26 de maio de 2022

Eleitor se organiza para disputa concentrada entre Lula e Bolsonaro

Evolução de petista indica atração de quem estava indeciso ou buscava outro candidato

Bruno Boghossian


Na montagem, Lula, Jair Bolsonaro, Simone Tebet e Ciro Gomes - Folhapress

O eleitorado que deu a Lula (PT) um crescimento considerável e consolidou seu apoio a Jair Bolsonaro (PL) reforçou a lógica de que há uma disputa concentrada entre o petista e o atual presidente. Os números da nova pesquisa do Datafolha indicam que os próprios eleitores se organizam de acordo com essa configuração.

A disparada de Lula em diversos segmentos sugere que o potencial do ex-presidente não se esgotou na onda de crescimento que ele obteve desde que recuperou seus direitos políticos.

Depois de experimentar uma alta em março, Bolsonaro ficou estável na última pesquisa. O presidente não se beneficiou da implosão de nomes alternativos de direita, como Sergio Moro (União Brasil) e João Doria (PSDB). Ele provou, no entanto, que tem a seu lado um eleitorado fiel para rivalizar com Lula.

O cenário estimulou a fórmula do voto útil, com a migração de eleitores indecisos e simpáticos a outros candidatos para os principais concorrentes. Lula aproveita a rejeição a Bolsonaro, enquanto o atual presidente pede holofotes como antagonista do petista.

Por enquanto, Lula é o principal beneficiário. A prova são os 54% dos votos válidos com o qual ele aparece num cenário com 13 candidatos –o que seria suficiente para vencer no primeiro turno.

O movimento renova as dificuldades da chamada terceira via, que depende de um derretimento de Lula ou de Bolsonaro para desbancá-los.

A disputa envolvendo um presidente e um ex-presidente com níveis razoáveis de popularidade levou muitos eleitores a anteciparem suas escolhas. Esse cenário ajudou a produzir o índice mais baixo de indecisos em pelo menos duas décadas nesta altura da disputa.

Em março de 2002, o percentual de entrevistados que não sabiam em quem votar na pesquisa espontânea (antes que o eleitor receba uma lista de candidatos) era de 50%. O índice se manteve num patamar semelhante ao longo das disputas seguintes –à exceção de 2006, quando Lula concentrou apoio a sua candidatura à reeleição e empurrou a taxa de indecisos para 37%.

Agora, só 29% dos eleitores afirmam não saber em quem votar de forma espontânea, e a maioria dos entrevistados deste grupo se mostra disposta a se decidir por algum nome quando é apresentada a cartela com os candidatos.

O avanço de Lula foi o responsável por boa parte do estreitamento desse espaço. O ex-presidente teve um salto nas intenções de voto em praticamente todos os principais segmentos da pesquisa, tanto nos redutos historicamente petistas como em grupos que demonstraram alguma simpatia a Bolsonaro.

A trajetória está desenhada nas declarações espontâneas de voto –únicas que podem ser comparadas, uma vez que a lista de candidatos mudou desde o levantamento anterior do Datafolha, em março.

Lula teve um salto de 11 pontos percentuais entre os eleitores com renda abaixo de dois salários mínimos, alcançando 43% das declarações espontâneas. Mas o petista também subiu de 6 a 8 pontos em faixas econômicas intermediárias.

O ex-presidente teve ganhos consideráveis em dois grupos que são considerados esteios do bolsonarismo: chegou a 39% entre os homens e a 36% na região Sul. Com esses números, Lula chega a superar o atual presidente nesses dois segmentos.

Parte do crescimento generalizado do petista pode ser explicado pela tomada de decisão de eleitores que, até então, não sabiam em quem votar ou estavam dispostos a procurar outros nomes na corrida. A lógica polarizada da campanha e o próprio crescimento registrado por Bolsonaro em pesquisas recentes empurram alguns votos para Lula.

A exposição política do petista –no lançamento de sua pré-candidatura e no noticiário sobre seu casamento com a socióloga Rosângela Silva– também são fatores que contribuem para que o nome do ex-presidente fique mais próximo da cabeça do eleitor.

Ao menos um grupo relevante se manteve fiel a Bolsonaro: os eleitores evangélicos. Entre esses entrevistados, os dois principais candidatos variaram dentro da margem de erro, com manutenção de uma vantagem para o presidente.

A estabilidade de Bolsonaro reforça os sinais de uma concentração de votos em torno dele. O presidente segurou patamares de 25% a 30% das intenções de voto na pesquisa espontânea em seus redutos mais importantes, incluindo a classe média e os eleitores das regiões Sul, Centro-Oeste e Norte.

Numa lógica contrária à que foi observada na pesquisa, Bolsonaro ainda teria chances de ganhar fôlego a depender das chances de Lula. Como principal antípoda do petista, o presidente tende a estimular a rejeição ao adversário para angariar apoio de eleitores que ainda estão indecisos ou flertam com outros candidatos.

A cristalização dos votos de Lula e Bolsonaro dificulta a vida de nomes que se posicionam como alternativas. O petista e o atual presidente têm níveis altos de eleitores convictos, dispostos a manter suas escolhas até o fim: 78% e 75%, respectivamente.

A má notícia que chega para Ciro Gomes (PDT) é que, além de haver menos votos em disputa, seus próprios eleitores dizem que ainda podem trocar de candidato. Só 35% se dizem firmes e 65% admitem uma mudança até o dia da eleição.

Escolhida por um consórcio de partidos para representar outra candidatura alternativa, a senadora Simone Tebet (MDB) enfrenta um problema semelhante. Sua principal vantagem é o fato de ainda ser desconhecida (mais de 70% não sabem quem ela é), mas a cesta de votos disponíveis na campanha parece estar cada vez menor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Guia essencial para a Jacobin

A Jacobin tem divulgado conteúdo socialista em ritmo acelerado desde 2010. Eis aqui um guia prático para algumas das obras mais importantes ...