Um novo documentário sobre Eric Hobsbawm apresenta um retrato sensível de um historiador que alcançou aclamação internacional apesar de sua política comunista. No entanto, o marxismo de Hobsbawm é fundamental para compreender seu trabalho e por que ele o empreendeu acima de tudo.
Matt Myers
Eric Hobsbawm: The Consolations of History (London Review of Books) |
Eric Hobsbawm foi um comunista sem arrependimentos por mais de três quartos de século. Sendo um dos historiadores mais famosos do mundo e um intelectual público influente, Hobsbawm possuía uma gama de qualidades que os intelectuais britânicos em geral não tinham. Ele se tornou conhecido por seu domínio amplo da história europeia e mundial, pela sua variedade multilíngue, sofisticação teórica, clareza sintética, senso para detalhes empíricos e frases eletrizantes, sem deixar de mencionar um compromisso moral com aqueles que a história injustamente ignorou.Com obras para um público de massas, tal qual sua série de livros Ages, o marxismo de Hobsbawm revelou-se sutilmente e sem didatismo. A estrutura e a lógica de seus argumentos, bem como as inúmeras citações mostravam mais
do que sua simples simpatia pelo marxismo. Ele acreditava que a tradição marxista se baseava na busca pela verdade. A história importava porque tinha um propósito: a investigação racional e objetiva do passado era um pré-requisito para o progresso humano.
Essas qualidades o tornaram um historiador incomum no retrocesso histórico da esquerda europeia. Se a Grã-Bretanha há muito é conhecida por sua insensibilidade às ideias revolucionárias tanto de esquerda quanto de direita, como pode ter produzido um historiador de tamanha estatura global?
A biografia individual de Hobsbawm fornece um ponto de vista particular sobre esta questão. Um novo filme sobre sua vida e obra, produzido para a London Review of Books (LRB) e pelo produtor, Anthony Wilks, narra e contextualiza a jornada de Hobsbawm da periferia ao centro da vida intelectual britânica. Um filme longo, bem pesquisado e profissional, Eric Hobsbawm: The Consolations of History [Eric Hobsbawn: A consolidação da História] provavelmente se tornará sua principal biografia audiovisual.
De maneira excepcional para um filme sobre um intelectual britânico, a centralidade da repressão de Estado durante a juventude e meia-idade de Hobsbawm é um dispositivo de enquadramento fundamental. O documentário começa e termina com uma invasão do Estado secreto britânico de um esconderijo do Partido Comunista da Grã-Bretanha (PCGB) – a organização de Hobsbawm de 1936 até sua dissolução. Quarenta e oito mil documentos – incluindo autobiografias de seus membros – foram apreendidos e copiados pelo MI5 em sua Operação Party Piece.
Após o lamento inicial de Hobsbawm ao seu ineficaz isolamento acadêmico dos trabalhadores industriais que ele desesperadamente queria servir., ouvimos um agente da polícia secreta do caso descrever Hobsbawm como um “incansável (e cansativo) organizador de petições e defensor das causas perdidas”. Este autorretrato melancólico é a prova mais importante da principal afirmação interpretativa do filme: Hobsbawm foi um intelectual brilhante que, apesar de seus raros dons, era politicamente impotente antes e depois de seu sucesso profissional.
Nesse sentido, o filme captura de maneira habilidosa a forma como as cores dos compromissos políticos de Hobsbawm se suavizam com o tempo para um tom mais claro de vermelho. No entanto, ele oferece relativamente poucos vislumbres de sua vida interior além das memórias de sua viúva, Marlene Hobsbawm. Os ex-colegas de profissão de Hobsbawm e colaboradores do LRB, como Richard Evans, John Foot, Stefan Collini e Donald Sassoon, conduzem a narrativa do filme. O resultado é um retrato sensível, mas não acrítico, de um intelectual brilhante cujo legado foi temperado por fracassos.
Na periferia
Essas qualidades o tornaram um historiador incomum no retrocesso histórico da esquerda europeia. Se a Grã-Bretanha há muito é conhecida por sua insensibilidade às ideias revolucionárias tanto de esquerda quanto de direita, como pode ter produzido um historiador de tamanha estatura global?
A biografia individual de Hobsbawm fornece um ponto de vista particular sobre esta questão. Um novo filme sobre sua vida e obra, produzido para a London Review of Books (LRB) e pelo produtor, Anthony Wilks, narra e contextualiza a jornada de Hobsbawm da periferia ao centro da vida intelectual britânica. Um filme longo, bem pesquisado e profissional, Eric Hobsbawm: The Consolations of History [Eric Hobsbawn: A consolidação da História] provavelmente se tornará sua principal biografia audiovisual.
De maneira excepcional para um filme sobre um intelectual britânico, a centralidade da repressão de Estado durante a juventude e meia-idade de Hobsbawm é um dispositivo de enquadramento fundamental. O documentário começa e termina com uma invasão do Estado secreto britânico de um esconderijo do Partido Comunista da Grã-Bretanha (PCGB) – a organização de Hobsbawm de 1936 até sua dissolução. Quarenta e oito mil documentos – incluindo autobiografias de seus membros – foram apreendidos e copiados pelo MI5 em sua Operação Party Piece.
Após o lamento inicial de Hobsbawm ao seu ineficaz isolamento acadêmico dos trabalhadores industriais que ele desesperadamente queria servir., ouvimos um agente da polícia secreta do caso descrever Hobsbawm como um “incansável (e cansativo) organizador de petições e defensor das causas perdidas”. Este autorretrato melancólico é a prova mais importante da principal afirmação interpretativa do filme: Hobsbawm foi um intelectual brilhante que, apesar de seus raros dons, era politicamente impotente antes e depois de seu sucesso profissional.
Nesse sentido, o filme captura de maneira habilidosa a forma como as cores dos compromissos políticos de Hobsbawm se suavizam com o tempo para um tom mais claro de vermelho. No entanto, ele oferece relativamente poucos vislumbres de sua vida interior além das memórias de sua viúva, Marlene Hobsbawm. Os ex-colegas de profissão de Hobsbawm e colaboradores do LRB, como Richard Evans, John Foot, Stefan Collini e Donald Sassoon, conduzem a narrativa do filme. O resultado é um retrato sensível, mas não acrítico, de um intelectual brilhante cujo legado foi temperado por fracassos.
Na periferia
O filme começa em 1917 em Alexandria, no Egito governado pela Grã-Bretanha, onde a primeira infância de Hobsbawm foi marcada por tragédias pessoais e um precoce engajamento intelectual e político. Seus pais morreram ainda jovens. O pai de Hobsbawm era esportivo e indiferente – tendo pouco interesse no jovem Eric – enquanto sua mãe era amorosa.
Hobsbawm foi enviado de Viena para ficar com parentes em Berlim após a morte de sua mãe. Lá ele passou sua adolescência no período imediatamente anterior à tomada do poder pelos nazistas. Berlim foi onde o seu engajamento político começou. Hobsbawm, matriculado no Ensino Médio, conta ao seu professor que agora ele é um comunista. O professor, de maneira paternalista, exorta-o a ler mais marxismo antes de fazer uma declaração tão ridícula.
O filme mostra Hobsbawm dando rapidamente o salto da teoria para a prática. Mais tarde, ele se lembrou de encher caixas de correio com folhetos eleitorais do Partido Comunista Alemão (KPD) no auge da política do “Terceiro Período” da Internacional Comunista. No entanto, seus slogans não tiveram uma influência duradoura sobre os jovens radicais. Entre 1928 e 1934, o KPD criticou muito os social-democratas mais moderados, a quem acusava de serem “social-fascistas”. O SPD, partido da social-democracia, pretendia ser o suporte final da condenada ordem de Weimar. Além disso, para os comunistas alemães, a memória da cumplicidade do SPD no assassinato de Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht ainda estava fresca. Hobsbawm escapou desse redemoinho para a Inglaterra e continuou a estudar diligentemente até ir para a Universidade de Cambridge para se dedicar a história. Ele ingressou no PCGB quando era estudante universitário em 1936. Este foi um ano significativo: o jovem Hobsbawm acompanhou seu tio a Paris, onde viu o governo da Frente Popular de socialistas, radicais e comunistas chegar ao poder. Ele concluiu Cambridge em primeiro com uma estrela dupla – a nota mais alta.
O filme faz questão de destacar que Hobsbawm não se tornou imediatamente uma celebridade intelectual. Com a intenção de fazer o doutorado após a formatura, precisou partir para a guerra. Alistado como escavador e convidado a construir pontes (trabalho para o qual não era adequado), Hobsbawm foi posteriormente transferido para o departamento de educação do exército. Ali ele esteve sob vigilância estatal pela primeira vez.
Enfrentou dificuldade para conseguir emprego como professor depois de apresentar sua tese de doutorado sobre os Fabianos em Cambridge. Apenas a pequena escola noturna no Birkbeck College, em Londres, o receberia. Sua política comunista dificultou as tentativas de compartilhar suas ideias em plataformas como a BBC. No entanto, o monitoramento furtivo do Estado secreto da Grã-Bretanha não enfraqueceu sua vitalidade intelectual. O isolamento forçado reuniu um grupo inovador de historiadores marxistas organizados em torno do Grupo de Historiadores do Partido Comunista entre 1946 e 1956. O filme apresenta imagens de arquivo de Hobsbawm falando sobre sua “sorte de pertencer a uma geração que transformou o ensino e a prática de história”.
Sua localização segura da guerra em Birkbeck deu-lhe tempo para preparar suas obras de estudo histórico tipicamente ambiciosas e acessíveis. A expansão do ensino superior britânico no pós-guerra proporcionou um público novo e receptivo de leitores e críticos. Essas mudanças demográficas transformaram a sorte pessoal de Hobsbawm. Seu sucesso muitas vezes vinha, apesar de seu comunismo ortodoxo. Hobsbawm desconfiava da teoria marxista europeia e fazia parte de uma geração culturalmente distinta das que vieram depois dos anos 1960: era apaixonado por jazz em vez de rock and roll.
A abordagem histórica marxista de Hobsbawm foi influenciada pelo rigor do empirismo britânico e pelos insights das ciências sociais europeias. Ele também mostrou preocupação com uma ampla diversidade de grupos subordinados que muitos marxistas haviam subestimado. Hobsbawm tratou as sociedades camponesas como sujeitos legítimos de pesquisa antes de muitos de seus colegas pensadores. Publicado em 1969, seu livro Bandido combinava um esquema marxista ortodoxo com uma simpatia moral e ética pelos perdedores, forasteiros e “rebeldes primitivos”.
Ainda assim, aqueles que desejam encontrar heresia não marxista ou dissidência liberal nessas atitudes ficarão desapontados. Hobsbawm não era o primeiro a combinar esses elementos; Antonio Gramsci e Nikolai Bukharin foram precursores notáveis. Muitas das simpatias intelectuais e políticas de Hobsbawm correspondem às de Bukharin: ambos tratariam os camponeses como protagonistas históricos, em vez de uma relíquia da história, e levariam a sério os acúmulos da ciência social “burguesa”. Somos informados por Hobsbawm, que dá aulas em alemão com sotaque austríaco:
É isso que torna as décadas de 1930 e 1940 tão interessantes para os historiadores. Em certo sentido, a frente única do capitalismo liberal e do comunismo era totalmente anormal. Embora não por muito tempo, uma breve pausa em suas hostilidades normais foi imposta entre eles. Sem Hitler, isso não teria acontecido. No entanto, na minha opinião, o capitalismo liberal e o comunismo pertencem à mesma família intelectual. Ambos eram filhos do Iluminismo e falavam a mesma língua. Na verdade, se ambos querem sobreviver, não apenas devem parar de lutar e trabalhar juntos, mas também aprender um com o outro.
A história de três partes de Hobsbawm do longo século XIX é seu tour de force. Sua ambição e meticulosidade incomparáveis foram acompanhadas por uma defesa enfática do materialismo histórico. Um dos temas definidores da série é sua batalha com o nêmesis do marxismo clássico: o nacionalismo. Hobsbawm mostra que o nacionalismo não foi um produto da consciência primordial, mas o filho das duas revoluções modernas na Grã-Bretanha e na França. De A Era das Revoluções: 1789-1848 em diante, Hobsbawm mostra como o crescente poder do Estado moderno territorializado, impulsionado pelo crescimento industrial e lutas de classe revolucionárias, inventou a nação como sua superestrutura ideológica artificial.
Os nacionalistas que agitavam bandeiras receberam pouca atenção. Enquanto relaxa em um vagão de trem em uma das filmagens do filme, Hobsbawm conta como “o passado é a matéria-prima para o nacionalismo… No entanto quase tudo que os nacionalistas dizem sobre o passado está errado”. O nacionalismo, continua ele, “não é compatível com o progresso da história”. Um tema recorrente na vida de Hobsbawm é seu momento de sorte. A Era do Capital: 1848-1875, publicado em 1975, apareceu quando o sistema capitalista parecia estar sofrendo de uma crise severa (embora as crenças em sua superação iminente logo tenham sido deslocadas).
A Era dos Impérios: 1875-1914, publicado em 1987, surge quando o pós-colonialismo do fim do século já era sentido numa Europa cada vez mais multicultural. Todos os três livros são caracterizados por uma lógica marxista clássica. Eles foram concebidos usando uma concepção ampla e criativa do materialismo histórico, em vez do empirismo de Ranke. Um colaborador do filme descreve o marxismo de Hobsbawm como um “dogma” sem o qual seu trabalho teria sido melhor. O fato de o historiador britânico mais famoso do final do século XX ter tido tanto sucesso, embora fosse um marxista, ainda perturba alguns.
Depois do outono
Os nacionalistas que agitavam bandeiras receberam pouca atenção. Enquanto relaxa em um vagão de trem em uma das filmagens do filme, Hobsbawm conta como “o passado é a matéria-prima para o nacionalismo… No entanto quase tudo que os nacionalistas dizem sobre o passado está errado”. O nacionalismo, continua ele, “não é compatível com o progresso da história”. Um tema recorrente na vida de Hobsbawm é seu momento de sorte. A Era do Capital: 1848-1875, publicado em 1975, apareceu quando o sistema capitalista parecia estar sofrendo de uma crise severa (embora as crenças em sua superação iminente logo tenham sido deslocadas).
A Era dos Impérios: 1875-1914, publicado em 1987, surge quando o pós-colonialismo do fim do século já era sentido numa Europa cada vez mais multicultural. Todos os três livros são caracterizados por uma lógica marxista clássica. Eles foram concebidos usando uma concepção ampla e criativa do materialismo histórico, em vez do empirismo de Ranke. Um colaborador do filme descreve o marxismo de Hobsbawm como um “dogma” sem o qual seu trabalho teria sido melhor. O fato de o historiador britânico mais famoso do final do século XX ter tido tanto sucesso, embora fosse um marxista, ainda perturba alguns.
Depois do outono
A Era dos Extremos: o breve século XX, 1914-1991, publicado em 1994, é menos marcada por um método marxista explícito. Publicado no auge do triunfalismo liberal após o colapso da URSS, o livro termina com previsões apoteóticas para o futuro. No entanto, a economia ainda determina sua periodização. O pessimismo de Hobsbawm é parcialmente explicado pela tendência do capital de destruir empregos mais rápido do que pode criá-los. A terceira e última seção do livro – intitulada “Desmoronando” – foi uma advertência contra aqueles que se apressaram em pronunciar “O fim da História”.
A queda da taxa de lucro, a superprodução e a supercapacidade do capitalismo foram acompanhadas apenas pela tendência social e política à fragmentação da identidade. Essas tendências têm mais probabilidade de levar a guerras endêmicas e limpeza étnica do que de reiniciar a marcha do trabalho e emprego.
No final do filme, Hobsbawm prevê que a desigualdade nascida de um mercado livre desenfreado abriria caminho para o nacionalismo xenófobo da extrema direita. Feitos no início do século XXI, esses comentários parecem proféticos. No entanto, nem todas as suas previsões durante este período se concretizaram. Hobsbawm foi rápido demais em pronunciar a morte do neoliberalismo em meados da década de 1990 e subestimou seu poder sobre grande parte da esquerda europeia e norte-americana.
Hobsbawm gostava de citar Ernest Renan sobre a “invenção” da tradição nacional: “O esquecimento, e eu diria também o erro histórico, são essenciais na criação de uma nação”. O esquecimento também foi uma condição necessária para a jornada de Hobsbawm ao coração da intelectualidade liberal e progressista da Grã-Bretanha. Seu compromisso comunista na década de 1930, no auge do “Terceiro Período”, é explicado no filme como uma forma idealista e legítima de antifascismo.
No entanto, também é digno de nota que as voltas e reviravoltas da política comunista nas décadas de 1940 e 1950 foram omitidas. A razão pela qual ele permaneceu membro durante os julgamentos de Moscou, o pacto nazi-soviético e o julgamento-espetáculo antissemita de Slánský na Tchecoslováquia comunista não são mencionadas. A continuação da filiação de Hobsbawm ao Partido Comunista após 1956 é descrita como carente do compromisso “ativo” de um verdadeiro militante partidário. Diz-se que Hobsbawm desencorajou um de seus alunos de se juntar ao partido para salvá-lo de lutar desnecessariamente contra os “stalinistas”. A razão mais convincente pela qual Hobsbawm permaneceu fiel até o fim foi dada pelo próprio homem: ele não queria desonrar seus camaradas falecidos tornando-se um “ex-comunista”.
Tesouro nacional?
A queda da taxa de lucro, a superprodução e a supercapacidade do capitalismo foram acompanhadas apenas pela tendência social e política à fragmentação da identidade. Essas tendências têm mais probabilidade de levar a guerras endêmicas e limpeza étnica do que de reiniciar a marcha do trabalho e emprego.
No final do filme, Hobsbawm prevê que a desigualdade nascida de um mercado livre desenfreado abriria caminho para o nacionalismo xenófobo da extrema direita. Feitos no início do século XXI, esses comentários parecem proféticos. No entanto, nem todas as suas previsões durante este período se concretizaram. Hobsbawm foi rápido demais em pronunciar a morte do neoliberalismo em meados da década de 1990 e subestimou seu poder sobre grande parte da esquerda europeia e norte-americana.
Hobsbawm gostava de citar Ernest Renan sobre a “invenção” da tradição nacional: “O esquecimento, e eu diria também o erro histórico, são essenciais na criação de uma nação”. O esquecimento também foi uma condição necessária para a jornada de Hobsbawm ao coração da intelectualidade liberal e progressista da Grã-Bretanha. Seu compromisso comunista na década de 1930, no auge do “Terceiro Período”, é explicado no filme como uma forma idealista e legítima de antifascismo.
No entanto, também é digno de nota que as voltas e reviravoltas da política comunista nas décadas de 1940 e 1950 foram omitidas. A razão pela qual ele permaneceu membro durante os julgamentos de Moscou, o pacto nazi-soviético e o julgamento-espetáculo antissemita de Slánský na Tchecoslováquia comunista não são mencionadas. A continuação da filiação de Hobsbawm ao Partido Comunista após 1956 é descrita como carente do compromisso “ativo” de um verdadeiro militante partidário. Diz-se que Hobsbawm desencorajou um de seus alunos de se juntar ao partido para salvá-lo de lutar desnecessariamente contra os “stalinistas”. A razão mais convincente pela qual Hobsbawm permaneceu fiel até o fim foi dada pelo próprio homem: ele não queria desonrar seus camaradas falecidos tornando-se um “ex-comunista”.
Tesouro nacional?
Em algumas partes do filme, o contexto político crucial está ausente. A União Soviética é pouco mais que um fantasma. Embora ele nunca tenha sido um militante ortodoxo do partido, os interesses intelectuais de Hobsbawm foram determinados por sua relação com o movimento comunista mundial por meio de seu partido nacional. Seu influente discurso – “A marcha do trabalho para frente foi interrompida?” – foi proclamado aos membros do partido na Conferência anual Marx Memorial Lecture do CPGB em 1978.
Se o elemento estrutural da União Soviética na política de Hobsbawm é minimizado, sua relação com o eurocomunismo é enfatizada. O filme retrata o “moderado” Partido Comunista Italiano e sua leitura por Antonio Gramsci como a inspiração para os argumentos de Hobsbawm sobre o declínio de 25 anos do apoio social ao trabalhismo britânico. Isso apesar do fato de que a conferência trata quase inteiramente das tendências demográficas e sociológicas britânicas de longo prazo e não faz menção a Gramsci ou seus conceitos distintos.
Os desenvolvimentos demográficos e sociológicos em primeiro plano poderiam ter ajudado a contextualizar a trajetória individual de Hobsbawm. Um estrato social radicalizado de ex-alunos de colarinho branco empregados no pujante setor público catalisou o que Hobsbawm viu como uma indesejável mudança para a esquerda no Partido Trabalhista nos anos 1970 e início dos anos 1980. No entanto, essa radicalização política também sinalizou um público ampliado e fascinado com seus livros.
O filme Consolations of History contribui para um crescente corpo de trabalhos sobre a vida de Hobsbawm. O filme o retrata como um historiador incomum que alcançou sucesso e influência apesar de suas crenças comunistas e abordagem marxista. No entanto, o gênio intelectual de Hobsbawm e seu marxismo não podem ser contrastados tão facilmente. O marxismo não foi uma moda passageira para Hobsbawm, mas a lógica que define sua obra. As suas intervenções mais importantes foram concebidas no seio do movimento comunista, publicadas nos seus jornais e dirigidas principalmente aos seus camaradas. Sua pesquisa acadêmica foi estruturada por um compromisso político vitalício que ele não compartilhou com nenhum dos colaboradores do filme.
A história, para esta versão de Hobsbawm, era uma fonte de compreensão em vez de consolo. Como ele argumentou em 1965, “a atividade do historiador não é elogio e censura, mas análise”. As novas gerações de historiadores podem redescobrir melhor esse Hobsbawm valendo-se de suas próprias palavras.
Sobre o autor
Matt Myers é doutorando na Universidade de Oxford. Escritor e colaborador de várias publicações e periódicos, ele é o autor do livro recém publicado Student Revolt: Voices of the Austerity Generation.
Matt Myers é doutorando na Universidade de Oxford. Escritor e colaborador de várias publicações e periódicos, ele é o autor do livro recém publicado Student Revolt: Voices of the Austerity Generation.
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