Que se estabeleça, com urgência, uma mesa de entendimento entre Executivo, Legislativo e Judiciário
José Guimarães
Advogado e deputado federal (PT-CE), é líder do governo na Câmara
Abrir debate sobre marco temporal das terras indígenas é abrir as veias da colonização do Brasil. É tentar interditar a história dos povos originários a partir do dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição vigente, como se o país fosse apenas dos colonizadores que estabeleceram a hereditariedade cartorial sobre a terra ocupada.
O projeto de lei 490/2007 aprofunda a discórdia na sociedade brasileira ao desprezar o direito originário e universal à terra dos povos indígenas tradicionais, que vivem no território nacional desde antes da criação do Estado brasileiro.
Marcar uma data, a partir da qual os direitos indígenas passam a ser validados, como prevê o projeto, seria um retrocesso perigoso, por inviabilizar o processo de demarcação em curso e eximir a União dos deveres de proteger e demarcar as terras indígenas como determina a Constituição. Hoje, 487 territórios indígenas estão demarcados e 725 processos em tramitação nos órgãos competentes.
A tese do marco temporal, originada de um recurso extraordinário de um processo de reintegração de posse contra o povo Xokleng, em Santa Catarina, aguarda decisão do Supremo Tribunal Federal —a corte deve retomar o julgamento nesta quarta-feira (7). Decisão que será determinante para orientação de todas as instâncias do Judiciário. Caso o marco temporal seja considerado inconstitucional, o projeto de lei ficará prejudicado.
Esse projeto nem sequer devia constar na pauta do Congresso Nacional. Ele acirra conflitos e não condiz com a criação do ambiente de paz e união do país para retomada do desenvolvimento sustentável, da inclusão social e da superação da pobreza. Pauta que está sendo levada pelo presidente Lula aos mais importantes fóruns internacionais.
O recente genocídio do povo yanomami —tragédia decorrente da invasão da reserva pelo crime organizado— é uma barbárie. Nos envergonha perante o mundo. Em conflitos seculares como esse, as autoridades competentes têm o dever de estancar, fazendo cumprir o artigo 231 da Constituição.
Tendo em vista tratar-se de um problema social de extrema relevância e urgência, a busca de solução para essa questão deve ser imbuída de espírito democrático e que se estabeleça, o mais breve possível, uma mesa de entendimento entre os representantes dos três Poderes —Executivo, Legislativo e Judiciário— a fim de evitar que o marco temporal seja motivo para mais violência.
A sustentabilidade e a defesa de direitos são eixos centrais do projeto de governo do presidente Lula. O Brasil tem uma Constituição, acordos internacionais sobre meio ambiente e direitos humanos a serem cumpridos. Isso tem que ser observado.
A construção do futuro passa pelo desenvolvimento sustentável, e pela conquista e preservação de direitos no processo civilizatório, na transição para uma sociedade democrática.
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