Em solidariedade ao ex-presidente Jair Bolsonaro, recentemente preso, Donald Trump impôs tarifas de 50% ao Brasil. Ele está aprendendo rapidamente que a influência dos EUA é mais fraca do que imaginava, em grande parte devido aos laços crescentes do Brasil com a China.
Alex MacArthur
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O presidente brasileiro Lula tem sido retratado como o raro líder latino-americano disposto a responder ao governo Trump com firmeza. (Andrew Harrer / Bloomberg via Getty Images) |
Na Assembleia Geral da ONU, realizada em Nova York no mês passado, os Estados-membros normalmente falam em uma ordem cuidadosamente determinada com base em seu nível de representatividade, preferência e equilíbrio geográfico. Mas, seguindo uma longa tradição, o Brasil — que não vem em primeiro lugar em ordem alfabética nem sequer tem assento no Conselho de Segurança — foi o primeiro país a discursar, seguido pelos Estados Unidos. A prática começou na época em que quase nenhum país queria falar primeiro; o Brasil se ofereceu, e a cortesia gradualmente se consolidou como tradição. Esse protocolo foi repentinamente carregado de significado este ano.
Durante os meses que antecederam a assembleia, Washington e Brasília estiveram envolvidos em um impasse amargo. Em julho, enfurecido pelo processo contra seu aliado Jair Bolsonaro e por uma decisão da Suprema Corte brasileira, que responsabilizou as plataformas de mídia social por desinformação, Trump impôs tarifas de 50% ao Brasil. Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Lula) subiu ao pódio, começou insistindo que a democracia brasileira não está em jogo — uma linha firme que ele tem mantido publicamente desde o início do impasse.
Então, seu tom se intensificou: ele alertou sobre "falsos patriotas" que "planejam e promovem publicamente ações contra o Brasil" e reiterou que "nossa democracia e nossa soberania são inegociáveis". Sem citar nomes, Lula conseguiu uma única repreensão que atingiu vários alvos: o autoritarismo brando de Trump; Bolsonaro em casa, agora cumprindo uma pena de 27 anos por sua própria tentativa de minar as instituições democráticas do Brasil; e, implicitamente, ao filho do ex-presidente, Eduardo, que pressionou Trump a impor tarifas ao Brasil e parece ansioso para assumir o posto de pai.
O discurso subsequente de Trump pegou de surpresa até os observadores mais experientes do Brasil. Em um discurso sinuoso no qual, entre outras coisas, anunciou aos delegados que seus "países estão indo para o inferno", Trump subitamente suavizou sua retórica em relação a Lula, elogiando sua "excelente química", relatando um breve abraço no corredor e anunciando uma reunião na próxima semana. Ele ainda acrescentou: "Ele parecia um homem muito legal... ele gostava de mim, eu gostava dele". Momentos depois, porém, Trump se gabou de que os Estados Unidos estavam "revidando [o Brasil] com muita força" e alertou que eles "se sairiam mal" sem Washington.
Os dois líderes pareceram avançar em uma videochamada "amigável" na segunda-feira, trocando números de telefone pessoais e esboçando planos para uma futura reunião. Ainda assim, resta saber se esse tom se mantém ou se o próximo encontro se transformará em mais uma discussão aos berros no Salão Oval.
O tom de Lula, por outro lado, não surpreendeu ninguém. Durante meses, ele foi retratado como o raro líder latino-americano disposto a responder a Washington com firmeza: ele continua insistindo que o Judiciário deve ser livre, que a soberania "não está em negociação" e que o Brasil não barganhará processos. Essa postura o diferenciou de outros líderes regionais e aumentou sua aprovação em casa, mesmo entre alguns centristas, ao explorar um patriotismo adormecido que muitos haviam reprimido durante o ataque fragmentado de Bolsonaro às instituições brasileiras.
Essa provocação ressoou muito além do salão de mármore da ONU. Em 10 de setembro, milhares de pessoas da esquerda e do centro desfraldaram uma enorme bandeira brasileira na principal avenida de São Paulo. Foi uma resposta direta à extrema direita, que havia, de forma controversa, hasteado uma gigantesca bandeira americana na cidade — no Dia da Independência do Brasil — apenas duas semanas antes (as autoridades agora investigam se era a mesma exibida em um jogo da National Football League entre o Kansas City Chiefs e o Los Angeles Chargers na cidade dias antes). O Rio de Janeiro, por sua vez, ecoou São Paulo com um protesto caracteristicamente musical. Multidões dançaram ao som de uma lendária formação de músicos brasileiros — Caetano Veloso, Gilberto Gil, Paulinho da Viola, Djavan e Chico Buarque — cujas canções de protesto da era ditatorial disfarçavam o desafio em metáforas para escapar da censura e permanecerem relevantes até hoje sem nenhuma alteração na letra.
Um cético poderia objetar que a posição de Lula não é nada extraordinária. Afinal, um presidente brasileiro não tem poder constitucional para interferir na mais alta corte do país, mesmo que a maioria de seus ministros concorde com suas opiniões sobre soberania nacional. Mas isso por si só não basta para explicar a conduta do presidente. Quando o presidente esquerdista da Colômbia, Gustavo Petro, fez recuar aviões militares americanos que transportavam deportados em janeiro de 2025, ele poderia plausivelmente alegar uma base legal para sua decisão. No entanto, essa justificativa se dissolveu quase instantaneamente quando Trump retaliou com ameaças de tarifas de 50% e revogação de vistos. Os líderes do México, Honduras e Venezuela descobriram, de forma semelhante, os altos custos de desafiar Washington.
Durante décadas, a influência de Washington sobre Brasília baseou-se no comércio, na ajuda humanitária e na ameaça de tarifas. Essa influência se desgastou.
Por que, então, Lula se manteve firme enquanto tantos de seus colegas regionais cederam?
Esses atos simbólicos e as afirmações de soberania nacional de Lula são importantes, mas são uma resposta aos movimentos geopolíticos mais profundos que os possibilitaram. A cobertura da grande mídia se fixou em símbolos, mas a história é estrutural.
Durante décadas, a influência de Washington sobre Brasília se baseou no comércio, na ajuda humanitária e na ameaça de tarifas. Essa influência se desgastou. Lula pode desafiar Washington porque o Brasil não depende mais dos Estados Unidos como antes. Nas últimas duas décadas, um novo gigante tomou seu lugar: a China.
A mudança em direção à China começou antes mesmo da primeira presidência de Lula e só se acelerou nos governos extremamente diferentes do Brasil, incluindo o de Bolsonaro. Após a adesão da China à Organização Mundial do Comércio em 2001, seu comércio com a América Latina cresceu cerca de 31% ao ano durante oito anos; em 2009, a China havia ultrapassado os Estados Unidos como principal parceiro comercial e principal destino de exportação do Brasil. E até 2024, a China era o destino de 28% das exportações brasileiras, enquanto apenas 12% iam para os Estados Unidos. Como o Brasil é uma economia relativamente fechada, com exportações representando cerca de 20% do PIB, as vendas para os Estados Unidos representam apenas 2,4% de sua produção.
A divergência é ainda mais acentuada nos volumes de importação: entre 2019 e 2024, o volume de produtos importados do Brasil da China aumentou 98%, enquanto o volume dos Estados Unidos caiu 23%. O Brasil — agora o principal fornecedor de soja, carne bovina, milho, açúcar e aves para a China — importa produtos manufaturados de maior valor agregado da China e, desde 2019, depende mais dela do que dos Estados Unidos para produtos de alta e média-alta tecnologia. Em suma, a parceria tem se mostrado amplamente simbiótica e estável, especialmente em comparação com a volatilidade de Washington.
O Brasil não apenas resistiu aos ataques de unilateralismo comercial de Trump — como também lucrou com eles. Quando, em 2018, a China impôs tarifas retaliatórias sobre produtos americanos em resposta à primeira guerra comercial entre EUA e China de Trump, recorreu ao Brasil como fornecedor alternativo de commodities cruciais. Naquele ano, as exportações de soja dos EUA para a China despencaram 75%, enquanto as exportações brasileiras de soja para a China dispararam em US$ 7 bilhões.
Em meio a essa disputa mais recente, as importações de soja atingiram um recorde histórico. Além das commodities, a China fez investimentos importantes no Brasil, começou a introduzir "títulos panda" denominados em yuan e até propôs construir, com a cooperação do governo Lula, uma ferrovia de 4.800 quilômetros ligando o coração agrícola do Brasil a um novo porto de águas profundas construído pela China no Peru, reduzindo drasticamente o tempo de embarque. Enquanto isso, a ofensiva tarifária de 50% de Trump começou a ter impacto em casa, levando seu próprio chefe de comércio a promulgar isenções para produtos que os Estados Unidos não produzem e estimulando uma iniciativa bipartidária no Congresso para excluir produtos como café e cacau.
Essa mudança do centro de gravidade econômico do Brasil em direção à China naturalmente aumentou a influência da superpotência na região. No entanto, como a própria Pequim enfatizou em uma publicação no X durante o caos da guerra tarifária de julho, seu dinheiro vem com menos condições do que o dos Estados Unidos: "Já deixamos nossa posição clara. Guerras tarifárias não têm vencedores. O unilateralismo não serve aos interesses de ninguém." No Brasil, muitos economistas reconhecem os riscos da blitz tarifária de Trump, mas os veem como turbulência de curto prazo, em vez de uma ameaça à ambição de longo prazo do país de se tornar uma potência econômica do Hemisfério Sul.
A repentina simpatia de Trump em relação a Lula, portanto, intrigou observadores que o veem como um demagogo agindo por lealdade a Bolsonaro. Isso é parcialmente verdade, mas, visto no contexto econômico, a repentina suavidade de Trump parece menos magnanimidade e mais um reconhecimento da diminuição da influência dos EUA. Talvez não se trate de uma mudança de ideia, mas de um último esforço para recuperar a influência sobre a maior economia da América Latina — uma alavanca desperdiçada ao longo de anos de unilateralismo errático. Ao tentar disfarçar o declínio, Trump apenas expôs o que menos quer admitir: os Estados Unidos perderam o controle sobre o Brasil.
Colaborador
Alex MacArthur é pesquisador e escritor freelancer, atualmente cursando mestrado em história econômica e social na Universidade de Cambridge.
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