Possível "IVA dual manco" concentra renda e agrava os conflitos federativos
Guilherme Mello
Folha de S.Paulo
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Guilherme Mello, professor do Instituto de Economia (IE) da Unicamp - Arquivo pessoal |
Após meses de protelação, o governo federal finalmente apresentou um esboço de sua proposta de reforma tributária, prevendo quatro mudanças principais: a unificação do PIS/Cofins em um único tributo, denominado Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS); a transformação do IPI em imposto seletivo; mudanças no Imposto de Renda, com redução das alíquotas máximas e fim de isenções; e redução dos encargos trabalhistas, a serem compensados pela arrecadação de uma "nova CPMF".
Dentre as quatro, apenas a criação da CBS foi detalhada em projeto de lei. Na comparação com outras propostas que tratam exclusivamente da mudança em impostos indiretos (como as PECs 45 e 110), ela representa um retrocesso.
Ao excluir do debate os impostos de competência estadual e municipal (ICMS e ISS), o governo federal se recusa a participar da reforma nos tributos que mais produzem complexidade tributária e conflitos federativos. A criação de fundos de desenvolvimento regional e a devolução do imposto para os mais pobres, necessários na criação de um novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA), são temas propositalmente ignorados pelo governo.
Além disso, a alíquota de 12% proposta para a CBS é maior do que a "alíquota neutra" que repõe a arrecadação atual. Isso significa que a arrecadação federal deverá aumentar através de tributos sobre consumo, o que irá centralizar a arrecadação e ampliar a desigualdade social, deformando a nossa já péssima estrutura tributária.
Caso estados e municípios consigam avançar sozinhos na criação de um IVA, teremos o chamado "IVA dual". Mas dada a alíquota federal de 12%, a mera adoção de uma "alíquota neutra" no IVA estadual-municipal produzirá uma alíquota total próxima a 30%, uma das maiores do mundo nesse tipo de imposto.
Em suma, o governo quer criar um "IVA dual manco", que simplifica pouco, concentra renda, centraliza arrecadação e agrava os conflitos federativos.
Além disso, a alíquota de 12% proposta para a CBS é maior do que a "alíquota neutra" que repõe a arrecadação atual. Isso significa que a arrecadação federal deverá aumentar através de tributos sobre consumo, o que irá centralizar a arrecadação e ampliar a desigualdade social, deformando a nossa já péssima estrutura tributária.
Caso estados e municípios consigam avançar sozinhos na criação de um IVA, teremos o chamado "IVA dual". Mas dada a alíquota federal de 12%, a mera adoção de uma "alíquota neutra" no IVA estadual-municipal produzirá uma alíquota total próxima a 30%, uma das maiores do mundo nesse tipo de imposto.
Em suma, o governo quer criar um "IVA dual manco", que simplifica pouco, concentra renda, centraliza arrecadação e agrava os conflitos federativos.
Por sua vez, com a proposta de substituir tributos sobre folha pela "nova CPMF", um tributo indireto cobrado em cascata, o governo desonera o empresário e onera o consumidor. Da forma apresentada, a "nova CPMF" será repassada ao preço dos produtos, prejudicando os mais pobres, os produtores nacionais e incentivando a verticalização produtiva.
Ademais, a aposta na redução dos encargos trabalhistas parece inócua em um cenário de falta de demanda, como foram as desonerações de folha e a reforma trabalhista no passado recente.
A única proposta de reforma tributária que combina simplificação, equilíbrio federativo, distribuição de renda e preocupação ambiental é a "Reforma tributária justa, solidária e sustentável", apresentada pela oposição. Curiosamente, ela é omitida do debate público, talvez por tributar a renda e patrimônio dos muito ricos e desonerar os mais pobres.
Ademais, a aposta na redução dos encargos trabalhistas parece inócua em um cenário de falta de demanda, como foram as desonerações de folha e a reforma trabalhista no passado recente.
A única proposta de reforma tributária que combina simplificação, equilíbrio federativo, distribuição de renda e preocupação ambiental é a "Reforma tributária justa, solidária e sustentável", apresentada pela oposição. Curiosamente, ela é omitida do debate público, talvez por tributar a renda e patrimônio dos muito ricos e desonerar os mais pobres.
Sobre o autor
Professor do Instituto de Economia (IE) e diretor do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (Cecon-IE) da Unicamp
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