Erik Baker
Jacobin
Resenha de Ronald Beiner, Dangerous Minds: Nietzsche, Heidegger and the Return of the Far Right (University of Pennsylvania Press, 2018).
Tradução / Friedrich Nietzsche pensava que haviam duas formas de responder ao que ele chamava de “eterno retorno de todas as coisas”. Esta era a ideia de que, como afirmou em A Gaia Ciência, “esta vida como você agora a vive e tem vivido, você terá de viver mais uma vez e mais inúmeras vezes”. Se você fosse um típico humano fraco, poderia “jogar-se ao chão e ranger seus dentes e amaldiçoar o demônio que o disse”. Mas haviam outros espíritos, maiores e mais fortes. Eles poderiam elevar-se do rebanho, fitar aquele mesmo demônio nos olhos, e responder: “És um deus e nunca antes ouvi nada mais divino”.
Uma certa dose do amor fati Nietzscheano é necessária para a tarefa a que se propôs o teórico político Ronald Beiner em seu novo livro, Dangerous Minds: Nietzsche, Heidegger, and the Return of the Far Right [Mentes Perigosas: Nietzsche, Heidegger e o retorno da extrema direita, em tradução livre]. Seu tema é a relação entre, por um lado, Nietzsche e o filósofo alemão do século 20, Martin Heidegger, e por outro o Nazismo — uma questão de conscrição póstuma no caso de Nietzsche, e de intensa admiração mútua no caso de Heidegger. Beiner quer mostrar que a política de extrema-direita foram assadas no bolo de suas filosofias. Como resultado, tentativas pós-modernas de estilizar um “Nietzscheanismo de esquerda” ou um “Heideggerianismo de esquerda” estão condenadas ao equívoco.
Nós já vivemos, de fato, essa polêmica, antes e a viveremos mais uma vez, talvez inúmeras vezes mais. É terra pouco explorada, por uma gama impressionante de filósofos e historiadores intelectuais: Georg Lukács, Jürgen Habermas, Zeev Sternhell, Richard Wolin e muitos outros. E Beiner recorre a muitos de seus predecessores ao longo de Mentes Perigosas.
Mas ele tem uma toque a acrescentar, um novo elemento que lhe dá esperança de que sua crítica será bem-sucedida onde a outros não foram dados ouvidos. Críticos anteriores, ele nota, tem focado na questão de como as visões de direita de Nietzsche e Heidegger devem moldar nossa avaliação de seus acólitos de esquerda, hoje. Mas ao focar tão tenazmente nos “radicais detentores”, estes críticos parecem inferir que o Nietzscheanismo ou Heideggerismo de direita autoconsciente é uma coisa do passado.
Talvez, polemistas do passado não foram bem-sucedidos pois eles concederam, sem se aperceber, um terreno chave aos seus oponentes. Afinal, se é verdade que o típico leitor de Nietzsche ou Heidegger hoje é de esquerda — se as visões de extrema-direita dos próprios pensadores são compreendidas como uma aberração, rápida e permanentemente corrigidas cedo em sua subsequente história receptiva — então a afirmação de que há algo de intrinsecamente reacionário em sua filosofia parece um tanto implausível.
É o descontentamento de Beiner com essa suposição histórica que explica a última parte do seu subtítulo: o retorno da extrema-direita. Beiner quer mudar sua imagem do típico Nietzscheano, ou Heideggeriano. Ele cita o ressurgimento fascista mundial de hoje e seus porta-vozes pseudointelectuais: Richard Spencer, Aleksandr Dugin, e seus aliados (ambos leitores árduos de Nietzsche e Heidegger).
Sua aposta é de que acadêmicos de esquerda ficarão menos empolgados com a expectativa de reaproveitar Heidegger e Nietzsche se estes nomes passarem a conjurar imagens de multidões com tochas, como as da manifestação Unificar a Direita em Charlottesville, reproduzidas na capa do livro, invés de seminários e cafés parisienses.
Apenas faça!
É uma criativa e promissora estratégia — o que torna ainda mais decepcionante que Beiner não realmente lhe dê continuidade após a introdução. A vasta maior parte do livro é dedicada à exegese textual de Nietzsche e Heidegger. Os títulos de seus dois longos capítulos, “Lendo[Nietzsche e Heidegger] numa era de Fascismo ressurgente”, terminam por ser decepcionantemente literais. Os capítulos são leituras; não são sobre leituras, ou leitores. Com exceção de umas poucas frases ou parágrafos aqui e ali, poderiam ter sido escritos em praticamente qualquer época.
O lado bom é que a leituras de Beiner são claras, acessíveis, e convincentes. São compreensíveis para os leitores iniciantes de Nietzsche ou Heidegger, sem sacrificar fidelidade textual ou sofisticação. Ambos capítulos fazem uma sólida defesa do que Beiner toma como a preocupação central, motivante de cada filósofo. Estas análises sublinham o quanto eles têm em comum e quanto suas semelhanças refletem suas visões partilhadas de direita.
Nas mãos de Beiner, Nietzsche e Heidegger tornam-se, em primeiro lugar e mais importante, críticos reacionários da cultura. Seu projeto se origina de um uivo de desprezo pelo mundo moderno, e especialmente os ideais da Revolução Francesa. Liberdade, igualdade e fraternidade foram uma catástrofe. O que se anunciou como emancipador, se provou espiritualmente fatal. A ênfase do Iluminismo na democracia e na racionalidade humana inata pariu uma epidemia de mediocridade arrogante. Pessoas ordinárias grandemente superestimando sua capacidade da razão, de saber das coisas, e usar seu conhecimento para melhorar o mundo. Uma sociedade de massa, na qual toda distinção foi nivelada, é também uma em que se perdeu o senso do trágico, de um mundo que deve ser aceito ao invés de transformado. Precisamos de uma nova autoridade, uma capaz de revitalizar nossa cultura, de restaurar a ordem cuja ausência tem aleijado o espírito moderno. Você tem de quebrar alguns ovos para fazer um omelete existencial.
Para Nietzsche, Beiner escreve, a raiz do problema é a “falta de horizonte” da modernidade. Nietzsche é, muitas vezes, entendido por amigos e inimigos como um profeta da desestabilização de todas as certezas fixas — valores, religiões, fatos, a própria noção de verdade. Beiner mostra que, se Nietzsche era tal profeta, era mais aos moldes do Velho Testamento do que dos TED Talks [conferências de influenciadores da tecnologia, entretenimento e design, muito semelhantes às palestras motivacionais]. Ou, talvez, aos moldes do velho esquisito no começo de um filme de terror.
Nietzsche pensava, de fato, que todas essas convicções orientadoras careciam de “fundamento” — mas ele também pensava que era necessário que abraçássemos um tipo de “horizonte” de qualquer forma. Sem horizontes não podemos agir, ou agir de forma suficientemente vigorosa, de “afirmação da vida”.
Nossos horizontes ainda careciam de fundamentos antes da modernidade. Só que numa era de paganismo, patriarcado inquiestionado, e teatro trágico, ninguém se afligia por isso. O mundo moderno mudou tudo isso, ao trazer a preocupação Platônica e Cristã com a metafísica ao seu ponto febril. Começamos a duvidar de nós mesmos e buscar razões para fazer as coisas ao invés de virar homens e fazê-las.
Cedo, no livro, Beiner cita, Nietzsche descreve a consequência, o homem moderno que “não mais consegue desprender-se da delicada teia de judiciosidade e verdade por um simples ato de vontade e desejo”. A esperança redentora de Nietzsche são os famosos Übermenschen [Super-homens], os indivíduos que podem nos salvar ao resistir ao “niilismo” moderno e exercitar a força necessária para criar seus próprios, novos horizontes — aos quais o resto do rebanho moderno podem alegremente se submeter.
Beiner insiste que é importante não deixar que as extensas e ambivalentes afirmações de Heidegger sobre Nietzsche obscureçam até que nível ele buscou contar uma história surpreendentemente similar sobre a modernidade. Sim, Heidegger, no fim das contas, conclui que Nietzsche representa o “ponto culminante” e não a superação da metafísica. Sim, eles diferem em várias questões específicas — Se o Renascimento foi bom, por exemplo. Nietzsche explicitamente rejeita o nacionalismo alemão que Heidegger defendia.
Mas, como Beiner escreve, no geral “os paralelos entre Nietzsche e Heidegger são, de fato, impressionantes”. Em particular, eles partilhavam o mesmo diagnóstico: uma visão da modernidade onde a experiência tornou-se rasa e banal pela sufocante hegemonia da metafísica Platônica e Cristã, do racionalismo, e do universalismo.
Para Heidegger, como para Nietzsche, a modernidade é cega ante a nossa mais básica existência como fazedores mais do que como sabedores. E, como Nietzsche, Heidegger pensa que o resultado é excesso de confiança e falta de confiança ao mesmo tempo. Somos pouco confiantes nas pressuposições que tomamos como dadas que nos permitem navegar o mundo no dia-a-dia — nós as sujeitamos à crítica racionalista; presumimos que elas ficam entre nós e uma compreensão precisa do mundo, quando elas são, na verdade, a única forma que o mundo nos é “revelado”.
O resultado é um excesso de confiança no entendimento do mundo produto de nossa reflexão racional, e uma fé arrogante em nossa habilidade de planejar e controlar tudo e qualquer coisa. Heidegger preferiria que respondêssemos às avarias em nossa habilidade prática entrando em uma experiência mais “autêntica” de nossa limitação e “enraizamento”, nos maravilhando com o incompreensível mistério do “Ser” — o mistério de que o nosso mundo é.
A grande aspiração de Heidegger por como alcançar a recuperação do enraizamento espiritual na Alemanha foi, é claro, o movimento nazista. O potencial da liderança Nazista de guiar os alemães de volta ao lar do Ser foi o que Heidegger chamou de “verdade interna e grandeza” do nazismo. Beiner sintetiza a imensa quantidade de evidências que vieram à luz sobre o quão fiel era Heidegger ao partido Nazista, sua admiração pessoal por Hitler, e, a contragosto da insistência de uma geração de apologistas, seu profundo antissemitismo.
A análise de Beiner deixa claro, de uma maneira que antigos críticos nem sempre tiveram sucesso em fazer, a lógica do antissemitismo de Heidegger. A carapuça serve. Não é apenas uma questão de reavaliar “aspectos” da filosofia de Heidegger, ou entrar em conflito a respeito da “ética” em apreciar a obra de uma pessoa realmente terrível. Beiner mostrar que toda a filosofia de Heidegger brotou de uma história, uma história sobre cosmopolitismo desenraizado orquestrando perturbadores desenvolvimentos políticos na União Soviética e Estados Unidos, e alienando o Volk [povo] alemão de sua experiência autêntica. Por que sempre foi difícil vê-lo pelo que realmente era?
Sem alternativa
Esta não é, no entanto, exatamente a questão que Beiner propõe. Ele está mais interessado no porquê Nietzsche e Heidegger achavam suas próprias visões atraentes, pra início de conversa. “Devemos ler os grandes teóricos antiliberais”, ele propõe, “para podermos chegar a uma compreensão mais profunda do porquê, precisamente, eles viram as costas para o liberalismo burguês e, portanto, por que muitos de nossos compatriotas são facilmente tentados a fazer o mesmo”. O problema é que, ao presumir que a explicação pode ser encontrada dentro dos textos em si, Beiner os leva por demais em conta. Ele acena com uma sociologia da reação que se dá nos termos dos reacionários.
Como resultado, em sua conclusão, Beiner parece fazer uma desconcertante reviravolta em sua anterior insistência de que a lógica da visão de mundo de Nietzsche e Heidegger levam inexoravelmente à catástrofe política. A razão de tanta gente ser atraída pelo seu diagnóstico da modernidade, ele agora anuncia, é que ele está basicamente correto. Realmente, há “um vazio espiritual no coração da modernidade”. E a tarefa do liberal democrata é defender a modernidade apesar da esmagadora evidência de seu “vazio espiritual ou cultural”.
Beiner não pensa, como Jürgen Habermas nos lembra, que a modernidade permanece um “projeto inacabado”, realizável apenas sob certas condições materiais. Ou Charles Mills, que insiste que os valores Iluministas de igualdade e liberdade podem, sim, ser atualizados, mas apenas ao confrontar as formas pelas quais a supremacia branca estruturou o pensamento Iluminista desde sua origem.
Não, o argumento final de Beiner é o de Margaret Thatcher: não há alternativa. “então o gerencialismo centrista liberal é insatisfatório”, ele admite. “Não é inspirador o suficiente. Não move a alma. É banal; é a política do homem comum. Tudo bem. E com o quê nos comprometemos para substituí-lo?” Como se o gerencialismo centrista liberal fosse tudo que a modernidade sempre foi, ou pudesse ser!
Ao chegas às últimas páginas, o erro fatal de Nietzsche e Heidegger não é mais seu desgosto precipitado pela razão, igualdade e democracia. É a sua tola presunção de que os problemas com esses valores que eles corretamente identificaram pudessem ser sanados. “É a esperança e arrogância deles que é perigosa”, Beiner escreve — sua traição vacilante de seu próprio compromisso com a tragédia e amor fati. “Quem nos deu garantia de que o problema da condição humana admite uma solução?” Beiner termina por questionar. Ele abraça o “ou isso, ou aquilo” Nietzscheano e Heideggeriano por completo: ou o delírio dos Übermenschene do Nacional-Socialismo, ou a ordem política atual, eternamente inalterada.
Beiner nunca chega, explicitamente, a um acordo com o fato de que ele termina por endossar um centrismo Nietzscheano, ou o quanto ele retrocede no objetivo a que se propõe na introdução. Ele, porém, sublinha o pedigree Nietzscheano de Max Weber, seu grande modelo de um liberalismo trágico. E ele pouco se esforça em esconder o elitismo Nietzscheano de sua própria visão política.
Eis uma clássica doutrina da verdade dupla. O que Nietzsche e Heidegger expõem sobre a modernidade é seguro e até salutar que liberais comprometidos e iluminados, entendam. O “perigo” do título se apresenta quando suas verdades perturbadoras se revelam “em um contexto onde tal compromisso não é de todo seguro ou é ativamente inseguro”. Pode-se discutir, mas apenas em tom silencioso, longe dos ouvidos da “multidão vulgar” — o que Beiner chama, citando um neonazista frustrado, “white trash” [lixo branco].
Mas a aspiração inicial de Beiner nunca é abandonada de fato. Ele continua a falar como se estivesse em busca de um projeto intelectual emancipador, um cujos contornos sejam mais bem definidos por uma mais completa apreciação de sua lógica de seu opostos reacionários e incompatíveis, Nietzsche e Heidegger. Acontece que, ao fim do livro, seu entendimento de emancipação começa a parecer estranhamente com devoção ao status quo. No momento em que ele elenca Karl Marx em sua lista de “teóricos antiliberais” a quem não se deve tentar “apropriar [...] para projetos intelectuais liberais ou de esquerda”, você pode se considerar perdoado por se perguntar exatamente de que Beiner pensa que a esquerda consiste.
Liberalismo iliberal
O que é frustrante a respeito desse atoleiro é que Beiner se deparou, de fato, com algo significativo. Beiner está absolutamente certo quando diz ser possível oferecer uma defesa coerente de um capitalismo liberal Nietzscheano, tendo Weber como testemunha. Beiner aponta para um liberalismo centrista que pode se distinguir da extrema-direita apenas por uma decisão sobre valores, ao invés de uma diferença de visão de mundo subjacente. Isso não incomoda muito Beiner. Ele parece confiante que as boas pessoas podem se apegar, indefinidamente, ao compromisso basicamente irracional que os separa das más pessoas. Ou, pelo menos, que é a melhor esperança que temos.
Mas se fizéssemos o que Beiner nos pede na introdução — olhar mais de perto a história do Nietzscheanismo ou Heideggerianismo realmente existente — poderia se mostrar mais difícil de se manter tal crença. Acharíamos perturbadoramente difícil, na prática, separar o trigo liberal do joio de extrema-direita.
Veja Max Weber, por exemplo. Ele torna-se o herói improvável de Mentes Perigosas, capaz de ver a “jaula de ferro” da modernidade tão claramente quanto Nietzsche e Heidegger e a “afirma” mesmo assim. Por não repousar na cogitação de fantasias sobre a transcendência da modernidade”, Beiner elogia, “a nobreza de Weber é, em última análise, mais nobre que a nobreza Nietzscheana”. E, ainda assim, um ardente nacionalismo alemão perpassava a obra deste “liberal muito pessimista” como uma linha vermelha e preta. Lida na contramão, a obra de Weber mostra menos uma determinação estoica em face da inevitabilidade da modernidade, e mais um terror frente à sua precariedade, ao menos em sua encarnação Alemã Imperial.
Para Weber, a jaula de ferro estava sempre sob ameaça de uma perigo não-alemão. Em sua aula inaugural de 1895 na universidade de Friburgo (da qual Heidegger, mais tarde, se tornaria reitor sob o regime nazista), eram os fazendeiros poloneses. Eles migravam para o leste da Prússia e ameaçavam a subsistência dos trabalhadores alemães nativos com sua vontade, determinada pela raça, de trabalhar sob condições mais degradantes. A solução que Weber propôs em 1893 era nada menos que a “absoluta exclusão dos trabalhadores Russos e Poloneses do leste da Alemanha”. Perto do fim de sua vida, a ameaça eram as forças racialmente depravadas combatendo a Alemanha na I Guerra Mundial. Ele alertava um público em 1917 “que a Alemanha lutava por sua própria vida contra um exército composto de negros, Ghurkas, e toda espécie de bárbaros que saíram de seus esconderijos por todo mundo e estão, agora, amontoados nas fronteiras da Alemanha, prontos para dar cabo de nossa nação”.
Nesse meio tempo, Weber desenvolveu uma elaborada narrativa teórica da “afinidade eletiva” entre a modernidade capitalista e os traços únicos dos europeus. O capitalismo não se desenvolveu por acaso na Europa. Ele nasceu da distinta capacidade religiosa e cultural dos Europeus para a disciplina e para a racionalidade instrumental, em oposição ao que Weber chamava de “ganância sem limites dos Asiáticos”. A crença de Weber no destino histórico mundial do Estado alemão não era, como Beiner afirma, uma aberração, mas uma extensão lógica do que era central em seu pensamento.
Weber não é, nem de longe, o único “liberal” Nietzscheano a ter se atracado com a direita autoritária ou nacionalista. Estudiosos notaram uma trajetória similar na história da escola austríaca de economia, a pedra angular intelectual do movimento neoliberal do século 20. O teórico político Corey Robin provocou uma tempestade de controvérsias em 2013, principalmente com escritores libertários, por um ensaiu sublinhando paralelos entre Nietzsche e os Austríacos. Mas alguma similaridade é clara como a luz do dia, não apenas (ou em especial) a respeito pessoalmente de Nietzsche, mas à subsequente tradição Nietzscheana.
Weber, por exemplo, foi um interlocutor do líder desta escola no início do século 20, Ludwig von Mises, e uma inspiração para os membros mais jovens como Alfred Schütz e Joseph Schumpeter. O mais importante economista austríaco do século 20, F. A. Hayek, lançou denúncias contra o “racionalismo” tão fortes quanto qualquer uma feita por Nietzsche ou Heidegger. (O teórico político Michael Oakeshott, a quem Hayek é comumente, com razão, comparado, tem sido chamado de “Heidegger inglês”).
Mais recentemente, tivemos Don Lavoie, um mentor de vários seguidores influentes da escola austríaca dos EUA e, quando da sua morte, era professor da escola Charles Koch de Economia na universidade George Mason. Lavoie passou sua carreira a defender uma afinidade entre a metodologia da escola austríaca e a filosofia “hermenêutica” de Heidegger e seu seguidor Hans-Georg Gadamer.
O mais forte ponto de contato entre muitos liberais austríacos e Nietzscheanos como Heidegger é a convicção compartilhada de que o autoritarismo político pode ser tolerável ou até necessário frente ao avanço da esquerda. Os Cadernos Negros de Heidegger, publicados recentemente, mostram até que ponto seu apoio ao nazismo estava ligado ao medo de um “Bolchevismo” rastejante, que ele via (é claro) como alimentado por um judaísmo mundial. Considerações similares, sans [exceto o] antissemitismo, levaram Ludwig von Mises a declarar em 1927 que o fascism “tem, por ora, resgatado a civilização Europeia” ao reprimir levantes comunistas na Itália. “O mérito que o fascismo tem, portanto, conquistado para si, permanecerá vivo, eternamente, na história”, pronunciou.
O historiador Quinn Slobodian demonstrou como essa lógica continou a dar suporte ao apoio neoliberal a regimes autoritários como o apartheid Sul-Africano e o de Augusto Pinochet no Chile. Seja motivado pelo medo do economista Wilhelm Röpke da possibilidade de um governo da maioria negra de “canibais” sul-africanos, ou receio do apoio popular de qual gozava o presidente marxista do Chile, democraticamente eleito, Salvador Allende, a tradição austríaca provou-se mais que disposta a fazer as pazes com a ideia de um “ditador liberal”, como Hayek uma vez chamou Pinochet.
Então é menos surpreendente que a início pareça, que Ludwig von Mises tenha unido-se a Nietzsche e Heidegger no panteão da direita alternativa de hoje. Richard Spencer tem recomendado aos seus acólitos a leitura de von Mises e seu aluno estado-unidense Murray Rothbard. Mencius Moldbug, o tipo preferido de líder neofascista pseudo-intelectual concorda: “Mises é um titã; Rothbard é um gigante”, ele escreveu. O presidente do instituto Ludwig von Mises (LVMI) em Auburn, Alabama, é Lew Rockwell, que você deve recordar por ser escritor fantasma de uma série de escritos racistas nos newsletters [boletins informativos] de Ron Paul. O mais notório afiliado do LVMI é Hans-Hermann Hoppe, cuja arenga de 2001, Democracy: The God That Failed [Democracia: o deus que falhou] tornou-se uma espécie de bíblia do movimento de direita alternativa.
Não se trata, apenas, de liberais capitalistas retrocedendo ao fascismo, em outras palavras. Os fascistas têm dificuldade pra se afastar do “liberalismo” capitalista, também.
A jaula irônica
Beiner supõe que o dilema central da política moderna é entre ser “a favor” ou “contra” a modernidade liberal. Mas em Mentes Perigosas ele chama nossa atenção para uma história que sugere que a escolha não é, nem de longe, tão simples. Acontece que defensores e oponentes da modernidade podem encontrar muitas posições intelectuais e programáticas em comum. A linha que separa o centrismo liberal da direita fascista parece perturbadoramente instável na prática.
O resultado é um excesso de confiança no entendimento do mundo produto de nossa reflexão racional, e uma fé arrogante em nossa habilidade de planejar e controlar tudo e qualquer coisa. Heidegger preferiria que respondêssemos às avarias em nossa habilidade prática entrando em uma experiência mais “autêntica” de nossa limitação e “enraizamento”, nos maravilhando com o incompreensível mistério do “Ser” — o mistério de que o nosso mundo é.
A grande aspiração de Heidegger por como alcançar a recuperação do enraizamento espiritual na Alemanha foi, é claro, o movimento nazista. O potencial da liderança Nazista de guiar os alemães de volta ao lar do Ser foi o que Heidegger chamou de “verdade interna e grandeza” do nazismo. Beiner sintetiza a imensa quantidade de evidências que vieram à luz sobre o quão fiel era Heidegger ao partido Nazista, sua admiração pessoal por Hitler, e, a contragosto da insistência de uma geração de apologistas, seu profundo antissemitismo.
A análise de Beiner deixa claro, de uma maneira que antigos críticos nem sempre tiveram sucesso em fazer, a lógica do antissemitismo de Heidegger. A carapuça serve. Não é apenas uma questão de reavaliar “aspectos” da filosofia de Heidegger, ou entrar em conflito a respeito da “ética” em apreciar a obra de uma pessoa realmente terrível. Beiner mostrar que toda a filosofia de Heidegger brotou de uma história, uma história sobre cosmopolitismo desenraizado orquestrando perturbadores desenvolvimentos políticos na União Soviética e Estados Unidos, e alienando o Volk [povo] alemão de sua experiência autêntica. Por que sempre foi difícil vê-lo pelo que realmente era?
Sem alternativa
Esta não é, no entanto, exatamente a questão que Beiner propõe. Ele está mais interessado no porquê Nietzsche e Heidegger achavam suas próprias visões atraentes, pra início de conversa. “Devemos ler os grandes teóricos antiliberais”, ele propõe, “para podermos chegar a uma compreensão mais profunda do porquê, precisamente, eles viram as costas para o liberalismo burguês e, portanto, por que muitos de nossos compatriotas são facilmente tentados a fazer o mesmo”. O problema é que, ao presumir que a explicação pode ser encontrada dentro dos textos em si, Beiner os leva por demais em conta. Ele acena com uma sociologia da reação que se dá nos termos dos reacionários.
Como resultado, em sua conclusão, Beiner parece fazer uma desconcertante reviravolta em sua anterior insistência de que a lógica da visão de mundo de Nietzsche e Heidegger levam inexoravelmente à catástrofe política. A razão de tanta gente ser atraída pelo seu diagnóstico da modernidade, ele agora anuncia, é que ele está basicamente correto. Realmente, há “um vazio espiritual no coração da modernidade”. E a tarefa do liberal democrata é defender a modernidade apesar da esmagadora evidência de seu “vazio espiritual ou cultural”.
Beiner não pensa, como Jürgen Habermas nos lembra, que a modernidade permanece um “projeto inacabado”, realizável apenas sob certas condições materiais. Ou Charles Mills, que insiste que os valores Iluministas de igualdade e liberdade podem, sim, ser atualizados, mas apenas ao confrontar as formas pelas quais a supremacia branca estruturou o pensamento Iluminista desde sua origem.
Não, o argumento final de Beiner é o de Margaret Thatcher: não há alternativa. “então o gerencialismo centrista liberal é insatisfatório”, ele admite. “Não é inspirador o suficiente. Não move a alma. É banal; é a política do homem comum. Tudo bem. E com o quê nos comprometemos para substituí-lo?” Como se o gerencialismo centrista liberal fosse tudo que a modernidade sempre foi, ou pudesse ser!
Ao chegas às últimas páginas, o erro fatal de Nietzsche e Heidegger não é mais seu desgosto precipitado pela razão, igualdade e democracia. É a sua tola presunção de que os problemas com esses valores que eles corretamente identificaram pudessem ser sanados. “É a esperança e arrogância deles que é perigosa”, Beiner escreve — sua traição vacilante de seu próprio compromisso com a tragédia e amor fati. “Quem nos deu garantia de que o problema da condição humana admite uma solução?” Beiner termina por questionar. Ele abraça o “ou isso, ou aquilo” Nietzscheano e Heideggeriano por completo: ou o delírio dos Übermenschene do Nacional-Socialismo, ou a ordem política atual, eternamente inalterada.
Beiner nunca chega, explicitamente, a um acordo com o fato de que ele termina por endossar um centrismo Nietzscheano, ou o quanto ele retrocede no objetivo a que se propõe na introdução. Ele, porém, sublinha o pedigree Nietzscheano de Max Weber, seu grande modelo de um liberalismo trágico. E ele pouco se esforça em esconder o elitismo Nietzscheano de sua própria visão política.
Eis uma clássica doutrina da verdade dupla. O que Nietzsche e Heidegger expõem sobre a modernidade é seguro e até salutar que liberais comprometidos e iluminados, entendam. O “perigo” do título se apresenta quando suas verdades perturbadoras se revelam “em um contexto onde tal compromisso não é de todo seguro ou é ativamente inseguro”. Pode-se discutir, mas apenas em tom silencioso, longe dos ouvidos da “multidão vulgar” — o que Beiner chama, citando um neonazista frustrado, “white trash” [lixo branco].
Mas a aspiração inicial de Beiner nunca é abandonada de fato. Ele continua a falar como se estivesse em busca de um projeto intelectual emancipador, um cujos contornos sejam mais bem definidos por uma mais completa apreciação de sua lógica de seu opostos reacionários e incompatíveis, Nietzsche e Heidegger. Acontece que, ao fim do livro, seu entendimento de emancipação começa a parecer estranhamente com devoção ao status quo. No momento em que ele elenca Karl Marx em sua lista de “teóricos antiliberais” a quem não se deve tentar “apropriar [...] para projetos intelectuais liberais ou de esquerda”, você pode se considerar perdoado por se perguntar exatamente de que Beiner pensa que a esquerda consiste.
Liberalismo iliberal
O que é frustrante a respeito desse atoleiro é que Beiner se deparou, de fato, com algo significativo. Beiner está absolutamente certo quando diz ser possível oferecer uma defesa coerente de um capitalismo liberal Nietzscheano, tendo Weber como testemunha. Beiner aponta para um liberalismo centrista que pode se distinguir da extrema-direita apenas por uma decisão sobre valores, ao invés de uma diferença de visão de mundo subjacente. Isso não incomoda muito Beiner. Ele parece confiante que as boas pessoas podem se apegar, indefinidamente, ao compromisso basicamente irracional que os separa das más pessoas. Ou, pelo menos, que é a melhor esperança que temos.
Mas se fizéssemos o que Beiner nos pede na introdução — olhar mais de perto a história do Nietzscheanismo ou Heideggerianismo realmente existente — poderia se mostrar mais difícil de se manter tal crença. Acharíamos perturbadoramente difícil, na prática, separar o trigo liberal do joio de extrema-direita.
Veja Max Weber, por exemplo. Ele torna-se o herói improvável de Mentes Perigosas, capaz de ver a “jaula de ferro” da modernidade tão claramente quanto Nietzsche e Heidegger e a “afirma” mesmo assim. Por não repousar na cogitação de fantasias sobre a transcendência da modernidade”, Beiner elogia, “a nobreza de Weber é, em última análise, mais nobre que a nobreza Nietzscheana”. E, ainda assim, um ardente nacionalismo alemão perpassava a obra deste “liberal muito pessimista” como uma linha vermelha e preta. Lida na contramão, a obra de Weber mostra menos uma determinação estoica em face da inevitabilidade da modernidade, e mais um terror frente à sua precariedade, ao menos em sua encarnação Alemã Imperial.
Para Weber, a jaula de ferro estava sempre sob ameaça de uma perigo não-alemão. Em sua aula inaugural de 1895 na universidade de Friburgo (da qual Heidegger, mais tarde, se tornaria reitor sob o regime nazista), eram os fazendeiros poloneses. Eles migravam para o leste da Prússia e ameaçavam a subsistência dos trabalhadores alemães nativos com sua vontade, determinada pela raça, de trabalhar sob condições mais degradantes. A solução que Weber propôs em 1893 era nada menos que a “absoluta exclusão dos trabalhadores Russos e Poloneses do leste da Alemanha”. Perto do fim de sua vida, a ameaça eram as forças racialmente depravadas combatendo a Alemanha na I Guerra Mundial. Ele alertava um público em 1917 “que a Alemanha lutava por sua própria vida contra um exército composto de negros, Ghurkas, e toda espécie de bárbaros que saíram de seus esconderijos por todo mundo e estão, agora, amontoados nas fronteiras da Alemanha, prontos para dar cabo de nossa nação”.
Nesse meio tempo, Weber desenvolveu uma elaborada narrativa teórica da “afinidade eletiva” entre a modernidade capitalista e os traços únicos dos europeus. O capitalismo não se desenvolveu por acaso na Europa. Ele nasceu da distinta capacidade religiosa e cultural dos Europeus para a disciplina e para a racionalidade instrumental, em oposição ao que Weber chamava de “ganância sem limites dos Asiáticos”. A crença de Weber no destino histórico mundial do Estado alemão não era, como Beiner afirma, uma aberração, mas uma extensão lógica do que era central em seu pensamento.
Weber não é, nem de longe, o único “liberal” Nietzscheano a ter se atracado com a direita autoritária ou nacionalista. Estudiosos notaram uma trajetória similar na história da escola austríaca de economia, a pedra angular intelectual do movimento neoliberal do século 20. O teórico político Corey Robin provocou uma tempestade de controvérsias em 2013, principalmente com escritores libertários, por um ensaiu sublinhando paralelos entre Nietzsche e os Austríacos. Mas alguma similaridade é clara como a luz do dia, não apenas (ou em especial) a respeito pessoalmente de Nietzsche, mas à subsequente tradição Nietzscheana.
Weber, por exemplo, foi um interlocutor do líder desta escola no início do século 20, Ludwig von Mises, e uma inspiração para os membros mais jovens como Alfred Schütz e Joseph Schumpeter. O mais importante economista austríaco do século 20, F. A. Hayek, lançou denúncias contra o “racionalismo” tão fortes quanto qualquer uma feita por Nietzsche ou Heidegger. (O teórico político Michael Oakeshott, a quem Hayek é comumente, com razão, comparado, tem sido chamado de “Heidegger inglês”).
Mais recentemente, tivemos Don Lavoie, um mentor de vários seguidores influentes da escola austríaca dos EUA e, quando da sua morte, era professor da escola Charles Koch de Economia na universidade George Mason. Lavoie passou sua carreira a defender uma afinidade entre a metodologia da escola austríaca e a filosofia “hermenêutica” de Heidegger e seu seguidor Hans-Georg Gadamer.
O mais forte ponto de contato entre muitos liberais austríacos e Nietzscheanos como Heidegger é a convicção compartilhada de que o autoritarismo político pode ser tolerável ou até necessário frente ao avanço da esquerda. Os Cadernos Negros de Heidegger, publicados recentemente, mostram até que ponto seu apoio ao nazismo estava ligado ao medo de um “Bolchevismo” rastejante, que ele via (é claro) como alimentado por um judaísmo mundial. Considerações similares, sans [exceto o] antissemitismo, levaram Ludwig von Mises a declarar em 1927 que o fascism “tem, por ora, resgatado a civilização Europeia” ao reprimir levantes comunistas na Itália. “O mérito que o fascismo tem, portanto, conquistado para si, permanecerá vivo, eternamente, na história”, pronunciou.
O historiador Quinn Slobodian demonstrou como essa lógica continou a dar suporte ao apoio neoliberal a regimes autoritários como o apartheid Sul-Africano e o de Augusto Pinochet no Chile. Seja motivado pelo medo do economista Wilhelm Röpke da possibilidade de um governo da maioria negra de “canibais” sul-africanos, ou receio do apoio popular de qual gozava o presidente marxista do Chile, democraticamente eleito, Salvador Allende, a tradição austríaca provou-se mais que disposta a fazer as pazes com a ideia de um “ditador liberal”, como Hayek uma vez chamou Pinochet.
Então é menos surpreendente que a início pareça, que Ludwig von Mises tenha unido-se a Nietzsche e Heidegger no panteão da direita alternativa de hoje. Richard Spencer tem recomendado aos seus acólitos a leitura de von Mises e seu aluno estado-unidense Murray Rothbard. Mencius Moldbug, o tipo preferido de líder neofascista pseudo-intelectual concorda: “Mises é um titã; Rothbard é um gigante”, ele escreveu. O presidente do instituto Ludwig von Mises (LVMI) em Auburn, Alabama, é Lew Rockwell, que você deve recordar por ser escritor fantasma de uma série de escritos racistas nos newsletters [boletins informativos] de Ron Paul. O mais notório afiliado do LVMI é Hans-Hermann Hoppe, cuja arenga de 2001, Democracy: The God That Failed [Democracia: o deus que falhou] tornou-se uma espécie de bíblia do movimento de direita alternativa.
Não se trata, apenas, de liberais capitalistas retrocedendo ao fascismo, em outras palavras. Os fascistas têm dificuldade pra se afastar do “liberalismo” capitalista, também.
A jaula irônica
Beiner supõe que o dilema central da política moderna é entre ser “a favor” ou “contra” a modernidade liberal. Mas em Mentes Perigosas ele chama nossa atenção para uma história que sugere que a escolha não é, nem de longe, tão simples. Acontece que defensores e oponentes da modernidade podem encontrar muitas posições intelectuais e programáticas em comum. A linha que separa o centrismo liberal da direita fascista parece perturbadoramente instável na prática.
Isto porque a modernidade por si só é instável. Weber estava errado. A modernidade não é uma jaula de ferro, que se torna inexoravelmente mais homogênea e previsível. Ela é complexa; ela é contraditória; ela contém multitudes. “O moderno não dá satisfação”, Marx escreveu: há um implacável movimento em seu coração. A modernidade profere promessas de democracia, liberdade e igualdade, enquanto entrincheira um sistema político-econômico que é estruturalmente incapaz de realizá-las. Ela oferece uma visão tentadora de um mundo coletivamente guiado à satisfação das necessidades humanas, enquanto opera no curto prazo na intensificação da exploração em uma escala sem precedentes.
Como Marx foi o primeiro a explicar, o capitalismo moderno cria as condições de sua própria superação, mesmo que tomar vantagem dessas condições tenha-se provado mais desafiador do que Marx esperava. A inércia do status quo não o mantém em estado estacionário, o move em direção à transformação revolucionária. Por isso os defensores do status quotem tantas vezes achado necessário regredir ao recurso do poder despótico “pré-moderno” para reprimir o clamor por democracia, liberdade, ou igualdade de um tipo que lhes sabe impalatável.
Não é nenhuma coincidência que Nietzsche e Heidegger só começaram a ganhar um grupo ávido de leitores radicais do meio para o fim do século 20, quando o projeto de esquerda tradicional começava a parecer um sonho distante destinado a acabar ou na deturpação stalinista ou em derrota para o thatcherismo.
É compreensível por que o uivo antimodernista possa parecer atrativo se você vem a acreditar que a única alternativa é a submissão relutante ao capitalismo dos anos 70 e 80. (Embora, se esse instinto te leva a retroceder a um entusiasmo qualificado pelo neoliberalismo de Gary Becker entre outros, como fez a Michel Foucault, pode-se razoavelmente esperar que você reavalie suas premissas). Na cabeça de Beiner, é ainda a mesma escolha que nos é posta, hoje. Ele acha que, avaliar o “retorno da extrema direita”, nos ajudará a fazer o giro necessário para tomar a pouco inspiradora decisão em favor do status quo.
Mas há uma alternativa. Podemos, ao invés de olhar para a extrema-direita de hoje como prova de que o status quo não é auto-idêntico, que ele contém as sementes de sua própria destruição, para o bem ou para o mal. Ao invés de tratar a revitalização da ultra-direita pós-Nietzscheana como outro giro da roda do eterno retorno, podemos tratá-la como prova de que o anti-modernismo reacionário acompanhará o capitalismo, nas palavras de Marx, ao seu abençoado fim. Podemos propor uma outra dicotomia: socialismo ou barbárie. Como um grande fascista, W.B. Yeats disse, o centro não pode segurar.
Sobre o autor
Erik Baker é doutorando no Departamento de História da Ciência em Harvard.
Como Marx foi o primeiro a explicar, o capitalismo moderno cria as condições de sua própria superação, mesmo que tomar vantagem dessas condições tenha-se provado mais desafiador do que Marx esperava. A inércia do status quo não o mantém em estado estacionário, o move em direção à transformação revolucionária. Por isso os defensores do status quotem tantas vezes achado necessário regredir ao recurso do poder despótico “pré-moderno” para reprimir o clamor por democracia, liberdade, ou igualdade de um tipo que lhes sabe impalatável.
Não é nenhuma coincidência que Nietzsche e Heidegger só começaram a ganhar um grupo ávido de leitores radicais do meio para o fim do século 20, quando o projeto de esquerda tradicional começava a parecer um sonho distante destinado a acabar ou na deturpação stalinista ou em derrota para o thatcherismo.
É compreensível por que o uivo antimodernista possa parecer atrativo se você vem a acreditar que a única alternativa é a submissão relutante ao capitalismo dos anos 70 e 80. (Embora, se esse instinto te leva a retroceder a um entusiasmo qualificado pelo neoliberalismo de Gary Becker entre outros, como fez a Michel Foucault, pode-se razoavelmente esperar que você reavalie suas premissas). Na cabeça de Beiner, é ainda a mesma escolha que nos é posta, hoje. Ele acha que, avaliar o “retorno da extrema direita”, nos ajudará a fazer o giro necessário para tomar a pouco inspiradora decisão em favor do status quo.
Mas há uma alternativa. Podemos, ao invés de olhar para a extrema-direita de hoje como prova de que o status quo não é auto-idêntico, que ele contém as sementes de sua própria destruição, para o bem ou para o mal. Ao invés de tratar a revitalização da ultra-direita pós-Nietzscheana como outro giro da roda do eterno retorno, podemos tratá-la como prova de que o anti-modernismo reacionário acompanhará o capitalismo, nas palavras de Marx, ao seu abençoado fim. Podemos propor uma outra dicotomia: socialismo ou barbárie. Como um grande fascista, W.B. Yeats disse, o centro não pode segurar.
Sobre o autor
Erik Baker é doutorando no Departamento de História da Ciência em Harvard.
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