Nelson Barbosa
Folha de S.Paulo
Sede do Banco Central em Brasília - Ueslei Marcelino-10.mai.17/Reuters |
A eleição se aproxima, mas hoje vou falar de juro por dois motivos: nesta semana houve duas decisões monetárias importantes, nos EUA e aqui, e eu acertei as duas decisões.
Antes de o leitor desistir de ler essa coluna, esclareço que, como todos os economistas, eu erro muito mais do que acerto minhas previsões, pois economia é assunto complexo sujeito a choques imprevisíveis. Ainda assim, é preciso fazer previsões e chegou a hora de ajustar meu cenário de juro.
Começando pelos EUA, no início de maio, escrevi neste espaço: "Por enquanto o Fed diz que a Selic deles (Fed Funds) subirá para algo entre 2,5% e 3%, mas acho que será mais. Como a inflação de lá está em mais de 8% ao ano, sem sinal de queda rápida e economia ainda muito aquecida, provavelmente a Fed Funds subirá para mais de 3% ainda neste ano, o que geralmente puxa a inflação de commodities para baixo."
Nesta quarta o Fed elevou seu juro básico para a faixa de 3% a 3,25%, pois eles ainda trabalham com banda de flutuação, e disse que vem mais. O mercado espera mais dois aumentos neste ano, colocando o teto de juro de lá entre 4% e 4,5% até dezembro. Concordo com essa previsão, apesar de a inflação norte-americana já ter começado a cair.
O risco de elevação maior do juro norte-americano vem de fora dos EUA, da possível escalada do conflito na Ucrânia e de tensões entre EUA e China, que podem gerar novo choque adverso no preço do petróleo e gargalos nas cadeias globais de valor que passam pelo leste asiático (quase todas). No cenário mais pessimista, a inflação dos EUA demorará a cair e a Fed Funds chegará a 5% no início de 2023, mas uma economia em "quase-guerra" também tende a estimular soluções heterodoxas (controle temporário de preços) como vemos atualmente na Europa.
Passando ao Brasil, também em maio, escrevi aqui: "Espero que a crise na Ucrânia não piore e que, caso derrotado, Bolsonaro aceite o resultado sem criar muita confusão. Neste cenário a Selic subirá para 13,25% em junho, como o Copom já telegrafou, e aumentará mais um pouco em agosto, para 13,50% ou 13,75%. A partir de então a Selic tende a ficar estável até dezembro, quando saberemos o resultado das ações do BC e dos votos da população." O BC elevou a Selic para 13,75% em agosto e, nesta quarta, manteve o juro básico no mesmo valor.
Olhando para a frente, o BC disse que manterá a Selic em 13,75% por um tempo prolongado, mas não descarta novos aumentos caso a situação piore. Uma piora possível é o cenário de quase-guerra mundial que eu mencionei anteriormente. Mas tirando fatores externos, também há incertezas domésticas para a política monetária.
A primeira e mais óbvia continua sendo política, caso Bolsonaro perca a eleição e não aceite o resultado. O ruído da provável transição de governo pode gerar alguma volatilidade no câmbio, mas não creio que suficiente para o BC alterar a Selic.
A outra incerteza é fiscal, sobre o rumo do Orçamento no novo governo, seja ele Lula ou Bolsonaro. Voto e torço para que seja Lula, mas em qualquer cenário o governo eleito em outubro terá que dizer como e em que velocidade reequilibrará as finanças públicas, hoje destroçadas por um teto irresponsável de gasto, PECs eleitoreiras e orçamento secreto.
Como a redução da incerteza fiscal levará tempo, acho que a Selic permanecerá em 13,75% até junho de 2023, com o BC esperando a definição no novo plano fiscal do governo federal, incluindo a aprovação ou não de reformas estruturais no primeiro semestre do ano que vem.
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