Nelson Barbosa
Folha de S.Paulo
Era início de 2013, e o governo Dilma debatia a mudança ou não de sua estratégia fiscal. O ano anterior não havia terminado bem.
A mudança do cenário internacional, com o fim do superciclo de commodities, e os efeitos da política fiscal errática da União, com contração excessiva em 2011 e expansão desorganizada e excessiva em 2012, aumentaram a incerteza sobre as contas públicas.
Para piorar a situação, em dezembro de 2012, o governo federal cumpriu sua meta de resultado primário via várias operações fiscais não recorrentes, mas legais, que despertaram grandes críticas no mercado.
A inflação estava acelerando, e as projeções indicavam que também seria difícil cumprir a meta fiscal estabelecida para 2013, a não ser que se adotasse nova rodada de operações não recorrentes, em volume maior do que no ano anterior.
Era início de 2013, e o governo Dilma debatia a mudança ou não de sua estratégia fiscal. O ano anterior não havia terminado bem.
A mudança do cenário internacional, com o fim do superciclo de commodities, e os efeitos da política fiscal errática da União, com contração excessiva em 2011 e expansão desorganizada e excessiva em 2012, aumentaram a incerteza sobre as contas públicas.
Para piorar a situação, em dezembro de 2012, o governo federal cumpriu sua meta de resultado primário via várias operações fiscais não recorrentes, mas legais, que despertaram grandes críticas no mercado.
A inflação estava acelerando, e as projeções indicavam que também seria difícil cumprir a meta fiscal estabelecida para 2013, a não ser que se adotasse nova rodada de operações não recorrentes, em volume maior do que no ano anterior.
Diante desse cenário, o governo Dilma considerou a possibilidade de alterar sua regra fiscal, adotando meta de gasto e resultado primário variável. Apelidada de "banda de resultado primário", a ideia era fixar a despesa e deixar o resultado flutuar de acordo com a receita.
Se o resultado ultrapassasse as "bandas", haveria medidas de ajuste gradual, para reestabelecer o equilíbrio fiscal. Contenção do gasto e/ou aumento de receita em caso de déficit excessivo. Expansão do gasto e/ou corte de impostos em caso de superávit excessivo.
A prática de meta de gasto e resultado primário variável já era comum em vários países avançados, mas no Brasil de 2013 ela foi considerada heresia. Houve debate acalorado sobre o tema, dentro e fora do governo.
No fim, prevaleceu a opção "deixa como está para ver como é que fica", na expectativa de que a economia se recuperaria rapidamente em 2013-2014.
A economia não se recuperou. O governo teve de adotar mais e mais operações não recorrentes, todas legais de acordo com a legislação daquela época, para cumprir as metas fiscais de 2013-14, fragilizando ainda mais a confiança na política fiscal.
No fim de 2014, houve mais um debate sobre a mudança ou não da regra fiscal. Novamente a opção foi manter a meta de resultado primário como principal referência da política fiscal, mas em valor menor diante da situação da economia.
A economia piorou ainda mais em 2015, por vários motivos que já comentei neste espaço. Focando o fiscal, no final daquele ano o governo Dilma finalmente reconheceu o inevitável, o "orçamento com déficit", a ser enfrentado com ajuste gradual via reformas estruturais da receita e da despesa.
Porém, devido à crise política daquele momento, a mudança para meta de gasto e resultado primário variável foi iniciada, mas não completada por Dilma. Temer poderia ter feito isso, mas incrivelmente escolheu estabelecer meta de gasto e manter meta de resultado primário. O resultado foi forte contingenciamento de gasto no início de 2017, abortando a recuperação da economia.
O governo Bolsonaro começou na mesma direção. Com meta de resultado primário e contingenciamento de gasto no início de 2019. Porém, diante da Covid-19, foi necessário abandonar a meta fiscal deste ano, e, para 2021, o governo anunciou que adotará nova sistemática, adivinhe: meta de gasto e resultado primário variável!
A meta de gasto em vigor (o teto Temer) ainda é inadequada, mas a mudança de lógica da política fiscal é bem-vinda. Pode demorar, mas o bom senso prevalece.
E, dado que levamos sete anos para a maioria se convencer de que é melhor abandonar meta de resultado primário, quanto tempo levará para alterar o teto Temer? Espero que menos de sete anos.
Sobre o autor
Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.
A prática de meta de gasto e resultado primário variável já era comum em vários países avançados, mas no Brasil de 2013 ela foi considerada heresia. Houve debate acalorado sobre o tema, dentro e fora do governo.
No fim, prevaleceu a opção "deixa como está para ver como é que fica", na expectativa de que a economia se recuperaria rapidamente em 2013-2014.
A economia não se recuperou. O governo teve de adotar mais e mais operações não recorrentes, todas legais de acordo com a legislação daquela época, para cumprir as metas fiscais de 2013-14, fragilizando ainda mais a confiança na política fiscal.
No fim de 2014, houve mais um debate sobre a mudança ou não da regra fiscal. Novamente a opção foi manter a meta de resultado primário como principal referência da política fiscal, mas em valor menor diante da situação da economia.
A economia piorou ainda mais em 2015, por vários motivos que já comentei neste espaço. Focando o fiscal, no final daquele ano o governo Dilma finalmente reconheceu o inevitável, o "orçamento com déficit", a ser enfrentado com ajuste gradual via reformas estruturais da receita e da despesa.
Porém, devido à crise política daquele momento, a mudança para meta de gasto e resultado primário variável foi iniciada, mas não completada por Dilma. Temer poderia ter feito isso, mas incrivelmente escolheu estabelecer meta de gasto e manter meta de resultado primário. O resultado foi forte contingenciamento de gasto no início de 2017, abortando a recuperação da economia.
O governo Bolsonaro começou na mesma direção. Com meta de resultado primário e contingenciamento de gasto no início de 2019. Porém, diante da Covid-19, foi necessário abandonar a meta fiscal deste ano, e, para 2021, o governo anunciou que adotará nova sistemática, adivinhe: meta de gasto e resultado primário variável!
A meta de gasto em vigor (o teto Temer) ainda é inadequada, mas a mudança de lógica da política fiscal é bem-vinda. Pode demorar, mas o bom senso prevalece.
E, dado que levamos sete anos para a maioria se convencer de que é melhor abandonar meta de resultado primário, quanto tempo levará para alterar o teto Temer? Espero que menos de sete anos.
Sobre o autor
Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.
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