Nelson Barbosa
Folha de S.Paulo
A eleição se aproxima, mas, devido à atual incerteza econômica e política, dificilmente os principais candidatos à Presidência apresentarão propostas econômicas detalhadas durante a campanha. Ainda assim, não é difícil antever quais serão as prioridades de um eventual governo progressista a partir de 2023.
Em primeiro lugar, como sabemos por experiência própria, inflação alta é um grande problema. Reduzir a inflação continuará sendo a prioridade mais imediata de política econômica em 2023, o que requererá uma Selic elevada por algum tempo, provavelmente até meados do próximo ano.
Apesar da recente redução da inflação pelo pacote eleitoral de Bolsonaro, a batalha não está ganha. Cortes de impostos têm efeito apenas temporário sobre a inflação. Eles ajudam a curto prazo, mas não resolvem a questão estrutural, que depende da ancoragem das expectativas monetárias (financiamento não explosivo do governo) e do crescimento da produtividade da economia.
Mesmo depois da megadesoneração bolsonarista, o mercado espera que a inflação feche 2022 em torno de 8%. Para 2023, a expectativa mais recente está em 5%. Como os dois valores estão bem acima da meta de inflação de longo prazo, de 3%, o combate à inflação continuará prioritário em 2023.
Em segundo lugar, o governo Bolsonaro também produzirá uma recessão técnica na virada de 2022 para 2023. O atual estímulo eleitoral não é sustentável. Quando a expansão fiscal cessar, em janeiro, a economia tenderá a desacelerar rapidamente. Por enquanto, as expectativas de crescimento para 2023 são de estagnação. Expansão entre zero e 1% do PIB, ou seja, provável queda do PIB per capita.
Devido à herança maldita de inflação e estagnação deixada por Bolsonaro, o próximo governo também terá que adotar medidas de estabilização da renda e do emprego no início de 2023.
No quadro de aperto fiscal previsto para o próximo ano, não será possível fazer tudo, mas será possível fazer alguma coisa. Os candidatos mais prováveis para reforço fiscal imediato são as transferências de renda aos mais pobres, prorrogando o benefício de R$ 600 além de dezembro de 2022, e aumento emergencial do investimento público, que hoje não repõe nem a depreciação do estoque de capital do governo.
Só com crescimento será possível reequilibrar o orçamento público, de modo gradual e transparente, o que me leva à provável terceira prioridade de um eventual próximo governo progressista: reforma fiscal para desarmar as bombas deixadas por Bolsonaro sem impacto adverso no câmbio e na taxa de juro.
Teremos uma nova regra fiscal, com foco no gasto, mas flexibilidade para absorver choques sem mudanças constitucionais recorrentes, e cenário para evolução do resultado primário e da dívida pública.
Teremos, também, medidas de recuperação de arrecadação, no bojo de uma reforma tributária sequencial (fatiada), começando pelos tributos federais, diretos e indiretos.
Mais importante, para arrumar a bagunça orçamentária deixada por Bolsonaro, o próximo governo também precisará pedir um espaço fiscal temporário em 2023, para saldar despesas atrasadas (exemplo: precatórios e fila no INSS) e atender demandas reprimidas (exemplo: correção da tabela de IR, reajuste de servidores e recomposição do orçamento da saúde e educação).
E, para que a inevitável flexibilização fiscal de 2023 não gere mais incerteza, ela provavelmente será aprovada em conjunto com reformas de médio prazo, para reequilibrar o Orçamento e reduzir o endividamento público, a partir de 2024.
Folha de S.Paulo
Pessoas caminham pelo centro de São Paulo na região da rua Santa Ifigênia - Rubens Cavallari - 15.abr.2021/Folhapress |
A eleição se aproxima, mas, devido à atual incerteza econômica e política, dificilmente os principais candidatos à Presidência apresentarão propostas econômicas detalhadas durante a campanha. Ainda assim, não é difícil antever quais serão as prioridades de um eventual governo progressista a partir de 2023.
Em primeiro lugar, como sabemos por experiência própria, inflação alta é um grande problema. Reduzir a inflação continuará sendo a prioridade mais imediata de política econômica em 2023, o que requererá uma Selic elevada por algum tempo, provavelmente até meados do próximo ano.
Apesar da recente redução da inflação pelo pacote eleitoral de Bolsonaro, a batalha não está ganha. Cortes de impostos têm efeito apenas temporário sobre a inflação. Eles ajudam a curto prazo, mas não resolvem a questão estrutural, que depende da ancoragem das expectativas monetárias (financiamento não explosivo do governo) e do crescimento da produtividade da economia.
Mesmo depois da megadesoneração bolsonarista, o mercado espera que a inflação feche 2022 em torno de 8%. Para 2023, a expectativa mais recente está em 5%. Como os dois valores estão bem acima da meta de inflação de longo prazo, de 3%, o combate à inflação continuará prioritário em 2023.
Em segundo lugar, o governo Bolsonaro também produzirá uma recessão técnica na virada de 2022 para 2023. O atual estímulo eleitoral não é sustentável. Quando a expansão fiscal cessar, em janeiro, a economia tenderá a desacelerar rapidamente. Por enquanto, as expectativas de crescimento para 2023 são de estagnação. Expansão entre zero e 1% do PIB, ou seja, provável queda do PIB per capita.
Devido à herança maldita de inflação e estagnação deixada por Bolsonaro, o próximo governo também terá que adotar medidas de estabilização da renda e do emprego no início de 2023.
No quadro de aperto fiscal previsto para o próximo ano, não será possível fazer tudo, mas será possível fazer alguma coisa. Os candidatos mais prováveis para reforço fiscal imediato são as transferências de renda aos mais pobres, prorrogando o benefício de R$ 600 além de dezembro de 2022, e aumento emergencial do investimento público, que hoje não repõe nem a depreciação do estoque de capital do governo.
Só com crescimento será possível reequilibrar o orçamento público, de modo gradual e transparente, o que me leva à provável terceira prioridade de um eventual próximo governo progressista: reforma fiscal para desarmar as bombas deixadas por Bolsonaro sem impacto adverso no câmbio e na taxa de juro.
Teremos uma nova regra fiscal, com foco no gasto, mas flexibilidade para absorver choques sem mudanças constitucionais recorrentes, e cenário para evolução do resultado primário e da dívida pública.
Teremos, também, medidas de recuperação de arrecadação, no bojo de uma reforma tributária sequencial (fatiada), começando pelos tributos federais, diretos e indiretos.
Mais importante, para arrumar a bagunça orçamentária deixada por Bolsonaro, o próximo governo também precisará pedir um espaço fiscal temporário em 2023, para saldar despesas atrasadas (exemplo: precatórios e fila no INSS) e atender demandas reprimidas (exemplo: correção da tabela de IR, reajuste de servidores e recomposição do orçamento da saúde e educação).
E, para que a inevitável flexibilização fiscal de 2023 não gere mais incerteza, ela provavelmente será aprovada em conjunto com reformas de médio prazo, para reequilibrar o Orçamento e reduzir o endividamento público, a partir de 2024.
Colaborador
Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.
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