Ranier Bragon
Danielle Brant
Folha de S.Paulo
Integrantes de partidos que formam a atual base de apoio a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmam haver conversas com parlamentares da oposição, em especial do PL de Jair Bolsonaro, para adesão ao governo nos primeiros meses da atual gestão.
O movimento, dizem aliados de Lula, já ocorria antes dos atos golpistas protagonizados por bolsonaristas no dia 8 e é condizente com a tradição observada no mundo político em início de gestão.
No Senado não há amarras para parlamentares mudarem de partido, caso queiram. Na Câmara, é preciso entrar em acordo com a legenda ou esperar janela partidária para trocar de sigla, algo que só vai ocorrer em 2026, ou então conseguir aval da Justiça.
Presidente do PL, Valdemar Costa Neto, em coletiva de imprensa em Brasília - Ueslei Marcelino-23.nov.22/Reuters |
Segundo governistas, um grupo de parlamentares pode recorrer a essa última opção argumentando que houve desvio do programa partidário do PL, presidido por Valdemar Costa Neto, ao questionar o resultado das urnas.
O PL saiu das eleições de 2022 como maior bancada do Senado —com 14 senadores— e da Câmara —com 99 deputados. Parte considerável desse sucesso nas urnas se deve ao fato de o partido ter apostado na imagem de Bolsonaro para alavancar sua força no Congresso.
O grupo, porém, se divide entre os "bolsonaristas raiz", ligados ao ex-presidente e com baixíssima probabilidade de conversas com o governo, e o "centrão raiz", que já se aliou do PSDB de Fernando Henrique a Bolsonaro, passando pelo PT de Lula.
É esse o grupo alvo do atual governo, que busca isolar o bolsonarismo no Congresso.
Além de aliados de Lula, a Folha conversou reservadamente com integrantes do PL. Alguns negaram as conversas para adesão a Lula, outros confirmaram que elas existem.
Um ponto ressaltado por congressistas que dizem participar das negociações é o de que alguns parlamentares do PL afirmam que antes de uma adesão formal precisam passar por uma espécie de quarentena com seu eleitorado, majoritariamente antipetista.
Esse período seria necessário para a modulação do discurso e avaliação do terreno —uma decisão final envolve não só a relação Congresso-Executivo, mas as realidades eleitorais locais.
Nesse contexto, não haveria, entretanto, grandes entraves quanto a votar junto com o governo em pautas econômicas. Em temas da chamada pauta de costumes, os parlamentares manteriam posicionamento fiel ao de sua base de eleitores. Até porque Lula e seus aliados não têm indicado intenção de mexer com esses temas tão cedo.
Os atos golpistas de 8 de janeiro levaram ao realinhamento de algumas expectativas políticas no Congresso. No cenário traçado por alguns sob reserva, há risco inclusive para as eleições municipais de 2024, nas quais o PL espera conquistar mais prefeituras ainda sob efeito Bolsonaro.
Além do questionamento do resultado das urnas, o PL vive atualmente outro problema interno com os ataques ao Palácio do Planalto e aos prédios do STF (Supremo Tribunal Federal) e do Congresso.
Os deputados bolsonaristas recém-diplomados André Fernandes (PL-CE) e Silvia Waiãpi (PL-AP), além de Clarissa Tércio (PP-PE), se tornaram alvo da PGR (Procuradoria-Geral da República) por incitarem os atos golpistas.
Em 22 de novembro, Valdemar anunciou uma ação no TSE pedindo para serem desconsiderados votos de urnas eletrônicas consideradas "comprometidas". O presidente do partido pautou a queixa em aparelhos usados no segundo turno, apesar de os mesmos equipamentos terem sido usados no primeiro turno.
O presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, determinou que o questionamento contemplasse também o primeiro turno, mas o PL inicialmente desconsiderou a decisão e manteve a contestação apenas sobre o segundo turno.
Moraes, então, multou em quase R$ 23 milhões a coligação de Bolsonaro —posteriormente, o ministro excluiu PP e Republicanos da ação e concentrou a penalidade no PL.
Uma saída de parlamentares do PL tende a beneficiar siglas da centro-direita hoje sob a órbita lulista, como o PSD de Gilberto Kassab e a União Brasil de Luciano Bivar, assim como siglas menores, como o Solidariedade.
Como os partidos de esquerda somam apenas cerca de 25% da Câmara e do Senado eleitos, Lula distribuiu nove ministérios a PSD, MDB e União Brasil para tentar ter uma base mais ampla no Congresso.
Na União Brasil, há ainda forte resistência interna a aderir ao Palácio do Planalto, sob o argumento de que os ministros escolhidos atendem muito mais aos interesses do senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) do que ao partido como um todo.
Mesmo que todas essas siglas votem unidas com o governo, Lula precisará ainda contar com o apoio de integrantes do centrão, formado por PL, PP e Republicanos, para ter uma base realmente sólida, ou seja, que dê uma margem de folga para, por exemplo, aprovar emendas à Constituição (que precisa do apoio de ao menos 60% dos deputados e senadores).
O novo Congresso toma posse em 1º de fevereiro, ocasião em que ocorrem as eleições para os comandos das duas Casas. Arthur Lira (PP-AL), na Câmara, e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), no Senado, são candidatos à reeleição e seguem favoritos a ficar mais dois anos nas respectivas funções.
Nenhum comentário:
Postar um comentário