Nelson Barbosa
No século passado, a grande economista Joan Robinson disse que o estudo de "economia sempre foi em parte um veículo para a ideologia dominante da época, bem como em parte um método de investigação científica".
Em outras palavras, poder econômico influencia o debate econômico, mas curiosidade, método de pesquisa e a evolução natural da sociedade tornam algumas questões inevitáveis, mesmo que elas contrariem os interesses da classe dominante de cada época.
Adaptando a reflexão de Robinson aos tempos atuais, acrescento que nós, economistas, muitas vezes ficamos imersos em nossas teorias e opiniões, sem ouvir adequadamente o "paciente", isto é, sem prestar atenção ao que a sociedade diz ser prioridade, mesmo que a mensagem venha com ruídos.
Como exemplo do ponto acima, relembro cinco temas recorrentes nos últimos 20 anos, independentemente da preferência teórica e política dos economistas ou da orientação do governo da ocasião.
Primeiro, a pobreza deve ser combatida com amplo programa de transferência de renda. Isso foi enfatizado por governos de esquerda no passado, mas mesmo um governo de extrema direita como o atual se rendeu à mensagem do "paciente", adotando e prorrogando o auxílio emergencial contra a Covid e mudando de opinião sobre o programa Bolsa Família, que agora é o carro-chefe da agenda de política econômica em 2022.
Segundo, é preciso reduzir desigualdades baseadas em injustiças, sobretudo no sistema tributário, no qual os muito ricos pagam relativamente bem menos impostos do que a classe média e os mais pobres.
O assunto não é novo, mas, diante do tamanho dos absurdos, até um governo de orientação neoliberal como o atual se rendeu ao fato de que é preciso tributar mais o "andar de cima", rasgando o evangelho segundo Friedman.
Terceiro, o governo precisa ter plano de investimento e desenvolvimento, do contrário a economia patina e alguém faz o plano que o governo se recusa a fazer, não necessariamente da melhor forma.
Como exemplo dessa mensagem do "paciente", temos o aumento do "orçamento paralelo" de emendas parlamentares e os "jabutis" colocados na privatização da Eletrobras. Nos dois casos o Legislativo ocupou o espaço de planejamento e coordenação deixado pelo Executivo, mostrando que o país quer e precisa de mais investimento.
Quarto, voltando à desigualdade, agora do lado da despesa, a remuneração de algumas castas do serviço público gera demanda por reforma administrativa para diminuir absurdos, especialmente no Poder Judiciário e nas Forças Armadas, mesmo que seja só para a frente, como é a tradição secular no Brasil de "privilégios adquiridos" (vide a questão das filhas solteiras de militares).
Sejam quais forem a orientação do governo e a preferência política da equipe econômica, a necessidade de mudança em carreiras e remuneração no setor público sempre reaparece.
Quinto, empresa estatal não é vaca sagrada nem praga a ser extinta. A sociedade se interessa mais pelo resultado da atividade do que pela forma na qual a atividade é feita. Em alguns setores estatais, são necessárias, do contrário o serviço não será prestado com a cobertura desejada pela população e o preço adequado ao risco e à rentabilidade do negócio. Em outros setores, a atividade pode ser feita pelo mercado, sob regulação do governo. Desde os anos 1990, houve concessão ou privatização em todos os mandatos presidenciais.
Frequentemente o debate econômico parece confuso porque só economistas falam. Se focarmos o que o paciente fala, a direção fica mais clara.
Adaptando a reflexão de Robinson aos tempos atuais, acrescento que nós, economistas, muitas vezes ficamos imersos em nossas teorias e opiniões, sem ouvir adequadamente o "paciente", isto é, sem prestar atenção ao que a sociedade diz ser prioridade, mesmo que a mensagem venha com ruídos.
Como exemplo do ponto acima, relembro cinco temas recorrentes nos últimos 20 anos, independentemente da preferência teórica e política dos economistas ou da orientação do governo da ocasião.
Primeiro, a pobreza deve ser combatida com amplo programa de transferência de renda. Isso foi enfatizado por governos de esquerda no passado, mas mesmo um governo de extrema direita como o atual se rendeu à mensagem do "paciente", adotando e prorrogando o auxílio emergencial contra a Covid e mudando de opinião sobre o programa Bolsa Família, que agora é o carro-chefe da agenda de política econômica em 2022.
Segundo, é preciso reduzir desigualdades baseadas em injustiças, sobretudo no sistema tributário, no qual os muito ricos pagam relativamente bem menos impostos do que a classe média e os mais pobres.
O assunto não é novo, mas, diante do tamanho dos absurdos, até um governo de orientação neoliberal como o atual se rendeu ao fato de que é preciso tributar mais o "andar de cima", rasgando o evangelho segundo Friedman.
Terceiro, o governo precisa ter plano de investimento e desenvolvimento, do contrário a economia patina e alguém faz o plano que o governo se recusa a fazer, não necessariamente da melhor forma.
Como exemplo dessa mensagem do "paciente", temos o aumento do "orçamento paralelo" de emendas parlamentares e os "jabutis" colocados na privatização da Eletrobras. Nos dois casos o Legislativo ocupou o espaço de planejamento e coordenação deixado pelo Executivo, mostrando que o país quer e precisa de mais investimento.
Quarto, voltando à desigualdade, agora do lado da despesa, a remuneração de algumas castas do serviço público gera demanda por reforma administrativa para diminuir absurdos, especialmente no Poder Judiciário e nas Forças Armadas, mesmo que seja só para a frente, como é a tradição secular no Brasil de "privilégios adquiridos" (vide a questão das filhas solteiras de militares).
Sejam quais forem a orientação do governo e a preferência política da equipe econômica, a necessidade de mudança em carreiras e remuneração no setor público sempre reaparece.
Quinto, empresa estatal não é vaca sagrada nem praga a ser extinta. A sociedade se interessa mais pelo resultado da atividade do que pela forma na qual a atividade é feita. Em alguns setores estatais, são necessárias, do contrário o serviço não será prestado com a cobertura desejada pela população e o preço adequado ao risco e à rentabilidade do negócio. Em outros setores, a atividade pode ser feita pelo mercado, sob regulação do governo. Desde os anos 1990, houve concessão ou privatização em todos os mandatos presidenciais.
Frequentemente o debate econômico parece confuso porque só economistas falam. Se focarmos o que o paciente fala, a direção fica mais clara.
Sobre o autor
Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.
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