Ben Radley e Nicholas Fairwood
A República Democrática do Congo está, mais uma vez, em guerra com Ruanda. Ressurgido desde o final de 2021, o Mouvement du 23 Mars (M23), apoiado por Ruanda, tem nos últimos meses tomado o controle de áreas estratégicas no leste do país, das grandes cidades de Goma e Bukavu às províncias de Kivu do Norte e do Sul. Centenas de milhares de pessoas foram deslocadas pelos combates e várias milhares foram mortas. O M23 acusa o governo congolês de não cumprir promessas feitas durante acordos de paz anteriores, incluindo a reintegração de ex-rebeldes ao exército nacional e a proteção das comunidades tutsis congolesas falantes de kinyarwanda. Contrariando todas as evidências, o presidente ruandês Paul Kagame e seu partido governante, a Frente Patriótica Ruandesa, negam apoiar o M23. Alegam que seu objetivo no leste da RDC é apenas proteger essas minorias tutsis vulneráveis, ameaçadas pelas Forças Democráticas de Libertação de Ruanda (FDLR) — grupo ligado ao genocídio de Ruanda de 1994, que continua ativo na região.
Enquanto isso, o presidente da RDC, Félix Tshisekedi, descreveu o apoio de Kagame ao M23 como uma tentativa de avançar as ambições expansionistas de Ruanda — na esperança de estabelecer uma "Grande Ruanda" ou, ao menos, uma "zona tampão" para proteger os interesses políticos e econômicos do país. A mais recente escalada ocorre após mais de três décadas de conflito. Quais são suas causas subjacentes? Alguns comentaristas apontam para a fraqueza do Estado congolês e sua incapacidade de defender suas fronteiras, enfatizando de forma limitada as falhas de governança interna. Mas, para entender por que o Estado congolês é fraco, é necessário adotar uma visão mais ampla — como a de Jason Stearns em seu recente ensaio na Sidecar, que situa a relação entre RDC e Ruanda dentro de um sistema econômico global onde o Congo está preso nas periferias, sujeito à predação por investidores estrangeiros, negociantes de commodities e corporações multinacionais. No que se segue, tentaremos ampliar essa análise da posição subordinada da RDC dentro da ordem imperial, explicando sua genealogia histórica e como ela moldou o conflito atual.
A Bélgica concedeu a independência ao Congo em 1960, sob pressão de diversos movimentos de libertação nacional, mas o novo Estado nasceu marcado pelos legados de seu passado colonial: um Estado autoritário projetado para forçar a população ao trabalho agrícola exploratório; severas restrições para os congoleses quanto à educação secundária e superior, bem como à administração pública; paternalismo belga contínuo; e o incentivo a associações étnicas, que permitiram que partidos étnicos dominassem as mobilizações populares que levaram à independência. Após expulsar a Bélgica, o Congo rapidamente se tornou um campo de batalha da Guerra Fria, com os EUA apoiando facções militares ultraconservadoras numa tentativa de conter o soberanismo de esquerda ou o não alinhamento. Isso levou a uma crise institucional generalizada e à secessão de duas províncias, enquanto os representantes americanos disputavam o controle do Estado, assassinando o primeiro-ministro democraticamente eleito do país, Patrice Lumumba, em 1961.
Outro legado colonial importante foi a economia congolesa: uma estrutura extrovertida voltada à extração mineral e à exportação de produtos agrícolas. Entre 1920 e 1932, quatro grupos financeiros belgas controlavam três quartos de todo o investimento no Congo, a grande maioria no setor de mineração e infraestrutura associada. Apesar de apresentar as maiores taxas de industrialização do subcontinente após a África do Sul, nos anos 1950 a propriedade permanecia majoritariamente nas mãos da minoria colonial, que representava apenas 1% da população. Esse grupo controlava impressionantes 95% do capital investido, além de 82% das empresas produtivas e 70% da produção comercializada. Uma série de medidas foi utilizada para minar sistematicamente as oportunidades econômicas das populações locais: expropriação de terras, restrições à propriedade privada e ao crédito, confisco de produtos, trabalho forçado e preços fixos.
Entre as consequências, houve uma aguda crise agrária. As políticas coloniais voltadas a ampliar o excedente agrícola por meio do cultivo forçado, ao mesmo tempo em que garantiam um suprimento constante de mão de obra barata para minas e plantações, levaram à estagnação da economia rural. O domínio belga forçou as regiões rurais a produzirem para o mercado internacional em condições altamente exploratórias, suprimindo a atividade econômica pré-colonial em favor do capital financeiro colonial, que foi usado principalmente para desenvolver os setores de mineração e transporte. Dessa forma, o desenvolvimento de um mercado interno no campo foi impedido, frustrando o surgimento de um capitalismo agrário indígena e provocando um êxodo para as cidades. Isso também dificultou o projeto da nação congolesa pós-colonial, que buscava algum grau de autonomia em relação ao Ocidente. A independência formal pouco fez para alterar sua posição nesse sistema global predatório.
Uma vez que Mobutu finalmente tomou o poder em 1965, com o apoio da Bélgica e dos Estados Unidos, a autoridade foi dramaticamente recentralizada no Estado, que impôs uma repressão brutal a seus opositores políticos. Agora renomeado como Zaire, o país embarcou numa breve campanha de industrialização liderada pelo Estado, favorecida por uma conjuntura econômica propícia. No entanto, as políticas de Mobutu falharam em enfrentar os problemas estruturais herdados do período colonial — desde a economia voltada para o exterior até o abandono da agricultura indígena. Em meados da década de 1970, essas questões foram agravadas por má gestão econômica, queda dos preços do cobre, o choque do petróleo e o endividamento crescente. Sem muitas opções, o governo decidiu seguir o caminho do ajuste estrutural, abandonando quaisquer ambições independentistas e aprofundando sua dependência do núcleo capitalista.
Sob supervisão do FMI e do Banco Mundial, o Zaire passou os anos seguintes implementando um programa de austeridade e contenção que devastou o setor público. Sob o lema da “eficiência de mercado”, os serviços de saúde e educação foram dizimados: privatizados informalmente e forçados a se autofinanciar. Com mais de dez rodadas de empréstimos e renegociações de dívida até o final dos anos 1980, o Zaire se manteve financeiramente à tona, mas o efeito sobre sua vida política foi desastroso, já que os EUA e outros credores atuaram lado a lado com uma elite doméstica cada vez mais predatória, cujo principal objetivo era reproduzir sua riqueza por meio de rendas. Essa dinâmica permitiu a Mobutu se apresentar como um fiador da estabilidade local e regional — um líder com um aguçado entendimento da política financeira internacional, e uma habilidade notável para garantir sua sobrevivência política manipulando seus patronos estrangeiros.
O fim da Guerra Fria minou esse equilíbrio precário, já que o regime zairense perdeu grande parte de sua utilidade geopolítica para os EUA. Diante de forte oposição interna, Mobutu anunciou oficialmente o fim do regime de partido único em 1990, mas conseguiu manter-se no poder por quase toda a década seguinte, embora a um custo terrível para o país. A produção de cobre despencou após o colapso da mina de Kamoto em 1990, consequência de anos de subinvestimento em manutenção e de agitação social na província de Katanga. Os doadores suspenderam a ajuda ao desenvolvimento. Os remanescentes do setor formal foram destruídos por hiperinflação e distúrbios em massa. As instituições do Estado foram esvaziadas e os funcionários públicos empurrados para a economia de sobrevivência. Em 1996, quando a Primeira Guerra do Congo eclodiu, o Zaire estava à beira do colapso.
Após o genocídio de Ruanda e o massivo afluxo de refugiados, o veterano dissidente Laurent-Désiré Kabila liderou uma insurgência com o apoio de diversos atores regionais — com destaque para Ruanda — que conseguiu derrubar Mobutu e pôr fim ao Estado zairense. No entanto, as alianças de Ruanda logo mudariam. Kabila mostrou-se menos maleável do que se esperava, e expulsou as forças de seu antigo patrono regional, o que levou Ruanda e Uganda a se voltarem contra ele. Ambos passaram a apoiar novos grupos rebeldes que buscavam derrubar o regime de Kabila, tomando vastas porções do território congolês nesse processo. Kabila reuniu apoio de vários Estados da região, incluindo Angola e Zimbábue, que o ajudaram a conter os insurgentes em um impasse militar. Ainda assim, ele se tornou cada vez mais isolado ao longo do conflito e acabou assassinado em 2001, em circunstâncias ainda obscuras. Esse período de violência, conhecido como a Segunda Guerra do Congo (1998–2003), foi alimentado tanto por Estados regionais quanto por rebeldes que buscavam lucrar com o solo mineral rico do Congo — ouro, diamantes, coltan. O choque entre essas forças frequentemente resultava em impasses sangrentos.
O filho de Laurent Kabila, Joseph, assumiu a presidência após a morte do pai e iniciou um processo de normalização das relações com os doadores, além de assinar acordos de paz com as forças rebeldes. Sob pressão do Ocidente, o Congo embarcou no que foi descrito como uma “tripla transição” rumo à paz, à democratização e à liberalização econômica. Esta última baseava-se numa narrativa particular sobre o colapso econômico dos anos 1990, que culpava exclusivamente a má gestão e as ineficiências do Estado congolês. O FMI e seus aliados argumentaram que, para evitar a repetição desse cenário e permitir que o setor de mineração prosperasse, a propriedade dos recursos minerais do país deveria ser transferida para a iniciativa privada. No entanto, como o colonialismo e a dependência externa sufocaram o desenvolvimento de uma classe capitalista congolesa, não havia uma elite doméstica apta a assumir o controle do setor — assim, a tarefa acabou ficando com as corporações mineradoras transnacionais.
Sob supervisão do FMI e do Banco Mundial, o Zaire passou os anos seguintes implementando um programa de austeridade e contenção que devastou o setor público. Sob o lema da “eficiência de mercado”, os serviços de saúde e educação foram dizimados: privatizados informalmente e forçados a se autofinanciar. Com mais de dez rodadas de empréstimos e renegociações de dívida até o final dos anos 1980, o Zaire se manteve financeiramente à tona, mas o efeito sobre sua vida política foi desastroso, já que os EUA e outros credores atuaram lado a lado com uma elite doméstica cada vez mais predatória, cujo principal objetivo era reproduzir sua riqueza por meio de rendas. Essa dinâmica permitiu a Mobutu se apresentar como um fiador da estabilidade local e regional — um líder com um aguçado entendimento da política financeira internacional, e uma habilidade notável para garantir sua sobrevivência política manipulando seus patronos estrangeiros.
O fim da Guerra Fria minou esse equilíbrio precário, já que o regime zairense perdeu grande parte de sua utilidade geopolítica para os EUA. Diante de forte oposição interna, Mobutu anunciou oficialmente o fim do regime de partido único em 1990, mas conseguiu manter-se no poder por quase toda a década seguinte, embora a um custo terrível para o país. A produção de cobre despencou após o colapso da mina de Kamoto em 1990, consequência de anos de subinvestimento em manutenção e de agitação social na província de Katanga. Os doadores suspenderam a ajuda ao desenvolvimento. Os remanescentes do setor formal foram destruídos por hiperinflação e distúrbios em massa. As instituições do Estado foram esvaziadas e os funcionários públicos empurrados para a economia de sobrevivência. Em 1996, quando a Primeira Guerra do Congo eclodiu, o Zaire estava à beira do colapso.
Após o genocídio de Ruanda e o massivo afluxo de refugiados, o veterano dissidente Laurent-Désiré Kabila liderou uma insurgência com o apoio de diversos atores regionais — com destaque para Ruanda — que conseguiu derrubar Mobutu e pôr fim ao Estado zairense. No entanto, as alianças de Ruanda logo mudariam. Kabila mostrou-se menos maleável do que se esperava, e expulsou as forças de seu antigo patrono regional, o que levou Ruanda e Uganda a se voltarem contra ele. Ambos passaram a apoiar novos grupos rebeldes que buscavam derrubar o regime de Kabila, tomando vastas porções do território congolês nesse processo. Kabila reuniu apoio de vários Estados da região, incluindo Angola e Zimbábue, que o ajudaram a conter os insurgentes em um impasse militar. Ainda assim, ele se tornou cada vez mais isolado ao longo do conflito e acabou assassinado em 2001, em circunstâncias ainda obscuras. Esse período de violência, conhecido como a Segunda Guerra do Congo (1998–2003), foi alimentado tanto por Estados regionais quanto por rebeldes que buscavam lucrar com o solo mineral rico do Congo — ouro, diamantes, coltan. O choque entre essas forças frequentemente resultava em impasses sangrentos.
O filho de Laurent Kabila, Joseph, assumiu a presidência após a morte do pai e iniciou um processo de normalização das relações com os doadores, além de assinar acordos de paz com as forças rebeldes. Sob pressão do Ocidente, o Congo embarcou no que foi descrito como uma “tripla transição” rumo à paz, à democratização e à liberalização econômica. Esta última baseava-se numa narrativa particular sobre o colapso econômico dos anos 1990, que culpava exclusivamente a má gestão e as ineficiências do Estado congolês. O FMI e seus aliados argumentaram que, para evitar a repetição desse cenário e permitir que o setor de mineração prosperasse, a propriedade dos recursos minerais do país deveria ser transferida para a iniciativa privada. No entanto, como o colonialismo e a dependência externa sufocaram o desenvolvimento de uma classe capitalista congolesa, não havia uma elite doméstica apta a assumir o controle do setor — assim, a tarefa acabou ficando com as corporações mineradoras transnacionais.
Embora a paz continuasse ilusória no leste, a situação foi contida militarmente, com atores armados integrados ao governo de transição de partilha de poder entre 2003 e 2006, presidido por Kabila. Entre os principais estavam o Reagrupamento Congolês para a Democracia (RCD-Goma), liderado por Azarias Ruberwa, e o Movimento de Libertação do Congo (MLC), liderado por Jean-Pierre Bemba — ambos tornaram-se vice-presidentes. Esse período registrou alguns avanços tímidos: a hiperinflação foi controlada, o crescimento econômico foi retomado e os gastos nos setores sociais foram restaurados, enquanto a maior parte da dívida congolesa foi perdoada em 2010.
No entanto, persistiam grandes contradições. A recuperação econômica da RDC baseava-se no mesmo modelo de crescimento da era Mobutu: integração ao sistema mundial como exportadora de minerais, mas sem um programa sério de reforma agrária ou uma estratégia coerente de diversificação econômica. Com o setor de mineração firmemente nas mãos de corporações estrangeiras, bilhões de dólares foram drenados para fora do país, privando o Estado de recursos essenciais. Instituições financeiras ocidentais ajudaram a garantir que grande parte desse capital terminasse em paraísos fiscais.
Com a riqueza escoando para fora da RDC devido à sua posição periférica na economia global, a política interna tornou-se cada vez mais feroz. A corrupção disparou, desde acordos obscuros sobre concessões de mineração até clientelismo econômico e subornos para aliados políticos — tudo isso tolerado pelos atores internacionais que supervisionavam a suposta transição do Congo, incluindo a União Europeia e os membros do Conselho de Segurança da ONU. Para esses atores, o objetivo principal tem sido manter o acesso irrestrito à economia congolesa. Em 2011 e 2018, potências ocidentais (EUA, Reino Unido, Bélgica, França) reconheceram os resultados oficiais das eleições presidenciais congolesas, apesar de irregularidades bem documentadas e evidências de fraude eleitoral. Na primeira ocasião, Kabila venceu o líder da oposição Étienne Tshisekedi, que havia prometido seguir um projeto nacional soberano, hostil aos interesses estrangeiros. Na segunda, o ex-executivo da ExxonMobil, Martin Fayulu — que havia indicado intenção de revisar os contratos de mineração e as relações com investidores estrangeiros — foi derrotado pelo filho de Tshisekedi, Félix. Muitos passaram, naturalmente, a acreditar que o sistema está manipulado para impedir a ascensão de políticos heterodoxos ao poder.
As esperanças de uma RDC genuinamente democrática e soberana hoje parecem uma memória distante. A lógica da política congolesa continua a ser de “o vencedor leva tudo”. O Estado está no centro de um sistema de clientelismo, e a economia depende fortemente das receitas da mineração, sem uma classe capitalista nacional suficientemente forte para desafiar essa orientação voltada para o exterior. No cargo, Tshisekedi tem utilizado os mesmos mecanismos de Kabila para sustentar esse status quo desolador — desde a gestão de coalizões políticas até o uso das instituições estatais e o financiamento de campanhas. Temendo o que vê como a influência contínua de Kabila sobre comandantes e generais, Tshisekedi fez pouco uso do exército regular, preferindo montar uma aliança improvisada de grupos armados não estatais e mercenários estrangeiros — que se mostrou incapaz de garantir segurança ou estabilidade.
Hoje, enquanto a guerra em curso no leste ameaça desestabilizar a extração contínua de cobre e cobalto na região de Katanga — o coração da mineração do país — os interesses imperiais e corporativos tornaram-se cada vez mais preocupados. A China, cujas empresas detêm a maior parte das minas industriais de cobre e cobalto no Congo, normalmente adota uma postura de não interferência política; mas recentemente pediu a Ruanda que encerrasse seu apoio ao M23 e votou a favor de uma resolução do Conselho de Segurança da ONU condenando o envolvimento ruandês no conflito.
A RDC — nascida sob o domínio colonial belga, transformada em palco da Guerra Fria e agora moldada por fluxos financeiros externos — continua, portanto, privada de qualquer coisa que se assemelhe à verdadeira soberania. Os doadores internacionais facilitaram a transição do país para fora das Guerras do Congo e sua reinserção na economia mundial em termos que não diferem muito daqueles que lhe foram impostos desde o início: como exportadora de minerais de baixo custo para alimentar o desenvolvimento capitalista alhures.
No entanto, persistiam grandes contradições. A recuperação econômica da RDC baseava-se no mesmo modelo de crescimento da era Mobutu: integração ao sistema mundial como exportadora de minerais, mas sem um programa sério de reforma agrária ou uma estratégia coerente de diversificação econômica. Com o setor de mineração firmemente nas mãos de corporações estrangeiras, bilhões de dólares foram drenados para fora do país, privando o Estado de recursos essenciais. Instituições financeiras ocidentais ajudaram a garantir que grande parte desse capital terminasse em paraísos fiscais.
Com a riqueza escoando para fora da RDC devido à sua posição periférica na economia global, a política interna tornou-se cada vez mais feroz. A corrupção disparou, desde acordos obscuros sobre concessões de mineração até clientelismo econômico e subornos para aliados políticos — tudo isso tolerado pelos atores internacionais que supervisionavam a suposta transição do Congo, incluindo a União Europeia e os membros do Conselho de Segurança da ONU. Para esses atores, o objetivo principal tem sido manter o acesso irrestrito à economia congolesa. Em 2011 e 2018, potências ocidentais (EUA, Reino Unido, Bélgica, França) reconheceram os resultados oficiais das eleições presidenciais congolesas, apesar de irregularidades bem documentadas e evidências de fraude eleitoral. Na primeira ocasião, Kabila venceu o líder da oposição Étienne Tshisekedi, que havia prometido seguir um projeto nacional soberano, hostil aos interesses estrangeiros. Na segunda, o ex-executivo da ExxonMobil, Martin Fayulu — que havia indicado intenção de revisar os contratos de mineração e as relações com investidores estrangeiros — foi derrotado pelo filho de Tshisekedi, Félix. Muitos passaram, naturalmente, a acreditar que o sistema está manipulado para impedir a ascensão de políticos heterodoxos ao poder.
As esperanças de uma RDC genuinamente democrática e soberana hoje parecem uma memória distante. A lógica da política congolesa continua a ser de “o vencedor leva tudo”. O Estado está no centro de um sistema de clientelismo, e a economia depende fortemente das receitas da mineração, sem uma classe capitalista nacional suficientemente forte para desafiar essa orientação voltada para o exterior. No cargo, Tshisekedi tem utilizado os mesmos mecanismos de Kabila para sustentar esse status quo desolador — desde a gestão de coalizões políticas até o uso das instituições estatais e o financiamento de campanhas. Temendo o que vê como a influência contínua de Kabila sobre comandantes e generais, Tshisekedi fez pouco uso do exército regular, preferindo montar uma aliança improvisada de grupos armados não estatais e mercenários estrangeiros — que se mostrou incapaz de garantir segurança ou estabilidade.
Hoje, enquanto a guerra em curso no leste ameaça desestabilizar a extração contínua de cobre e cobalto na região de Katanga — o coração da mineração do país — os interesses imperiais e corporativos tornaram-se cada vez mais preocupados. A China, cujas empresas detêm a maior parte das minas industriais de cobre e cobalto no Congo, normalmente adota uma postura de não interferência política; mas recentemente pediu a Ruanda que encerrasse seu apoio ao M23 e votou a favor de uma resolução do Conselho de Segurança da ONU condenando o envolvimento ruandês no conflito.
A RDC — nascida sob o domínio colonial belga, transformada em palco da Guerra Fria e agora moldada por fluxos financeiros externos — continua, portanto, privada de qualquer coisa que se assemelhe à verdadeira soberania. Os doadores internacionais facilitaram a transição do país para fora das Guerras do Congo e sua reinserção na economia mundial em termos que não diferem muito daqueles que lhe foram impostos desde o início: como exportadora de minerais de baixo custo para alimentar o desenvolvimento capitalista alhures.
Embora muitos comentaristas apontem a fraqueza do Estado congolês como um dos principais fatores do atual conflito, muitas vezes não contextualizam essa fraqueza dentro da história mais ampla e prolongada de intervenção e interferência imperial no país. Em vez disso, tendem a atribuir a culpa — explícita ou implicitamente — apenas às falhas congolesas.
Para desenvolver uma compreensão mais profunda da tragédia em curso, é essencial reconhecer o papel duradouro do imperialismo na produção de um Estado congolês tão enfraquecido. Atualmente, sem um projeto nacional soberano que una o Congo — provavelmente por meio de uma combinação de mobilização popular e liderança política — é difícil imaginar um futuro mais promissor.
Para desenvolver uma compreensão mais profunda da tragédia em curso, é essencial reconhecer o papel duradouro do imperialismo na produção de um Estado congolês tão enfraquecido. Atualmente, sem um projeto nacional soberano que una o Congo — provavelmente por meio de uma combinação de mobilização popular e liderança política — é difícil imaginar um futuro mais promissor.
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