31 de julho de 2023

Enquanto a Itália e a Grécia ardem, os seus líderes ficam obcecados com os imigrantes

Os líderes da União Europeia promovem o medo da imigração enquanto negligenciam as ameaças reais e mortais das alterações climáticas. Toda a região mediterrânica devia colaborar em prol das pessoas deslocadas, contra os gigantes dos combustíveis fósseis e em prol da descarbonização.

Nathan Akehurst

Jacobin

Um homem está pronto para combater as chamas enquanto elas engolfam uma encosta em 27 de julho de 2023, em Apollana, Rodes, Grécia. (Dan Kitwood/Getty Images)

A Europa está a arder. Atingindo quase 43ºC, Roma bateu o seu recorde de calor, estabelecido apenas no ano passado, e alguns hospitais italianos comunicaram que o número de doentes internados atingiu os níveis da pandemia de covid-19. Enviaram-se aviões para Corfu e Rodes para retirar os turistas por causa dos incêndios que assolam as ilhas gregas, enquanto os habitantes locais sofrem as consequências. Até os Alpes estão a atingir os 37ºC. Do outro lado do Mediterrâneo, a Argélia registou a noite mais quente da história de África.

Esta é uma crise global que exige uma liderança global: as temperaturas extremas e as inundações atingiram desde os Estados Unidos até à China, passando pelo Brasil e o subcontinente asiático. As estruturas políticas supranacionais existentes, como a União Europeia (UE), poderiam - e deveriam - estar a liderar a resposta. No entanto, e à medida que a terra racha, as árvores ardem e os abastecimentos se esgotam, a Europa está a olhar na direção errada.

A EUROPA, A VAGA DE CALOR E A FRONTEIRA


Enquanto os avisos de emergência ordenavam aos romanos que se mantivessem em casa durante o dia, a primeira-ministra de extrema-direita, Giorgia Meloni, organizou uma conferência internacional para apelar a uma cooperação urgente entre a Europa e África. Não para enfrentar a crise climática, mas para controlar a migração. Os meios de comunicação social italianos optaram por brincar enquanto Roma ardia literalmente, preferindo relatar a cobertura alarmada de medias estrangeiros em vez do que realmente estava a acontecer.

É comum ouvir os opositores à migração dizerem que temos de nos focar nas pessoas do nosso país em vez de ajudarmos os estrangeiros. No entanto, os Estados europeus mais afetados pelo clima, como a Itália e a Grécia, dedicam mais recursos e tempo político a perseguir, a deter e a atacar pessoas nas suas costas do que a proteger aqueles cujas casas estão a arder. Compare-se, por exemplo, os novos e brilhantes campos de detenção na Grécia com o seu fraco historial de resposta a emergências.

Seria errado, no entanto, atribuir este problema de inação apenas aos Estados fronteiriços da Europa, eles próprios assolados por uma década de crise em que a austeridade imposta pela UE desempenhou um papel importante. Os seus governos argumentam, não sem razão, que os Estados mais ricos do norte da Europa empurram a responsabilidade de resposta a emergências migratórias para os Estados fronteiriços mais pobres. Entretanto, as instituições europeias criticam publicamente os registos de direitos humanos dos Estados fronteiriços (quer sejam membros da UE, quer sejam a Líbia e a Tunísia), ao mesmo tempo que continuam, na prática, a colaborar e até a encorajar abusos.

Para aqueles que sofrem e morrem na fronteira mais letal do mundo, a situação é extrema. Mas, a nível estatístico, a migração está muito longe de ser a crise existencial que é habitualmente apresentada na política europeia. Em comparação, na Colômbia - um país muito mais pobre do que qualquer Estado-membro da UE, e que absorveu milhões de pessoas que pediram asilo nos últimos anos - a migração ainda não tem o perigo mortal da política europeia. De facto, a Europa foi perfeitamente capaz de absorver vários milhões de ucranianos que fugiam da invasão russa no ano passado. A chamada crise migratória sempre foi um problema inventado. Agora, é um problema ainda mais perigoso que retira o foco político da conflagração que ameaça vidas e meios de subsistência em ambos os lados do Mediterrâneo.

As pessoas que procuram segurança são também as primeiras vítimas da emergência climática. Em primeiro lugar, as catástrofes trouxeram novos riscos de deslocação em toda a região euro-mediterrânica - os incêndios florestais a noroeste de Atenas destruíram comunidades residenciais, enquanto os choques climáticos afetaram as pessoas envolvidas em conflitos no Norte de África. Os efeitos climáticos deste ano, seja no sector do turismo grego ou no rendimento das colheitas argelinas, podem contribuir, a longo prazo, para a deslocação de pessoas. As consequências para as pessoas já deslocadas têm sido brutais: na fronteira dos Estados Unidos, estão a ser recuperados corpos de pessoas que sucumbiram à insolação.

Em toda a região euro-mediterrânica, os centros de detenção, os campos de refugiados e os acampamentos informais serão marcados pela escassez e pelos riscos para a saúde, e o sol de um oceano em aquecimento não dará tréguas às pessoas que farão este verão as desesperadas travessias do Mediterrâneo e do Egeu. No entanto, esta emergência é controlável.

Com um esforço coordenado entre países - e a UE estaria fortemente posicionada para desempenhar um papel de liderança - as pessoas poderiam receber todo o apoio para ficarem em casa onde pudessem e para partirem onde tivessem de o fazer. Os recursos podem e devem ser disponibilizados nesta base, incluindo investimentos para proteger os meios de subsistência e a indústria, proporcionar uma ajuda eficaz em caso de catástrofe e facilitar as deslocações para a realojamento a curto e a longo prazo. Estes esforços enquadram-se perfeitamente no projeto de controlar as temperaturas globais nesta década, gerindo simultaneamente os danos existentes.

ESCOLHA DE PRIORIDADES

A política é uma questão de prioridades e as escolhas da Europa têm sido claras. A conferência de Meloni sobre migração, com a presença de vinte países, não passou de velhos chavões sobre a importância da cooperação para o desenvolvimento. Este projeto, designado por "Equipa Europa", é uma estrutura inventada e irresponsável, como salientou um membro do Parlamento Europeu, na qual Meloni está lado a lado com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. As suas intervenções deste verão visaram, antes de mais, a "cooperação" com a Tunísia em matéria de controlo da migração.

Esta é a mesma Tunísia que, nos últimos meses, na sequência do discurso racista do seu presidente contra a "substituição étnica" por migrantes negros, assistiu a numerosos ataques a migrantes, cujas tentativas de fuga resultaram em duzentas mortes no mar num período de dez dias.

O acordo com a Tunísia é a mais recente opção da longa missão da Europa em forçar os Estados da periferia do bloco a atuar como polícia de fronteira. Isto teve consequências brutais: de afogamentos e escravatura na Líbia, ao massacre de Melilla em 2022 na fronteira hispano-marroquina, passando pelo sombrio acordo da UE com o presidente turco, Recep Tayyip Erdoğan.

Este tipo de controlo fronteiriço "externalizado" é defendido por todos os políticos mainstream - o pacto com a Turquia foi liderado pelo atual candidato de centro-esquerda a primeiro-ministro holandês, Frans Timmermans. É frequentemente enquadrado como uma questão de desenvolvimento. A UE forneceu serviços biométricos aos Estados africanos, aparentemente para o recenseamento eleitoral, mas que, na realidade, constituíram uma base de dados de impressões digitais para o controlo da migração da EU. Financiou também as Forças de Apoio Rápido para impedir a migração no Norte de África, que acumularam um historial abismal em matéria de direitos humanos que está a ser repetido no novo conflito civil do Sudão. Há quase uma década que o controlo da migração, por todos os meios necessários, tem sido a estrela polar da política externa europeia e o seu domínio só tem vindo a piorar.

Mesmo do ponto de vista da segurança da própria Europa, a primazia do controlo da migração na política externa é profundamente prejudicial. Quando Marrocos afrouxou brevemente o seu papel de guarda fronteiriço da Europa, irritado com a perceção de que a política externa espanhola era pouco exigente, houve uma crise humanitária em Ceuta em 2021. Nesse inverno, a Rússia e a Bielorrússia foram acusadas de "transformar numa arma" os fluxos migratórios na fronteira polaca para desestabilizar a Europa. O presidente recentemente reeleito da Turquia, Erdoğan, tentou repetidamente usar o controlo da migração como moeda de troca nos assuntos internacionais.

Num certo sentido, isto fornece às potências europeias uma desculpa para uma inação letal; a miséria na fronteira pode simplesmente ser atribuída a um ator não pertencente à UE (e esta é, de facto, a imagem mais ampla que a política de externalização dá). No entanto, num sentido mais lato, as circunstâncias em que potências rivais ou mais pequenas podem forçar as suas agendas na cena global, manipulando a paranoia europeia sobre fluxos migratórios (mais uma vez, em termos gerais, bastante pequenos), dificilmente são saudáveis para os Estados da UE.

No entanto, o problema não está apenas nas consequências negativas da abordagem atual, mas também nas oportunidades perdidas de uma abordagem diferente. Um mundo em que o principal incentivo por detrás da ação europeia fosse a prevenção do colapso climático - e não impedir as pessoas necessitadas de se deslocarem - permitiria um conjunto diferente e mais construtivo de relações interestatais.

Há incentivos que trabalham contra uma mudança de abordagem. O mais óbvio é que grande parte da direita europeia, tendo presidido a manifestos fracassos internos, não conseguiria ganhar eleições sem alimentar o medo e a paranóia em relação a um alvo externo. Mas não é a extrema-direita que controla efetivamente as lucrativas engrenagens da política internacional europeia. A formação em controlo de fronteiras que a polícia alemã, as empresas privadas de armamento e as agências de desenvolvimento estatal forneceram às forças de segurança sauditas (que têm um historial de disparar sobre pessoas na fronteira) é reveladora da profunda teia de relações envolvidas. A indústria mundial das fronteiras e da vigilância está totalmente enredada nos altos comandos da Europa, e sê-lo-á cada vez mais à medida que o exército fronteiriço europeu Frontex se for expandindo.

Entretanto, como a Friends of the Earth demonstrou, existe um ciclo de feedback de pessoal e agendas entre as indústrias de segurança, degradação da terra e combustíveis fósseis. Na atual crise energética, as grandes companhias petrolíferas voltam a ter os olhos postos no Norte de África - apesar da relação bem documentada entre a extração de combustíveis fósseis, a desestabilização da região e a caótica agenda de política externa da antiga potência colonial França. Muitos interesses empresariais e políticos poderosos beneficiam de uma Europa que se concentra incessantemente num desafio estratégico inventado que lhes permite ganhar dinheiro (o controlo da migração) em detrimento de um desafio real e mortal (as alterações climáticas) cuja resolução poderia ameaçar esses lucros (literais e metafóricos).

O DILEMA DOS PRÓS-EUROPEUS

A Europa tem estado bloqueada numa luta de quase uma década entre os neoliberais mais pró-UE e os direitistas mais críticos, regenerados na era Trump de insurgências conservadoras. A esquerda tem falhado largamente em penetrar e ultrapassar esta divisão. A abordagem da direita é fácil de entender: misturar a paranoia racializada sobre a migração com queixas genuínas sobre a forma como as autoridades da UE trataram os cidadãos mais pobres do próprio bloco, a fim de construir um bloco nacionalista.

É um pouco mais difícil de compreender por que razão tantos europeístas liberais de Bruxelas aderiram a uma estratégia que corre o risco de minar fatalmente o seu projeto. Talvez estejam verdadeiramente empenhados, por razões ideológicas, em vastos controlos fronteiriços externalizados e não discordem fundamentalmente da direita. Talvez sigam a opinião de um antigo conselheiro de Donald Tusk de que flanquear a direita e tranquilizar os eleitores conservadores é a única forma de travar a ascensão da direita. Talvez sejam simplesmente bastante vulneráveis aos lóbis e ao pensamento de grupo. Seja como for, a sua falta de vontade de impedir que a extrema-direita faça da migração a principal questão do dia na Europa ameaça o seu projeto global de uma Europa poderosa como polo independente num mundo multipolar.

Pode discutir-se se isto é desejável, e é certo que a ausência de uma posição comum clara da esquerda sobre o projeto europeu a tem prejudicado um pouco. Mas, independentemente disso, as ambições dos europeístas já estão em terreno instável.

O regresso pós-guerra da Ucrânia às rivalidades internacionais militarizadas deslocou a centralidade da Alemanha na Europa, ao mesmo tempo que mudou as mentalidades de alto nível das estruturas lideradas pela NATO da era da Guerra Fria, aumentando a influência dos EUA. Embora os europeístas no Reino Unido gostem de pintar o Brexit como o colapso de qualquer vestígio da influência global britânica, a Grã-Bretanha pós-Brexit está a conduzir uma diplomacia eficaz na Europa através do seu hawkishness na Ucrânia, que sem dúvida se estenderá à esfera não militar. Mesmo no que diz respeito à migração, o muito apregoado (e preocupante) novo pacto de asilo da UE pouco faz para resolver as questões subjacentes que levaram ao longo debate sobre a sua adoção, ou a fratura existente entre o centro e a periferia da Europa, que uma parte da direita continua a explorar.

Para a extrema-direita europeia, o enfraquecimento da ação climática é paralela ao reforço do controlo da migração no topo da agenda. Nos últimos meses, uma aliança de direita liderada pela Itália de Meloni, mas que representa países de todos os cantos da UE, tem procurado resgatar Bruxelas em relação à migração e obter novos financiamentos para o controlo das fronteiras, com alguns sucessos importantes.

Embora Von der Leyen possa ter sido a arquiteta da expansão das fronteiras europeias, essas mesmas forças, entre as quais o também conservador alemão e líder do Partido Popular Europeu, Manfred Weber, deixaram-na a lutar pelo seu futuro. A ameaça à sua oportunidade de um segundo mandato é tal que Washington parece ter tentado lançar-lhe uma tábua de salvação, oferecendo-se para a apoiar como secretária-geral da NATO. A lição que muitos no centro tiraram das manobras eficazes da direita em relação à migração desde 2015 - que a capitulação repetida era a única resposta - apenas reforçou a posição da direita, e não apenas em relação à migração.

O alvo dos opositores de Von der Leyen é o extenso Pacto Ecológico Europeu e as ações no domínio do clima e da natureza em geral. Grande parte da direita europeia é cética em relação ao clima ou mesmo negacionista. Usando uma linguagem típica da direita, Meloni referiu-se à atual vaga de calor como mau tempo imprevisível, sem ter em conta que era totalmente previsível. Parte da sua raiva deve-se à ambição e ao sucesso das medidas climáticas da UE, como a proibição de novos carros a gasolina e a gasóleo ou a introdução da primeira tarifa de carbono do mundo. Embora a Europa continue a basear-se em soluções de mercado altamente questionáveis para as emissões, as normas que as integram foram, pelo menos, reforçadas.

Mas o contra-ataque também tem sido eficaz. O grupo de Weber infligiu fortes danos à recente lei de restauração da natureza (que acabou por ser aprovada por uma maioria pouco expressiva). O agronegócio desempenhou um papel neste ataque, enquanto os lobistas dos combustíveis fósseis têm estado constantemente na ofensiva. As medidas para reduzir o uso de pesticidas e o "greenwashing" também foram alvo de críticas. Os críticos questionaram se a UE tem acesso ao financiamento necessário para concretizar as suas ambições.

Em suma, alcançar os objetivos climáticos atuais - e expandi-los ou exercer pressão sobre outras potências - exige uma atenção política implacável que não existe atualmente.

O PIVÔ

A imagem que a UE tem de si própria é muito diferente da sua realidade. Os europeístas falam da política que desejam em termos de valores liberais enraizados numa herança de pacificação e cooperação do pós-guerra. Na prática, a UE atua para impor coletes-de-forças fiscais, limites cruéis à circulação de pessoas e - mais recentemente - incubar um militarismo ressurgente, embora ainda dependente do patrocínio dos Estados Unidos. A sua política é fraturada e fragmentada, tanto dentro como entre grupos partidários e Estados-membros.

Mas o único caminho para se sair do atual atoleiro dos europeístas é a realização da sua própria autoimagem - não capitular, mas assumir um enfoque histórico único na resolução do maior desafio que existe. A Europa já tem um discurso climático menos nocivo do que os Estados Unidos. Existe um apoio generalizado à descarbonização e há um historial de realizações no domínio do clima; os atuais choques climáticos são um argumento claro e visceral para a urgência de se fortalecer esta abordagem.

Atualmente, o negacionismo é em grande parte marginal e, embora o greenwashing e as falsas soluções o possam ter substituído em teoria, a maior parte da política europeia está empenhada numa transição. A liderança europeia tem muito em que se basear: precisa apenas de ter a coragem política de afirmar que a abordagem das alterações climáticas e das suas consequências é a prioridade acima de tudo e de pôr efetivamente em prática essa afirmação. Isto significa uma grande viragem da migração para o clima, com tudo o que essa viragem simboliza - do nacionalismo para o internacionalismo, da competição para a cooperação, e que não seja conduzido por interesses instalados que a tenta condicionar.

Comparar a migração com o clima pode parecer arbitrário. Mas a política é muitas vezes um jogo de soma zero. E à medida que o tempo é consumido pelo interminável debate sobre a migração, sempre conduzido em termos que dão poder à direita, a atenção é afastada da diplomacia climática. A UE tem sido um importante líder global (em comparação com a escassa concorrência) em matéria de objetivos climáticos, mas esses resultados não são seguros e há muito, muito mais que pode ser feito.

Esta questão tornou-se evidente por causa de uma emergência mundial sem precedentes. Esta não é, de longe, a primeira chamada de atenção que recebemos, mas é talvez a mais dramática. Três décadas de ações climáticas extremamente insuficientes resultaram em emissões que poderiam ter sido evitadas. Os gigantes dos combustíveis fósseis e os seus aliados trabalharam arduamente para aumentar a procura e a oferta de combustíveis fósseis e encontrar soluções que evitassem a necessidade de uma verdadeira mudança, enquanto a política se concentrou em quimeras.

No dia em que foram publicados novos dados que dizem que julho foi o mês mais quente de que há registo - potencialmente o mais quente dos últimos 120 mil anos - a Shell e a Total anunciaram os lucros do segundo trimestre (com relatórios da Chevron, ExxonMobil e BP a chegarem nos dias seguintes). Mudar de rumo é uma oportunidade para recuperar um rumo numa política que muitas vezes parece não o ter. Não se pode permitir que os acontecimentos deste ano se desvaneçam antes de o ciclo eleitoral recomeçar no próximo ano.

Esta é uma tarefa urgente para os governos de todo o mundo. Na Europa, significa construir uma conceção de solidariedade maior que a própria UE, uma conceção que não lide com África erguendo muros. Em vez disso, deve ver ambos os continentes como parte de uma região partilhada, ligada e não separada pela água, com a sua história recente de derramamento de sangue colonial contrastada por uma história mais longa de interdependência.

Na prática, isto significa tanto uma rápida descarbonização dos países mais ricos como o financiamento de uma transição justa naqueles que não a podem suportar. Significa aplicar os recursos finitos do capital político e da pressão diplomática contra os gigantes do carbono e não contra as pessoas que procuram segurança. Significa usar a transição verde para alcançar a justiça económica e não para simplesmente alargar as relações neocoloniais. Significa um esforço concertado, desde a costa inglesa até às ilhas gregas e ao Sara, para criar defesas contra inundações e secas e medidas de socorro de emergência. Isto no âmbito de instituições euro-mediterrânicas dotadas de recursos suficientes que possam coordenar tanto a resposta a incidentes como o planeamento a longo prazo.

Esta ação a mais longo prazo inclui a salvaguarda dos abastecimentos alimentares e dos recursos de que as pessoas dependem. Inclui também repensar a nossa atitude em relação à migração, apoiando tanto o direito a ficar como o direito a deslocar-se. A maioria das pessoas não quererá abandonar as suas casas, muito menos os seus países, mas a Europa pode canalizar a melhor parte do seu património - a sua contribuição para o desenvolvimento da Convenção relativa aos Refugiados no caos que se seguiu à II Guerra Mundial - para responder às necessidades daqueles que o fazem.

Nada disto é simples. Exigirá um equilíbrio delicado entre paciência e urgência; entre a resolução de problemas complexos e a sua simplificação; e entre a diplomacia e o empenhamento obstinados em todas as tradições políticas. É um processo para comunidades, campanhas e movimentos de base, tanto quanto para políticos e grandes instituições. Mas o momento atual não exige menos do que isso. Este verão de incêndios e inundações pode pressagiar novas catástrofes, escassez de alimentos e ameaças à vida e aos meios de subsistência. Ou pode marcar o momento em que mudámos de rumo.

Colaborador

Nathan Akehurst é um escritor e ativista que trabalha com comunicação e defesa política.

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