Bancada ficou sem postos de comando no Senado e, na Câmara, não é maioria nem dentro do PL
Ranier Bragon
Em 2019, o chamado "bolsonarismo raiz" aportou no Congresso Nacional com um histórico de barulho na internet e a promessa de implantação de uma nova política. Após fracassar na tentativa de cumprir a meta mesmo sendo governo, o grupo hoje está maior, mas, diferentemente de quatro anos atrás, enfrenta isolamento, percalços e o desafio de ser uma oposição para além das lives em redes sociais.
O início tem sido desfavorável.
Os ataques golpistas à sede dos três Poderes, em 8 de janeiro, e os quase três meses de permanência de Jair Bolsonaro (PL) nos Estados Unidos contribuíram para o isolamento maior do bolsonarismo e para uma relativa boa vontade de grupos ao centro e à direta com o incipiente governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
No Senado, os aliados de Bolsonaro foram derrotados na eleição para o comando da Casa, em fevereiro, e ficaram sem nenhum posto na Mesa Diretora e nas presidências das comissões.
Na Câmara, o PL é a maior bancada, com 99 cadeiras, mas a maioria não pertence ao bolsonarismo e sim ao centrão, que não é necessariamente refratário a uma aproximação com o presidente Lula.
Na Câmara os bolsonaristas radicais chegaram com a marca de ter em seu entorno o deputado federal mais votado do país, Nikolas Ferreira (PL-MG). Por ora, o parlamentar de 26 anos teve como principal ato no Congresso subir com uma peruca loira à tribuna, no Dia da Mulher, para promover um discurso transfóbico.
O grupo novato, formado entre outros pelos ex-ministros Ricardo Salles (SP) e Eduardo Pazuello (RJ), e pelo ex-atleta Maurício do Vôlei (MG), tem se reunido semanalmente na Câmara, sob coordenação do "veterano" Carlos Jordy (PL-RL), 41, eleito em 2018 na onda bolsonarista.
"A galera está se ambientando bem. Tem alguns deputados com alguma experiência, como eu a Bia [Kicis], e a gente tem buscado passar bastante coisa para eles no início. Eles são pessoas muito interessadas em aprender, fizeram curso de Regimento Interno, estão com muita vontade e mergulhando de cabeça no trabalho", afirma Jordy, que deve ser o líder da oposição na Câmara.
Antes da posse, alguns dos novatos do bolsonarismo tentaram colocar de pé um movimento para derrubar o líder da bancada do PL, Altineu Côrtes (RJ), deputado de terceiro mandato, mas a rebelião não prosperou.
Jordy afirma que hoje o partido está unido em torno das pautas relacionadas a Bolsonaro e que, para liderar a oposição agora, ele estudou os métodos usados pela bancada do PT durante o governo anterior.
"O PT sempre teve um trabalho muito coordenado de oposição e nós, enquanto o governo, não tínhamos esse trabalho. E eu observei muito bem como eles faziam durante esses quatro anos e eu pensei que eu deveria colocar isso em prática agora que eles são governo. Daí, antes mesmo de começar o nosso mandato, eu já comecei a chamar para mim essa responsabilidade."
O PL irá comandar também a liderança da minoria, com Eduardo Bolsonaro (SP), e 5 das 30 comissões permanentes da Câmara, mas em nenhuma delas o posto será ocupado por um novato.
"Nosso objetivo é fortalecer o bolsonarismo, a direita e o PL, para que a gente consiga caminhar no sentido do impeachment de Lula e para restaurar a ordem no país", diz o novato Paulo Bilynskyj (PL-SP), ecoando discurso de colegas que prometem uma oposição acirrada.
A bancada bolsonarista de 2019, então filiada ao PSL (hoje União Brasil), também chegou com forte discurso revolução política, mas, no decorrer do período, se pulverizou no baixo clero e depois foi absorvida pelo PL, um dos maiores símbolos do centrão e da até então atacada "velha política".
O partido de Valdemar Costa Neto tem entre seus integrantes algumas dezenas de parlamentares do "centrão raiz" que podem dar votos a favor de Lula assim que as principais votações do ano começarem, possivelmente no próximo mês.
Em linhas gerais cerca de um terço da bancada pode ser considerada bolsonarista convicta. Os outros dois terços estão vinculados ao centrão.
Maurício do Vôlei boceja enquanto lê papel durante votação no plenário da Câmara dos Deputados
O deputado Maurício do Vôlei (sentado), no plenário da Câmara dos Deputados, durante sessão de votação - Ranier Bragon - 7.mar.2023/Folhapress
No Senado, o mau ano bolsonarista começou com a tentativa de eleição do ex-ministro Rogério Marinho (PL-RN) na disputa com Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O atual presidente da Casa acabou reeleito com 49 votos a 32.
Todos os sete cargos da Mesa Diretora e as presidências das comissões ficaram com partidos que integraram a campanha de Pacheco, escanteando a oposição e estrelas do bolsonarismo raiz, como Damares Alves (Republicanos-DF) e Astronauta Marcos Pontes (PL-SP).
A oposição protestou e diz ainda haver chance de um entendimento, como a criação de comissões para abrigá-la, apesar da resistência do conjunto de siglas que apoiou Pacheco.
"Percebe-se já que há mais bom senso dos dois lados", diz Carlos Portinho (RJ), líder do PL na Casa. Rogério Marinho, que assumiu o posto de líder da oposição, afirma que as conversas continuam. "Espero que nos próximos 15 dias possamos resolver."
Apesar do começo atribulado, há uma avaliação entre parlamentares mais experientes de que o núcleo bolsonarista mais aguerrido tende a se manter fiel ao ex-presidente, tendo em vista o caso de dissidentes que em quatro anos desceram do patamar de votações consagradoras para o fracasso eleitoral em 2022 —como o caso, entre outros, de Joice Hasselmann e Alexandre Frota, ambos de São Paulo.
Lula tenta formar sua base de apoio no Congresso unindo os partidos de esquerda ao MDB, PSD e União Brasil, mas haverá dissidências. Por isso ele também busca no varejo parlamentares do centrão (PL, PP e Republicanos).
Uma base de apoio sólida precisa ter apoio que supere com alguma folga o mínimo necessário para aprovação de emendas à Constituição, 308 dos 513 deputados e 49 dos 81 senadores.
Tanto oposição como governo afirmam que Lula ainda não atingiu esse patamar.
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