Gustavo Petro
Jacobin
Venho de um dos três países mais bonitos da terra. Há uma explosão de vida lá. Milhares de espécies multicoloridas nos mares, nos céus, nas terras. Venho da terra das borboletas amarelas e da magia. Lá nas montanhas e vales de todos os verdes, descem não só as águas abundantes, mas, também, as torrentes de sangue.
Jacobin
Segue-se uma tradução em português do discurso do presidente colombiano Gustavo Petro na Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20 de setembro de 2022.
Tradução / Secretário-Geral das Nações Unidas António Guterres, Excelências, Chefes de Estado e Chefes de Missão acreditados junto da Septuagésima Sétima Assembleia Geral das Nações Unidas; Vice-secretária-geral das Nações Unidas, Amina Mohammed, a todos vocês.
Venho de um dos três países mais bonitos da terra. Há uma explosão de vida lá. Milhares de espécies multicoloridas nos mares, nos céus, nas terras. Venho da terra das borboletas amarelas e da magia. Lá nas montanhas e vales de todos os verdes, descem não só as águas abundantes, mas, também, as torrentes de sangue.
Venho de um país de beleza ensanguentada.
Meu país não é só bonito, ele também é violento.
Como a beleza pode ser combinada com a morte? Como a biodiversidade da vida pode irromper com as danças da morte e do horror? Quem é o culpado por quebrar o encanto com o terror? Quem é o culpado por quebrar o encanto com o terror?
Quem ou o que é responsável por afogar a vida nas decisões rotineiras de riqueza e do lucro?
Quem nos leva à destruição como nação e como povo?
Meu país é lindo porque tem a Floresta Amazônica, a Floresta Tropical do Chocó, as águas, as cordilheiras dos Andes e os oceanos.
Quem ou o que é responsável por afogar a vida nas decisões rotineiras de riqueza e do lucro?
Quem nos leva à destruição como nação e como povo?
Meu país é lindo porque tem a Floresta Amazônica, a Floresta Tropical do Chocó, as águas, as cordilheiras dos Andes e os oceanos.
Nessas selvas, o oxigênio planetário é emanado e o CO2 atmosférico é absorvido. Uma dessas plantas que absorve o CO2, entre milhões de espécies, é uma das mais perseguidas na Terra. De todas as formas buscam a sua destruição: é uma planta amazônica, é a planta de coca, planta sagrada dos Incas.
Como em uma encruzilhada paradoxal. A selva que se tenta salvar, ao mesmo, é destruída.
Para destruir a planta de coca jogam venenos, glifosato em massa, que corre pelas águas; detém seus produtores e os encarceram. Por destruir ou possuir a folha de coca, um milhão de latino-americanos são assassinados e dois milhões de afros na América do Norte são presos. ‘Destruam a planta que mata’, gritam desde o Norte, mas a planta é apenas mais uma entre as milhões que perecem quando ateiam fogo na floresta.
Destruir a selva, a Amazônia, tornou-se o slogan seguido por Estados e empresários. Não importa o grito dos cientistas batizando a Floresta como um dos grandes pilares climáticos. Para as relações do poder do mundo, a floresta e seus habitantes são os culpados pela praga que as atormenta. As relações de poder são atormentadas pelo vício do dinheiro, pela sua perpetuação, pelo petróleo, pela cocaína e por drogas mais duras, a fim de se anestesiarem cada vez mais.
Nada mais hipócrita do que o discurso para salvar a Floresta.
A floresta queima, senhores, enquanto vocês fazem guerra e brincam com ela. A floresta, o pilar climático do mundo, desaparece com toda a sua vida. A grande esponja que absorve o CO2 planetário evapora. A floresta salvadora é vista em meu país como o inimigo a ser derrotado, como a vegetação a ser extinta. O espaço da coca e dos camponeses que a cultivam, porque não têm mais nada para cultivar, é demonizado. Para vocês, o meu país lhes interessa apenas jogar venenos em suas florestas, levar seus homens para a cadeia e jogar suas mulheres à exclusão. Não estão interessados na educação da criança, mas em matar sua floresta e extrair o carvão e o petróleo de suas entranhas. A esponja que absorve os venenos não serve, preferem jogar mais venenos na atmosfera.
Nós servimos somente como desculpa para o vazio e a solidão de sua própria sociedade, que os levam a viver no meio das bolhas de drogas. Escondemos seus problemas que se recusam a reformar. É melhor declarar guerra à floresta, às suas plantas, aos seus povos.
Enquanto deixam as florestas queimarem, enquanto os hipócritas perseguem as plantas com venenos para esconder os desastres de sua própria sociedade, nos pedem mais e mais carvão, mais e mais petróleo, para acalmar o outro vício: o do consumo, o do poder, o do dinheiro.
O que é mais venenoso para a humanidade: a cocaína, o carvão ou o petróleo? A decisão do poder ordenou que a cocaína é o veneno e deve ser perseguida, mesmo que só cause mortes por overdose, e pelas misturas causadas por sua clandestinidade estabelecida. Mas, por outro lado, o carvão e o petróleo devem ser protegidos, apesar de que seu uso possa extinguir toda a humanidade. Essas são as coisas do poder mundial, coisas da injustiça, coisas da irracionalidade, porque o poder mundial tornou-se irracional.
Eles veem na exuberância da floresta, em sua vitalidade, a luxúria, o pecado; a origem da culpa da tristeza de suas sociedades, imbuídas da compulsão ilimitada do ter e do consumir. Como esconder a solidão do coração, sua secura no meio de sociedades sem afetos, competitivas até aprisionar a alma na solidão, mas colocando a culpa na planta, no homem que a cultiva, nos segredos libertários da floresta. De acordo com o poder irracional do mundo, a culpa não é o mercado que corta a existência; a culpa é da floresta e daqueles que a habitam.
As contas bancárias tornaram-se ilimitadas; séculos não serão suficientes para gastar todo os dinheiros guardados pelos mais poderosos do mundo. A tristeza da existência produzida por esse chamado artificial à concorrência, é preenchida com ruído e drogas. O vício em dinheiro e ao ter tem outra cara: o vício em drogas nas pessoas que perdem a competição, nos perdedores da corrida artificial em que se transformou a humanidade. A doença da solidão não será curada com o glifosato jogado nas florestas. A culpada não é a floresta. A culpada é sua sociedade educada no consumo infinito, na estúpida confusão entre consumo e felicidade, que, de fato, permite que os bolsões de poder se encham de dinheiro.
A culpada do vício em drogas não é a floresta, é a irracionalidade de seu poder mundial.
Coloquem um pouco de razão ao seu poder. Acendam as luzes do século novamente.
A guerra contra as drogas já dura 40 anos; se não corrigirmos o curso e essa guerra durar mais 40 anos, os Estados Unidos verão 2.800.000 jovens morrerem de overdose de fentanil, que não é produzido em nossa América Latina. Verão milhões de afro-americanos presos em suas prisões privadas. O prisioneiro afro se tornará um negócio de empresas prisionais; mais um milhão de latino-americanos morrerão assassinados; nossas águas e nossos campos verdes se encherão de sangue; verão o sonho da democracia morrer tanto na minha América quanto na América Anglo-Saxã. A democracia morrerá onde nasceu, na grande Atenas da Europa Ocidental.
Ao esconder a verdade, eles verão a floresta e as democracias morrerem.
A guerra contra as drogas fracassou. A luta contra a crise climática fracassou.
Os consumos mortais aumentaram, das drogas leves foram para as mais fortes; houve um genocídio no meu continente e no meu país, milhões de pessoas foram condenadas às prisões; para esconder suas próprias culpas sociais culparam a floresta e suas plantas. Esvaziaram os discursos e as políticas.
Exijo daqui, da minha América Latina ferida, que acabem com a guerra irracional contra as drogas. Para reduzir o uso de drogas não precisa de guerras, precisa de todos nós para construir uma sociedade melhor: uma sociedade mais solidária, mais afetuosa, onde a intensidade da vida salva dos vícios e das novas escravidões. Querem menos drogas? Pensem em menos lucros e em mais amor. Pensem em um exercício racional de poder.
Não toquem com seus venenos a beleza da minha pátria. Ajudem-nos sem hipocrisias para salvar a Floresta Amazônica, para salvar a vida da humanidade no planeta.
Vocês reuniram os cientistas, e eles falaram com a razão. Com a matemática e os modelos climatológicos, eles disseram que o fim da espécie humana está se aproximando, que seu tempo não é mais de milênios, ou mesmo de séculos. A ciência disparou o alarme, mas paramos de ouvi-la. A guerra serviu como desculpa para não tomar as medidas necessárias.
Quando as ações eram mais necessárias, quando os discursos não eram mais úteis, quando era indispensável depositar dinheiro em fundos para salvar a humanidade, quando era necessário se afastar do carvão e do petróleo o mais rápido possível, uma guerra e outra e outra foram inventadas. Invadiram a Ucrânia, mas também o Iraque, a Líbia e a Síria. Invadiram o nome do petróleo e do gás.
No século 21, descobriram o pior de seus vícios: o vício em dinheiro e em petróleo.
As guerras serviram como desculpa para não agirem contra a crise climática. As guerras mostraram-lhes quão dependentes eles são do que vai acabar com a espécie humana.
Se observam que os povos estão com fome e sede e migram aos milhões para o norte, para onde está a água; então vocês os trancam, constroem muros, usam metralhadoras, atiram neles. Os expulsam como se não fossem seres humanos; quintuplicam a mentalidade daqueles que criaram politicamente as câmaras de gás e os campos de concentração; reproduzem em escala planetária o que passou em 1933. O grande triunfo do ataque à razão.
Por acaso não veem que a solução para o grande êxodo rumo aos seus países é fazer com que a água encha os rios e os campos se encham de nutrientes?
O desastre climático nos enche de vírus que pululam e nos matam; mas, vocês fazem negócios com os medicamentos e transformam as vacinas em mercadorias. Propõem que o mercado nos salvará do que o próprio mercado criou. O Frankenstein da humanidade está em deixar o mercado e a ganância agirem sem planejamento, rendendo o cérebro e a razão, ajoelhando a racionalidade humana à ganância.
Para que a guerra se o que precisamos é salvar a espécie humana? De que serve a Otan e os impérios, se o que está por vir é o fim da inteligência?
O desastre climático matará centenas de milhões de pessoas e, ouçam bem, isso não é produzido pelo planeta, é produzido pelo capital. A causa do desastre climático é o capital. A lógica de se relacionar para consumir cada vez mais, produzir cada vez mais, e para alguns ganhem cada vez mais produz desastres climáticos. Articularam a lógica do acúmulo expandido, os motores energéticos do carvão e do petróleo e desencadearam o furacão: a mudança química da atmosfera mais profunda e mortal. Agora, em um mundo paralelo, o acúmulo expandido de capital é um acúmulo expandido de morte.
Desde as terras da floresta e da beleza, de onde decidiram transformar uma planta da floresta amazônica em inimigo, extraditar e aprisionar seus produtores, eu os convido a parar a guerra, e parar o desastre climático.
Aqui, nessa Floresta Amazônica, há um fracasso da humanidade. Por trás das fogueiras que a queimam, após seu envenenamento, há um fracasso integral e civilizacional da humanidade.
Por trás do vício em cocaína e em drogas, por trás do vício em petróleo e em carvão está o verdadeiro vício dessa fase da história humana: o vício no poder irracional, no lucro e no dinheiro. Essa é a enorme maquinaria mortal que pode extinguir a humanidade.
Como presidente de um dos países mais bonitos do mundo, e um dos mais ensanguentados e violentados, proponho a vocês acabar com a guerra contra as drogas e permitir que nosso povo viva em paz.
Convoco toda a América Latina para este fim. Convoco a voz da América Latina a se unir para derrotar o irracional que martirize nosso corpo.
Convoco-lhes a salvar a Floresta Amazônica integralmente com os recursos que possam ser alocados em todo o mundo para a vida. Se vocês não têm a capacidade de financiar o fundo para a revitalização das florestas, se é mais importante alocar dinheiro para armas do que para a vida, então reduzam a dívida externa para liberar nossos próprios espaços orçamentários e, com eles, possamos realizar a tarefa de salvar a humanidade e a vida no planeta. Podemos fazer isso se vocês não querem. Apenas troquem a dívida pela vida, pela natureza.
Proponho e convoco a América Latina para isso: dialogar para acabar com a guerra. Não nos pressionem para nos levar aos campos de guerra. É hora da paz. Que os povos eslavos falem uns com os outros, deixem os povos do mundo possam fazer o mesmo. A guerra é apenas uma armadilha que aproxima o fim dos tempos na grande orgia da irracionalidade.
Da América Latina, convocamos a Ucrânia e a Rússia a fazer a paz.
Só em paz poderemos salvar a vida nessa nossa terra. Não há paz total sem justiça social, econômica e ambiental. Também estamos em guerra com o planeta. Sem paz com o planeta, não haverá paz entre as nações.
Sem justiça social, não há paz social.
Como em uma encruzilhada paradoxal. A selva que se tenta salvar, ao mesmo, é destruída.
Para destruir a planta de coca jogam venenos, glifosato em massa, que corre pelas águas; detém seus produtores e os encarceram. Por destruir ou possuir a folha de coca, um milhão de latino-americanos são assassinados e dois milhões de afros na América do Norte são presos. ‘Destruam a planta que mata’, gritam desde o Norte, mas a planta é apenas mais uma entre as milhões que perecem quando ateiam fogo na floresta.
Destruir a selva, a Amazônia, tornou-se o slogan seguido por Estados e empresários. Não importa o grito dos cientistas batizando a Floresta como um dos grandes pilares climáticos. Para as relações do poder do mundo, a floresta e seus habitantes são os culpados pela praga que as atormenta. As relações de poder são atormentadas pelo vício do dinheiro, pela sua perpetuação, pelo petróleo, pela cocaína e por drogas mais duras, a fim de se anestesiarem cada vez mais.
Nada mais hipócrita do que o discurso para salvar a Floresta.
A floresta queima, senhores, enquanto vocês fazem guerra e brincam com ela. A floresta, o pilar climático do mundo, desaparece com toda a sua vida. A grande esponja que absorve o CO2 planetário evapora. A floresta salvadora é vista em meu país como o inimigo a ser derrotado, como a vegetação a ser extinta. O espaço da coca e dos camponeses que a cultivam, porque não têm mais nada para cultivar, é demonizado. Para vocês, o meu país lhes interessa apenas jogar venenos em suas florestas, levar seus homens para a cadeia e jogar suas mulheres à exclusão. Não estão interessados na educação da criança, mas em matar sua floresta e extrair o carvão e o petróleo de suas entranhas. A esponja que absorve os venenos não serve, preferem jogar mais venenos na atmosfera.
Nós servimos somente como desculpa para o vazio e a solidão de sua própria sociedade, que os levam a viver no meio das bolhas de drogas. Escondemos seus problemas que se recusam a reformar. É melhor declarar guerra à floresta, às suas plantas, aos seus povos.
Enquanto deixam as florestas queimarem, enquanto os hipócritas perseguem as plantas com venenos para esconder os desastres de sua própria sociedade, nos pedem mais e mais carvão, mais e mais petróleo, para acalmar o outro vício: o do consumo, o do poder, o do dinheiro.
O que é mais venenoso para a humanidade: a cocaína, o carvão ou o petróleo? A decisão do poder ordenou que a cocaína é o veneno e deve ser perseguida, mesmo que só cause mortes por overdose, e pelas misturas causadas por sua clandestinidade estabelecida. Mas, por outro lado, o carvão e o petróleo devem ser protegidos, apesar de que seu uso possa extinguir toda a humanidade. Essas são as coisas do poder mundial, coisas da injustiça, coisas da irracionalidade, porque o poder mundial tornou-se irracional.
Eles veem na exuberância da floresta, em sua vitalidade, a luxúria, o pecado; a origem da culpa da tristeza de suas sociedades, imbuídas da compulsão ilimitada do ter e do consumir. Como esconder a solidão do coração, sua secura no meio de sociedades sem afetos, competitivas até aprisionar a alma na solidão, mas colocando a culpa na planta, no homem que a cultiva, nos segredos libertários da floresta. De acordo com o poder irracional do mundo, a culpa não é o mercado que corta a existência; a culpa é da floresta e daqueles que a habitam.
As contas bancárias tornaram-se ilimitadas; séculos não serão suficientes para gastar todo os dinheiros guardados pelos mais poderosos do mundo. A tristeza da existência produzida por esse chamado artificial à concorrência, é preenchida com ruído e drogas. O vício em dinheiro e ao ter tem outra cara: o vício em drogas nas pessoas que perdem a competição, nos perdedores da corrida artificial em que se transformou a humanidade. A doença da solidão não será curada com o glifosato jogado nas florestas. A culpada não é a floresta. A culpada é sua sociedade educada no consumo infinito, na estúpida confusão entre consumo e felicidade, que, de fato, permite que os bolsões de poder se encham de dinheiro.
A culpada do vício em drogas não é a floresta, é a irracionalidade de seu poder mundial.
Coloquem um pouco de razão ao seu poder. Acendam as luzes do século novamente.
A guerra contra as drogas já dura 40 anos; se não corrigirmos o curso e essa guerra durar mais 40 anos, os Estados Unidos verão 2.800.000 jovens morrerem de overdose de fentanil, que não é produzido em nossa América Latina. Verão milhões de afro-americanos presos em suas prisões privadas. O prisioneiro afro se tornará um negócio de empresas prisionais; mais um milhão de latino-americanos morrerão assassinados; nossas águas e nossos campos verdes se encherão de sangue; verão o sonho da democracia morrer tanto na minha América quanto na América Anglo-Saxã. A democracia morrerá onde nasceu, na grande Atenas da Europa Ocidental.
Ao esconder a verdade, eles verão a floresta e as democracias morrerem.
A guerra contra as drogas fracassou. A luta contra a crise climática fracassou.
Os consumos mortais aumentaram, das drogas leves foram para as mais fortes; houve um genocídio no meu continente e no meu país, milhões de pessoas foram condenadas às prisões; para esconder suas próprias culpas sociais culparam a floresta e suas plantas. Esvaziaram os discursos e as políticas.
Exijo daqui, da minha América Latina ferida, que acabem com a guerra irracional contra as drogas. Para reduzir o uso de drogas não precisa de guerras, precisa de todos nós para construir uma sociedade melhor: uma sociedade mais solidária, mais afetuosa, onde a intensidade da vida salva dos vícios e das novas escravidões. Querem menos drogas? Pensem em menos lucros e em mais amor. Pensem em um exercício racional de poder.
Não toquem com seus venenos a beleza da minha pátria. Ajudem-nos sem hipocrisias para salvar a Floresta Amazônica, para salvar a vida da humanidade no planeta.
Vocês reuniram os cientistas, e eles falaram com a razão. Com a matemática e os modelos climatológicos, eles disseram que o fim da espécie humana está se aproximando, que seu tempo não é mais de milênios, ou mesmo de séculos. A ciência disparou o alarme, mas paramos de ouvi-la. A guerra serviu como desculpa para não tomar as medidas necessárias.
Quando as ações eram mais necessárias, quando os discursos não eram mais úteis, quando era indispensável depositar dinheiro em fundos para salvar a humanidade, quando era necessário se afastar do carvão e do petróleo o mais rápido possível, uma guerra e outra e outra foram inventadas. Invadiram a Ucrânia, mas também o Iraque, a Líbia e a Síria. Invadiram o nome do petróleo e do gás.
No século 21, descobriram o pior de seus vícios: o vício em dinheiro e em petróleo.
As guerras serviram como desculpa para não agirem contra a crise climática. As guerras mostraram-lhes quão dependentes eles são do que vai acabar com a espécie humana.
Se observam que os povos estão com fome e sede e migram aos milhões para o norte, para onde está a água; então vocês os trancam, constroem muros, usam metralhadoras, atiram neles. Os expulsam como se não fossem seres humanos; quintuplicam a mentalidade daqueles que criaram politicamente as câmaras de gás e os campos de concentração; reproduzem em escala planetária o que passou em 1933. O grande triunfo do ataque à razão.
Por acaso não veem que a solução para o grande êxodo rumo aos seus países é fazer com que a água encha os rios e os campos se encham de nutrientes?
O desastre climático nos enche de vírus que pululam e nos matam; mas, vocês fazem negócios com os medicamentos e transformam as vacinas em mercadorias. Propõem que o mercado nos salvará do que o próprio mercado criou. O Frankenstein da humanidade está em deixar o mercado e a ganância agirem sem planejamento, rendendo o cérebro e a razão, ajoelhando a racionalidade humana à ganância.
Para que a guerra se o que precisamos é salvar a espécie humana? De que serve a Otan e os impérios, se o que está por vir é o fim da inteligência?
O desastre climático matará centenas de milhões de pessoas e, ouçam bem, isso não é produzido pelo planeta, é produzido pelo capital. A causa do desastre climático é o capital. A lógica de se relacionar para consumir cada vez mais, produzir cada vez mais, e para alguns ganhem cada vez mais produz desastres climáticos. Articularam a lógica do acúmulo expandido, os motores energéticos do carvão e do petróleo e desencadearam o furacão: a mudança química da atmosfera mais profunda e mortal. Agora, em um mundo paralelo, o acúmulo expandido de capital é um acúmulo expandido de morte.
Desde as terras da floresta e da beleza, de onde decidiram transformar uma planta da floresta amazônica em inimigo, extraditar e aprisionar seus produtores, eu os convido a parar a guerra, e parar o desastre climático.
Aqui, nessa Floresta Amazônica, há um fracasso da humanidade. Por trás das fogueiras que a queimam, após seu envenenamento, há um fracasso integral e civilizacional da humanidade.
Por trás do vício em cocaína e em drogas, por trás do vício em petróleo e em carvão está o verdadeiro vício dessa fase da história humana: o vício no poder irracional, no lucro e no dinheiro. Essa é a enorme maquinaria mortal que pode extinguir a humanidade.
Como presidente de um dos países mais bonitos do mundo, e um dos mais ensanguentados e violentados, proponho a vocês acabar com a guerra contra as drogas e permitir que nosso povo viva em paz.
Convoco toda a América Latina para este fim. Convoco a voz da América Latina a se unir para derrotar o irracional que martirize nosso corpo.
Convoco-lhes a salvar a Floresta Amazônica integralmente com os recursos que possam ser alocados em todo o mundo para a vida. Se vocês não têm a capacidade de financiar o fundo para a revitalização das florestas, se é mais importante alocar dinheiro para armas do que para a vida, então reduzam a dívida externa para liberar nossos próprios espaços orçamentários e, com eles, possamos realizar a tarefa de salvar a humanidade e a vida no planeta. Podemos fazer isso se vocês não querem. Apenas troquem a dívida pela vida, pela natureza.
Proponho e convoco a América Latina para isso: dialogar para acabar com a guerra. Não nos pressionem para nos levar aos campos de guerra. É hora da paz. Que os povos eslavos falem uns com os outros, deixem os povos do mundo possam fazer o mesmo. A guerra é apenas uma armadilha que aproxima o fim dos tempos na grande orgia da irracionalidade.
Da América Latina, convocamos a Ucrânia e a Rússia a fazer a paz.
Só em paz poderemos salvar a vida nessa nossa terra. Não há paz total sem justiça social, econômica e ambiental. Também estamos em guerra com o planeta. Sem paz com o planeta, não haverá paz entre as nações.
Sem justiça social, não há paz social.
Colaborador
Gustavo Petro é o trigésimo quarto presidente da República da Colômbia.
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