14 de julho de 2025

Procurador-Geral do Brasil: Brasil e Estados Unidos podem fazer melhor

As diferenças entre os Estados Unidos e o Brasil devem ser abordadas por meio de negociação e respeito mútuo, não de medidas punitivas.

Jorge Messias

Jorge Messias é o procurador-geral do Brasil.

The New York Times

Evelyn Hockstein/Reuters

Em 9 de julho, o presidente dos Estados Unidos anunciou unilateralmente uma tarifa de 50% sobre todas as exportações brasileiras — uma medida sem precedentes na história moderna das relações entre nossos países. A justificativa oferecida pelo presidente Trump — as supostas práticas comerciais desleais do Brasil, os supostos ataques à liberdade de expressão e o processo contra um ex-presidente — exige uma resposta cuidadosa e baseada em princípios, além da firme defesa de nossa ordem jurídica, nossa soberania e a integridade de nossas instituições.

O Brasil e os Estados Unidos cultivam há muito tempo uma relação madura, diversa e estratégica. No ano passado, comemoramos 200 anos de relações diplomáticas, que remontam à época em que o presidente James Monroe recebeu José Silvestre Rebello em Washington como o primeiro enviado do recém-independente Império do Brasil. Nossa parceria resistiu a conflitos globais, crises econômicas e transições políticas graças aos nossos valores compartilhados: democracia, respeito ao Estado de Direito e um compromisso geral com a cooperação internacional pacífica. Esses princípios não são meras abstrações. São a base sobre a qual nossas sociedades são construídas e exigem vigilância constante e respeito mútuo, especialmente em tempos de desacordo.

A afirmação do Sr. Trump de que os Estados Unidos sofrem com uma relação comercial injusta e não recíproca com o Brasil é contrariada pelos fatos. Segundo dados do governo americano, somente em 2024, o superávit comercial dos EUA com o Brasil atingiu US$ 7,4 bilhões. Quando os serviços são incluídos, segundo cálculos do governo brasileiro com base em dados americanos, o superávit sobe para US$ 28,6 bilhões, tornando o Brasil o terceiro maior contribuinte para o superávit comercial global dos EUA, quando bens e serviços são combinados. Nos últimos 15 anos, os Estados Unidos acumularam superávits recorrentes e significativos em bens e serviços, com o Brasil totalizando US$ 410 bilhões.

A imposição de uma tarifa geral de 50% não é apenas desproporcional, mas também contrária às regras do comércio justo. Tais medidas minam a segurança jurídica para empresas e investidores, interrompem as cadeias de suprimentos globais e violam o espírito de cooperação que define nosso relacionamento. No Brasil, respondemos a esses desafios com respeito à lei, às normas internacionais e ao nosso mandato constitucional de defender o interesse nacional — inclusive, se necessário, por meio de medidas recíprocas.

O Sr. Trump afirmou que as tarifas estão relacionadas aos processos judiciais em andamento contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, acusado de participar de uma tentativa de golpe, que o Sr. Trump chamou de "caça às bruxas". Como procurador-geral, devo enfatizar que o governo brasileiro rejeita categoricamente qualquer tentativa de terceiros de interferir em nossos processos judiciais. Os processos judiciais em andamento contra indivíduos acusados de tentar subverter nossa democracia em 8 de janeiro de 2023 são de domínio exclusivo do judiciário independente do Brasil. Nenhum governo estrangeiro tem o direito de ditar ou questionar a administração da justiça em nosso país. A defesa da legalidade e da autonomia de nossas instituições são pilares inegociáveis de nossa democracia.

As outras alegações do Sr. Trump na semana passada sobre a censura de empresas de tecnologia americanas e os ataques à liberdade de expressão no Brasil são igualmente infundadas. No Brasil, o direito à liberdade de expressão é protegido, mas não deve ser confundido com o direito de incitar a violência, cometer fraudes ou minar o Estado de Direito — limitações amplamente reconhecidas em sociedades democráticas. No mês passado, nossa Suprema Corte reconheceu que, em determinadas circunstâncias, plataformas digitais podem ser responsabilizadas por conteúdo de terceiros que viole nosso Estado de Direito, como aqueles que envolvem pornografia infantil ou outros conteúdos ilícitos, incluindo incitação a ações antidemocráticas ou discurso de ódio. Todas as empresas, nacionais e estrangeiras, que operam no Brasil estão sujeitas às nossas leis, assim como as empresas brasileiras cumprem as regulamentações americanas quando operam nos Estados Unidos.

Este é um momento crítico. Sob a liderança do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governo brasileiro permanece comprometido com um relacionamento construtivo e pragmático com os Estados Unidos, baseado no respeito à soberania, à legalidade e ao Estado de Direito. Nossas diferenças devem ser abordadas por meio do diálogo, da negociação e do respeito mútuo — não de ameaças e medidas punitivas.

Nossos países superaram desafios maiores no passado. A força da nossa parceria reside na nossa capacidade de superar divergências, preservando os princípios que nos unem. O Brasil continuará a defender sua soberania, a integridade de seu sistema jurídico e os interesses de seu povo, enquanto busca maneiras de aprofundar a cooperação com os Estados Unidos a serviço da paz e da prosperidade globais.

Jorge Messias é o procurador-geral do Brasil.

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