Paulo Nogueira Batista Jr.
Folha de S.Paulo
Folha de S.Paulo
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) se encontrou com o presidente americano Donald Trump, durante visita aos EUA no sábado (7). Jim Watson/AFP/ |
A política externa brasileira causa perplexidade. Como pode um grande país, pergunta-se no mundo inteiro, comportar-se de forma tão subalterna e até ridícula? O Brasil, um dos gigantes do planeta, apresenta-se agora como um anão ignorante e ressentido. Estranha-se, em especial, o alinhamento aos EUA.
Qual é a lógica da atual política externa, em especial da relação com os EUA? Pode ser, leitor, que não haja lógica nenhuma. Mas quero crer que exista, sim, algum “método nessa loucura”, como diria Hamlet.
Qual é a lógica da atual política externa, em especial da relação com os EUA? Pode ser, leitor, que não haja lógica nenhuma. Mas quero crer que exista, sim, algum “método nessa loucura”, como diria Hamlet.
Antecipo, em duas frases, a minha hipótese explicativa: o que temos, na verdade, não é uma relação Brasil-EUA, mas a tentativa, da parte do presidente brasileiro, de criar uma relação muito particular, de natureza inconfessável, com o presidente norte-americano. Para tal, Bolsonaro faz, por assim dizer, cortesia com chapéu alheio: cede posições e interesses brasileiros, econômicos e políticos, para obter vantagens para si, isto é, para fortalecer-se nos embates internos correntes e futuros.
Não quero descartar as explicações habituais. Há, certamente, um componente de admiração beócia pelos Estados Unidos e, em particular, por Donald Trump. O presidente brasileiro e seu chanceler sofrem provavelmente de um certo problema cognitivo. Difícil não admitir que as esquisitices da relação com os EUA possam resultar, em parte, de simples falta de noção sobre como funcionam as relações internacionais.
Mesmo assim, leitor, as explicações habituais não convencem inteiramente. Afinal, não é preciso grande esforço para entender que todo país deve defender seus interesses e que ofertas unilaterais não levam a nada. Desde o começo, o governo brasileiro tem feito uma série de concessões comerciais e políticas sem contrapartidas ou com contrapartidas modestas. Os resultados práticos para o Brasil vêm sendo irrisórios ou enganosos.
Não quero descartar as explicações habituais. Há, certamente, um componente de admiração beócia pelos Estados Unidos e, em particular, por Donald Trump. O presidente brasileiro e seu chanceler sofrem provavelmente de um certo problema cognitivo. Difícil não admitir que as esquisitices da relação com os EUA possam resultar, em parte, de simples falta de noção sobre como funcionam as relações internacionais.
Mesmo assim, leitor, as explicações habituais não convencem inteiramente. Afinal, não é preciso grande esforço para entender que todo país deve defender seus interesses e que ofertas unilaterais não levam a nada. Desde o começo, o governo brasileiro tem feito uma série de concessões comerciais e políticas sem contrapartidas ou com contrapartidas modestas. Os resultados práticos para o Brasil vêm sendo irrisórios ou enganosos.
O governo Bolsonaro é fraco, politicamente contestado, inclusive por setores expressivos do establishment doméstico. Não tem base parlamentar estável nem capacidade ou vontade real de construí-la. A ninguém escapa, portanto, que Bolsonaro poderá correr, em algum momento, risco de impeachment ou, no mínimo, de perder as condições de governar. O risco de impeachment é exacerbado por uma imprudência na escolha do vice. A melhor proteção contra o impeachment, como se sabe, é um vice que assusta —José Alencar, não Michel Temer.
Problemas cognitivos ou não, Bolsonaro deve saber disso tudo. E já vem preparando o seu plano B, com três pontos, a ser acionado em caso de ameaças graves a seu projeto de poder, tais como impeachment ou inviabilidade de reeleição. O primeiro ponto é a militarização do governo e a cooptação das Forças Armadas. Oficiais ocupam posições-chave e tratamento especial vem sendo oferecido às corporações militares, inclusive na reforma da Previdência.
Segundo ponto: o fortalecimento das milícias, no Rio de Janeiro e alhures, alimentadas e encorajadas por sua relação com o presidente da República e seus filhos. Disso faz parte a facilitação da compra e do porte de armas. Pode até ser a antessala de um golpe de tipo boliviano: forças paramilitares de extrema direita, armadas até os dentes, preparadas para, no momento certo, partir para a violência, com o beneplácito e, no limite, a ajuda das forças oficiais.
Segundo ponto: o fortalecimento das milícias, no Rio de Janeiro e alhures, alimentadas e encorajadas por sua relação com o presidente da República e seus filhos. Disso faz parte a facilitação da compra e do porte de armas. Pode até ser a antessala de um golpe de tipo boliviano: forças paramilitares de extrema direita, armadas até os dentes, preparadas para, no momento certo, partir para a violência, com o beneplácito e, no limite, a ajuda das forças oficiais.
“Last but not least”, a relação muito particular com Donald Trump, ponto de apoio potencialmente importante em caso de agravamento do quadro interno e risco de descontinuidade do bolsonarismo. Vista por esse prisma, não se torna mais inteligível, por exemplo, a intenção de Bolsonaro, aparentemente absurda, de indicar aquele seu filho para o posto de embaixador em Washington? E mais inteligível, também, certas afirmações de Bolsonaro em seu recente encontro com Trump na Flórida? Na ocasião, o presidente brasileiro soltou, ao discursar, uma frase que causou alguma estranheza: "Eu tenho certeza que num futuro próximo é (sic) muito bom contar com um bom relacionamento de direita".
A reeleição de Trump em 2020 seria então peça essencial do plano B de Bolsonaro. Se essas conjecturas têm algum fundamento, o que estamos vendo é o desaparecimento das fronteiras entre a política interna e a externa, convertendo-se esta última em mero instrumento da primeira.
A reeleição de Trump em 2020 seria então peça essencial do plano B de Bolsonaro. Se essas conjecturas têm algum fundamento, o que estamos vendo é o desaparecimento das fronteiras entre a política interna e a externa, convertendo-se esta última em mero instrumento da primeira.
Sobre o autor
Economista, ex-vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (estabelecido pelos Brics em Xangai), ex-diretor executivo no FMI em Washington e autor de "O Brasil não cabe no quintal de ninguém" (editora LeYa)
Nenhum comentário:
Postar um comentário