1 de setembro de 2022

Expansão ou contração fiscal de 2023?

Provável aumento de gastos no ano que vem implica um déficit maior do que o projetado no plano orçamentário

Nelson Barbosa

Folha de S.Paulo

O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, em cerimônia em Brasília - Adriano Machado - 25.fev.2022/Reuters

O governo apresentou seu Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2023 e agora nós economistas podemos fazer considerações com base nas projeções oficiais.

O anúncio me relembrou o ano passado, quando o governo Bolsonaro também elaborou um PLOA com previsão de grande contração fiscal e depois voltou atrás, aumentando o gasto substancialmente via duas propostas de emenda constitucional, uma no final de 2021 e outra no meio deste ano.

A diferença entre os PLOA de 2022 e 2023 é que hoje o teto de gastos está tão desacreditado que não houve secretário do Tesouro pedindo demissão porque o governo furaria o teto. Melhor assim, pois governo não é lugar para ideólogos, mas vamos aos números.

Segundo as previsões oficiais, mantido o atual teto de gasto, a despesa primária da União cairá de 18,9% do PIB, neste ano, para 17,6% do PIB, em 2023. Haveria, portanto, uma contração de 1,3 ponto percentual (pp) no gasto do próximo ano, mas nem a equipe de Guedes acredita nisso.

O atual governo e o principal candidato de oposição, Lula, já anunciaram que manterão o orçamento de transferência de renda no valor equivalente a um benefício de R$ 600 por mês. A medida implica pelo menos mais 0,5 pp de gasto em 2023. Acho que será mais, pois há fila para receber o auxílio, mas vamos com o número oficial.

Em segundo lugar, atualmente o investimento da União está em 0,3% do PIB e não consegue manter a infraestrutura existente. De acordo com números do próprio governo, é preciso 0,5% do PIB para repor a depreciação do estoque de capital público federal.

Elevar o investimento para cobrir a depreciação e retomar alguns projetos implicará gasto adicional de pelo menos 0,5 pp do PIB em relação ao previsto no PLOA 2023. Somando este valor à manutenção do Auxílio Brasil mencionada acima, o gasto primário federal subiria para 18,6% do PIB no próximo ano.

Terceiro, dado que os orçamentos de saúde, educação, ciência e tecnologia também estão sendo comprimidos, caso o próximo governo queira voltar a investir no futuro do Brasil (tomara que sim), teríamos outros 0,5 pp de despesa primária adicional, elevando o total para 19,1% do PIB.

Antes que alguém grite "gastança", lembro que a despesa deste ano será 18,9% do PIB. Traduzindo do economês, um gasto de 19,1% em 2023 parece muito em relação à proposta irrealista do PLOA feito por Bolsonaro, mas é praticamente neutro em relação ao valor praticado por Bolsonaro neste ano.

Há outras pressões? Sim e na semana passada apontei outras fontes de aumento de despesa. Uma vez anunciados os números oficiais, apenas relembro que o gasto necessário para começar a recompor salários de servidores e fazer concursos é muito maior do que o anunciado no PLOA 2023.

E para fechar o quadro fiscal, temos dois grandes riscos para 2023: o eventual pagamento dos precatórios atrasados por Bolsonaro e a compensação, da União aos estados, pela redução do ICMS sobre combustível.

As duas coisas dependem de decisão do STF e, se nossos ministros-juízes resolverem encerrar o imbróglio rápido, isto pode resultar em mais 1 pp de gasto, elevando a despesa total para algo próximo de 20% do PIB em 2023.

Passando ao resultado primário, a provável expansão do gasto em 2023 implica um déficit maior do que o projetado no PLOA, mas o efeito não é um para um, pois parte do aumento do gasto volta ao governo via arrecadação. Fazendo as contas, o déficit primário de 2023 deve ficar entre 1% e 2% do PIB, sem incluir a eventual decisão do STF sobre os papagaios criados por Bolsonaro.

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