2 de junho de 2022

O PIB da reabertura, Putin e eleição

Aperte os cintos, haverá volatilidade na economia nos próximos meses

Nelson Barbosa


Consumidores fazem compras em loja na capital paulista - Danilo Verpa - 26.nov.2021/Folhapress

O PIB cresceu 1% no primeiro trimestre. Se a economia não crescer mais no restante do ano, o resultado do primeiro trimestre já garantirá uma expansão de 1,5% em 2022, o que nós, economistas, chamamos de carregamento estatístico.

A maioria dos analistas espera crescimento menor do que 1,5% em 2022, ou seja, a perspectiva é de queda do PIB no restante deste ano.

O bom desempenho do PIB veio de três fatores: reabertura da economia, elevação de preços de commodities e keynesianismo de ano eleitoral. Vejamos cada um separadamente.

Devido às três ondas de contágio e à manutenção do distanciamento social, o setor de serviços só começou a se recuperar mais rápido no fim de 2021. Depois, com o avanço da vacinação e a diminuição da gravidade da Covid, as coisas se normalizaram e tivemos até Carnaval, só que em abril.

Como os serviços respondem por 70% do PIB antes dos impostos, era esperado que o fim do distanciamento social tivesse efeito significativo, mas temporário, sobre o PIB. Mas, como não se reabre algo que já está aberto, o crescimento do setor de serviços tende a ser menor no restante de 2022.

Do lado externo, o aumento dos preços internacionais de commodities é tradicionalmente expansionista no Brasil. O efeito ocorre via aumento dos lucros do agronegócio, mineração e petróleo, maior arrecadação e gasto do governo e apreciação cambial.

Em 2021, a incerteza política criada por Bolsonaro, o terrorismo fiscal da Faria Lima sobre o teto de gastos e a hesitação do BC no juro emperraram o canal commodities-câmbio. O câmbio permaneceu alto apesar do boom de commodities.

Agora, a nova rodada de inflação de commodities gerada pelo "choque Putin" elevou a arrecadação e o resultado fiscal do governo, e o BC resolveu pagar o juro que a Faria Lima pedia. As duas coisas apreciaram o real, o que é temporariamente expansionista no Brasil.

Teoricamente, o choque Putin também é temporário. Quando os preços de commodities se estabilizarem em um patamar mais elevado, o efeito positivo sobre o PIB brasileiro perderá força e ficaremos "apenas" com o efeito negativo do aumento de juro para combater a elevação da inflação.

Terceiro, 2022 é ano eleitoral, e isso inverte a lógica orçamentária. Em vez de contingenciar gastos no início do ano e soltar o Orçamento no fim do ano, em ano de eleição ocorre o contrário. O governo faz "antecipação de PIB" via desonerações, subsídios e benefícios extraordinários.

Por definição, desoneração tributária tem impacto temporário sobre o crescimento. Quando o imposto se estabiliza na alíquota mais baixa, o efeito positivo sobre a renda disponível do setor privado cessa. O mesmo princípio vale para benefícios antecipados. O 13º salário pago agora não estará disponível em dezembro. Idem para os saques do FGTS.

Juntando as três coisas: reabertura, choque Putin e o impulso fiscal eleitoral, o crescimento do PIB deve continuar no segundo trimestre, mas em menor grau do que no primeiro trimestre porque o aumento de juro realizado pelo BC já começou a impactar negativamente a economia.

Para o segundo semestre, a expectativa é de nova estagnação do PIB, com risco de breve recessão técnica quando o mercado passar a analisar os efeitos do desgoverno Bolsonaro sobre as finanças públicas e a estrutura produtiva do Brasil em 2023 e depois.

Teoricamente, um novo governo pode melhorar a situação, anunciando uma política econômica racional e civilizada, mas ainda faltam quatro meses para o primeiro turno. Aperte os cintos, haverá volatilidade.

Sobre o autor

Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

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