Economia do bico explica a combinação de crescimento com redução da produtividade
Nelson Barbosa
Andrew Spear / The New York Times |
Meus colegas da FGV Ibre apontaram que a produtividade média do trabalho caiu 0,7% no terceiro trimestre, em comparação com o mesmo período do ano passado. Como o PIB cresceu 1,2% na mesma base de comparação, esse resultado significa que o número de horas trabalhadas subiu mais que o valor produzido.
A redução da produtividade ocorreu principalmente no setor de serviços, mas também houve queda na indústria. Somente a agropecuária registrou aumento de produção por hora trabalhada.
À primeira vista, é difícil entender crescimento com queda de produtividade, mas isso pode acontecer em “economias duais”, isto é, economias compostas por setores bem heterogêneos. O fenômeno foi inicialmente apresentado na década de 1950, por Celso Furtado e William Arthur Lewis.
A redução da produtividade ocorreu principalmente no setor de serviços, mas também houve queda na indústria. Somente a agropecuária registrou aumento de produção por hora trabalhada.
À primeira vista, é difícil entender crescimento com queda de produtividade, mas isso pode acontecer em “economias duais”, isto é, economias compostas por setores bem heterogêneos. O fenômeno foi inicialmente apresentado na década de 1950, por Celso Furtado e William Arthur Lewis.
Lewis analisou a questão de modo mais completo do que Furtado e recebeu o Prêmio Nobel de Economia por sua contribuição. Como toda ideal genial, a hipótese Lewis-Furtado parece óbvia após ser explicada.
Considere uma economia com dois setores: um “moderno”, de alta produtividade, e um “atrasado”, de baixa produtividade. À medida que a economia se desenvolve, trabalhadores migram do setor atrasado (agricultura de subsistência no modelo de Lewis-Furtado) para o setor moderno (a indústria).
Como a produtividade é maior na indústria, a simples transferência de trabalhadores do setor atrasado para o setor moderno empurra a média da economia para cima.
Considere uma economia com dois setores: um “moderno”, de alta produtividade, e um “atrasado”, de baixa produtividade. À medida que a economia se desenvolve, trabalhadores migram do setor atrasado (agricultura de subsistência no modelo de Lewis-Furtado) para o setor moderno (a indústria).
Como a produtividade é maior na indústria, a simples transferência de trabalhadores do setor atrasado para o setor moderno empurra a média da economia para cima.
Mais importante, enquanto houver grande número de trabalhadores no setor atrasado, o setor moderno pode atrair empregados pagando um salário ligeiramente acima do verificado no setor atrasado. O ganho de produtividade é, portanto, apropriado pelas firmas, que podem destinar seus lucros para investimentos, expandindo ainda mais o setor moderno.
No modelo Lewis-Furtado, o crescimento do setor moderno eventualmente absorve o excesso de oferta de trabalhadores do setor atrasado. Quando isso acontece, o salário no setor moderno começa a subir em linha com a produtividade e a economia entra em um estágio avançado de desenvolvimento, dominado pelo setor moderno.
No modelo original de Lewis, a dualidade seria um fenômeno temporário, acontecendo enquanto as economias se desenvolvem. Porém, atualmente o mesmo modelo tem sido aplicado para entender o aumento da desigualdade em economias ocidentais.
A lógica segue o raciocínio de Lewis e Furtado, mas no sentido inverso. Imagine novamente uma economia com dois setores, mas na qual o setor moderno não gera emprego suficiente para a força de trabalho disponível. Nesse caso, muitos trabalhadores perdem emprego no setor moderno (digamos, indústria e serviços formais) e acabam migrando para o setor atrasado (digamos, serviços informais nas cidades).
Nós, economistas, chamamos essa transição de “economia do bico” (gig economy) ou “uberização” das relações de trabalho e ela vem acontecendo em várias economias avançadas e emergentes.
No caso do Brasil, a recente combinação de crescimento com redução da produtividade pode ser explicada pelo fato de que os trabalhadores que perderam emprego formal estão voltando a trabalhar, mas no setor informal de prestação de serviços urbanos, no qual sua produtividade é menor.
A qualificação do trabalhador continua a mesma de antes, mas, como a economia não é capaz de gerar empregos adequados à capacidade produtiva de quem perdeu emprego, as pessoas se viram fazendo o que podem, e isso aparece como redução da produtividade média da economia.
No modelo Lewis-Furtado, o crescimento do setor moderno eventualmente absorve o excesso de oferta de trabalhadores do setor atrasado. Quando isso acontece, o salário no setor moderno começa a subir em linha com a produtividade e a economia entra em um estágio avançado de desenvolvimento, dominado pelo setor moderno.
No modelo original de Lewis, a dualidade seria um fenômeno temporário, acontecendo enquanto as economias se desenvolvem. Porém, atualmente o mesmo modelo tem sido aplicado para entender o aumento da desigualdade em economias ocidentais.
A lógica segue o raciocínio de Lewis e Furtado, mas no sentido inverso. Imagine novamente uma economia com dois setores, mas na qual o setor moderno não gera emprego suficiente para a força de trabalho disponível. Nesse caso, muitos trabalhadores perdem emprego no setor moderno (digamos, indústria e serviços formais) e acabam migrando para o setor atrasado (digamos, serviços informais nas cidades).
Nós, economistas, chamamos essa transição de “economia do bico” (gig economy) ou “uberização” das relações de trabalho e ela vem acontecendo em várias economias avançadas e emergentes.
No caso do Brasil, a recente combinação de crescimento com redução da produtividade pode ser explicada pelo fato de que os trabalhadores que perderam emprego formal estão voltando a trabalhar, mas no setor informal de prestação de serviços urbanos, no qual sua produtividade é menor.
A qualificação do trabalhador continua a mesma de antes, mas, como a economia não é capaz de gerar empregos adequados à capacidade produtiva de quem perdeu emprego, as pessoas se viram fazendo o que podem, e isso aparece como redução da produtividade média da economia.
Sobre o autor
Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.
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