André Roncaglia
Professor de economia da Unifesp e doutor em economia do desenvolvimento pela FEA-USP
No artigo da semana passada, falei da emergente dominância financeira. Em cenário inflacionário e com alto endividamento, a escalada nas taxas de juros pelos bancos centrais produz instabilidade financeira.
No mesmo dia, veio o colapso do Silicon Valley Bank (SVB), convertendo investidores libertários em defensores da intervenção estatal para salvar o banco privado.
Na sequência, o famigerado Credit Suisse recebeu do banco central suíço uma módica ajuda de 7% do PIB do país. Capitalismo na subida, socialismo na queda.
Outra lição do episódio veio em reportagem de 13/3 do jornal The New York Times segundo a qual a quebra do SVB ameaça a continuidade de inovações climáticas. O banco tinha mais de 1.550 empresas dedicadas a projetos de energia solar, hidrogênio e armazenamento de baterias e outros setores estimulados pela agenda de transição verde do governo Biden.
Outra lição do episódio veio em reportagem de 13/3 do jornal The New York Times segundo a qual a quebra do SVB ameaça a continuidade de inovações climáticas. O banco tinha mais de 1.550 empresas dedicadas a projetos de energia solar, hidrogênio e armazenamento de baterias e outros setores estimulados pela agenda de transição verde do governo Biden.
Placa do BNDES na sede da instituição, no Rio de Janeiro - Sergio Moraes/Reuters |
Livres das crendices neoliberais, países desenvolvidos estão usando abertamente subsídios, bancos de desenvolvimento e outros estímulos estatais para construir a nova fronteira tecnológica. Intensivo em inovações disruptivas, o processo combina resultados incertos com investimentos em larga escala, afugentando a precificação de mercado.
No Brasil, a qualidade do debate ainda é "medieval". O desenvolvimento de tecnologias verdes há tempos conta com a atuação do BNDES (por exemplo, os parques eólicos na região Nordeste). A nova direção do banco busca resgatar sua vocação estratégica e, como esperado, tem suscitado temores e críticas infundados.
Vejamos. Além de o banco ser lucrativo e ter um corpo técnico muito capacitado, as evidências mostram que seus desembolsos estimulam investimentos que geram renda e emprego —sobretudo quando os tomadores do crédito são micro, pequenas e médias empresas— e fomentam a nossas exportações.
No caso da transição verde, o recurso a taxas subsidiadas não se deve à natureza estatal do banco, mas à particularidade da aplicação dos recursos em setores repletos de externalidades, mercados incompletos e incerteza radical, traços que afastam capitais privados.
As restrições fiscais resultantes da economia política atual obrigam o banco a diversificar suas fontes de financiamento. A LCD atende a esse objetivo, combinando a particularidade dos investimentos na transição verde com o caráter voluntário do título financeiro (isento de IR).
Dado o alto risco dos projetos aos quais se destinarão os fundos, critérios de regulação bancária limitam o volume de recursos que o banco pode captar por esse meio. A LCD disputará uma pequena fatia do volume captado pelos instrumentos privados nos setores imobiliário e do agronegócio, incentivados por isenções fiscais —como debêntures incentivadas, LCI, LCA etc.
O BNDES não participa desse mercado, que já mobiliza R$ 1 trilhão e não exige contrapartidas ao benefício fiscal concedido. Em contraste, o BNDES já conta, desde 2010, com protocolo robusto de avaliação da efetividade de sua atuação. Isso dará maior transparência à destinação dos recursos da LCD.
A rejeição exagerada da LCD contrasta com a complacência com as operações compromissadas no Banco Central, que já somam 11% do PIB. Essas operações rentabilizam as sobras de caixa das instituições financeiras, inflam as estatísticas de dívida pública e constituem um imenso estoque de recursos ociosos.
A combinação de queda da taxa de juros com um marco fiscal que priorize o investimento público pode destravar esses recursos e canalizá-los para o enfrentamento do desafio que a crise climática impõe ao país. Dispor de um BNDES equipado e capacitado será crucial nesse processo.
Voltarei ao tema em breve, mas fica o alerta: o hemisfério Norte abandonou, há tempos, as superstições neoliberais. O Brasil precisa seguir o exemplo urgentemente.
No Brasil, a qualidade do debate ainda é "medieval". O desenvolvimento de tecnologias verdes há tempos conta com a atuação do BNDES (por exemplo, os parques eólicos na região Nordeste). A nova direção do banco busca resgatar sua vocação estratégica e, como esperado, tem suscitado temores e críticas infundados.
Vejamos. Além de o banco ser lucrativo e ter um corpo técnico muito capacitado, as evidências mostram que seus desembolsos estimulam investimentos que geram renda e emprego —sobretudo quando os tomadores do crédito são micro, pequenas e médias empresas— e fomentam a nossas exportações.
No caso da transição verde, o recurso a taxas subsidiadas não se deve à natureza estatal do banco, mas à particularidade da aplicação dos recursos em setores repletos de externalidades, mercados incompletos e incerteza radical, traços que afastam capitais privados.
As restrições fiscais resultantes da economia política atual obrigam o banco a diversificar suas fontes de financiamento. A LCD atende a esse objetivo, combinando a particularidade dos investimentos na transição verde com o caráter voluntário do título financeiro (isento de IR).
Dado o alto risco dos projetos aos quais se destinarão os fundos, critérios de regulação bancária limitam o volume de recursos que o banco pode captar por esse meio. A LCD disputará uma pequena fatia do volume captado pelos instrumentos privados nos setores imobiliário e do agronegócio, incentivados por isenções fiscais —como debêntures incentivadas, LCI, LCA etc.
O BNDES não participa desse mercado, que já mobiliza R$ 1 trilhão e não exige contrapartidas ao benefício fiscal concedido. Em contraste, o BNDES já conta, desde 2010, com protocolo robusto de avaliação da efetividade de sua atuação. Isso dará maior transparência à destinação dos recursos da LCD.
A rejeição exagerada da LCD contrasta com a complacência com as operações compromissadas no Banco Central, que já somam 11% do PIB. Essas operações rentabilizam as sobras de caixa das instituições financeiras, inflam as estatísticas de dívida pública e constituem um imenso estoque de recursos ociosos.
A combinação de queda da taxa de juros com um marco fiscal que priorize o investimento público pode destravar esses recursos e canalizá-los para o enfrentamento do desafio que a crise climática impõe ao país. Dispor de um BNDES equipado e capacitado será crucial nesse processo.
Voltarei ao tema em breve, mas fica o alerta: o hemisfério Norte abandonou, há tempos, as superstições neoliberais. O Brasil precisa seguir o exemplo urgentemente.
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