5 de março de 2020

"Eles não acham que nossas vidas sejam tão importantes quanto as deles"

Na segunda-feira à noite, trabalhadores de um armazém da Amazon em Chicago se uniram a uma onda nacional de paralisações sobre o que eles dizem ser a resposta inadequada da gerência à pandemia de coronavírus. Um dos organizadores da ação falou com a Jacobin sobre isso.

Uma entrevista com
Terry Miller


Ex-funcionários da Amazon feridos se juntam a organizadores de trabalho e ativistas da comunidade para protestar e realizar uma conferência de imprensa fora de uma loja da Amazon Go em 10 de dezembro de 2019 em Chicago, Illinois. Scott Olson / Getty.

Tradução / Na semana passada, funcionários do JFK8, um depósito da Amazon localizado em Staten Island, abandonaram seus postos de trabalho em protesto contra a resposta inadequada da empresa aos casos confirmados de coronavírus entre os próprios empregados que ali trabalhavam. “Quantos casos confirmados? Dez!”, entoavam fora do prédio.

Naquela mesma noite, funcionários de outro depósito da Amazon, o DCH1, localizado em Chicago, também foram as ruas. Um deles, Terry Miller — um pseudônimo para que ele pudesse falar livremente — afirmou que a maioria dos trabalhadores do turno da noite ficaram do lado de fora do prédio durante a paralisação. “Esta empresa ganha muito dinheiro às nossas custas”, diz um trabalhador em um vídeo que registrou a ação daquele dia. “Minha vida não é um meio para este fim”, acrescenta.

No mesmo vídeo, outro funcionário diz que a empresa “esperou que o turno da noite terminasse para contar” sobre um caso confirmado de coronavírus entre os trabalhadores daquele depósito. “Eles não avisaram para as pessoas até que mais três turnos chegassem no dia seguinte”, diz ele.

Ontem, o funcionário Terry Miller conversou com Alex Press, da Jacobin, a respeito do planejamento da paralisação, da resposta da administração do depósito DCH1, e do motivo da preocupação dos executivos da Amazon, que demitiram Christian Smalls, organizador da paralisação em Staten Island; demissão esta que envolveu os vice-presidentes sêniores da empresa e o próprio dono Jeff Bezos. Apesar dos desafios, Miller é claro sobre a situação do movimento: “Estamos fazendo avanços”. A transcrição abaixo foi editada para dar maior fluidez e clareza ao texto.

AP

Assisti ao vídeo gravado na segunda-feira, onde você e seus colegas de trabalho estavam do lado de fora do DCH1, um depósito da Amazon localizado em Chicago. Pode me dizer o que levou a paralisação e qual foi a resposta da gerência?
TM

Ao longo de vários meses, crescemos e intensificamos nosso movimento. Cada vez que fazíamos uma petição, tínhamos mais assinaturas. Cada vez que distribuíamos boletins informativos, mais pessoas pegavam e liam. Nossa lista de contatos de colegas de trabalho adeptos ao movimento cresceu. Estávamos fazendo potlucks (confraternização onde cada participante leva comes e bebes) semanais durante o almoço. Tivemos eventos sociais antes da quarentena provocada pela pandemia do coronavírus. Tivemos uma variedade de eventos que fortaleceram o movimento, tanto dentro como fora do depósito. Em janeiro e fevereiro, estávamos trabalhando no conquistado regime de folga remunerada (paid time off – PTO). Em suma, passamos por uma variedade de situações que foram bem-sucedidas do nosso ponto de vista: ganhamos muitos adeptos ao nosso movimento.

Quando a pandemia do coronavírus atingiu os Estados Unidos, sabíamos que era uma questão de tempo até que um caso aparecesse em nosso local de trabalho. O primeiro foi no depósito DBK1, em Nova York — os funcionários de lá reagiram rapidamente, fechando-o — e, por isso, sabíamos que precisávamos estar prontos quando chegasse a nossa vez.

Desenvolvemos o movimento e algumas das infraestruturas necessárias para nos precaver das infecções, mas alguns de nós preferiram se proteger nas estruturas e não trabalhar, então foi meio caótico. No momento em que recebemos a confirmação da gerência sobre um caso de infecção, concluímos que precisávamos responder imediatamente. O nosso comitê organizador – que é o grupo de nós que está mais engajado nos esforços do movimento- fez uma reunião de emergência no dia seguinte e disse: “Temos um caso confirmado de coronavírus. Até agora, a gerência não só tem sido sombria quanto a isso, como também está tentando encobrir este fato ou está esperando que vários turnos cheguem antes de fazerem um pronunciamento, colocando todos em risco. Isto é uma crise. Precisamos responder. O que devemos fazer?”.

Foi quando formulamos nosso plano: precisamos iniciar imediatamente uma petição, precisamos de um conjunto de exigências, temos que ser muito claros sobre o que queremos mudar neste depósito para nos protegermos do coronavírus. Registramos nossas exigências nessa reunião e fizemos a tal petição para que pudéssemos esclarecer nossas demandas para todos os nossos colegas de trabalho, para que todos ficassem na mesma página e para que tivéssemos unidade. De lá para cá, tivemos que iniciar uma paralisação, pois percebemos que era é a única maneira de acabar com o problema.

O caso confirmado veio na sexta-feira, 27 de março. Segunda-feira à noite foi nossa paralisação. Tivemos 48 horas desde o momento em que o vírus começou a nos atingir até o momento que planejamos paralisar. Precisávamos reagir rápido porquê quanto mais tempo este depósito estivesse aberto, mais nossos colegas de trabalho estariam em risco. Tenho colegas de trabalho com mais de 70 anos e sabemos que a taxa de fatalidade para eles é maior. Imagine ter 72 anos e trabalhar em um depósito da Amazon por que você não pode se aposentar. Portanto, é uma crise do caralho.

Distribuímos a petição principalmente por via eletrônica porquê estamos de quarentena. Se fôssemos para o depósito, há regras que não nos permitiriam ficar a menos de um metro um do outro, e por isso não poderíamos andar por aí com uma prancheta e uma petição nas mãos.

Primeiramente enviamos mensagens SMS, e-mails e usamos as mídias sociais para conseguirmos assinaturas. Após isso, imprimimos nossa petição e tínhamos tudo pronto na segunda-feira para falar com nossos colegas de trabalho. No depósito, montamos um piquete de greve antes do turno da noite começar, conversamos com todos os colegas que iam chegando, e explicamos o que estávamos fazendo e o porquê queríamos fechar o depósito.

Foi assim que conseguimos iniciar uma paralisação significativa no turno da noite. Por causa disto, o depósito foi incapaz de movimentar grande parte de seu volume.

Vale a pena notar a tristeza da subjugação do capitalismo, especialmente para negros da classe trabalhadora. Quando colegas entravam no depósito, furando o bloqueio do piquete, não ficamos ressentidos. Foi tipo: “Ei, você quer se juntar a nós? Estamos tentando fechar este depósito sem que sejamos prejudicados”, mas eles disseram: “Eu preciso deste salário.” Outros colegas afirmaram: “Eu apoio vocês. Eu assinei sua petição, mas eu preciso destas horas de trabalho” [nos EUA, o cálculo do salário se dá pelas horas trabalhadas].

E nós estávamos, tipo, “tudo bem, faça o que achar melhor”. Nós perguntamos a eles: “Vocês se sentem seguros entrando neste depósito? Vocês realmente acham que a gerência está fazendo o suficiente para nos proteger do coronavírus? O que vocês acham que deveria acontecer?” Eles responderam: “Acho que deveríamos fechar o prédio”. E nós dissemos que isto era justamente a nossa primeira exigência descrita em nossa petição e por isso estávamos paralisando. Eles comentaram, ainda assim: “Sim, concordamos com você, mas precisamos das horas de trabalho.”

Isso é escravidão do capitalismo. Das pessoas que entraram no depósito, a maioria expressou apoio à nossa paralisação, mas disseram que precisavam do dinheiro.

AP

Muitos colegas vêem os procedimentos da Amazon e dizem: “É loucura bater de frente com esta empresa”. O que você diria para os colegas que admiram a coragem de enfrentamento dos camaradas, mas que acham que isso não é possível acontecer dentro do ambiente de trabalho dos depósitos?
TM

Esta dificuldade sempre fará parte da nossa realidade, mas veja o quanto conquistamos até agora. Maio passado foi nossa primeira ação organizada. A gerência estava tirando a água potável do depósito. Há mais detalhes, mas os garrafões de água não estavam mais lá, e as estações de água estavam vazias ou sujas demais para serem utilizadas. Nossos colegas de trabalho estavam muito aborrecidos.

Então, começamos uma petição, entregamos, e em cerca de 1 hora a gerência foi até um supermercado. Eles nunca tinham visto funcionários enfrentando-os. Eles trouxeram garrafinhas de água e, 2 semanas depois, instalaram tubulações de água por todo o depósito.

Também conseguimos paralisar o depósito no dia mais quente do ano, em 19 de julho, na semana “Amazon Prime”. Tivemos muitas ações. Fizemos uma petição, dirigimo-nos até nosso chefe, de modo de deixamos-lhe muito nervoso. Isso foi noticiado na imprensa. E conseguimos paralisar o depósito sem prejuízos para os nossos colegas, beneficiando cerca de 200 deles, e cada um recebeu US$ 100 que jamais conseguiriam doutra maneira a não ser por meio de protesto. Recebemos cerca de US$ 20.000 da Amazon naquele dia.

Então, mais recentemente, fizemos a campanha do PTO (paid time off – folga remunerada). Beneficiamos todos os trabalhadores meio-período do país com a folga remunerada, enquanto que anteriormente dezenas de milhares eram dispensados do dia de trabalho sem receber um tostão.

Ganhamos muitas coisas que melhoraram nossas condições e salários, e tudo dentro do período de 1 ano. Nenhum de nós foi demitido por conta de atividades políticas. Não posso prever o futuro, mas o que estamos fazendo agora está funcionando: estamos crescendo e espalhando nosso movimento — há agora pelo menos 3 grupos públicos de trabalhadores se organizando no país sob o nome de “Amazonians United”. Houve a paralisação na segunda-feira. Todas estas coisas foram bem-sucedidas. Então, sim, estamos inseridos em condições de merda porquê é isso que o capitalismo faz conosco, mas estamos fazendo grandes avanços para contornar esta situação.

AP

Voltemos a falar a respeito de segunda-feira à noite. Qual foi a reação da gerência frente a esta paralisação?
TM

Foi medo e nervosismo no início. Estes gerentes não estão acostumados com trabalhadores que os enfrentam; eles pensam que somos estúpidos, que somos pobres e desesperados, e eles esperam que obedeçamos a cada comando deles. Mas, de repente, eles têm todos esses trabalhadores se reunindo lá fora. Uma das primeiras coisas que [um gerente] fez foi sair e dizer: “há uma regra de distanciamento social em vigor, todo mundo tem que ficar a 1,80 metros de distância um do outro por questão de segurança”. Mas o olhar em seu rosto era apenas: “Oh, que droga”.

Então, falávamos com os colegas que chegavam ao depósito e a quantidade de adeptos começou a crescer. O gerente voltou e pareceu que estava prestes a chorar. “Isso pode ser ruim para mim. Se eu não conseguir lidar com isso, posso ser demitido”. Tenho certeza que ele ligou para o seu superior, a política empresarial clichê: diga ao seu superior o que está acontecendo, e peça para a equipe da Amazon especializada em conter protestos para fazer uma videochamada.

Mas a resposta recebida foi vigilância básica e intimidação, além de lembretes contínuos sobre a política de 6 metros. Entretanto, sobre aquele funcionário de Staten Island [Christian Smalls], que foi demitido, eles obviamente o dispensaram por encabeçar um movimento, mas uma das desculpas que a Amazon forneceu foi que ele quebrou a quarentena – ele estava violando a regra de 1,80 metros. Na segunda à noite, alguém da gerência estava lá e pegou um telefone para tirar uma foto nossa. Começamos a perceber que eles estavam construindo seu caso para nos demitir por violar a regra de distanciamento social recomendada pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC).

Não é possível trabalhar no depósito longe 1,80 metros um do outro. Todo mundo sabe disso, incluindo a gerência. Quando estávamos entregando a petição no final da ação de segunda à noite, estávamos dentro da sala de descanso quando 02 gerentes entraram e nos advertiram que tínhamos que estar a 1,80 metros de distância um dos outros.

Mas eles disseram isso enquanto estavam literalmente ombro a ombro um do outro. Eu disse: “Vocês dois não estão a 1,80 metros de distância”. Eles olharam um para o outro constrangidos e se afastaram um pouco.

Na segunda à noite, fizemos uma live. A entrega da petição é uma formalidade neste momento – mas a política da Amazon é recusar qualquer forma ou legitimidade de movimento, e então eles sempre recusam petições. É a política deles. Então sabíamos que apresentaríamos nossas solicitações e eles recusariam, e então continuaríamos a prosseguir com nosso movimento junto aos nossos colegas de trabalho em face do desrespeito flagrante da gestão para conosco.

Mas ação de segunda à noite os surpreendeu. Eles não estavam preparados para isso; estavam ligando uns para os outros para entrar em uma teleconferência para falar sobre como lidar com isso.

Terça-feira de manhã fizemos um novo enfrentamento do lado de fora do prédio. Mas o chefe superior do local estava lá e não precisou de seus lacaios para fazer seu trabalho sujo. Ele ameaçou os funcionários, lembrando-os da política de 1,80 metros, e sabíamos que ele estava usando isso para nos demitir em algum momento.

Os trabalhadores estão na sala de descanso quando ele diz: “Se você não vai bater o ponto, você tem que sair”. Então ele sai da sala, e fala aos que estavam lá fora: “Se não vão trabalhar, então vão embora daqui”. Ele disse que ia anotar o nome dos manifestantes. Ele fez isso seis ou oito vezes, e em uma delas ele disse: “Se não vão embora, serão demitidos”.

Ele ameaçou demiti-los por estarem do lado de fora. Já estamos no processo de apresentação de uma queixa formal contra a ULP [unfair labor practice process – prática laboral desleal] e de divulgação disto aos colegas de trabalho e tudo mais, mas a direção já tinha desferido suas ameaças naquela manhã. Vários de nós receberam telefonemas com várias perguntas do RH.

AP

Para esclarecer, houve um caso confirmado de coronavírus no depósito e a empresa não esvaziou o prédio primeiramente para dar a notícia?
TM

Sim. Sexta-feira à noite, 27 de março, foi quando a administração alegou ter recebido a confirmação de um caso confirmado pela primeira vez – supostamente, eles receberam essa informação após o turno da noite já ter completado a maior parte de seu serviço rotineiro. A forma que recebemos a notícia foi através de 02 gerentes que se deslocaram pelo depósito, dizendo a cada funcionário individualmente: “Queremos informar que houve um caso confirmado de coronavírus aqui. Fiquem quietos porquê seremos nós quem vai contar isso ao restante do pessoal”. Eles falavam assim nos arredores do depósito.

Os nossos colegas lá dentro enviaram imediatamente uma mensagem ao nosso grupo a respeito da notícia da primeira infecção. Nós pensamos: “Um caso confirmado. Nós conhecemos colegas que fazem parte do grupo de risco no turno de sexta à noite, e por isso temos que contar a eles imediatamente. Temos que contar pra eles e pra todos do depósito”. A forma que a gerência avisou sobre o coronavírus – através de cochichos – não é a forma correta de avisar algo desta magnitude em um local onde há várias pessoas que estão na categoria de grupo de risco. Foi uma completa falta de respeito.

Enviamos um e-mail para a nossa lista de colegas de trabalho que assinaram a petição anterior ou que disseram que queriam ouvir as divulgações de nosso grupo. Nós colocamos a notícia na nossa página de colegas de trabalho do Facebook. Para tentar evitar que os funcionários ficassem chateados, a gerência disse: “Também temos filhos”. Como gestores, eles recebem 10x mais do que nós e possuem o benefício de um plano de saúde. Eles podem ir ao médico. Nós não.

Trata-se de um depósito que funciona na escala 24/7. Temos 04 ou 05 turnos por dia, todos os dias da semana. O turno da noite é por volta das 20h00 às 05h00; o da manhã é por volta das 05h00 às 09h00; um turno de 06h00 às 11h00; o da tarde por volta das 09h00 às 14h00, e depois um turno da noite por volta das 16h00 às 18h00, normalmente. Ou seja, há sempre trabalhadores no depósito.

Supostamente, o conhecimento do caso confirmado foi recebido pela gerência na sexta-feira à noite, e eles imediatamente debateram entre si sobre o que fazer. Assim, o turno da manhã veio depois do turno da noite, e depois o turno das 06h00 às 11h00, e depois o turno da tarde, até que o turno da noite estava basicamente a chegar antes de eu receber uma ligação pré-gravada, pouco depois das 16h00 de sábado à tarde. 04 turnos de funcionários tinham entrado e esta foi a primeira comunicação oficial que fizeram conosco!

AP

Então eles contaram pessoalmente a alguns funcionários na sexta à noite, e então só voltaram a contar ao restante do pessoal às 16h00 do dia seguinte?
TM

Acho que alguns da gerência contaram (por cochichos) aos funcionários a medida que estes chegavam, mas, ainda assim, nem todos ficaram sabendo. E todos que ficaram sabendo, obviamente, só descobriram da infecção quando entraram no depósito. A irresponsabilidade da Amazon é agravada pelo fato da empresa possuir muitas ferramentas para nos informar de coisas instantaneamente, e eles usam estas ferramentas o tempo todo — temos alertas de mensagens de texto (SMS), temos o app da Amazon, temos mensagens por e-mail, temos murais, temos o portal online de funcionários — várias ferramentas que eles usam para se comunicar conosco em caso da necessidade de turnos extras, folgas etc. Estas são ferramentas que eles usam para se comunicar com todos os trabalhadores diariamente, mas quando há caso de coronavírus confirmado, eles optaram por usar uma ligação pré-gravada 10 horas depois, depois de quatro turnos de funcionários não tiveram escolha a não ser adentrar em um potencial depósito infectado com coronavírus.

Essa é a extrema injustiça. Temos trabalhadores em grupo de risco, temos colegas de trabalho com asma e com outras complicações médicas, colegas de trabalho com deficiência — todas estas pessoas que estão em risco muito maior de fatalidade por coronavírus. Eles foram submetidos a isso sem conhecimento ou consentimento do que realmente estava acontecendo.

Parte da nossa mensagem de segunda à noite que enviamos aos nossos colegas foi: “É assim que a gerência tem reagido. Tá tudo errado. Eles estão nos colocando em risco. Precisamos fazer alguma coisa.

Precisamos fechar o depósito por 02 semanas para uma desinfecção completa. Não se pode fazer uma desinfecção enquanto todos trabalhadores estão em atividade no prédio, cruzando por partes contaminadas o tempo todo. No ensino fundamental e em desenhos animados, aprendemos sobre como os vírus se espalham – não dá pra desinfectar um local com uma centena de trabalhadores indo e voltando”.

É necessário fechar o prédio por 02 semanas, não só para desinfectá-lo, mas para descobrir quem eventualmente também está infectado. Precisamos ser capazes de avaliar se temos coronavírus para optarmos por ficar em casa ou procurar atendimento médico, em vez de propagarmos o vírus livremente pelo ambiente de trabalho.

Baseado na atitude deles no fim de semana, eles não acham que nossas vidas importam tanto quanto as deles. Isso é a verdade. Eles acham que somos estúpidos, como se nós, trabalhadores, por conta de más escolhas, devêssemos necessariamente trabalhar muito mais do que eles por muito menos. É assim que eles pensam: que estamos aqui para sermos explorados – pode haver um vírus que tem probabilidade de matar-nos, mas não tem problema, continuem trabalhando, é só caprichar mais na higiene do local. É assim que eles nos tratam. É assim que eles nos veem.

AP

Falando de como os superiores da Amazon vêem os seus trabalhadores, você mencionou que o mentor Chris Smalls foi despedido em Nova Iorque. Você deve ter visto o documento vazado onde a empresa chamou o Smalls de não esperto e inarticulado. Por que os vice-presidentes seniores e o próprio Jeff Bezos foram atrás deste funcionário? Por qual razão estão tão preocupados com este movimento?
TM

Os gestores pensam que nem sequer conseguimos ler o nosso próprio manual de funcionário. Na nossa campanha da folga remunerada (PTO – paid time off), apontamos o trecho no manual que dizia: “todos os trabalhadores têm direito a folga remunerada”. Em outras palavras, eles publicaram este direito somente por escrito na tentativa que não o percebêssemos por inabilidade de leitura.

Mas eu acho que eles estão ameaçados devido à sua própria experiência de gestão. Eles pensam: “Isso são indícios de um movimento organizado. Nunca se sabe, e com a pandemia do coronavírus, todos estão desesperados, e um aborrecimento por causa disto ou daquilo, nestas circunstâncias, facilmente pode levá-los a protestar sem medo do que vai acontecer”.

Eles compreendem e conhecem a história dos movimentos dos trabalhadores, como se dá seu início, e como parar. Eles entendem essas dinâmicas de poder. Há agora alguns depósitos que estão temporariamente fechados pela própria Amazon porquê eles estão tentando se antecipar ao movimento. Eles estão a pensar: “Nossos funcionários estão a desafiar o nosso poder. Estão dominando a narrativa exposta na mídia, estão a ameaçar a nossa marca. Estão a criar a seu próprio movimento organizado e nós precisamos esmagá-lo em seu início, pois se os deixarmos continuar, eles vão adquirir mais confiança e adeptos para prosseguir. Temos de continuar a trabalhar para impedir este movimento para que não cheguem a construir algo grande e organizado dentro do nosso império”. É assim que eles pensam sobre o assunto.

Não há dúvidas que eles sentem que seu poder está sob ameaça. Elegemos candidatos como Bernie Sanders e Cory Booker, que impulsionaram a nossa petição “Amazonians United”, a qual requeria medidas protetivas a classe trabalhadora em face do coronavírus. E os executivos pensam: “Talvez devêssemos deixar de subestimá-los”.

Quanto ao documento que foi vazado: bem, é assim que eles falam de nós e o que pensam de nós. Agora que estão mais conscientes do que se passa, nós temos de ser mais cuidadosos, temos de ser mais inteligentes em algumas coisas. Mas temos que continuar a trabalharem nosso movimento. Temos de continuar com ainda mais pressa.

AP

Qual é a mensagem que você gostaria de passar para as pessoas que lerão isto e para seus colegas de trabalho?

TM

Falem com os seus colegas, descubram as questões que sejam de interesse comum, iniciem uma petição, saiam, faça o que for preciso para lutar pelo o que vocês sabem ser correto. A nossa primeira reunião foi com seis adeptos num Krispy Kreme (empresa multinacional americana de donuts); foi por aí que começamos. Somos pessoas comuns, como todos os outros. No entanto, ganhamos a folga remunerada para dezenas de milhares de trabalhadores. Mas precisamos que outros trabalhadores da Amazon também façam o mesmo. Precisamos que todos os que trabalham em depósitos da empresa se organizem para que estes fechem durante a pandemia.

Sobre o autor

Terry Miller é membro do DCH1 Amazonians United.

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