19 de junho de 2022

Colômbia em um ponto de bifurcação

O confronto entre Gustavo Petro e Rodolfo Hernández não é apenas eleitoral. Representa, sobretudo, um embate político entre uma cultura retardatária, que vê em Hernández a possibilidade de prolongar o espírito majestoso da república, e uma cultura popular que vê em Petro e Márquez a restauração moral da nação.

Santiago Pulido

Jacobin

Manifestantes participam de um protesto exigindo ação do governo para enfrentar a pobreza, a violência policial e as desigualdades nos sistemas de saúde e educação, em Bogotá, Colômbia, em 10 de maio de 2021. Foto EFF.

As ideias de impasse catastrófico e ponto de bifurcação surgiram com o trabalho do ex-vice-presidente boliviano, Álvaro García Linera. Segundo Linera, o vínculo catastrófico ocorre no quadro de uma profunda crise institucional-estatal e se caracteriza por três aspectos fundamentais: o confronto de dois projetos nacionais com capacidade de mobilizar e seduzir as forças sociais; o enfrentamento institucional (nas esferas parlamentar e extraparlamentar) de dois blocos sociais antagônicos que disputam o poder do aparelho de Estado; a paralisia relativa do comando estatal e a irresolução temporária dessa paralisia.

O empate catastrófico, afirma Linera, pode durar meses e até anos. No entanto, as sociedades estão se aproximando gradualmente de um momento decisivo: um ponto de resolução e desempate. Uma bifurcação.

Guardando as devidas proporções, a Colômbia de hoje também parece estar passando por um empate catastrófico e se aproxima de uma nova etapa decisiva. Neste domingo, 19 de junho, segundo turno presidencial, o progressismo pode ganhar espaço no desempate.

Dois projetos de país em disputa

Desde 2016, com a derrota do Sim à Paz no plebiscito, a sociedade colombiana está presa em um ambiente de indecisão entre dois projetos de país antagônicos: por um lado, um projeto político que se comprometeu a acabar com a história de violência na Colômbia e que, de certa forma, procurou garantir algumas aberturas democráticas no regime político; do outro, um projeto disposto a romper a paz e retomar, de qualquer forma, o ciclo de violência no país.

Naquela época, o ex-presidente Juan Manuel Santos resolveu a reversão da paz através do parlamento, dando lugar, com isso, a uma primeira fase de cumprimento dos acordos. No entanto, o ambiente político e a correlação de forças, ao invés de endossar a decisão do corpo legislativo, distanciaram ainda mais os dois polos em disputa: o uribismo, por sua vez, radicalizou seu discurso contra o processo de paz e jurou “rasgar em pedaços” o acordo; por outro lado, algumas forças da direita, centro e esquerda moderadas coincidiram na defesa do acordo.

De qualquer forma, essas tentativas não deram em nada com a vitória eleitoral do candidato do uribismo Iván Duque em 2018. O estado em que estava o acordo de paz regrediu rapidamente. No entanto, foi uma tentativa incompleta, pois foi confrontada, desde as ruas, pela mobilização de organizações e movimentos sociais que saíram para se manifestar contra a guerra declarada contra a paz pelo governo nacional e contra o assassinato sistemático de lideranças sociais e ex-combatentes. Cabe esclarecer que no decorrer dessas mobilizações se constituiu uma articulação heterogênea e dispersa de diferentes expectativas e demandas sociais de mudança. Não se tratava, então, de uma defesa exclusiva da paz como acordo, mas, fundamentalmente, das diferentes expressões de justiça social que giravam em torno dela.

Esse ciclo de mobilizações enfraqueceu fortemente o governo Duque, que viu frustradas suas tentativas de reforma (reforma tributária e reforma sanitária). O caráter interrompido e intermitente da mobilização foi criando, paulatinamente, as condições para que o conjunto de forças políticas que, em princípio, defendiam a paz, aparecesse nessa conjuntura eleitoral como alternativa de mudança para o uribismo. Ou seja, o ciclo de rebeliões, infelizmente, não representou uma alternativa de poder popular, mas cristalizou a opção de endossar, de dar lugar ao empate catastrófico e à crise político-institucional por meio de uma força eleitoral progressista.

Hernández e Petro: disputando um projeto majoritário

Os resultados da atual situação eleitoral não puderam ser explicados a não ser em termos da mudança no equilíbrio de forças provocada pela Greve Nacional de 2021. O episódio de abril representou um ponto de virada na vida política nacional: por um lado, confrontou as forças da ordem com camadas e setores populares, jovens e estudantes; por outro, modificou o estado de forças no país: nenhum deputado poderia aprovar, sem mais delongas, sem olhar para a rua, as propostas de reforma do governo nacional.

Com as manifestações de 2021, destacaram-se os dois projetos de país que ainda estavam em conflito: uma Colômbia subordinada e popular (a do Sim à paz) que se mobilizou contra o autoritarismo do governo Duque; outra Colômbia reacionária e retardatária (a do Não à paz) que saiu para defender, de revólver na cintura, os interesses do establishment e da "gente de bem". De modo que o vínculo catastrófico, no caso colombiano, não implica apenas uma disputa político-eleitoral sobre o aparelho do Estado (embora esta seja sua expressão imediata, sua expressão conjuntural), é, de modo mais geral, uma disputa entre diferentes estruturas.

Los resultados de primera vuelta revelaron tal característica: Gustavo Petro, líder de la bancada progresista Pacto Histórico, logra «recoger» la votación de los puntos de resistencia del Paro Nacional del 2021 y el voto por la paz de las regiones (litoral pacífico, la costa atlántica, Bogotá y algunas ciudades del sureste colombiano). Esta votación tiene una particularidad: tiene un importante contenido regional y de clase. Demuestra que las zonas y regiones más afectadas por la violencia y, sobre todo, por el régimen de acumulación neoliberal de matriz extractivista, votó por el proyecto de cambio de Gustavo Petro y Francia Márquez. En ciudades principales (Bogotá, Cali y Medellín) se comprobó algo en una dirección similar: los barrios populares, maltratados por la policía, también votaron a Petro y Márquez, mientras los barrios de la élite bogotana, caleña y antioqueña le votaron a su hoy contendiente, Rodolfo Hernández.

Este último, a su vez, obtuvo la votación mayoritaria en la región centro andina, caracterizada por apoyar el talante autoritario de los últimos gobiernos. Esta ligera caracterización permite comprender las tensiones entre dos proyectos de país antagónicos que están siendo representados por Gustavo Petro y Rodolfo Hernández. El enfrentamiento no es solo electoral e institucional, sino que es, de cierto modo, un enfrentamiento entre estructuras culturales: una retardataria, reaccionaria que ve en Rodolfo Hernández la posibilidad de prolongar el espíritu señorial de nuestra república; otra popular y progresista que ve en Petro y Francia Márquez la reconstrucción moral de la nación.

Um desempate final?

Retomando las consideraciones iniciales, Colombia atraviesa, en efecto, por un empate catastrófico. Al igual que en la Bolivia del 2005, dos polos regionales están siendo protagonistas de una disputa cultural: Petro y Hernández representan hoy dos Colombias distintas, dos proyectos nacionales con capacidad de movilización y seducción de fuerzas sociales, atravesada, desde luego, por la profunda crisis institucional (crisis del sistema de partidos, crisis del régimen político, crisis de representatividad) que terminó de abrir el ciclo de movilizaciones del 2021.

Hasta el momento, ningún proyecto logra ser hegemónico sobre el otro. De hecho, la segunda vuelta electoral demostrará cuál de las dos Colombias es mayoría. Sin embargo, Petro, a diferencia de Hernández, cuenta con la virtud de articular las expectativas de cambio de la Colombia pobre y trabajadora. Expectativas que hacen parte de un sentido común en disputa. Recordemos que la lucha ideológica empezó en el plano de la sociedad civil movilizada: con la batalla por la paz, con la defensa de los acuerdos, con las marchas estudiantiles, con el Paro Cívico en Buenaventura y el gran episodio movilizatorio de abril que creyó cambiarlo todo, ahora tendrá que trasladarse al ámbito institucional y mantenerse, desde luego, en el subsuelo político. Petro representa parcialmente esas luchas, por lo que tendrá margen de maniobra en caso de ser gobierno.

En cualquier caso, la disputa cultural no se resolverá este domingo en las urnas. El resultado de las elecciones será un paso en el desempate, pero de ningún modo representa su conclusión o resolución. Queda pendiente, en el caso del progresismo, avanzar en la tarea de construcción y expansión de la hegemonía. En ese sentido, Petro tendrá cuatro importantes retos en caso de ser vencedor: primero, el reto de avanzar en su plan de reformas estructurales y lograr una correlación de fuerzas institucionales favorables a su plan de gobierno; segundo, domesticar democráticamente las fuerzas reactivas parlamentarias y extra-parlamentarias; tercero, disciplinar, en el buen sentido, las fuerzas internas del Pacto Histórico hacia un proyecto de estatalidad popular; cuarto, mantener un diálogo y reconocer autonomía a las organizaciones sociales y populares que se movilizaron contra Duque. Fue esa irrupción movilizatoria la que abrió la oportunidad de liderazgo de Petro y es la misma que podrá defender los avances democráticas de su eventual gobierno.

Se acerca un momento decisivo en el desempate. En medio de la decisión, la Colombia de los trabajadore/as, de los desposeídos, de los sectores populares, se juega las lágrimas y la esperanza de que, efectivamente, su realidad cambie. Sería imposible no desear suerte a esta candidatura que abrió los sueños y expectativas de un país golpeado por el régimen y arrasado por el hambre y la violencia.

Sobre o autor

Estudante da Universidade de Tolima (Colômbia) e editor da revista Militancia y Sociedad.

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