A revista socialista Mot Dag formou algumas das principais figuras públicas da Noruega, incluindo três primeiros-ministros do Partido Trabalhista e o cofundador da Organização Mundial da Saúde. A experiência deles mostra como a mídia de esquerda pode construir uma consciência socialista na sociedade e ajudar os militantes no parlamento a resistir à propaganda do establishment.
Conferência nacional do Partido Trabalhista Norueguês, 1923. (Wikimedia Commons) |
Tradução / Em setembro de 1921, o lançamento de uma revista socialista na Universidade de Oslo veio com um convite e um desafio: “O Mot Dag busca liderança intelectual”, insistia, “Nem todos os acadêmicos pertencem a este lugar, apenas aqueles que pensam”. Sua missão – desenvolver uma elite revolucionária de trabalhadores e intelectuais que pudessem assumir o poder na Noruega.
Os membros do grupo Mot Dag tornaram-se figuras públicas importantes, desde o cofundador da Organização Mundial da Saúde até autores e poetas de destaque. No entanto, seu principal sucesso foi político. Depois que o Partido Trabalhista norueguês formou seu primeiro governo de verdade em 1935, dando início a três décadas de hegemonia social-democrata, foram os membros do Mot Dag que compuseram sua equipe como assessores e deputados, além de serem os responsáveis por três dos primeiros quatro primeiros-ministros do Partido Trabalhista.
Mesmo uma experiência tão bem-sucedida não pode ser simplesmente arrancada de seu próprio contexto e reproduzida no presente. No entanto, os esforços desses socialistas noruegueses oferecem lições importantes para os dias de hoje. Para que um partido de esquerda não apenas se mantenha no cargo, mas realmente assuma o poder, é necessário que ele desenvolva seu poder e influência em toda a sociedade, mesmo além de sua presença no parlamento, para que possa resistir à pressão econômica de uma reação do establishment.
No caso norueguês, isso exigiu um projeto de décadas: um projeto que transformou uma causa política em um movimento com apoio amplo e duradouro nas artes, no meio acadêmico e até mesmo no serviço público. A história do Mot Dag mostra como a mídia de esquerda pode ser educativa para um público amplo e cultivar o desenvolvimento de uma intelligentsia de esquerda – uma parte crucial da construção da hegemonia socialista na sociedade como um todo.
Origens
O Mot Dag foi fundado em 1921 por Erling Falk, filho de um deputado liberal e parte da classe média alta do país. Ele se mudou para Minnesota em 1907 e permaneceu nos Estados Unidos por onze anos, desenvolvendo um sotaque de Chicago.
Esses laços entre os EUA e a Noruega foram importantes para os movimentos trabalhistas de ambos os países nessa época. Em 1º de maio de 1921, o líder norueguês-imigrante do Sindicato Internacional dos Marítimos dos EUA lançou uma greve de dois meses dos trabalhadores portuários, sete dias antes de os trabalhadores marítimos noruegueses, eles próprios enfrentando cortes salariais, iniciarem sua própria greve inspirados por seus companheiros norte-americanos.
Durante sua estada nos Estados Unidos, Falk teve vários empregos no centro-oeste, principalmente como contador do sindicato radical, o Industrial Workers of the World (IWW). Embora fosse um revolucionário convicto, apaixonado pelo sindicalismo do IWW, ele não era marxista nessa época e até desenvolveu um certo respeito pela administração eficiente das grandes empresas. Mesmo assim, ele retornou à Noruega em 1918 com a intenção de participar da luta pelo socialismo.
Diferentemente da Alemanha e da Rússia, o meio socialista norueguês teve início no movimento sindical, e não nos círculos intelectuais. O movimento foi liderado por Martin Tranmæl, um abstêmio rigoroso e ex-pintor de casas, cujo socialismo ético era da tradição compartilhada pelo fundador do Partido Trabalhista Britânico, Keir Hardie. Tranmæl também passou um tempo trabalhando nos Estados Unidos e esteve presente em Chicago para o nascimento do IWW. Um gigante do socialismo norueguês entre guerras, ele sugeriu de forma memorável que os trabalhadores deixassem dinamite em seu local de trabalho para desencorajar os fura-greves.
O socialismo revolucionário de Tranmæl estava em alta no Partido Trabalhista norueguês no início da década de 1920, e Falk queria dar destaque a essas mesmas ideias na vida intelectual. Naquela época, a Noruega tinha apenas uma universidade, então, naturalmente, ele recorreu à sua altamente politizada Sociedade de Estudantes – nessa época, povoada por uma geração horrorizada pelo trauma da Primeira Guerra Mundial. Em uma das primeiras edições do Mot Dag, o estudante de história Arne Ording – ele mesmo um futuro político trabalhista – escreveu: “…acordamos e o antigo desejo se tornou uma exigência viva: Esta tinha que ser a última guerra!”
Falk lançou a primeira edição do Mot Dag com um pequeno grupo de estudos em setembro de 1921. Líder carismático, ele queria formar um grupo de estudantes e jovens trabalhadores que fizessem da revolução sua primeira prioridade. Como escreve George Lakey, o grupo “buscava substituir o individualismo da classe média por um espírito coletivo e disciplinado”, organizando-se com tanta intensidade que alguns se referiam a ele como uma “ordem de monges de magia negra”.
Embora a maioria dos membros do Mot Dag fossem filhos desiludidos da burguesia, o grupo também recrutava ativamente nos sindicatos. Seu número de membros não passava de duzentos, mas a revista, com 6.500 assinantes, era considerada a mais influente de sua época. Sua intenção era influenciar líderes emergentes da classe trabalhadora, como Tranmæl e Oscar Torp, um ex-eletricista que foi presidente do Partido Trabalhista de 1923 até a Segunda Guerra Mundial. No entanto, eles não viam as mulheres como líderes e, apesar de vários membros femininos notáveis, como a poetisa Inger Hagerup e a psiquiatra Nic Waal, as mulheres não tiveram grande participação em seu trabalho político.
Virada comunista
Um ano após o lançamento da revista, em 1922, o grupo formou a “Organização Comunista do Mot Dag” e tornou-se filiado do Partido dos Trabalhadores. Eles mantiveram sua própria bancada, mas se aliaram à ala revolucionária liderada por Tranmæl.
A década seguinte trouxe um intenso sectarismo. Primeiro, um grupo se separou para formar um Partido Social Democrata e, em 1923, um Partido Comunista fez o mesmo. No final da década, Mot Dag também deixaria o partido. No entanto, foi o relacionamento entre o Mot Dag de Falk e a ala Tranmæl do partido que garantiu que o Partido Trabalhista não entrasse em colapso durante a turbulenta metade da década de 1920.
As divisões diziam respeito, em grande parte, ao relacionamento do partido com a Internacional Comunista (Comintern), sediada em Moscou, à qual ele havia aderido em 1919. Em 1922, a maioria dos principais socialistas noruegueses estava frustrada com o estilo de comando dos soviéticos e, principalmente, com suas instruções para se preparar para a luta armada, o que era um anátema para os instintos anti militaristas dos noruegueses. À sombra da Primeira Guerra Mundial e da Revolução Russa, a ideia de mais derramamento de sangue era uma proposta infeliz.
Em 1922, o partido produziu o “rascunho de Kristiania”, um documento clássico na história do movimento trabalhista norueguês. Redigido principalmente por Falk, ele continha o que Falk e Tranmæl consideravam essenciais em termos políticos: liderança sob controle permanente dos membros e autoemancipação dos trabalhadores. Em retrospectiva, o projeto pode ser visto como uma mistura das tradições democráticas norueguesas com uma desconfiança tipicamente americana em relação à burocracia – na época, diretamente voltada contra o Comintern. Crucialmente, ele propunha que o Partido Trabalhista se separasse da Internacional.
Os líderes soviéticos encarregados do Comintern reagiram furiosamente. Seu enviado à Noruega teria dito que queria que Falk fosse jogado em uma cova com “ossos quebrados”. As anotações de uma plenária do Comitê Executivo em 1922 capturam a atitude da liderança: “A Internacional Comunista não é um hotel, onde você pode fazer check-in e check-out. Hōgland defende o jornal Mot Dag. Ele pede que sejamos leais aos camaradas noruegueses. Certamente, devemos ser leais aos camaradas, mas não a pessoas que nos combatem de forma tão desleal como o grupo Mot Dag”.
Em meio a essa discussão, Falk e Tranmæl foram convocados a Moscou para se explicar. Embora o grupo Mot Dag admirasse os soviéticos, eles permaneceram críticos. Falk, excepcionalmente, tratou os líderes soviéticos como iguais, falando sarcasticamente e resistindo às suas suposições estratégicas. De forma decisiva, os noruegueses queriam criar um partido de massas, enquanto os comunistas russos queriam criar um partido que liderasse as massas. O Comitê Executivo do Comintern emitiu um ultimato ao Partido Trabalhista, fazendo-o escolher entre “um bom relacionamento com Erling Falk e um bom relacionamento com a Internacional”. Na conferência seguinte do Partido Trabalhista, em 1923, os comunistas do partido se separaram. Na batalha pela liderança que se seguiu, a bancada do Mot Dag foi fundamental para manter o poder majoritário do Tranmæl.
No entanto, sua colaboração logo foi substituída por um amargo antagonismo, pois, no final das contas, tanto Tranmæl quanto Falk não conseguiam aceitar a liderança de ninguém, exceto a sua própria. A dissidência crônica de Mot Dag em relação à linha do partido chegou ao auge durante uma greve militar em 1925. O Partido Trabalhista havia convocado os homens a se recusarem a prestar serviço militar, mas depois que vários representantes do chão de fábrica foram presos e encarcerados por fazerem isso, o partido rapidamente voltou atrás e cancelou a ação. Como comunistas revolucionários, os Mot Dag ficaram indignados com esse recuo, especialmente porque ele ocorreu logo após uma dinâmica semelhante ter ocorrido durante a greve dos trabalhadores da indústria siderúrgica de 1923. Os eventos foram o ápice da tensão clássica entre reforma e revolução, e o resultado final foi a expulsão do grupo Mot Dag do partido.
Missão de renovação
Foi durante esses anos, em que a política partidária dominante foi evitada, que o programa cultural e acadêmico do Mot Dag se desenvolveu. Com os liberais e os conservadores no governo, o Partido Trabalhista fora dos limites para eles e o Partido Comunista como uma força marginal, eles se voltaram para o que hoje descreveremos como trabalho contra-hegemônico. Esse aproveitamento do conhecimento para fins sociais foi fundamental para sua missão de renovação. Vemos isso na repreensão de uma edição aos seus antecessores intelectuais:
Quem poderia imaginar que os cientistas exploraram as mais recentes e gloriosas descobertas da ciência a serviço da guerra, quem poderia imaginar que os artistas, os escritores e os poetas dedicariam seu brilho interior ao ódio e à destruição?
Em 1925, o grupo Mot Dag fundou uma Escola Noturna para Trabalhadores que trouxe muitos novos membros como professores e autores de folhetos de estudo. Um jovem estudante de medicina chamado Karl Evang juntou-se ao grupo, e seus escritos tornaram-se extremamente populares.
Ele passou a ser o médico-chefe da Noruega, erradicando com sucesso a poliomielite por meio de um programa nacional coordenado. Evang, juntamente com outros dois médicos – um belga e um iugoslavo – fundaria a Organização Mundial da Saúde em 1948.
Outros membros formaram a Socialist Architects Association e criaram uma revista chamada PLAN. Sua breve existência de quatro edições representou uma “voz importante e radical na comunidade arquitetônica e no desenvolvimento de políticas de habitação social”. Novamente, algumas das ideias sobre habitação social formadas nas páginas da PLAN se tornaram realidade após a Segunda Guerra Mundial, pois alguns de seus membros se tornaram ministros do Trabalho.
O periódico político mais bem escrito de sua época, o Mot Dag adotou um tom às vezes feroz ao denunciar a inadequação das elites governantes. Após a morte de Christian Michelsen, que havia sido o primeiro primeiro-ministro da Noruega, a revista rejeitou a tentativa consensual de elevá-lo como um ícone: “A geração que assumiu a liderança neste país nos primeiros anos do século XX foi bastante desprovida de talento. Ela perdeu a cabeça quando a [Primeira Guerra Mundial] chegou, e deixou o país atolado em dívidas e má administração.” Um artigo que discutia o conceito de terror criticava a política colonial britânica na Índia: “Quando o fermento de problemas se torna muito grande em um distrito e um surto parece iminente, o exército de ocupação inglês envia um esquadrão de bombardeiros. Os vilarejos são incendiados, uma parte adequada dos nativos é despedaçada e os campos são queimados.”
Primeiro governo trabalhista
Em meados da década de 1930, o movimento fascista da Noruega estava em ascensão, e os membros do Mot Dag imunizaram efetivamente a população estudantil contra esse fenômeno crescente. Desde seu programa cultural de exibição de filmes até sua agitação antifascista, é difícil exagerar a importância política de sua hegemonia ideológica. Ela marginalizou com sucesso a União Nacional de Vidkun Quisling, que tentou aumentar sua participação de 2% nos votos, organizando estudantes desiludidos. Todos os esforços fascistas e semifascistas foram repetidamente derrotados nas eleições da Sociedade de Estudantes durante a década de 1930.
Mas, à medida que a saúde de Falk declinava, o mesmo acontecia com a sorte de Mot Dag, que dependia substancialmente da força de sua personalidade. Em 1935, o Partido Trabalhista formou seu primeiro governo, como parte de uma virada moderada que tanto Tranmæl quanto Falk defenderam como um movimento estratégico necessário contra a ameaça fascista. Compreendendo a necessidade de unidade na esquerda, ele anunciou sua aposentadoria da política para que o Mot Dag pudesse se fundir formalmente com o Partido Trabalhista; o relacionamento entre ele e Tranmæl havia se rompido de tal forma que a saída de Falk foi necessária para que a integração acontecesse.
Isso significava que o Mot Dag agora se dissolvia como uma instituição separada. No entanto, a última edição prometeu continuar o trabalho de seus membros no movimento mais amplo:
Os membros do Mot Dag, com alegria e entusiasmo, participarão com força total em uma luta que levará à conquista do poder social pelo partido e à vitória do socialismo na Noruega.
O Mot Dag conseguiu entrar na política com uma estratégia que influenciou com sucesso o movimento operário e a cultura em geral. Enquanto Martin Tranmæl e os sindicatos organizaram com sucesso os trabalhadores descontentes no início dos anos 1900, vinte anos depois Erling Falk e Mot Dag fizeram o mesmo com os intelectuais descontentes. Se os detratores fizeram um elogio indireto ao chamá-lo de “o notório Mot Dag”, os apoiadores o chamaram de “a organização política mais unida que já existiu nos países nórdicos”.
Isso não significava que todos os envolvidos compartilhavam um plano bem elaborado para fundar uma revista, tornar-se um caucus, dispersar-se na sociedade e tornar-se líderes em campos tão variados. Porém, no centro de sua abordagem estava a ideia de criar influência em toda a sociedade. Enquanto as discussões contemporâneas sobre uma estratégia “dentro” ou “fora” do Estado geralmente contrapõem as atrações concorrentes da política partidária eleitoral ou do ativismo “nas ruas”, a história do Mot Dag enfatiza a necessidade dos socialistas fazerem a longa marcha por todos os tipos de instituições – de fato, um ex-membro do Mot Dag chegou a ser diretor da inteligência militar da Noruega.
Construindo o poder
Podemos entender a lição do Mot Dag como o legado institucional que seus ex-membros deixaram para trás: da OMS aos órgãos culturais e às inovações lideradas pelos socialistas nas ciências e na educação. A construção dessa autoridade em campos variados foi um pré-requisito essencial para a hegemonia social-democrata e para a construção de um poder na sociedade capaz de resistir à propina do capital. Isso ficou evidente quando o governo trabalhista assumiu o poder em 1935, quando imediatamente enfrentou intensa pressão para ceder.
Essa oposição veio especialmente da Federação dos Empregadores, que durante anos lutou abertamente contra a crescente militância dos trabalhadores. Mas, diante de 105 greves somente naquele ano, esse clube de patrões teve de ceder à resistente coalizão entre os trabalhadores e a classe média. Finalmente, um “Acordo Básico” foi assinado: os capitalistas aceitaram os sindicatos, a negociação coletiva e o direito de greve, e o governo concordou que os empresários poderiam manter a propriedade de seus ativos.
Esse compromisso teria sido impensável sem um movimento com uma teoria de mudança amplamente compartilhada. Anos de grupos de estudo e educação política haviam ensinado ao movimento a necessidade de uma polarização na sociedade para dar início a um equilíbrio de poder transformador. De fato, a aliança liderada pelos trabalhistas também foi apoiada pelo pequeno Partido Agrário, formado principalmente por trabalhadores rurais, que trocou o apoio aos conservadores. O Partido Trabalhista havia se comprometido há muito tempo a não coletivizar as fazendas familiares caso assumisse o poder – uma decisão estratégica que valeu a pena em 1935.
Hoje, na Grã-Bretanha e em outros lugares, a politização vibrante da “geração da esquerda” e sua distribuição entre as profissões oferece um potencial para que ideias socialistas sejam encontradas em empresas multinacionais, universidades e nas artes, como na Noruega entre guerras. No entanto, é bem mais difícil encontrar exemplos de mídia de esquerda revitalizando a cultura do movimento sindical, ecoando os esforços conscientes do Mot Dag para educar e organizar estudantes, jovens profissionais e, principalmente, trabalhadores.
Como nos anos entre guerras, não há nada de inevitável no fato de o descontentamento da sociedade criar uma geração de socialistas. Construir isso exige um esforço deliberado – e é difícil. Mas, mesmo quando o Partido Trabalhista norueguês estava em dificuldades, o Mot Dag permaneceu uma organização ativa e continuou a desenvolver suas próprias forças, certo de que o objetivo não era apenas aumentar a força eleitoral do Partido Trabalhista, mas formar uma consciência socialista mais ampla em toda a sociedade. O Mot Dag sabia que, mesmo quando o partido chegasse ao governo, o movimento trabalhista teria que estar pronto não apenas para assumir o cargo, mas para manter o poder, baseando-se em um apoio profundamente enraizado ao seu programa.
Não existe uma tradução exata para Mot Dag, mas pode-se pensar que significa “Rumo a Tempos Melhores”. A Noruega, como sabemos, passou por tempos melhores: das dificuldades econômicas generalizadas no início do século XX, ela avançou para uma democracia social robusta, ainda hoje admirada em todo o mundo. Em sua primeira edição, a revista fez um convite direcionado principalmente a acadêmicos atenciosos, mas com uma visão otimista: “Será uma revista jovem, uma revista para aqueles que têm fé em si mesmos e no futuro do mundo.” Esse é exatamente o espírito de que precisamos hoje.
Isso não significava que todos os envolvidos compartilhavam um plano bem elaborado para fundar uma revista, tornar-se um caucus, dispersar-se na sociedade e tornar-se líderes em campos tão variados. Porém, no centro de sua abordagem estava a ideia de criar influência em toda a sociedade. Enquanto as discussões contemporâneas sobre uma estratégia “dentro” ou “fora” do Estado geralmente contrapõem as atrações concorrentes da política partidária eleitoral ou do ativismo “nas ruas”, a história do Mot Dag enfatiza a necessidade dos socialistas fazerem a longa marcha por todos os tipos de instituições – de fato, um ex-membro do Mot Dag chegou a ser diretor da inteligência militar da Noruega.
Construindo o poder
Podemos entender a lição do Mot Dag como o legado institucional que seus ex-membros deixaram para trás: da OMS aos órgãos culturais e às inovações lideradas pelos socialistas nas ciências e na educação. A construção dessa autoridade em campos variados foi um pré-requisito essencial para a hegemonia social-democrata e para a construção de um poder na sociedade capaz de resistir à propina do capital. Isso ficou evidente quando o governo trabalhista assumiu o poder em 1935, quando imediatamente enfrentou intensa pressão para ceder.
Essa oposição veio especialmente da Federação dos Empregadores, que durante anos lutou abertamente contra a crescente militância dos trabalhadores. Mas, diante de 105 greves somente naquele ano, esse clube de patrões teve de ceder à resistente coalizão entre os trabalhadores e a classe média. Finalmente, um “Acordo Básico” foi assinado: os capitalistas aceitaram os sindicatos, a negociação coletiva e o direito de greve, e o governo concordou que os empresários poderiam manter a propriedade de seus ativos.
Esse compromisso teria sido impensável sem um movimento com uma teoria de mudança amplamente compartilhada. Anos de grupos de estudo e educação política haviam ensinado ao movimento a necessidade de uma polarização na sociedade para dar início a um equilíbrio de poder transformador. De fato, a aliança liderada pelos trabalhistas também foi apoiada pelo pequeno Partido Agrário, formado principalmente por trabalhadores rurais, que trocou o apoio aos conservadores. O Partido Trabalhista havia se comprometido há muito tempo a não coletivizar as fazendas familiares caso assumisse o poder – uma decisão estratégica que valeu a pena em 1935.
Hoje, na Grã-Bretanha e em outros lugares, a politização vibrante da “geração da esquerda” e sua distribuição entre as profissões oferece um potencial para que ideias socialistas sejam encontradas em empresas multinacionais, universidades e nas artes, como na Noruega entre guerras. No entanto, é bem mais difícil encontrar exemplos de mídia de esquerda revitalizando a cultura do movimento sindical, ecoando os esforços conscientes do Mot Dag para educar e organizar estudantes, jovens profissionais e, principalmente, trabalhadores.
Como nos anos entre guerras, não há nada de inevitável no fato de o descontentamento da sociedade criar uma geração de socialistas. Construir isso exige um esforço deliberado – e é difícil. Mas, mesmo quando o Partido Trabalhista norueguês estava em dificuldades, o Mot Dag permaneceu uma organização ativa e continuou a desenvolver suas próprias forças, certo de que o objetivo não era apenas aumentar a força eleitoral do Partido Trabalhista, mas formar uma consciência socialista mais ampla em toda a sociedade. O Mot Dag sabia que, mesmo quando o partido chegasse ao governo, o movimento trabalhista teria que estar pronto não apenas para assumir o cargo, mas para manter o poder, baseando-se em um apoio profundamente enraizado ao seu programa.
Não existe uma tradução exata para Mot Dag, mas pode-se pensar que significa “Rumo a Tempos Melhores”. A Noruega, como sabemos, passou por tempos melhores: das dificuldades econômicas generalizadas no início do século XX, ela avançou para uma democracia social robusta, ainda hoje admirada em todo o mundo. Em sua primeira edição, a revista fez um convite direcionado principalmente a acadêmicos atenciosos, mas com uma visão otimista: “Será uma revista jovem, uma revista para aqueles que têm fé em si mesmos e no futuro do mundo.” Esse é exatamente o espírito de que precisamos hoje.
Colaborador
Huw Morgan é um escritor e ativista que vive na Nova Zelândia
Nenhum comentário:
Postar um comentário