17 de novembro de 2025

Mario Tronti e a crise do operaísmo italiano

O operaísmo italiano teve grande influência na esquerda do pós-guerra. Como um de seus principais pensadores, Mario Tronti teve que lidar com um mundo em que essas lutas entraram em acentuado declínio.

Jamila Mascat

Jacobin

A tendência operaísta italiana argumentava que as lutas operárias desempenharam um papel fundamental no desenvolvimento do capitalismo. Por um lado, o trabalho é parte integrante do capital; por outro, é uma força autônoma que se opõe ao capital e provoca suas reações. (Adriano Alecchi Mondadori via Getty Images)

Em 1964, Mario Tronti e um grupo de camaradas, incluindo Antonio Negri, fundaram a revista Classe operaia (“Classe Operária”). Embora este possa ter sido um evento menor em meio à turbulência global daqueles anos, ele ressoou com as lutas dos trabalhadores nas indústrias do norte da Itália. A revista também deixou uma marca profunda no desenvolvimento subsequente da extrema esquerda italiana e na história do marxismo internacional.

Classe operaia nasceu como uma dissidência de Quaderni rossi, uma revista lançada em 1961 pelo sociólogo marxista Raniero Panzieri, para a qual Tronti também havia contribuído. Ela reunia um grupo de ativistas e pesquisadores que se dedicavam ao estudo da composição da classe trabalhadora nas fábricas italianas. O novo projeto da Classe operaia buscava, nas palavras de Tronti, passar da análise das formas e organizações do movimento operário para o engajamento em “uma fase de intervenção articulada nas lutas” ao lado dos trabalhadores em greve.

Classe operaia Filósofo de formação e político por vocação, Tronti pertencia a uma geração de jovens comunistas italianos para quem os eventos de 1956, quando os tanques soviéticos esmagaram a revolta húngara, representaram uma revelação, abalando-os e afastando-os do seu stalinismo habitual. Embora permanecessem nas fileiras do Partido Comunista Italiano (PCI), esses “jovens marxistas em formação e militantes comunistas inquietos”, como Tronti os descreveu mais tarde, começaram a questionar a liderança de Palmiro Togliatti e os rumos do PCI.

A Fermentação Viva

Na visão de Tronti, tornou-se rapidamente evidente que as limitações políticas da liderança de Togliatti refletiam restrições teóricas e filosóficas mais profundas, particularmente a ideologia historicista defendida pelo partido. Como ele próprio afirmou: “Eles podiam concordar com a invasão do Exército Vermelho, precisamente porque eram historicistas.”

Para Tronti, o termo “historicismo” referia-se à construção ideológica engendrada pelo PCI, que fundia uma interpretação idealista da “filosofia da práxis” de Antonio Gramsci com elementos do hegelianismo e do materialismo dialético. Servindo como fundamento da política cultural do PCI, o historicismo transformara o marxismo numa espécie de ideologia nacional-popular, moldada por uma lógica de compromisso em que tudo era mediado, interpretado e gradualmente transformado, mas nunca derrubado.

Ao longo de sua trajetória intelectual, Tronti resistiu consistentemente às tentações do historicismo. Em contrapartida, encontrou inspiração no marxismo científico de Galvano della Volpe, cuja abordagem materialista rompeu decisivamente com Hegel e com a marca idealista do marxismo italiano. O jovem Tronti, assim, esforçou-se para construir uma ciência operária capaz de compreender e intervir na dinâmica política explosiva da Itália dos anos 1960.

Mario Tronti pertencia a uma geração de jovens comunistas italianos para quem os eventos de 1956 representaram uma revelação.

“Grandes coisas são feitas por saltos abruptos”, escreveu Tronti certa vez, acrescentando que “as descobertas que importam sempre rompem o fio da continuidade”. Os saltos — tão caros a Lenin como leitor da Ciência da Lógica de Hegel — eram centrais para a teoria e a prática de Tronti. A experiência da Classe operaia personificou um grande salto em sua trajetória política e intelectual. Também desempenhou um papel crucial na formação do caminho de muitos ativistas radicais que foram educados na escola do operaismo.

Os artigos que Tronti escreveu para a revista em 1966 foram reunidos em Operários e Capital, livro considerado a pedra angular do operárioismo italiano. Fundamentado numa leitura heterodoxa de Marx, tornou-se o que Tronti descreveria mais tarde como um “romance de formação para mentes jovens e antagônicas”. Nos Grundrisse de Marx, Tronti deparou-se com a noção de trabalho vivo, que utilizou como alavanca para sua “revolução copernicana” conceitual.

Em vez da mercadoria, ponto de partida de Marx em O Capital, é o trabalho dos operários enquanto trabalho vivo e força de trabalho que serve de eixo para a compreensão de Tronti sobre o desenvolvimento capitalista. Por causa do trabalho, argumentava ele, a função da classe trabalhadora deve ser entendida como dupla, ou deve ser “contada duas vezes”: tanto dentro quanto contra o capital.

Por um lado, o trabalho é parte integrante do capital; por outro, é uma força autônoma que se opõe ao capital e provoca suas reações. Distorcendo o discurso clássico de Marx, Tronti chegou à conclusão de que “sem a classe trabalhadora, não há desenvolvimento capitalista” e que as lutas dos trabalhadores são o fermento vivo do capital.

Nessa interpretação peculiar de Marx, emergiram duas intuições-chave de Tronti. A primeira foi a ideia de que a classe trabalhadora dita o ritmo do antagonismo entre trabalho e capital. A segunda foi o reconhecimento da insubordinação e da recusa do trabalho por parte dos trabalhadores como a força motriz da luta da classe trabalhadora.

Fim de uma Era

Em 1967, a revista Classe Operaia deixou de ser publicada. Para Tronti, os eventos do ano seguinte já marcavam o fim de uma era, não apesar do movimento de protesto internacional de 1968, mas precisamente por causa dele. Tratava-se de uma revolta contra a autoridade que ele considerava, em última análise, alinhada ao caminho do progresso capitalista e que jamais lhe despertou simpatia.

Em retrospectiva, a década de 1960 pareceu quase uma quimera na visão de Tronti: “Vimos vermelho. Mas não era o vermelho de um novo amanhecer; era o vermelho do pôr do sol.” Enquanto protestos estudantis e operários irrompiam em todo o mundo durante esse período, principalmente na Itália, Tronti olhava para trás, para a década, para analisar as razões do que ele considerava a derrota já consumada da classe trabalhadora, que ele atribuía, no contexto italiano, à falta de uma infraestrutura organizacional.

“A reivindicação revolucionária operária”, ele observaria muitos anos depois, “poderia ter se materializado se tivesse encontrado organização e liderança política não em um grupo de militantes dispostos, mas em uma grande força popular já existente.” O que faltava, em sua visão, não era a vontade de trabalhadores bravos e insubordinados da base — “a rude raça pagã”, como Tronti os chamava —, mas sim essa força.

Em retrospectiva, a década de 1960 pareceu quase uma quimera na visão de Tronti.

Naquela época, Tronti precisava situar as promissoras intuições de Operários e Capital em um tempo e espaço mais específicos. Essas intuições não apenas se aplicavam a uma fase muito particular do desenvolvimento capitalista na Itália — a do capitalismo industrial, incluindo o trabalhador de massa socialmente organizado —, mas mesmo dentro desse contexto, seus limites se tornavam evidentes. Como Tronti refletiu em sua obra de 2009, Noi operaisti: “Em certo momento, percebemos... a própria classe trabalhadora não conseguia mais sustentar a luta. Não podia derrotar seu adversário de classe sem se munir de uma armadura política.”

Assim começou o afastamento de Tronti do quadro operário anterior, conduzindo-o a um novo caminho intelectual centrado na autonomia do político e culminando, na década de 1990, em seu diagnóstico do “crepúsculo da política” — uma condição que, em sua visão, continua a assombrar o nosso presente.

A partir do final da década de 1960, Tronti começou a refletir sobre a relação entre classe, partido e Estado. Crítico da direção do PCI a partir de uma perspectiva antirreformista, opôs-se, ao mesmo tempo, aos caminhos trilhados pela esquerda italiana extraparlamentar, que havia absorvido figuras proeminentes do meio operaísta, incluindo Negri. A principal preocupação de Tronti era que o PCI desenvolvesse uma política capaz de recuperar um papel hegemônico dentro dos movimentos operário e estudantil, evitando, ao mesmo tempo, as armadilhas do reformismo e do extremismo de extrema esquerda.

Durante esse período, diversos representantes do operaísta distanciaram-se de Tronti, questionando sua crença de que as organizações tradicionais do movimento operário ainda poderiam ser os veículos do poder e da luta de classe. Por sua vez, Tronti mostrava-se cético em relação à guinada radical tomada por aqueles que se concentravam na organização fora do partido e permanecia convicto da necessidade de alinhamento com a força mais poderosa em seu auge, ou seja, o PCI.

A questão da organização política era decisiva e tinha precedência sobre as lutas de classes. Em sua visão, o partido podia, por vezes, desviar-se da direção pretendida pela classe precisamente para agir em seu melhor interesse, isto é, consolidar o poder de classe na esfera política. Em uma perspectiva pascaliana, poderíamos dizer que, para Tronti, o partido tinha suas razões, das quais a própria classe nada sabia.

Crepúsculo da Política

A década de 1970 marcou um afastamento da política para Tronti, inaugurando um longo período de estudo e meditação filosófica sobre os clássicos do realismo político. Ele se dedicou à obra de diversos pensadores, de Thomas Hobbes a Carl Schmitt e de Nicolau Maquiavel a Max Weber, enquanto lecionava filosofia moral e política na Universidade de Siena.

No início da década de 1980, Tronti era membro do Comitê Central do PCI. Ele vislumbrava uma nova oportunidade para uma política efetiva, atrelada à crescente força eleitoral do PCI na década anterior, como o maior partido comunista em qualquer país ocidental. Contudo, a visão política almejada por Tronti jamais se concretizou, e o PCI acabou se dissolvendo, tornando-se um partido de centro-esquerda convencional após o colapso da União Soviética.

A missão teórica de Tronti era reafirmar a posição dos trabalhadores, mesmo quando esta desaparecesse da face da história.

Para Tronti, o fim do comunismo e o desaparecimento dos comunistas — “os únicos capazes de realmente assustar o capital” — inauguraram o “crepúsculo da política”, uma verdadeira tragédia política na qual nossos tempos ainda estão imersos. O que triunfou, a seus olhos, não foi apenas o capitalismo, mas a democracia política. Foi o triunfo da democracia, e não meramente a dinâmica de um sistema econômico, que diluiu o duplo antagonismo da luta de classes no pluralismo da política de massas — na qual o trabalhador de massa acabou por se dissolver.

Diante do fim da política, naqueles anos, Tronti voltou-se para a teologia política, inspirando-se na obra de Walter Benjamin, Jacob Taubes e São Paulo em busca de armas críticas para manter vivo o espírito da transcendência comunista e resistir ao pântano da antipolítica. Nessa fase de regressão ideológica, a missão teórica de Tronti era reafirmar a posição dos trabalhadores, mesmo quando esta desaparecia da superfície da história, e defender a ideia do comunismo como uma utopia concreta.

A linguagem da teologia política adequava-se à sua busca pelas alturas da transcendência em oposição ao mundo abaixo, um mundo totalmente subsumido pela lógica do capital e dominado pelo espírito do homo democraticus. O ponto de vista dos trabalhadores como um espaço epistemologicamente privilegiado para a compreensão da realidade capitalista permaneceu central na filosofia de Tronti como a descoberta intelectual irreversível do operaismo, uma escola e um estilo de pensamento únicos, como ele escreveria na década de 2000, e uma “forma política de olhar o mundo e uma forma humana de agir nele”.

Um toque paradoxal de idealismo coloriu o pensamento tardio de Tronti, apesar de seu declarado realismo político. Isso se manifestou de forma mais marcante em suas tentativas de intervir nas fileiras do Partido Democrático (PD) pós-comunista — um partido que há muito havia esquecido os trabalhadores e, de fato, abandonado sua causa — quando foi eleito para o Senado italiano em 2013.

Nesses anos, para Tronti, era a memória, e não a política cotidiana, que podia manter a chama comunista acesa em meio às cinzas. Era preciso lançar a grandiosa história do século XX contra o vazio atemporal do século XXI e a paralisia do “presentismo”, que embota o pensamento radical. A obsolescência torna-se uma arma de resistência, embora não possa oferecer nada além de uma aposta sem garantias.

Direito à Experimentação

O esforço determinado para dar sentido à conjuntura histórica impulsionou o pensamento de Tronti em tempos de desespero teórico. “Pensamento extremo, ação prudente” tornou-se o lema que guiou seus últimos anos, enfatizando a necessidade de separar teoria e prática em prol de ambas. Juntamente com o convite apaixonado para “reconectar o ideal e o real desta história [comunista] dentro de um horizonte compartilhado”, a obra de Tronti deixou lições duradouras para a esquerda radical.

Primeiro, uma epistemologia partidária que nos encoraja a manter firme o ponto de vista partidário e suas verdades. Para Tronti, “o conhecimento está ligado à luta” e “só quem verdadeiramente odeia pode verdadeiramente conhecer”. Segundo, um apelo à experimentação que conecta o Tronti da fase final com sua encarnação mais jovem, que reivindicava para a classe trabalhadora e sua geração militante “o direito de experimentar, que é o único que realmente vale a pena reivindicar”.

O Tronti da fase final frequentemente nos lembrava que a experiência do “socialismo realmente existente” durou pouco mais de setenta anos no total. Este período, insistiu ele, equivalia a uma experiência de curta duração, “um sopro na ‘longa duração’ dos processos históricos”.

Em sua obra final, Il proprio tempo appreso col pensiero (2024), Tronti refletiu sobre as consequências da vitória incontestável do capitalismo democrático. É o fim do fim, quando a névoa se dissipa para revelar o que resta da outrora gloriosa história do movimento operário, “uma cidade morta, devastada pelo tempo”. É precisamente neste fim do fim que Tronti sugere a possibilidade de um novo começo — uma possibilidade que só pode ser cultivada por meio de um pensamento militante.

Colaborador

Jamila Mascat é professora assistente de estudos de gênero e pós-coloniais na Universidade de Utrecht.

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