Nelson Barbosa
Folha de S.Paulo
O ex-ministro da Fazenda Nelson Barbosa em sessão no Senado, em 2016 - Alan Marques - 27.ago.16/Folhapress |
Chegou o dia da votação, e a Folha me convidou para escrever sobre os desafios econômicos do próximo governo. É difícil falar de economia quando a continuação da democracia pode estar em votação, mas aceitei a tarefa.
As pesquisas mais recentes indicaram crescimento das intenções de voto na extrema direita, e o mercado financeiro respondeu com euforia. Alguns podem tomar isso como sinal de melhora econômica, mas a questão pode ser outra.
O mercado antecipou que, em um eventual governo ultraliberal que cogita "autogolpe", os direitos dos trabalhadores serão reduzidos, os salários crescerão menos do que a produtividade e, portanto, os lucros das empresas absorverão uma parcela maior da renda, mesmo que seja com lento crescimento da economia.
Como o preço das ações reflete o valor presente dos lucros esperados, o índice Ibovespa subiu.
Nesse cálculo o mercado não foi bom ou mau. O mercado foi pragmático, entendendo que a proposta da extrema direita aumenta o valor presente dos lucros em relação aos salários. Bom para uma pequena parcela da população, que vive de renda do capital. Provavelmente ruim para a maioria restante, que vive de salários, sobretudo se o crescimento continuar lento (vide euforia inicial com Macri e Argentina hoje).
Seria possível aumentar o valor presente de lucros e salários com mais crescimento e geração de empregos? Teoricamente sim, mas isso exige capacidade de coordenação, não de conflito. Este é o maior desafio para o próximo presidente.
Acabamos de sair de uma grande recessão, fruto de choques externos, erros internos e conflagração política. Vivemos a mais lenta recuperação após uma grande recessão devido à continuação da crise política, com intervenção judicial no funcionamento do governo e nas eleições. Para sair desse impasse com democracia será necessário construir consensos.
Nosso principal problema econômico é o alto desemprego. Há capacidade ociosa na economia e podemos crescer mais rapidamente com estabilidade da inflação. Para que isso aconteça, é preciso diminuir a incerteza econômica e insegurança jurídica que se abateram sobre o país desde 2013.
O reequilíbrio do Orçamento público é uma ação necessária, mas não suficiente, para recuperar o emprego. Também será preciso estimular o crescimento diretamente, via aumento do investimento público, mas isso só será possível mediante reformas fiscais estruturais, no gasto e na receita.
Só ajuste não funciona. Só estímulo também não funciona. É preciso combinar as duas coisas na sequência correta, daí a necessidade de coordenação e diálogo.
Do lado positivo, a inflação está sob controle, a taxa de juro real está baixa, o governo tem elevado estoque de reservas internacionais e o país tem baixo déficit em conta corrente com o resto do mundo. Há uma gama de investimentos represados, esperando mais previsibilidade econômica para se concretizarem. Se nos entendermos sobre a divisão da conta fiscal, o resto fluirá mais facilmente.
O problema fiscal é eminentemente interno, de coordenação entre o que queremos do Estado e o quanto estamos dispostos a pagar em impostos.
O Orçamento público é uma das formas de conflito distributivo na sociedade.
É normal existir divergências em uma democracia, sobretudo em uma sociedade tão desigual como a nossa, em que uma parcela da população paga mais ou se beneficia mais do que a outra em suas relações com o governo.
O que não é normal é querer resolver conflitos com "tiro, porrada e bomba", pois isso nega a própria democracia, além de piorar a situação econômica e social mais à frente, como comprova o fim da ditadura militar no Brasil (sim, foi ditadura) nos anos 1980.
A solução de nossos problemas está na "conversa, acordo e compromisso", como defendem quase todos os candidatos a presidente neste ano. Voto pela democracia e boa eleição para todos!
As pesquisas mais recentes indicaram crescimento das intenções de voto na extrema direita, e o mercado financeiro respondeu com euforia. Alguns podem tomar isso como sinal de melhora econômica, mas a questão pode ser outra.
O mercado antecipou que, em um eventual governo ultraliberal que cogita "autogolpe", os direitos dos trabalhadores serão reduzidos, os salários crescerão menos do que a produtividade e, portanto, os lucros das empresas absorverão uma parcela maior da renda, mesmo que seja com lento crescimento da economia.
Como o preço das ações reflete o valor presente dos lucros esperados, o índice Ibovespa subiu.
Nesse cálculo o mercado não foi bom ou mau. O mercado foi pragmático, entendendo que a proposta da extrema direita aumenta o valor presente dos lucros em relação aos salários. Bom para uma pequena parcela da população, que vive de renda do capital. Provavelmente ruim para a maioria restante, que vive de salários, sobretudo se o crescimento continuar lento (vide euforia inicial com Macri e Argentina hoje).
Seria possível aumentar o valor presente de lucros e salários com mais crescimento e geração de empregos? Teoricamente sim, mas isso exige capacidade de coordenação, não de conflito. Este é o maior desafio para o próximo presidente.
Acabamos de sair de uma grande recessão, fruto de choques externos, erros internos e conflagração política. Vivemos a mais lenta recuperação após uma grande recessão devido à continuação da crise política, com intervenção judicial no funcionamento do governo e nas eleições. Para sair desse impasse com democracia será necessário construir consensos.
Nosso principal problema econômico é o alto desemprego. Há capacidade ociosa na economia e podemos crescer mais rapidamente com estabilidade da inflação. Para que isso aconteça, é preciso diminuir a incerteza econômica e insegurança jurídica que se abateram sobre o país desde 2013.
O reequilíbrio do Orçamento público é uma ação necessária, mas não suficiente, para recuperar o emprego. Também será preciso estimular o crescimento diretamente, via aumento do investimento público, mas isso só será possível mediante reformas fiscais estruturais, no gasto e na receita.
Só ajuste não funciona. Só estímulo também não funciona. É preciso combinar as duas coisas na sequência correta, daí a necessidade de coordenação e diálogo.
Do lado positivo, a inflação está sob controle, a taxa de juro real está baixa, o governo tem elevado estoque de reservas internacionais e o país tem baixo déficit em conta corrente com o resto do mundo. Há uma gama de investimentos represados, esperando mais previsibilidade econômica para se concretizarem. Se nos entendermos sobre a divisão da conta fiscal, o resto fluirá mais facilmente.
O problema fiscal é eminentemente interno, de coordenação entre o que queremos do Estado e o quanto estamos dispostos a pagar em impostos.
O Orçamento público é uma das formas de conflito distributivo na sociedade.
É normal existir divergências em uma democracia, sobretudo em uma sociedade tão desigual como a nossa, em que uma parcela da população paga mais ou se beneficia mais do que a outra em suas relações com o governo.
O que não é normal é querer resolver conflitos com "tiro, porrada e bomba", pois isso nega a própria democracia, além de piorar a situação econômica e social mais à frente, como comprova o fim da ditadura militar no Brasil (sim, foi ditadura) nos anos 1980.
A solução de nossos problemas está na "conversa, acordo e compromisso", como defendem quase todos os candidatos a presidente neste ano. Voto pela democracia e boa eleição para todos!
Sobre o autor
Doutor em economia e professor da FGV e da UnB; ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016, governo Dilma Rousseff).
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