Celso Rocha de Barros
Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".
Na última terça-feira (23), Lula foi ao Congresso e teve uma grande vitória: o novo regime fiscal foi aprovado com votação esmagadora.
No dia seguinte, Lula voltou ao Congresso e levou uma surra. Em um único dia, o Parlamento esvaziou ministérios de Lula, retirando competências das pastas do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas, aprovou urgência para a votação do marco temporal para demarcação de terras indígenas e liberou uma mutreta que permite desmatar a mata atlântica.
Lula não foi apresentado ontem ao presidencialismo de coalizão brasileiro, em que o presidente se elege sem maioria parlamentar e tem que formá-la distribuindo cargos e verbas. Já administrou o sistema por oito anos e sobreviveu. O que mudou?
Por outro lado, há duas diferenças notáveis entre o Congresso que Lula encontrou agora e seu vizinho de praça dos três Poderes de 2003.
Para o cientista Sergio Abranches, criador do conceito de "presidencialismo de coalizão", "o modelo entrou em crise nos últimos anos, mas os presidentes continuam se elegendo sem maioria parlamentar".
O Congresso acumulou poder durante a sequência de presidentes fracos (Dilma, Temer e Bolsonaro) e não quer devolvê-lo a Lula ou a qualquer outro chefe do Executivo. Como Arthur Lira já deixou claro, os parlamentares querem que um pedaço maior do Orçamento seja distribuído sob a forma de emendas parlamentares, e não gastos em políticas públicas do governo federal. Isso diminui a eficácia de políticas de caráter estratégico, de longo prazo, e joga mais recursos para a política regional, em que a fiscalização da imprensa e das autoridades é menor.
Além disso, o Congresso parece mais ideologizado. Não por acaso, o grande sucesso de Lula no Congresso foi o regime fiscal, que não é tão restritivo quanto a maioria conservadora queria, mas reflete concessões importantes da esquerda. Já as derrotas do governo foram em meio ambiente, direitos indígenas e combate às fake news, pautas em que é a direita que não quer ser submetida a qualquer limite.
Parte desse problema é conjuntural: há uma disputa pelo posto de rival de direita do PT nas disputas presidenciais, posição que por muitos anos foi do PSDB. O cientista político Fernando Limongi nota que os partidos de direita que antes aderiam a qualquer governo (PP, PL, Republicanos, etc.) agora cogitam esperar a próxima eleição presidencial para assumir o poder, dificultando a formação da nova maioria.
No longo prazo, pode ser bom que partidos como o PL, o PP ou o PSD procurem adquirir identidades ideológicas mais claras conforme cresçam e se tornem rivais do PT nas eleições presidenciais. No curto prazo, porém, Lula vive no pior dos mundos: um Congresso ainda sem ideologia suficiente para dispensar a distribuição de cargos e verbas, mas já ideológico o suficiente para barrar propostas de esquerda, inclusive as boas.
No dia seguinte, Lula voltou ao Congresso e levou uma surra. Em um único dia, o Parlamento esvaziou ministérios de Lula, retirando competências das pastas do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas, aprovou urgência para a votação do marco temporal para demarcação de terras indígenas e liberou uma mutreta que permite desmatar a mata atlântica.
Lula não foi apresentado ontem ao presidencialismo de coalizão brasileiro, em que o presidente se elege sem maioria parlamentar e tem que formá-la distribuindo cargos e verbas. Já administrou o sistema por oito anos e sobreviveu. O que mudou?
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante evento do Dida da Indústria na Fiesp, em São Paulo - Bruno Santos - 25.mai.2023/Folhapress |
Alguns críticos apontam problemas em sua gestão atual do modelo. Por exemplo, o governo pode ter aceitado o fatiamento do Meio Ambiente para evitar o fatiamento da Casa Civil, que controla muito mais recursos. Se for o caso, isso reforça a tese do cientista político Carlos Pereira, que vem insistindo que Lula precisa repartir de maneira mais proporcional os recursos do governo entre seus aliados.
Por outro lado, há duas diferenças notáveis entre o Congresso que Lula encontrou agora e seu vizinho de praça dos três Poderes de 2003.
Para o cientista Sergio Abranches, criador do conceito de "presidencialismo de coalizão", "o modelo entrou em crise nos últimos anos, mas os presidentes continuam se elegendo sem maioria parlamentar".
O Congresso acumulou poder durante a sequência de presidentes fracos (Dilma, Temer e Bolsonaro) e não quer devolvê-lo a Lula ou a qualquer outro chefe do Executivo. Como Arthur Lira já deixou claro, os parlamentares querem que um pedaço maior do Orçamento seja distribuído sob a forma de emendas parlamentares, e não gastos em políticas públicas do governo federal. Isso diminui a eficácia de políticas de caráter estratégico, de longo prazo, e joga mais recursos para a política regional, em que a fiscalização da imprensa e das autoridades é menor.
Além disso, o Congresso parece mais ideologizado. Não por acaso, o grande sucesso de Lula no Congresso foi o regime fiscal, que não é tão restritivo quanto a maioria conservadora queria, mas reflete concessões importantes da esquerda. Já as derrotas do governo foram em meio ambiente, direitos indígenas e combate às fake news, pautas em que é a direita que não quer ser submetida a qualquer limite.
Parte desse problema é conjuntural: há uma disputa pelo posto de rival de direita do PT nas disputas presidenciais, posição que por muitos anos foi do PSDB. O cientista político Fernando Limongi nota que os partidos de direita que antes aderiam a qualquer governo (PP, PL, Republicanos, etc.) agora cogitam esperar a próxima eleição presidencial para assumir o poder, dificultando a formação da nova maioria.
No longo prazo, pode ser bom que partidos como o PL, o PP ou o PSD procurem adquirir identidades ideológicas mais claras conforme cresçam e se tornem rivais do PT nas eleições presidenciais. No curto prazo, porém, Lula vive no pior dos mundos: um Congresso ainda sem ideologia suficiente para dispensar a distribuição de cargos e verbas, mas já ideológico o suficiente para barrar propostas de esquerda, inclusive as boas.
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