Auxílio emergencial está sendo pago a informais, desempregados e beneficiários do Bolsa Família. Gabriel Cabral/Folhapress |
O auxílio emergencial de R$ 600 por mês, criado pelo Congresso Nacional, evitou uma recessão mais grave no Brasil.
Considerando os valores já pagos ou previstos, o aumento de renda para os mais pobres será de aproximadamente R$ 250 bilhões (3,6% do PIB) neste ano. Se o auxílio de R$ 600 durar até dezembro, o valor subirá para cerca de R$ 450 bilhões (6,4% do PIB). Tudo isso em apenas um programa, necessário e crucial para atenuar o impacto da pandemia na economia.
A injeção de renda é tão grande que, em vários casos, as famílias beneficiadas ganham mais hoje do que antes da pandemia. Isso confirma quão errada estava nossa economia antes da crise e deveria fazer nós economistas pensarmos se devemos mesmo voltar ao "normal", mas hoje quero falar do significado da renda básica universal.
Até hoje a maioria de nossos programas de transferência de renda compensa o beneficiário por alguma coisa. Pode ser incapacidade de trabalho (benefícios do INSS), perda de emprego (seguro desemprego), salário baixo (abono salarial), pobreza (Bolsa Família), impossibilidade de pescar (seguro defeso) e assim em diante.
O efeito do auxílio emergencial sobre a economia estimulou a mudança de lógica da proteção social, em direção à transferência de renda incondicional, uma renda básica para todos pelo simples fato de a pessoa existir. Em vez de compensação por algo, renda básica se tornaria direito, como saúde e educação públicas.
Como quase tudo no Brasil, a lei já existe. Ela foi aprovada no governo Lula (Lei 10.835 de 2004), por iniciativa de Eduardo Suplicy e assinatura de Palocci e Ciro Gomes, mas nunca implementada.
Talvez possamos avançar agora por três razões: (1) o impacto positivo do auxílio emergencial na economia aumentou o apoio à renda básica universal, (2) a tecnologia e capacidade produtiva da economia permitem, já há algum tempo, sustentar uma população inativa crescente sem perda de renda per capita e (3) o grau de desigualdade da distribuição de renda e riqueza indica que a renda mínima pode e deve ser financiada por tributação dos mais ricos, sobretudo da renda do capital.
Mas temos consenso político? Aparentemente não, haja vista o debate sobre financiamento da eventual Renda Brasil.
Já apareceram propostas de queimar patrimônio (desinvestimentos ou privatização pelo Estado) e antecipar receitas finitas (renda do petróleo) para pagar o auxílio emergencial por mais tempo. Isso é um equívoco. Pode até ser bem intencionado, mas continua um equívoco.
A eventual criação da renda básica universal requer base permanente de financiamento. Os recursos devem vir de tributação mais progressiva de lucros e dividendos (renda do capital), bem como de altos salários (renda do trabalho).
A reorganização dos atuais programas de transferência de renda pode ajudar no financiamento da renda básica, mas o objetivo do projeto não é simplesmente realocar recursos já existentes entre os mais pobres. O objetivo é que os mais ricos financiem uma renda mínima para todos, via contribuição adicional, daí a dificuldade política da ideia.
E do ponto de vista histórico, a adoção da renda básica seria uma mudança estrutural no capitalismo, pois todos virariam, em parte, rentistas! Todos receberiam parte do "excedente" produzido pela sociedade simplesmente por existirem, independentemente da posse dos "meios de produção". Mas paro por aqui para não assustar nossas lideranças nem-nem que hoje apoiam o fim (ou consagração?) do capitalismo. Voltarei ao assunto em outra coluna.
Talvez possamos avançar agora por três razões: (1) o impacto positivo do auxílio emergencial na economia aumentou o apoio à renda básica universal, (2) a tecnologia e capacidade produtiva da economia permitem, já há algum tempo, sustentar uma população inativa crescente sem perda de renda per capita e (3) o grau de desigualdade da distribuição de renda e riqueza indica que a renda mínima pode e deve ser financiada por tributação dos mais ricos, sobretudo da renda do capital.
Mas temos consenso político? Aparentemente não, haja vista o debate sobre financiamento da eventual Renda Brasil.
Já apareceram propostas de queimar patrimônio (desinvestimentos ou privatização pelo Estado) e antecipar receitas finitas (renda do petróleo) para pagar o auxílio emergencial por mais tempo. Isso é um equívoco. Pode até ser bem intencionado, mas continua um equívoco.
A eventual criação da renda básica universal requer base permanente de financiamento. Os recursos devem vir de tributação mais progressiva de lucros e dividendos (renda do capital), bem como de altos salários (renda do trabalho).
A reorganização dos atuais programas de transferência de renda pode ajudar no financiamento da renda básica, mas o objetivo do projeto não é simplesmente realocar recursos já existentes entre os mais pobres. O objetivo é que os mais ricos financiem uma renda mínima para todos, via contribuição adicional, daí a dificuldade política da ideia.
E do ponto de vista histórico, a adoção da renda básica seria uma mudança estrutural no capitalismo, pois todos virariam, em parte, rentistas! Todos receberiam parte do "excedente" produzido pela sociedade simplesmente por existirem, independentemente da posse dos "meios de produção". Mas paro por aqui para não assustar nossas lideranças nem-nem que hoje apoiam o fim (ou consagração?) do capitalismo. Voltarei ao assunto em outra coluna.
Sobre o autor
Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.
Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.
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