15 de fevereiro de 2024

Verdeando Marx no Japão

O contexto japonês de estagnação econômica de décadas ajudou a gerar uma leitura inesperada de Marx como um proponente do protodecrescimento. Kōhei Saito discute sua nova síntese do materialismo histórico da Escola Kuruma, da filologia alemã e do ecossocialismo americano.

Entrevista com Kohei Saito


NLR 145 • Jan/Feb 2024

Baseando-se nas tradições do marxismo japonês, seu trabalho desempenhou um papel distinto ao trazer os insights de uma economia política marxista para questões ecológicas — e propõe uma nova leitura "verde" do próprio Mouro. Poderia nos contar primeiro sobre a jornada pessoal e intelectual que o levou ao pensamento de Marx — sua formação familiar e sua educação?

Nasci em 1987 e cresci em Tóquio. O Japão é uma sociedade bastante conservadora e minha família não era muito esquerdista. No ensino médio, eu gostava principalmente de jogar futebol. O que primeiro me fez pensar em política internacional foi o 11 de setembro — eu tinha quatorze anos na época — e depois a preparação para a invasão do Iraque, que ocorreu dezoito meses depois. Houve muito debate sobre a decisão de Koizumi de enviar as Forças de Autodefesa do Japão para se juntar à ocupação do Iraque, e houve uma grande manifestação. Comecei a ler Edward Said, Noam Chomsky, esse tipo de coisa. Mas foi somente quando entrei na Universidade de Tóquio, em 2005, que conheci pessoas que liam Marx — e professores que ensinavam sua obra. Esse também foi o momento em que Koizumi estava promovendo sua agenda neoliberal, com um número crescente de trabalhadores precários e desigualdade crescente. Comecei a me aprofundar nessas questões e percebi que o capitalismo era a causa raiz desses problemas e que eu precisava estudá-lo com mais cuidado.

É interessante que 2005, quando você se interessou por Marx, foi provavelmente o ano em que ele estava mais fora de moda no Ocidente, no auge da bolha da globalização. Houve algum professor em particular na Universidade de Tóquio que foi importante para você?

Sim, 2005 viu uma espécie de renascimento do interesse radical no Japão, embora a economia tivesse seguido uma trajetória diferente da do Ocidente — não houve o boom dos anos 1990, apenas a recessão contínua após a crise de 1989. Na universidade, fui apresentado à escola do marxismo fundada por Samezō Kuruma. Na década de 1950, Kuruma era diretor do Instituto Ohara de Pesquisa Social — fundado em 1919, era um tanto análogo à Escola de Frankfurt. Kuruma havia realizado trabalhos importantes nas décadas de 1920 e 1930 sobre teorias da mais-valia. Ele teve um famoso debate com Kōzō Uno sobre a forma do valor na década de 1950. Embora Uno e Kōjin Karatani sejam mais famosos no mundo anglófono, a escola Kuruma desempenhou um papel importante no Japão. Kuruma faleceu em 1982, mas seus alunos — Ryuji Sasaki e Tomonaga Tairako — foram meus professores. Um de seus alunos mais proeminentes foi meu professor, Teinosuke Otani.

No entanto, você deixou Tóquio para concluir seu bacharelado na Universidade Wesleyan, nos EUA?

Eu havia ganhado uma bolsa para estudar lá e parecia importante entender o país, dado seu papel no mundo — embora eu tenha acabado estudando filosofia e teoria social. No entanto, testemunhei a escala da desigualdade econômica nos EUA — é muito maior do que no Japão. Então, com a crise financeira de 2008, fiquei profundamente convencido da insustentabilidade e injustiça do capitalismo. Eu queria estudar marxismo, então decidi ir para a Alemanha para minha pós-graduação — primeiro na Universidade Livre de Berlim, depois na Humboldt. A escola Kuruma sempre leu Marx em alemão e também deu grande importância à leitura dos manuscritos, cartas e cadernos — ao contrário da escola Uno, que o leu em inglês. Fiquei fascinado por essa abordagem, porque ela tentava fazer algo muito diferente do marxismo soviético. Eles se concentravam na teoria da reificação, que também se tornou central para minha compreensão.

Eu me envolvi mais com questões ecológicas enquanto estava nos EUA, mas, após o desastre nuclear de Fukushima em 2011, tornei-me ativo no movimento antinuclear e comecei a refletir seriamente sobre questões tecnológicas e a relação entre humanidade e natureza. Tive que desafiar algumas das minhas ideias ingênuas de focar apenas no movimento da classe trabalhadora, sem realmente dar muita atenção às questões ecológicas. Comecei a refletir sobre como Marx teria respondido a essas questões. Mas, felizmente, em Berlim, tive acesso ao projeto Marx-Engels-Gesamtausgabe, "mega2" — que produz edições acadêmicas da totalidade das obras reunidas de Marx e Engels. Comecei a estudar os cadernos de ciências naturais de Marx e, com base neles, escrevi minha dissertação sobre a dimensão ecológica da crítica de Marx ao capitalismo. Esse se tornou meu primeiro livro, Natur Gegen Kapital, publicado em alemão em 2016. A Monthly Review Press lançou uma tradução em inglês, Ecossocialismo de Karl Marx, em 2017, que, felizmente, ganhou o Prêmio Deutscher no ano seguinte.

Você poderia explicar como se envolveu no projeto MEGA2 e como o novo projeto foi organizado após a queda da União Soviética? Qual foi sua experiência nesse sentido?

O projeto de publicar os documentos completos de Marx e Engels foi iniciado na década de 1920 por David Ryazanov, que começou a tarefa de coletar todos os manuscritos existentes de ambos naquela época. Riazanov foi um dos velhos bolcheviques assassinados por ordem de Stalin na década de 1930, efetivamente encerrando o projeto, que foi retomado na década de 1970 em Moscou e Berlim, naturalmente acompanhado pelas introduções dos editores, que refletiam as interpretações oficiais soviéticas. Após a queda da União Soviética, todo esse megaprojeto entrou em crise, o que poderia significar seu fim. Entretanto, a associação da Academia de Ciências e Humanidades Berlim-Brandemburgo, a Fundação Internacional Marx-Engels em Bonn e o Instituto Internacional de História Social em Amsterdã, onde a maior parte dos escritos de Marx e Engels estão preservados, evitou tal cenário. Como resultado do trabalho conjunto, mais volumes começaram a ser publicados a partir de 1994, por uma editora conhecida como mega2.

Um dos editores alemães, Jürgen Rojahn, convidou meu professor Teinosuke Otani para se juntar ao conselho editorial da MEGA2. A história que ouvi é que Teinosuke estava pesquisando em Moscou sobre algumas frases problemáticas no terceiro volume de O Capital, que eram uma fonte de disputa entre Kuruma e a escola Uno. Teinosuke queria verificar se Engels havia lido a caligrafia de Marx corretamente, e descobriu que havia muitos erros e problemas com suas interpretações. Teinosuke então escreveu vários artigos em alemão, que Rojahn leu e que despertaram sua admiração, fato que levou à criação do grupo japonês MEGA2. Recebemos três volumes da Seção IV, que abrange os cadernos, ou seja, os volumes 17, 18 e 19. Foi basicamente uma coincidência que o volume 18, no qual trabalhei, incluísse os cadernos de Marx da década de 1860 relacionados às ciências naturais. Eu tinha lido o trabalho de John Bellamy Foster e Paul Burkett sobre a ecologia de Marx, seus estudos das ciências naturais e sua categoria crucial de degradação metabólica, mas não fazia ideia de que ele havia escrito tantos cadernos sobre esses tópicos.

Então você teve que aprender a decifrar a difícil caligrafia de Marx?

Eu tive que entender a letra dele, mas felizmente, cadernos são mais fáceis de trabalhar porque você pode consultar os livros de onde vieram os trechos escritos neles. Essa foi uma das razões pelas quais eles foram designados para a equipe japonesa. É realmente difícil trabalhar com manuscritos, porque neles encontramos Marx pensando e escrevendo suas próprias ideias, então não há pistas ou indicações. Mas, estudando os cadernos, é possível rastrear as passagens correspondentes das obras que Marx estava lendo.

Você retornou ao Japão para assumir um cargo na Universidade Metropolitana de Osaka antes de escrever seu próximo livro, 人新世の「資本論」 (2020), que poderia ser traduzido como Capital no Antropoceno1. Era um livro politicamente informado que propunha uma interpretação altamente original do pensamento ecológico e político-econômico de Marx, que tendia ao comunismo de decrescimento. Você deu continuidade a isso com um trabalho mais acadêmico em inglês, Marx no Antropoceno (2023). O que levou você a adotar essa postura mais intervencionista?

Uma reação ao meu primeiro livro foi dizer: mesmo que Marx tivesse sido um ecossocialista, que importância isso teria, já que ele é essencialmente um filósofo antiquado do século XIX? Marx no Antropoceno e Desaceleração são, de certa forma, tentativas de responder a essa pergunta. Eles se baseiam no pensamento ecológico de Marx e o combinam com sua pesquisa sobre sociedades pré-capitalistas não ocidentais, seus rascunhos de cartas a Vera Zasulich sobre formas comunitárias "arcaicas" e sua ideia de "riqueza comum" ou abundância pública, contida na Crítica do Programa de Gotha, para mostrar que, no final de sua vida, Marx estava caminhando em direção a posições que podem ser melhor descritas como uma forma de comunismo de decrescimento. Marx oferece não apenas uma análise da dinâmica do capitalismo, mas também uma solução para ela.

Creo que hemos olvidado, o al menos marginado, este aspecto del pensamiento de Marx, porque todavía tenemos la imagen de Marx, concebido como un productivista prometeico, establecida por el experimento soviético. Al rastrear el desarrollo intelectual de Marx, al leer sus cuadernos de notas sobre las sociedades no occidentales, sobre las sociedades precapitalistas y sobre las ciencias naturales, resulta posible leerlo de una manera no ortodoxa y recuperar así ese legado olvidado del comunismo anarquista para el siglo xxi. Algunos de estos aspectos se han debatido de forma puntual: John Bellamy Foster y otros estudiosos se han centrado en las cuestiones ecológicas y Kevin B. Anderson en su libro Marx at the Margins, recientemente publicado en castellano, ha discutido sus opiniones sobre las sociedades no occidentales, pero estos autores no han combinado estos aspectos del pensamiento de Marx. Así que mi tentativa pretende lograr una especie de síntesis, que reúna la tradición de Kuruma, el ambientalismo marxista promovido por Foster y Burkett, las sociedades no occidentales exploradas por Anderson y las conclusiones presentes de los cuadernos de notas procedentes del proyecto de la mega2 : Alemania, Estados Unidos y Japón. Volviendo a tu primera pregunta, ese ha sido a grandes rasgos mi itinerario intelectual personal hasta el día de hoy.

Contrapones todo esto a una lectura productivista y económico-determinista de Marx, pero ¿hay alguien que proponga esa lectura hoy en día? El propio Engels, en su carta a Bloch, explicaba que durante la década de 1840, él y Marx querían hablar de fuerzas materiales y económicas, porque todos los demás –los jóvenes feuerbacheanos– eran idealistas; pero nunca pretendieron negar la importancia del derecho, el poder político, etcétera. En la tradición marxista occidental, Adorno y Horkheimer, por ejemplo, se mostraron ferozmente contrarios a la totalidad de los desarrollos de la ciencia; eran una especie de antiproductivistas radicales a su manera. ¿Quiénes eran los marxistas productivistas en tu mundo? 

Mi primer encuentro con este planteamiento vino de la mano del Partido Comunista de Japón, que sigue siendo una presencia activa en comparación con sus homólogos occidentales. Por poner un ejemplo: Japón quedó traumatizado por Hiroshima y Nagasaki y, sin embargo, durante los años de posguerra el Partido Comunista abogó por la energía nuclear y únicamente después de Fukushima se pronunciaron finalmente en contra de la misma. Pero hoy abogan por un Green New Deal y la ejecución de inversiones a gran escala en energía solar. No estoy en contra de la energía solar, por supuesto, pero el Partido ignora por completo la idea del decrecimiento, lo cual es emblemático del productivismo japonés; creo además que esta posición puede encontrarse en otros lugares. Por ejemplo, en los debates sobre cómo el desarrollo de nuevas tecnologías puede emanciparnos del trabajo, como sucede en el aceleracionismo de Alex Williams y Nick Srnicek o en la obra de Aaron Bastani y Paul Mason. Matt Huber y otros estudiosos en Estados Unidos también critican duramente el decrecimiento. Algunas concepciones de un Green New Deal implican el aumento de las fuerzas productivas y de la intervención en la naturaleza. De modo que yo no diría que el productivismo está ausente de la tradición occidental. De hecho, creo que parte de la prueba del arraigo residual del productivismo es que solo recientemente hemos empezado a debatir sobre el decrecimiento. La gente todavía duda en aceptarlo, sobre todo en Estados Unidos. La reacción común es que el decrecimiento es contrario a los intereses de la clase obrera, poco atractivo y políticamente imposible. Es interesante oír ese tipo de reacción de amigos marxistas, incluso de aquellos que aceptan las ideas ecosocialistas. Foster nunca aceptó la idea del decrecimiento. El año pasado la Monthly Review publicó un número sobre el decrecimiento, pero hasta entonces, durante casi veinte años de estudio y análisis de la ecología de Marx, la revista nunca había hablado de ello. Por supuesto, es preciso diferenciar las distintas corrientes del marxismo occidental, el cual, sin embargo, aunque hizo valiosas críticas del estalinismo, en mi opinión se centró demasiado en la cultura y la filosofía, lo cual supuso la separación de Marx de Engels, hecho que redundó saitō: Entrevista 57 en la expulsión de este último como una figura engañosa asociada a la comprensión positivista y mecanicista de las leyes de la naturaleza y en el rescate de Marx como filósofo dialéctico. El resultado fue que la cuestión de la naturaleza fue descartada junto con Engels. Y ello supone un enorme problema, porque si Marx es solo un filósofo social del capitalismo, no podemos basarnos en él para analizar la crisis ecológica del momento presente. 

Abordemos esta descripción de Marx como un anarco-comunista. Después de todo su mayor adversario en la izquierda durante este último periodo fue Bakunin, de modo que tal vez Marx se mostraría en desacuerdo contigo respecto a esta cuestión. Y después tenemos la carta a Zasulich: los marxistas rusos examinaron la amplia penetración del capital en aquellas formas agrarias comunales, que ya se estaban disolviendo en la década de 1890. Marx comprendía sin duda que el campo ruso no era en absoluto un paraíso comunista-primitivo. 

Sí, las notas sobre Bakunin son en realidad algo problemáticas para mi interpretación, lo admito. También tengo que admitir que Marx nunca dijo que el decrecimiento fuera necesario ni nada por el estilo. Obviamente sus ideas sobre la dictadura del proletariado permanecen, incluso en la Crítica del Programa de Gotha, y ciertamente hay ambivalencias en su pensamiento, lo cual explica por qué Marx escribe en su carta a Zasulich, que la sociedad occidental necesita volver a un estadio superior de comunas arcaicas. Que para superar la crisis del capitalismo, las sociedades de Alemania, Francia y Gran Bretaña necesitan volver a las comunas precapitalistas, no abandonando la tecnología, sino aprendiendo de la gestión precapitalista de las tierras, la propiedad y otros recursos. Podemos utilizar los frutos del capitalismo, razón por la cual Marx afirma que se trata de la forma superior de las comunas arcaicas. Pero esto es muy distinto de impulsar el desarrollo tecnológico de las fuerzas productivas. 

¿Dónde encontraste por primera vez la idea del decrecimiento? 

Inicialmente me mostré escéptico y todavía más si el decrecimiento se asociaba con la idea de un Green New Deal. La creación de mejores empleos y la obtención de salarios más altos para la clase trabajadora se hallan entre los fundamentos de la política socialista. Después de Fukushima, abogué por ello con redoblada pasión: como tenemos que 58 nlr 145 abolir la energía nuclear y nos hallamos ante la crisis climática, necesitamos inversiones a gran escala en energías renovables. Pero me percaté de que no estaba prestando suficiente atención al Sur global. Japón, por ejemplo, no dispone de demasiados recursos y, por lo tanto, para construir nuevas infraestructuras ecológicas, necesitamos importar muchos recursos del Sur global. También había supuesto que, una vez que invirtiéramos más en tecnologías verdes, el crecimiento económico continuaría, pero llegué a reconocer que, independientemente del modo de producción, el crecimiento es insostenible a partir de cierto punto. Y esto es lo que Marx estaba diciendo: el metabolismo entre los seres humanos y la naturaleza no es exclusivo del capitalismo y continuará también en el socialismo. La organización capitalista de este metabolismo puede abolirse, pero el propio metabolismo no. Así pues, creo que necesitamos una organización más cuidadosa del metabolismo social, lo cual me llevó a la idea de la planificación ecológica abordada desde la perspectiva de decrecimiento. 

¿Quiénes fueron los pensadores más importantes para cambiar tu perspectiva? 

El más importante fue Jason Hickel. Sus artículos sobre el desacoplamiento y la abundancia radical ofrecen un vía para conectar las tradiciones socialista y decrecentista. El otro fue Giorgos Kallis. Su libro Limits (2019) me resultó útil para imaginar una nueva concepción de la libertad: la autolimitación como forma de aumentar nuestra libertad. A menudo asociamos los límites con la falta de libertad, pero en realidad nos vemos obligados a consumir más, a producir más. This Life (2020), de Martin Hägglund, ilustra cómo nuestra sociedad es libre en tanto que no vivimos en una dictadura, pero no lo es en el sentido de que no decidimos qué merece la pena perseguir. Esto ya está predeterminado por el beneficio. Así que estos tres autores (Hägglund, Kallis y Hickel), pero también la tradición ecofeminista de pensadoras como Silvia Federici, Stefania Barca, Maria Mies, Vandana Shiva, contribuyeron a dar forma a mi perspectiva. En esencia, abogan por el decrecimiento sin utilizar su vocabulario. Hasta que no reconocí la importancia del decrecimiento, no supe apreciar la contribución real de las ecofeministas a la crítica radical del capitalismo. 

¿Cómo distingues entre decrecimiento y economía estacionaria? 

Una de las razones por las que no utilizo el concepto de economía estacionaria es que la gente que elaboró el concepto como Herman Daly saitō: Entrevista 59 no era muy crítica del capitalismo; mientras introduzcamos determinadas regulaciones como leyes, reformas fiscales, etcétera podemos preservar los mercados y la propiedad privada. Daly también se volvió muy conservador en materia de inmigración y en otras cuestiones. La tradición del decrecimiento presta más atención a los movimientos de la justicia medioambiental, incluidos los del Sur global y los de los pueblos indígenas. 

Pero el decrecimiento también cuenta con su cuota de pensadores reaccionarios. E. O. Wilson, por ejemplo, que propuso el rewilding [reasilvestramiento] de la mitad de la tierra, fue inicialmente un sociobiólogo de extrema derecha durante los años de Reagan, que abogaba por combinar su marco de la «media tierra» con una especie de capitalismo autoritario. Podría decirse que, desde el punto de vista de su tradición, el decrecimiento es menos progresista que el estado estacionario, corriente que podríamos iniciar con John Stuart Mill, que lo contemplaba como una especie de utopía en la que ya no existirían la prisa y la aceleración capitalistas. 

Obviamente, el decrecimiento tiene muchas tradiciones diferentes y lo mismo puede afirmarse del estado estacionario. Lo que estoy intentando hacer es introducir a Marx en los debates sobre el decrecimiento. Quiero demostrar que Marx y otros socialistas y comunistas del siglo xix como William Morris o Kropotkin no pensaban en términos de crecimiento económico eterno. Creo que el marxismo puede contribuir mucho aportando una economía política y una crítica del imperialismo. De lo contrario, el decrecimiento podría caer en una posición más reaccionaria y conservadora. Pero necesitamos planes, y eso es algo que Marx no elaboró realmente. Así que, en cierto sentido, hoy tenemos que ir más allá de Marx: él no habló de cómo establecer el comunismo del decrecimiento, lo cual ha espoleado mi interés por la cuestión de la planificación ecológica. 

¿Podrías esbozar las ideas en las que estás pensando en términos de planificación ecológica? Entendemos que se trata de un proyecto nuevo, pero, ¿qué tienes en mente? 

El decrecimiento exige dos cosas: la primera es abandonar el pib como única medida de progreso y la segunda es distinguir entre lo que es innecesario y lo que es necesario, para reducir lo innecesario y aumentar lo necesario. Para organizar la transición a la sociedad del decrecimiento 60 nlr 145 debemos efectuar una cuidadosa planificación, porque no se puede reducir ni aumentar todo al mismo tiempo, porque se desperdician energía y recursos que son muy limitados. Se trata de centrarse en la dimensión del valor de uso de la producción en lugar de confiar en el mecanismo de precios para la asignación y distribución de los productos. La cuestión es cómo lo hacemos. Estas decisiones no pueden ser tomadas por burócratas o políticos. Por lo tanto, necesitamos una forma más democrática de gestionar y decidir lo que necesitamos –y debemos aumentar– y lo que no necesitamos y debemos reducir. Es necesario un nuevo debate sobre el cálculo socialista. Es difícil imaginar la abolición del mercado de golpe. ¿Cuál es el equilibrio adecuado entre un sistema de mercado y otro que no lo es? También disponemos de nuevas tecnologías informáticas, si bien es peligroso depender únicamente de este tipo de mecanismos algorítmicos, así que se trata de encontrar el equilibrio correcto. Existen en realidad muchas formas de planificación en la actualidad. La planificación está en todas partes. Cuando la educación y la sanidad se desmercantilizan, el Estado y los gobiernos locales planifican qué recursos se asignan a cada escuela y a cada hospital. Del mismo modo, las empresas capitalistas asignan la energía y los recursos de forma planificada. Todavía estamos en una fase muy preliminar en realidad, pero intentamos encontrar el equilibrio adecuado, diferenciar las categorías de planificación y utilizarlas como fundamento para una política ecosocialista. 

La refutación estándar de los argumentos que sustentan las soluciones medioambientales a partir del cambio social es que estas precisan de demasiado tiempo. La propiedad capitalista está ferozmente defendida, respaldada por todo el complejo institucional y jurídico del Estado y se halla fuertemente armada, mientras que el movimiento obrero se ha debilitado enormemente. La crisis climática es tan aguda, afirman los críticos, que es mejor tener soluciones capitalistas ahora que esperar a que la clase obrera tome el poder a lo largo del mundo. 

El problema es que el capitalismo verde simplemente no es lo suficientemente rápido. Mientras su objetivo sea el crecimiento continuo, invertirá en la producción de nuevos coches, nuevos aviones, nuevos barcos de crucero, etcétera. La producción capitalista crea excesos que no podemos permitirnos en una época de crisis ecológica. Una vez comprendida la crítica ecosocialista, queda claro que la expansión y la acumulación infinitas de capital son las causas de la crisis climática. No saitō: Entrevista 61 soo hay que invertir en energías renovables y vehículos eléctricos, sino también pensar en reducir el número de coches y el uso agregado de energía y recursos. El capitalismo no puede hacerlo, porque tiene que producir continuamente nuevas mercancías, dinámica que no puede producir un proceso de descarbonización con la rapidez requerida. Los defensores del decrecimiento han criticado adecuadamente la insostenibilidad del capitalismo verde, pero el problema es que su planteamiento suele ser antiestatal y hace demasiado hincapié en la transformación de abajo arriba. Por supuesto, no queremos repetir los fracasos del siglo xx, pero el decrecimiento también necesita una visión de una transformación sistemática. Lo mismo puede decirse de los movimientos recientes, como Extinction Rebellion y Just Stop Oil. Han contribuido realmente a cambiar las percepciones, pero estas acciones directas no logran proponer una estrategia para la transición. En este sentido, creo que la tradición marxista y socialista puede aportar mucho. 

¿Qué tipo de desarrollo apoyarías en las zonas más pobres del Sur global? 

Esta es una pregunta clásica para el decrecimiento. Yo diría que el desarrollo, o algún tipo de crecimiento, es obviamente necesario en el Sur global, porque las necesidades sociales básicas deben ser satisfechas para todos. El Norte global debe invertir y ayudar a construir infraestructuras. El problema es, por supuesto, que esto aumenta las emisiones de carbono y necesitamos más recursos para construir estas nuevas infraestructuras, lo cual significa que el Norte global debe reducir aún más su consumo de recursos y energía. No digo que tengamos que ser pobres, porque podemos utilizar la tecnología, aumentar la eficiencia, etcétera; no tenemos que renunciar a todo, pero tenemos que pensar en reducir el consumo de carne; tenemos que pensar en reducir la moda rápida; tenemos que reducir el número de coches. Y estas son cosas que debemos hacer al mismo tiempo o en otro caso aventurémonos a pensar las consecuencias de que China o la India intenten ser como Japón o Gran Bretaña. Sin una nueva visión de la abundancia, toda la población del Sur global, junto con la clase trabajadora del Norte global, lucharán por una forma capitalista de abundancia que es sencillamente insostenible. 

Los partidarios del Green New Deal aducirían al respecto que una contracción radical, bajo las actuales relaciones sociales, recaería enteramente sobre la clase trabajadora. En general, en este debate, el decrecimiento parece entenderse a menudo como una especie de austeridad, que suena regresiva y aterradora para la gente, por no mencionar que es muy difícil de aplicar. Pero leyendo tus libros me da la impresión de que no se trata de un decrecimiento generalizado en el que la gente es cada vez más pobre. Por el contrario, parece que propones una transición cualitativa a tenor de la cual determinadas cosas ven reducida su producción mientras otras la ven incrementada. ¿No hay un problema retórico con el debate decrecimiento versus productivismo, que a veces puede parecer atrapado en una oscilación entre esos pares binarios? 

Ese par binario de decrecimiento y antidecrecimiento es parte del legado del productivismo. Creo que todos los socialistas estarían básicamente de acuerdo con las ideas del decrecimiento, correctamente entendido, aunque no utilicen ese término. Lo que intentan decir los defensores del decrecimiento es bastante razonable y aceptable desde un punto de vista socialista. De hecho, yo asocio el decrecimiento con la abundancia de bienes públicos. Recientemente, Nick Srnicek y Helen Hester han escrito un libro, After Work (2023), en el que también hablan de abundancia social o lujo social. Creo que también se están acercando al decrecimiento. Es el capitalismo el que crea escasez artificial; podemos tener abundancia de educación, de transporte, de Internet, esencialmente a través de la desmercantilización de todo. En tales condiciones, también podríamos trabajar menos: el decrecimiento aboga por la reducción de la jornada laboral. Es el capitalismo el que nos obliga a trabajar más y durante más tiempo, porque la explotación del excedente de tiempo de trabajo es la fuente del beneficio. En Slow Down hablo de cómo podemos transformar gradualmente nuestros comportamientos y nuestros valores mediante la creación de una esfera de riqueza común, de abundancia pública. Este elemento suele faltar en el planteamiento del Green New Deal, porque sus partidarios siguen pensando en proseguir el desarrollo actual, pero de forma sostenible. Podemos imaginarnos una sociedad en la que el Green New Deal tenga realmente éxito, pero sigamos trabajando muchas horas a la semana para comprarnos el último modelo Tesla, mientras sigue existiendo la desigualdad de género, nos vemos obligados a pagar matrículas universitarias muy altas y continuamos pagando los intereses de nuestros préstamos, etcétera. ¿Por qué no imaginar por el contrario un tipo diferente de sociedad? El problema de muchos defensores del Green New Deal es que intentan ser demasiado atractivos y evitan los temas más difíciles. Por un lado, Robert Pollin dirá que la crisis climática es muy grave, pero por saitō: Entrevista 63 otro, que la solución es simplemente invertir el 2 por 100 del pib mundial en industrias verdes y todo el mundo estará mejor, disfrutando de mejores empleos y mejores salarios. No estoy convencido de ello. Ello apela al sentido común existente en lugar de desafiarlo. Y ya se están produciendo cambios, sobre todo en Europa. Algo como prohibir los denominados suv se habría considerado utópico hace diez años, pero hace poco en París votaron en contra de los mismos, no para prohibirlos, sino para cobrarles a partir de ahora tarifas de aparcamiento más caras por el hecho de ser coches de mayor tamaño. Por supuesto, los socialistas pueden ir mucho más lejos. Tenemos que aceptar que los niveles actuales de consumo y producción en el Norte global son excesivos e insostenibles, incluso con energías renovables y vehículos eléctricos. Entiendo que algunos de los cambios de estilo de vida necesarios –reducir el consumo de carne, reducir el número de vuelos– no son atractivos para mucha gente, al menos a día de hoy. Pero por ello debemos argumentar en pro de tal estrategia. El decrecimiento sostiene que puede combinarse un nuevo tipo de abundancia con una menor producción. Creo que cuando la gente lo entiende, las propuestas cobran sentido. Reducir el consumo no solo ayudaría al medio ambiente, sino que tendría un efecto positivo sobre nuestra salud y sobre nuestra calidad de vida. Simplemente no necesitamos gastar tanto dinero en determinadas cosas. Una vez que renunciemos a nuestro deseo capitalista de comprar coches más grandes, casas más grandes, de adquirir los últimos modelos, azuzados por la publicidad, todo lo cual es muy despilfarrador, podremos concebir formas de vida diferentes, que amplíen el ámbito de la libertad. Hay que reducir el reino de la necesidad –es lo que dice Marx– para ampliar el reino de la libertad. Y podemos ampliar el reino de la libertad renunciando a cosas que consideramos necesarias, pero que en realidad no necesitamos. Esta es mi interpretación de la Crítica del Programa de Gotha de Marx, que afirma que la Genossenschaft –la riqueza– fluye abundantemente en una sociedad comunista, lo cual no significa que necesitemos producir tantas cosas como producimos ahora una vez que entremos en la etapa socialista. La abundancia en el comunismo es diferente de la propiedad privada en cuyo régimen todo está monopolizado por los capitalistas, pero donde también nosotros monopolizamos muchos recursos. En cambio, una vez que empezamos a compartir, llegamos a reconocer la abundancia de la cultura existente. Es esta nueva concepción de la riqueza la que es necesaria.

Das Kapital in the Anthropocene –la edición japonesa de Slow Down– tuvo un éxito notable. Japón tiene una historia de libros de izquierda que alcanzan cierta prominencia: la novela proletaria de la década de 1920, Crab Cannery Ship, de Takiji Kobayashi, por ejemplo, se convirtió en un sorprendente éxito de ventas en 2008; Kōjin Karatani alcanzó cierta fama como crítico. Parece que la cultura japonesa tiene la capacidad de generar estos saltos para la literatura radical, lo que resulta sorprendente, dada la reputación del país de ser una sociedad realmente conservadora. ¿Cómo explicas este comportamiento? 

Es interesante lo que dices. Mi libro vendió cerca de medio millón de ejemplares, una cifra realmente elevada para un libro sobre el comunismo del decrecimiento de Marx. ¿Por qué? La economía japonesa lleva treinta años estancada y las reformas económicas solo han creado más precariedad. Los salarios están bloqueados y a día de hoy la desigualdad también está creciendo debido a la inflación. Mucha gente está descontenta con el sistema, pero no tiene medios para expresarlo, mientras igualmente innumerables personas que trabajan en ong, en temas de justicia medioambiental o en los sectores agrícolas, se muestran en estos momentos realmente interesadas en estas ideas. Incluso los trabajadores de las grandes empresas se interesan por la nueva idea de poscapitalismo, debido al penoso comportamiento de la economía. Así pues, aunque la izquierda japonesa es débil, el interés por las alternativas al estado de cosas presente es fuerte. Las generaciones mayores, que conocieron tiempos mejores antes del estallido de la burbuja japonesa, han propuesto a menudo una cierta idea de decrecimiento o de estado estacionario. Cuando se jubilaron, empezaron a hablar de que Japón no crecía y que había que encontrar otra forma de vida, lo cual provocó la ira de las generaciones más jóvenes, que están trabajando por salarios bajos. Pero yo pertenezco a la generación más joven y creo que esto ha ayudado a crear una percepción diferente de estos argumentos. El mundo académico japonés tiene una historia única después de la Segunda Guerra Mundial. Los departamentos de economía han estado esencialmente ocupados por marxistas, lo que significa que la gente empleada en las grandes empresas japonesas, que ahora tienen cincuenta o sesenta años, han estado expuestos a la economía marxista cuando eran jóvenes. Hoy en día, los jóvenes no tienen muchas oportunidades de estudiar el marxismo, pero la gente de más edad tuvo una experiencia muy diferente y por eso se muestran realmente abiertos a los conceptos e ideas marxistas, aunque no hagan nada para oponerse saitō: Entrevista 65 al capitalismo. Hay una apertura general a términos como comunismo o marxismo, pero esto también se debe en parte a que estos conceptos están despolitizados. Mi libro ha tenido éxito, pero eso no significa que la gente haya tomado conciencia o se haya radicalizado. La gente lo lee, pero no tenemos partidos políticos ni movimientos sociales, que exijan transformaciones radicales. Incluso el Partido Comunista ignora mi libro.

Parece una situación compleja y ambivalente: por un lado, tu libro es popular y apareces regularmente en televisión. Y, sin embargo, la izquierda japonesa sigue siendo débil. 

Sí, presenté un programa sobre El capital de Marx y aparezco una o dos veces por semana en la televisión como comentarista de la actualidad. Puedo criticar lo mal que lo está haciendo el primer ministro Kishida desde una perspectiva de izquierda, pero en los movimientos sociales no tenemos ningún desafío radical al capitalismo. Ha habido algunos repuntes en la última década en Estados Unidos y en el Reino Unido y también en Francia, pero no estoy seguro de que este tipo de radicalización política vaya a producirse en Japón. Espero que sí, pero por el momento no veo nada equivalente en el horizonte. Ni siquiera el tema nuclear adquiere una gran importancia en Japón. En general, no se perciben desafortunadamente grandes iniciativas en estos momentos. 

Durante las década de 1960 y 1970 se produjeron importantes movimientos sociales en Japón, algunos de los cuales tuvieron notables dimensiones ecológicas: las protestas desencadenadas por el envenenamiento de la población con mercurio industrial en Minamata, por ejemplo, o contra la construcción del aeropuerto de Narita en Tokio. ¿Existe alguna continuidad entre la izquierda japonesa de entonces y la de ahora? 

Todos esos movimientos radicales han desaparecido. Es muy difícil encontrar rastros de ese tipo de radicalismo hoy en día. No sé realmente por qué el declive de la izquierda se produjo tan rápidamente. Lo mismo ocurrió en el mundo académico. Si nos fijamos en el departamento de economía de la Universidad de Tokio, ya no hay unoístas. Es muy difícil encontrar lugares para estudiar economía marxista en Japón hoy en día. La situación es diferente en el Reino Unido o en Estados Unidos, donde el marxismo nunca fue tan popular como en Japón. La ecología de Marx se ha hecho muy popular recientemente en Estados Unidos, gracias a Foster, Joel Kovel, James O’Connor y a revistas como Capitalism Nature 66 nlr 145 Socialism y la Monthly Review. Pero en Japón las preocupaciones ecológicas fueron planteadas por economistas marxistas ya en la década de 1960. La gente prestó atención al problema de la contaminación durante la rápida industrialización posterior a la Segunda Guerra Mundial. Surgieron vigorosos movimientos sociales en zonas como Minamata, que lucharon contra las grandes empresas, mientras los intelectuales defendían la sostenibilidad y la justicia ecológica. El problema es que todo esto ha desaparecido y no es posible detectar la continuación de esa tradición. Si interrogas a los Fridays for Future de Japón, no conocen la experiencia de Minamata, no conocen a esos economistas medioambientales marxistas. Es muy lamentable, pero existe una ruptura entre la generación de los mayores y la de los jóvenes. Estoy introduciendo estas ideas como si fueran nuevas, pero en Japón hemos debatido mucho sobre estos temas durante las décadas pasadas, solo que ello se ha olvidado. Creo que una forma de revitalizar el movimiento ecologista japonés es redescubrir esa tradición.

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