ninguém ficaria surpreso que a inclusão de áreas do Sudeste na contagem iriam afastar uma liderança adiantada do PT, por exemplo.
Logo antes do anúncio dos resultados parciais, não oficiais e preliminares, na tarde de 20 de outubro, houve uma aumento de votos contados de Santa Cruz – um núcleo do sentimento anti-Morales que prejudicou as boas notícias frequentes ao presidente em exercício. De toda maneira, as fichas de registro que ainda seriam contadas estavam vindo de áreas que já haviam apresentado uma forte preferência por Morales. Quando a contagem rápida pausou em 84% dos votos apurados, Morales ultrapassava Mesa por apenas 8%. Mesmo assim quando os resultados preliminares foram reportados, um dia depois, com outros 9% de votos, Morales tinha (provisoriamente) uma liderança em 10% – obtendo sua vitória em primeiro turno.
Seria esta vitória inexplicável – construída às escuras – como sugeriu a OEA? Teria sido uma mudança de destino inevitável? Meu colega, Jake Johnston, rapidamente elaborou uma análise dos resultados na capital de Cochabamba, onde a alteração era particularmente visível. Observando os resultados por região, Jake mostrou que havia pouquíssima mudança no apoio de Morales antes e após a interrupção da contagem; em boa medida, Morales se saiu melhor, atrasado, em Cochabamba, pois, regiões mais favoráveis a ele foram – seja lá por qual motivo – apuradas depois. Uma abordagem mais rigorosa sobre a eleição, sugerida por John Newman, iria mostrar algo similar: na localização de Cochabamba, Morales na verdade teve um desempenho mais baixo que o esperado, posteriormente quando o mix de regiões foi considerado.
O mesmo vale para toda a eleição. De forma consistente, estudos mostram que ao considerar uma composição diferente de regiões antes e após a interrupção, a vitória de Morales era previsível.
A auditoria final da OEA
As análises da OEA foram notáveis por sua constante recusa em considerar tais diferenças intra-geográficas, presumindo – ao contrário de todas as evidências – que o apoio de um candidato deve ser mais ou menos uniforme durante toda apuração.
A OEA alegou, no dia após a votação, que a contagem preliminar continha uma “mudança inexplicável de tendência” nos resultados preliminares – por conta de uma inclinação drástica a favor de Morales. Mas sua alegação era duvidosa desde o princípio. Tão cedo quanto dia 22 de outubro, começamos a levantar sérias questões sugerindo que a “alteração inexplicável” era bem previsível.
A OEA iria, posteriormente apoiar sua alegação afirmando que a contagem oficial também continha um rompimento tardio em favor de Morales que “não pode ser facilmente explicado” pelo apoio geralmente recebido de áreas rurais, especificamente por conta da contagem oficial cujos “dados não refletem o momento em que o resultado foi reportado ao TSE [Tribunal Supremo Eleitoral]”. Esta premissa está totalmente errada; votos das principais cidades tendem a ser contados muito mais cedo, pois, a contagem oficial requer a entrega em mãos (em vez de transmissão eletrônica) dos materiais eleitorais aos escritórios do TSE.
Raciocínios falhos à parte, os resultados da OEA são irreproduzíveis.
Dez meses depois chegou a revelação de que algumas das desconcertantes conclusões previstas pela OEA são explicadas por um erro de codificação. Ela ordenou os carimbos de horário nas fichas de registro [N.T. Fichas de votação manual] alfabeticamente em vez de cronologicamente – e, portanto, destruindo sua narrativa de uma mudança repentina na contagem oficial.
Afastado injustamente
Oestrago, obviamente, já estava feito. Em 11 de novembro de 2019, o presidente da Bolívia, Evo Morales – com seu mandato incompleto – se afastou da presidência em meio às alegações de fraudes. O relatório da OEA foi decisivo para o afastamento ao apresentar seus resultados preliminares em uma auditoria da eleição de 20 de outubro. Estas “descobertas” não eram favoráveis à Morales, questionando sua vitória oficial em primeiro turno.
Membros da oposição, que já vinham falando que Morales e seu partido Movimento ao Socialismo (MAS) tentariam fraudar a eleição para seguir no poder, foram às ruas para organizar violentos protestos. Apesar de Morales ter concordado em refazer a eleição, o líder dos militares disse que ele deveria se afastar do cargo. Ele renunciou e embarcou em um dramático vôo da Bolívia para o México – quase não escapando vivo, de acordo com o ministro mexicano de relações exteriores.
Esta não é a primeira vez que a OEA utilizou estatísticas falsas para invalidar resultados eleitorais. Em 2010, a OEA interviu no Haiti, demandando que o candidato posicionado no terceiro lugar participasse do segundo turno da eleição, junto ao candidato que ficou em primeiro lugar – deixando o segundo classificado, por acaso o único candidato que não era de direita, de fora.
Para ter certeza, a segurança na eleição na Bolívia era insuficiente. Sob o risco de ficar no “e o outro?”, o mesmo poderia ser dito de qualquer eleição nos EUA. Entretanto, as descobertas da OEA apresentadas em novembro eram, na realidade, cheias de insinuações e pouco detalhadas. A OEA não apresentou evidências reais de que mesmo um único voto tenha sido alterado. Em vez disso, oferecia uma análise que o estatístico Andrew Gelman, caracteriza como “uma piada”.
Conclusões convenientes, presunções duvidosas
Mesmo se a abordagem fosse discutível e os resultados impossíveis de reproduzir, poderiam ao menos apresentar algo. O informe da OEA à imprensa, no dia seguinte ao da votação, não apresentou nenhuma análise – ainda que certamente tenha aumentado o volume de protestos da oposição. Entre gritos de “fraude”, membros proeminentes do partido de Morales e seus familiares foram agredidos ou ameaçados de morte. O governo “interino” de Jeanine Áñez – ainda hoje no poder, tendo adiado as eleições três vezes – posteriormente citaria os relatórios da OEA como evidências quase exclusivas em sua campanha para desmantelar o MAS.
Apesar de diversos pedidos, a OEA não ofereceu justificativas à suas alegações. E isso, mesmo que os resultados parecessem alinhados às pesquisas eleitorais. Com a apuração preliminar 84% completa, Morales havia recebido mais de 45% dos votos válidos na corrida eleitoral. Mesmo sob a legislação eleitoral boliviana, isso não seria o suficiente para ganhar a corrida imediatamente: apenas se obtivesse maioria absoluta ou estivesse à frente por 10 pontos do segundo colocado, Carlos Mesa, Morales conseguiria evitar um segundo turno.
A liderança de Morales aumentou consistentemente conforme progredia a contagem preliminar. Fato que não oferecia nenhum motivo em especial para achar que havia algo de estranho ali. Em vez disso, fichas de registro das regiões apoiadoras de Morales geralmente são contadas mais tarde, em relação às áreas favoráveis à oposição e foi esse o caso nesta eleição. Imagine primeiro contar os votos de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Brasília, antes de considerar estados do Nordeste, como Piauí, Paraíba, Sergipe, ou Bahia. Ninguém ficaria surpreso que a inclusão de áreas do Sudeste na contagem iriam afastar uma liderança adiantada do PT, por exemplo.
Logo antes do anúncio dos resultados parciais, não oficiais e preliminares, na tarde de 20 de outubro, houve uma aumento de votos contados de Santa Cruz – um núcleo do sentimento anti-Morales que prejudicou as boas notícias frequentes ao presidente em exercício. De toda maneira, as fichas de registro que ainda seriam contadas estavam vindo de áreas que já haviam apresentado uma forte preferência por Morales. Quando a contagem rápida pausou em 84% dos votos apurados, Morales ultrapassava Mesa por apenas 8%. Mesmo assim quando os resultados preliminares foram reportados, um dia depois, com outros 9% de votos, Morales tinha (provisoriamente) uma liderança em 10% – obtendo sua vitória em primeiro turno.
Seria esta vitória inexplicável – construída às escuras – como sugeriu a OEA? Teria sido uma mudança de destino inevitável? Meu colega, Jake Johnston, rapidamente elaborou uma análise dos resultados na capital de Cochabamba, onde a alteração era particularmente visível. Observando os resultados por região, Jake mostrou que havia pouquíssima mudança no apoio de Morales antes e após a interrupção da contagem; em boa medida, Morales se saiu melhor, atrasado, em Cochabamba, pois, regiões mais favoráveis a ele foram – seja lá por qual motivo – apuradas depois. Uma abordagem mais rigorosa sobre a eleição, sugerida por John Newman, iria mostrar algo similar: na localização de Cochabamba, Morales na verdade teve um desempenho mais baixo que o esperado, posteriormente quando o mix de regiões foi considerado.
O mesmo vale para toda a eleição. De forma consistente, estudos mostram que ao considerar uma composição diferente de regiões antes e após a interrupção, a vitória de Morales era previsível.
A auditoria final da OEA
As análises da OEA foram notáveis por sua constante recusa em considerar tais diferenças intra-geográficas, presumindo – ao contrário de todas as evidências – que o apoio de um candidato deve ser mais ou menos uniforme durante toda apuração.
O relatório da auditoria final de 4 de dezembro era explicitamente enviesada, lançando dúvidas sobre vitória de Morales no primeiro turno. O time da auditoria buscou expressamente por irregularidades em fichas de registro que fossem muito favoráveis à Morales – justificando esta busca seletiva baseada em alegadas evidências estatísticas que a vitória de Morales era “inexplicável”. Entretanto, a evidência estatística apresentada pela auditoria da OEA não era apenas pouco convincente; sua análise estava completamente errada. A análise se resume em dois pontos.
Primeiro, a OEA argumentou que o último 5% dos votos na contagem não oficial e preliminar mostrou “uma tendência alarmante de crescimento. Que é bem diferente”. Entretanto, não é incomum que mudanças durante a apuração se mostrem decisivas. Como foi denotado em uma carta aberta de economistas e estatísticos:
Não é incomum que resultados eleitorais sejam distorcidos por região, o que significa que resultados podem mudar dependendo da ordem em que as diferentes regiões estão sendo apuradas. Ninguém argumentou que houve fraude na eleição para governadoria de Louisiana em 16 de novembro, quando o candidato democrata John Bel Edwards, ganhou com uma vitória de 2,6% de pontos, depois de ter ficado para trás durante toda noite, porque ele ganhou com 90% dos votos na cidade de Orleans, que só foi contabilizada no final.
A ordem em que tais resultados preliminares eram anunciados publicamente era ligeiramente diferente da ordem em que Irfan Nooruddin (autor das análises estatísticas da OEA) os considera. Muitas fichas de registro, durante a contagem, foram transcritas, mas sua aprovação se daria posteriormente. Aquelas aprovadas no final tendiam a ser muito mais representativas da eleição inteira – mesmo que desfavoráveis à Morales. Independente disso, a tendência de crescimento nos dados de Nooruddin, era prevista com base nos dados do início, pois as suas fichas de registro vieram mais tarde de áreas que mostraram um apoio avassalador à Morales
Em segundo lugar, Nooruddin argumentou que sua descoberta é amparada pelo fato de que o último 5% de votos na contagem oficial também eram inconsistentes com os 95% anteriores e também o penúltimo 5%. Especificamente, a OEA apresentou gráficos mostrando que os votos para Morales cresceram acentuadamente após a marca dos 95%, ao passo que Mesa registrou uma queda brusca.
Mas estes resultados era impossíveis de se reproduzir. Até 19 de agosto.
Avanços
Semanas após a publicação do relatório da OEA, pesquisadores tentaram, sem sucesso, replicar as descobertas utilizando dados publicamente disponíveis. A OEA ignorou requerimentos para disponibilizar seus dados e a explicação de sua metodologia, mas havia dois sinais sugerindo que a análise continha sérios erros. Primeiro, a OEA concluiu sua auditoria com os resultados de uma “análise interna” que diretamente contrariava os gráficos. Aquela tabela implica que Morales se saiu melhor – não pior – no penúltimo 5% do que no último 5%. Segundo, a tabela acima fragmentou os resultados por delegações selecionadas (equivalente aos estados nos Estados Unidos). Nenhum destes números parecia fazer sentido.
Isso não foi uma simples diferença entre dados internos, públicos e oficiais. Em 25 de maio, finalmente recebi os dados diretamente do TSE; de novo, Cochabamba inteira foi apurada antes da marca dos 95%. O avanço na análise veio apenas em 19 de agosto. Quando Nooruddin, postou seus dados em um repositório de Harvard. Ao distribuir as fichas de registro por esta variável de progresso, estava tudo certo desde o princípio. Mas a transição entre os dia 20 e 21 de outubro se sobressai.
Primeiro, a OEA argumentou que o último 5% dos votos na contagem não oficial e preliminar mostrou “uma tendência alarmante de crescimento. Que é bem diferente”. Entretanto, não é incomum que mudanças durante a apuração se mostrem decisivas. Como foi denotado em uma carta aberta de economistas e estatísticos:
Não é incomum que resultados eleitorais sejam distorcidos por região, o que significa que resultados podem mudar dependendo da ordem em que as diferentes regiões estão sendo apuradas. Ninguém argumentou que houve fraude na eleição para governadoria de Louisiana em 16 de novembro, quando o candidato democrata John Bel Edwards, ganhou com uma vitória de 2,6% de pontos, depois de ter ficado para trás durante toda noite, porque ele ganhou com 90% dos votos na cidade de Orleans, que só foi contabilizada no final.
A ordem em que tais resultados preliminares eram anunciados publicamente era ligeiramente diferente da ordem em que Irfan Nooruddin (autor das análises estatísticas da OEA) os considera. Muitas fichas de registro, durante a contagem, foram transcritas, mas sua aprovação se daria posteriormente. Aquelas aprovadas no final tendiam a ser muito mais representativas da eleição inteira – mesmo que desfavoráveis à Morales. Independente disso, a tendência de crescimento nos dados de Nooruddin, era prevista com base nos dados do início, pois as suas fichas de registro vieram mais tarde de áreas que mostraram um apoio avassalador à Morales
Em segundo lugar, Nooruddin argumentou que sua descoberta é amparada pelo fato de que o último 5% de votos na contagem oficial também eram inconsistentes com os 95% anteriores e também o penúltimo 5%. Especificamente, a OEA apresentou gráficos mostrando que os votos para Morales cresceram acentuadamente após a marca dos 95%, ao passo que Mesa registrou uma queda brusca.
Mas estes resultados era impossíveis de se reproduzir. Até 19 de agosto.
Avanços
Semanas após a publicação do relatório da OEA, pesquisadores tentaram, sem sucesso, replicar as descobertas utilizando dados publicamente disponíveis. A OEA ignorou requerimentos para disponibilizar seus dados e a explicação de sua metodologia, mas havia dois sinais sugerindo que a análise continha sérios erros. Primeiro, a OEA concluiu sua auditoria com os resultados de uma “análise interna” que diretamente contrariava os gráficos. Aquela tabela implica que Morales se saiu melhor – não pior – no penúltimo 5% do que no último 5%. Segundo, a tabela acima fragmentou os resultados por delegações selecionadas (equivalente aos estados nos Estados Unidos). Nenhum destes números parecia fazer sentido.
Isso não foi uma simples diferença entre dados internos, públicos e oficiais. Em 25 de maio, finalmente recebi os dados diretamente do TSE; de novo, Cochabamba inteira foi apurada antes da marca dos 95%. O avanço na análise veio apenas em 19 de agosto. Quando Nooruddin, postou seus dados em um repositório de Harvard. Ao distribuir as fichas de registro por esta variável de progresso, estava tudo certo desde o princípio. Mas a transição entre os dia 20 e 21 de outubro se sobressai.
Pouco antes das alegações de Nooruddin sobre a marca dos 11%, os carimbos de tempo pulam de 11:59 p.m. para 01:00 a.m. É possível que houvesse um intervalo de uma hora? Não. Havia fichas de registro com o carimbo de tempo registrando 12:00 a.m no dia 21, mas estavam nos últimos lugares da lista – logo passando a marca de 61%, imediatamente entre as fichas de registro carimbadas às 23:59 e as carimbadas às 00:00h.
Ficou nítido o que Nooruddin fez. Seus carimbos de tempo foram formatados com letras e números; quando ele classificou suas fichas de registro, ele o fez por ordem alfabética, não cronológica. Nooruddin tinha cada dia começando em 01:00 a.m., avançando até a 01:00 p.m., 01:01 a.m., e assim por diante até 12:59 a.m. finalmente concluindo às 12:59 p.m.
As alegações da OEA contra a legitimidade dos resultados da eleição originalmente centravam-se naquilo que considerava ser uma inexplicável mudança na tendência dos votos ao longo do tempo. Mas as análises de Nooruddin refletem desconhecimento do mundo real acerca da ordem em que as fichas de registro foram contadas. Seu “primeiros 95%” incluíam fichas de registro de até 10:55 p.m. em 22 de outubro, mas seus “últimos 5%” incluíam fichas de registro de 12:19 a.m. – horas antes. Ao classificar as fichas de registro em ordem cronológica, a variável de progressão não faz sentido.
A variável de progressão de Nooruddin não é cronológica. Fonte: Irfan Nooruddin |
Resistindo ao escrutínio
Ofato é que a OEA não está acostumada com este tipo de escrutínio – e geralmente a enfrenta com um ar de autoridade. Empoderada por este falso senso de segurança, a OEA seguiu insistindo em sua defesa do estudo. No Twitter, Gerardo de Icaza — diretor de observações eleitorais da OEA – elogiou Nooruddin como “um dos melhores estatísticos eleitorais do mundo” e insistiu falsamente que seus resultados eram seguros.
O que tem sido um padrão consistente nas respostas da OEA a qualquer crítica de seus relatórios: quando os dados falham, eles simplesmente ignoram as evidências e partem para o ataque. Quando o New York Times providenciou que diversos acadêmicos avaliassem a evidência estatística e publicou suas descobertas de que a apresentação de Nooruddin estava errada, o secretário geral da OEA, Luis Almagro, iniciou um ataque selvagem ao jornal. Outros com influência em Washington, como o diretor da International Crisis Group e Human Rights Watch’s Americas, José Miguel Vivanco, notou o comportamento cada vez mais errático de Almagro.
O secretário geral da OEA chamou a atenção até mesmo do Departamento de Washington na América Latina, que há tempos tem sido crítico de muitos dos governos de esquerda. Almagro recentemente enfraqueceu a independência da Comissão Intra Americana de Direitos Humanos – o braço autônomo da OEA voltado aos direitos humanos – ao se posicionar de forma unilateral na continuação do mandato de Paulo Abrão como secretário executivo. A Comissão tem sido crítica do governo na Bolívia por seus abusos – um regime que provavelmente não iria estar no poder não se fosse a intervenção da OEA na eleição.
É evidente que há uma podridão completa. Isso não foi apenas um escorregão com os dados. Não apenas uma análise estatística indefensável, oficialmente deslegitimando uma eleição. Não apenas uma auditoria. Isso não foi apenas uma investigação objetiva, científica da eleição, mas um meio de defender uma análise indefensável previamente construída. A OEA sob Almagro agora está visivelmente fora de controle. Sua missão ostensiva é apoiar a ordem internacional. Poderia começar largando o histórico de dois séculos de interferência dos EUA.
Sobre o autor
David Rosnick é economista no Center for Economic and Policy Research (cepr.net).
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