Na Alemanha, o tabloide Bild está liderando uma campanha para nomear e envergonhar os ativistas pró-Palestina. H. P. Loveshaft, líder drag king e manifestante que enfrentou uma onda de abusos após um artigo do Bild, conta a Jacobin como a sua identidade foi usada como arma contra ele.
Liam McNiff
Jacobin
A polícia confronta manifestantes pró-Palestina em 26 de abril de 2024, em Berlim, Alemanha. (Sean Gallup / Getty Images) |
https://jacobin.com.br/2024/06/a-caca-as-bruxas-antipalestina-da-alemanha-tambem-esta-mirando-os-judeus/
Em 12 de fevereiro, Der Spiegel, uma das maiores revistas de notícias da Alemanha, publicou um vídeo intitulado “Protestos contra os judeus”. O foco era um protesto pró-Palestina na Universidade Livre (UL), a maior instituição desse tipo em Berlim. O vídeo começa com um homem de cabelo cor de arco-íris atirando água de uma garrafa de cerveja no cameraman e gritando: “Bitte schön (aqui está), f*** off!”
“O líder do protesto se autodenomina H. P. Loveshaft, se identifica como trans, usa os pronomes ele/dele, entre aspas, ‘ficou cara a cara com o ânus cósmico’”, entoa o narrador severamente, enquanto fotografias de H. P. de drag, tiradas do seu Instagram e do seu site, passam pela tela.
Em 21 de maio, o Bild – um tabloide berlinense com maior circulação do que qualquer outro jornal na Europa – publicou um artigo identificando aquilo a que chamou “O epicentro dos odiadores de Israel”. Nele aparecem os rostos e os nomes de várias pessoas que participaram de protestos pró-Palestina em Berlim. O Bild os identifica como apoiadores de terroristas e, implicitamente, como antissemitas.
O cabelo colorido de H. P. Loveshaft aparece no meio da página, com o rosto contorcido e as mãos puxadas para trás pela polícia. “H. P. Loveshaft se comporta de forma cada vez mais agressiva nas manifestações pró-Palestina”, escreve o Bild, “atacando jornalistas ou gritando com a polícia”. Queixa-se de que o seu trabalho é financiado por um fundo público de artes cênicas – “nossos impostos”.
H. P. Loveshaft é um drag king russo-americano e estudante que vive em Berlim. Também é judeu, um fato que tanto o Spiegel como o Bild não mencionaram, apesar do quipá que ele usou no protesto da Universidade Livre. Ele não esteve envolvido na organização do evento da UL e apenas se ofereceu para moderar. “Sou um drag king, um artista profissional em tempo integral”, ele explicou. “Estou bastante confortável em um microfone.”
O conflito Israel-Palestina é uma questão pessoal para H. P. A sua família mudou-se de Moscou para Israel quando ele tinha dois anos e viveu lá durante cinco anos antes de se mudar para os Estados Unidos para escapar do caos da Primeira Intifada, a revolta popular palestina contra a ocupação israelita que durou de 1987 até à assinatura do primeiro Acordo de Oslo em 1993. Muitos dos familiares de H. P. ainda vivem em Israel e ele descreve o seu histórico familiar como declaradamente sionista.
Embora H. P. simpatize há muito tempo com a causa palestina, como resultado do seu longo envolvimento em cenas de esquerda e queer, diz que foi o clima agressivamente antipalestino que viveu na Alemanha desde o dia 7 de outubro que fez com que a questão se tornasse central para ele.
“O efeito de radicalização se deve inteiramente à Alemanha”, afirma.
H. P. vive num bairro de Berlim onde se encontra uma das maiores comunidades palestinas da Europa, que tem sido particularmente sujeita a brutais repressões policiais nos últimos meses.
“Vejo frotas e frotas de polícias armados nas minhas ruas, no meu bairro, na minha estação de trem”, recorda. “Estão violentando as mulheres. Estão prendendo pessoas por estarem sozinhas, apenas segurando um cartaz. [Eu até vi] um polícia alemão de capacete pisoteando velas de memorial”.
Os paralelos históricos da brutalização de uma minoria pela polícia alemã não lhe escapam. “Se vocês estão fazendo fascismo, então eu tenho de ser antifascista. Desculpem, sou judeu e transexual, está no meu sangue”.
Ainda mais que essa brutalização está sendo utilizada em nome da proteção dos judeus, explica.
“E se o fascismo está sendo implementado em meu nome, então não tenho outra opção senão gritar o mais alto possível sobre isso, não é?”, pergunta. “Que outra opção existe?”
“A conspiração gay comunista”
No dia do protesto da Universidade Livre, eram os meios de comunicação social e os contra protestantes sionistas que estavam sendo agressivos, e não os manifestantes pró-Palestina, insiste H. P. Segundo ele, apareceram quase tantos repórteres como manifestantes, que se amontoaram em volta dos organizadores e dificultaram os seus discursos. Alguns dos cameramen se recusaram a sair do local, mesmo depois de ter sido repetidamente pedido a eles que abrissem espaço para os manifestantes, um contexto que H. P. diz que Der Spiegel omitiu.
Segundo H. P., os contra manifestantes pró-Israel, retratados com simpatia no vídeo da Spiegel, apesar de um deles ter gritado “Ouçam, terroristas, as suas vilas podem queimar!” em hebraico, também se comportaram de forma agressiva. Um deles se aproximou de H. P. durante a manifestação e, ao ver o seu quipá, o perguntou se era judeu. Pediu-lhe então que recitasse uma oração para provar e depois perguntou-lhe quais dos seus pais eram judeus. H. P. diz que o homem o acusou de não ser um “verdadeiro judeu”.
Em 12 de fevereiro, Der Spiegel, uma das maiores revistas de notícias da Alemanha, publicou um vídeo intitulado “Protestos contra os judeus”. O foco era um protesto pró-Palestina na Universidade Livre (UL), a maior instituição desse tipo em Berlim. O vídeo começa com um homem de cabelo cor de arco-íris atirando água de uma garrafa de cerveja no cameraman e gritando: “Bitte schön (aqui está), f*** off!”
“O líder do protesto se autodenomina H. P. Loveshaft, se identifica como trans, usa os pronomes ele/dele, entre aspas, ‘ficou cara a cara com o ânus cósmico’”, entoa o narrador severamente, enquanto fotografias de H. P. de drag, tiradas do seu Instagram e do seu site, passam pela tela.
Em 21 de maio, o Bild – um tabloide berlinense com maior circulação do que qualquer outro jornal na Europa – publicou um artigo identificando aquilo a que chamou “O epicentro dos odiadores de Israel”. Nele aparecem os rostos e os nomes de várias pessoas que participaram de protestos pró-Palestina em Berlim. O Bild os identifica como apoiadores de terroristas e, implicitamente, como antissemitas.
O cabelo colorido de H. P. Loveshaft aparece no meio da página, com o rosto contorcido e as mãos puxadas para trás pela polícia. “H. P. Loveshaft se comporta de forma cada vez mais agressiva nas manifestações pró-Palestina”, escreve o Bild, “atacando jornalistas ou gritando com a polícia”. Queixa-se de que o seu trabalho é financiado por um fundo público de artes cênicas – “nossos impostos”.
H. P. Loveshaft é um drag king russo-americano e estudante que vive em Berlim. Também é judeu, um fato que tanto o Spiegel como o Bild não mencionaram, apesar do quipá que ele usou no protesto da Universidade Livre. Ele não esteve envolvido na organização do evento da UL e apenas se ofereceu para moderar. “Sou um drag king, um artista profissional em tempo integral”, ele explicou. “Estou bastante confortável em um microfone.”
O conflito Israel-Palestina é uma questão pessoal para H. P. A sua família mudou-se de Moscou para Israel quando ele tinha dois anos e viveu lá durante cinco anos antes de se mudar para os Estados Unidos para escapar do caos da Primeira Intifada, a revolta popular palestina contra a ocupação israelita que durou de 1987 até à assinatura do primeiro Acordo de Oslo em 1993. Muitos dos familiares de H. P. ainda vivem em Israel e ele descreve o seu histórico familiar como declaradamente sionista.
Embora H. P. simpatize há muito tempo com a causa palestina, como resultado do seu longo envolvimento em cenas de esquerda e queer, diz que foi o clima agressivamente antipalestino que viveu na Alemanha desde o dia 7 de outubro que fez com que a questão se tornasse central para ele.
“O efeito de radicalização se deve inteiramente à Alemanha”, afirma.
H. P. vive num bairro de Berlim onde se encontra uma das maiores comunidades palestinas da Europa, que tem sido particularmente sujeita a brutais repressões policiais nos últimos meses.
“Vejo frotas e frotas de polícias armados nas minhas ruas, no meu bairro, na minha estação de trem”, recorda. “Estão violentando as mulheres. Estão prendendo pessoas por estarem sozinhas, apenas segurando um cartaz. [Eu até vi] um polícia alemão de capacete pisoteando velas de memorial”.
Os paralelos históricos da brutalização de uma minoria pela polícia alemã não lhe escapam. “Se vocês estão fazendo fascismo, então eu tenho de ser antifascista. Desculpem, sou judeu e transexual, está no meu sangue”.
Ainda mais que essa brutalização está sendo utilizada em nome da proteção dos judeus, explica.
“E se o fascismo está sendo implementado em meu nome, então não tenho outra opção senão gritar o mais alto possível sobre isso, não é?”, pergunta. “Que outra opção existe?”
“A conspiração gay comunista”
No dia do protesto da Universidade Livre, eram os meios de comunicação social e os contra protestantes sionistas que estavam sendo agressivos, e não os manifestantes pró-Palestina, insiste H. P. Segundo ele, apareceram quase tantos repórteres como manifestantes, que se amontoaram em volta dos organizadores e dificultaram os seus discursos. Alguns dos cameramen se recusaram a sair do local, mesmo depois de ter sido repetidamente pedido a eles que abrissem espaço para os manifestantes, um contexto que H. P. diz que Der Spiegel omitiu.
Segundo H. P., os contra manifestantes pró-Israel, retratados com simpatia no vídeo da Spiegel, apesar de um deles ter gritado “Ouçam, terroristas, as suas vilas podem queimar!” em hebraico, também se comportaram de forma agressiva. Um deles se aproximou de H. P. durante a manifestação e, ao ver o seu quipá, o perguntou se era judeu. Pediu-lhe então que recitasse uma oração para provar e depois perguntou-lhe quais dos seus pais eram judeus. H. P. diz que o homem o acusou de não ser um “verdadeiro judeu”.
Desde a publicação do vídeo da Spiegel, H. P. tem recebido uma enxurrada de ódio e ameaças na Internet e teve de pedir segurança para os seus eventos habituais de drag. Quando questionado se pensa que o Der Spiegel estava deliberadamente tentando incitar a transfobia no seu público, ele diz: absolutamente!
“É tão claro. Mesmo antes de cortar para o meu Instagram, há uma foto da multidão e são todas as bandeiras comunistas. Eles dizem: ‘Olha para esta conspiração gay comunista para radicalizar todos os muçulmanos e criar uma jihad contra os judeus alemães, a civilização branca alemã'”.
No entanto, H. P. continuou a sua atividade pró-palestina em Berlim. Em março, H. P. foi agarrado e arrastado pela polícia para fora de um protesto pró-palestino na Estação Central de Berlim. É certamente notável que o vídeo de um judeu que usa um quipá sendo violentado pela polícia alemã armada não tenha causado um escândalo ou gerado qualquer tipo de atenção por parte da mídia nacional.
A fundação política e mediática alemã se orgulhada “cultura da memória” da Alemanha, referindo-se à centralidade que a recordação e a expiação do Holocausto têm na política e na sociedade. A Stolpersteine, “pedras de tropeço” com os nomes das vítimas do Holocausto, colocadas nos passeios de todo o país, são um exemplo proeminente do empenho da Alemanha em manter viva a memória dos crimes nazistas. Mas, cada vez mais, a cultura oficial da memória tem-se concentrado em combater um suposto ressurgimento do antissemitismo sob a forma de anti-sionismo e de “antissemitismo importado” trazido pela imigração.
Armando a culpa
A narrativa de que a Alemanha tinha eliminado o antissemitismo até que os imigrantes o trouxeram de volta transformou a culpa alemã pelo Holocausto em um porrete sendo empunhado contra a população muçulmana da Alemanha. Sem surpresa, o partido de extrema direita Alternative for Germany (Alternative for Germany – AfD) tem sido um dos principais proponentes dessa narrativa, mas ele ganhou amplo apoio em todo o estabelecimento político. Isto apesar do fato de praticamente todos os recentes ataques violentos contra a comunidade judaica alemã, como o tiroteio de 2019 contra uma sinagoga em Halle que matou duas pessoas, terem sido perpetrados pela extrema direita.
A cultura da memória também implica o compromisso inabalável do Estado e da mídia alemã com Israel. Desde o dia 7 de outubro, a sua obsessão em fechar todas as críticas às ações de Israel atingiu um nível febril. A caça às bruxas pública a todos os que dizem algo, mesmo que ligeiramente, crítico em relação a Israel levou a acusações de antissemitismo mesmo contra figuras judaicas bem conhecidas.
O sociólogo israelense-alemão Moshe Zuckermann e o fotógrafo judeu sul-africano Adam Broomberg viram-se do lado errado da cruzada alemã contra o antissemitismo, tal como a escritora judia russo-americana Masha Gessen, que viu uma cerimînia de entrega de prémios cancelada depois de o governo de Bremen e a Fundação Heinrich Böll, ligada ao Partido Verde, terem cancelado a sua participação devido a um artigo que Gessen escreveu, comparando a invasão de Gaza à liquidação do Gueto de Varsóvia.
A filósofa judia americana Nancy Fraser viu a sua cátedra ser cancelada na Universidade de Colónia por causa de uma carta de solidariedade com os habitantes de Gaza. A investigadora Emily Dische-Becker calculou que cerca de um terço das pessoas que foram publicamente destituídas na Alemanha por suposto antissemitismo eram judias.
H. P. enfatiza que, apesar do absurdo de os judeus serem acusados de odiadores de judeus, são os palestinos e outros muçulmanos que mais sofrem na Alemanha. O ativista palestino alemão Salah Said, que também é difamado tanto no vídeo do Spiegel como no artigo do Bild, tem sofrido repetidas perseguições policiais devido ao seu envolvimento no movimento pró-Palestina em Berlim, incluindo três invasões policiais à sua casa. Khaled Shehadeh, um ativista pró-Palestina que o Bild identifica como “modelo e herói dos odiadores de Israel”, foi detido quase vinte vezes. Muitos outros palestinos sofreram o mesmo nas mãos da polícia de Berlim.
Quando H. P. se mudou de Los Angeles para Berlim em 2018, foi pelo que parecia ser um país mais progressista, com “transportes públicos, controle de rendas, educação muito barata e dinheiro para a arte”. Também queria estar num país que, na sua opinião, tinha lidado melhor com a sua história violenta do que os Estados Unidos.
“Na Alemanha, há monumentos e estilhaços saindo das paredes. Sua história está diante deles. Não é porque sejam melhores pessoas, mas, sabe, talvez porque o resto do mundo os obrigou a isso. Mas, de uma forma ou de outra, acreditei ingenuamente que a Alemanha era melhor”.
Lamenta que a cidade para onde veio pela sua reputação de capital artística, queer e cultural esteja queimando essa reputação, tudo em prol de defender os crimes de guerra israelitas. Está mesmo considerando deixar o país ao qual chama de casa há seis anos – e diz que muitos dos seus amigos também estão.
Mas acima de tudo, diz H. P., “me parte o coração pelos alemães”. Vê poucos alemães protestando com ele e os seus colegas ativistas, e os que o fazem são normalmente não brancos, homossexuais ou marginalizados.A maioria dos alemães, diz ele, está em silêncio.
“Daqui a vinte, trinta anos, vamos todos ter conversas com crianças e elas vão nos fazer perguntas sobre o que fizemos. E não sei o que os alemães vão contar a elas”.
Colaborador
“É tão claro. Mesmo antes de cortar para o meu Instagram, há uma foto da multidão e são todas as bandeiras comunistas. Eles dizem: ‘Olha para esta conspiração gay comunista para radicalizar todos os muçulmanos e criar uma jihad contra os judeus alemães, a civilização branca alemã'”.
No entanto, H. P. continuou a sua atividade pró-palestina em Berlim. Em março, H. P. foi agarrado e arrastado pela polícia para fora de um protesto pró-palestino na Estação Central de Berlim. É certamente notável que o vídeo de um judeu que usa um quipá sendo violentado pela polícia alemã armada não tenha causado um escândalo ou gerado qualquer tipo de atenção por parte da mídia nacional.
A fundação política e mediática alemã se orgulhada “cultura da memória” da Alemanha, referindo-se à centralidade que a recordação e a expiação do Holocausto têm na política e na sociedade. A Stolpersteine, “pedras de tropeço” com os nomes das vítimas do Holocausto, colocadas nos passeios de todo o país, são um exemplo proeminente do empenho da Alemanha em manter viva a memória dos crimes nazistas. Mas, cada vez mais, a cultura oficial da memória tem-se concentrado em combater um suposto ressurgimento do antissemitismo sob a forma de anti-sionismo e de “antissemitismo importado” trazido pela imigração.
Armando a culpa
A narrativa de que a Alemanha tinha eliminado o antissemitismo até que os imigrantes o trouxeram de volta transformou a culpa alemã pelo Holocausto em um porrete sendo empunhado contra a população muçulmana da Alemanha. Sem surpresa, o partido de extrema direita Alternative for Germany (Alternative for Germany – AfD) tem sido um dos principais proponentes dessa narrativa, mas ele ganhou amplo apoio em todo o estabelecimento político. Isto apesar do fato de praticamente todos os recentes ataques violentos contra a comunidade judaica alemã, como o tiroteio de 2019 contra uma sinagoga em Halle que matou duas pessoas, terem sido perpetrados pela extrema direita.
A cultura da memória também implica o compromisso inabalável do Estado e da mídia alemã com Israel. Desde o dia 7 de outubro, a sua obsessão em fechar todas as críticas às ações de Israel atingiu um nível febril. A caça às bruxas pública a todos os que dizem algo, mesmo que ligeiramente, crítico em relação a Israel levou a acusações de antissemitismo mesmo contra figuras judaicas bem conhecidas.
O sociólogo israelense-alemão Moshe Zuckermann e o fotógrafo judeu sul-africano Adam Broomberg viram-se do lado errado da cruzada alemã contra o antissemitismo, tal como a escritora judia russo-americana Masha Gessen, que viu uma cerimînia de entrega de prémios cancelada depois de o governo de Bremen e a Fundação Heinrich Böll, ligada ao Partido Verde, terem cancelado a sua participação devido a um artigo que Gessen escreveu, comparando a invasão de Gaza à liquidação do Gueto de Varsóvia.
A filósofa judia americana Nancy Fraser viu a sua cátedra ser cancelada na Universidade de Colónia por causa de uma carta de solidariedade com os habitantes de Gaza. A investigadora Emily Dische-Becker calculou que cerca de um terço das pessoas que foram publicamente destituídas na Alemanha por suposto antissemitismo eram judias.
H. P. enfatiza que, apesar do absurdo de os judeus serem acusados de odiadores de judeus, são os palestinos e outros muçulmanos que mais sofrem na Alemanha. O ativista palestino alemão Salah Said, que também é difamado tanto no vídeo do Spiegel como no artigo do Bild, tem sofrido repetidas perseguições policiais devido ao seu envolvimento no movimento pró-Palestina em Berlim, incluindo três invasões policiais à sua casa. Khaled Shehadeh, um ativista pró-Palestina que o Bild identifica como “modelo e herói dos odiadores de Israel”, foi detido quase vinte vezes. Muitos outros palestinos sofreram o mesmo nas mãos da polícia de Berlim.
Quando H. P. se mudou de Los Angeles para Berlim em 2018, foi pelo que parecia ser um país mais progressista, com “transportes públicos, controle de rendas, educação muito barata e dinheiro para a arte”. Também queria estar num país que, na sua opinião, tinha lidado melhor com a sua história violenta do que os Estados Unidos.
“Na Alemanha, há monumentos e estilhaços saindo das paredes. Sua história está diante deles. Não é porque sejam melhores pessoas, mas, sabe, talvez porque o resto do mundo os obrigou a isso. Mas, de uma forma ou de outra, acreditei ingenuamente que a Alemanha era melhor”.
Lamenta que a cidade para onde veio pela sua reputação de capital artística, queer e cultural esteja queimando essa reputação, tudo em prol de defender os crimes de guerra israelitas. Está mesmo considerando deixar o país ao qual chama de casa há seis anos – e diz que muitos dos seus amigos também estão.
Mas acima de tudo, diz H. P., “me parte o coração pelos alemães”. Vê poucos alemães protestando com ele e os seus colegas ativistas, e os que o fazem são normalmente não brancos, homossexuais ou marginalizados.A maioria dos alemães, diz ele, está em silêncio.
“Daqui a vinte, trinta anos, vamos todos ter conversas com crianças e elas vão nos fazer perguntas sobre o que fizemos. E não sei o que os alemães vão contar a elas”.
Colaborador
Liam McNiff é um escritor baseado em Barcelona.
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