Paul Chambers, eminente estudioso da Tailândia, foi preso sob a acusação de criticar a monarquia tailandesa. Chambers é um dos alvos mais notórios da repressão à dissidência e aos críticos do rei mais rico do mundo.
Michael G. Vann
Em 8 de abril de 2025, o Dr. Paul Chambers respondeu a um mandado de prisão em uma delegacia de polícia local em Phitsanulok, no norte da Tailândia. O mandado foi emitido em 31 de março e não havia nenhuma advertência ou intimação prévia para ele se apresentar.
Chabers foi imediatamente preso por suposta violação da Seção 112 do Código Penal, comumente conhecida como lei de lesa-majestade, e da Lei de Crimes Informáticos. O crime de insulto ao monarca pode resultar em quinze anos de prisão por infração.
A Terceira Região do Exército da Tailândia teria apresentado a queixa contra Chambers, um cidadão estadunidense. O Tribunal Provincial de Phitsanulok posteriormente negou-lhe fiança e ordenou que ele fosse detido enquanto seus advogados começaram a apelar da decisão judicial.
Após inicialmente declarar que Chambers apresentava risco de fuga por ser estrangeiro, as autoridades tailandesas o libertaram da prisão na quinta-feira, 10 de abril. No entanto, as acusações permanecem válidas e ele é obrigado a usar um monitor eletrônico. E ainda corre o risco de perder o visto e o direito de trabalhar na Tailândia.
Monarquismo e militarismo
Apesar de seu histórico de escândalos e comportamento errático, é extremamente perigoso criticar o Rei Maha Vajiralongkorn, Rama X. Enquanto seu pai, o Rei Bhumibol Adulyadej, que reinou de 1946 a 2016, era uma figura genuinamente popular e reverenciada, o filho não desfruta de tal popularidade e recorreu a medidas autoritárias para silenciar a dissidência e as críticas.
Centenas de cidadãos tailandeses receberam penas severas por atos tão banais como compartilhar postagens em redes sociais de clipes da série Last Week Tonight, de John Oliver, da HBO. Por essa ofensa aparentemente trivial, o ativista político “Busbas” Mongkhon Thirakot recebeu cinquenta anos de prisão. As Nações Unidas e advogados internacionais que defendem os direitos humanos condenaram este e muitos outros casos.
Antes do golpe militar de 1932, os reis tailandeses eram monarcas absolutos. Nas décadas seguintes, uma série de líderes militares desbancou o poder da coroa. Durante a Guerra Fria, no entanto, uma aliança foi firmada entre os militares e a monarquia. Uma série de generais utilizou uma combinação de monarquismo, budismo e militarismo para forjar uma aliança anticomunista, garantindo assim a unidade de uma coalisão nacionalista de direita e um fluxo aparentemente inesgotável de ajuda militar e investimento de capital dos EUA.
Com um patrimônio líquido de US$ 43 bilhões, Rama X é agora o monarca mais rico do mundo, e muitos de seus generais também acumularam fortunas substanciais. Explorando a reverência budista tailandesa pela autoridade sagrada do monarca, os governantes do país tornaram a manifestação de preocupação com a corrupção evidente, oposição ao regime militar ou apelos por reformas democráticas infrações graves, nos termos da Seção 112.
Em janeiro de 2025, um painel de especialistas em direitos humanos das Nações Unidas condenou a lei e exigiu sua revogação imediata:
Segundo o direito internacional, os indivíduos têm o direito de criticar autoridades públicas, incluindo um rei, e de defender pacificamente a reforma de qualquer instituição pública, incluindo a monarquia. […] A lei tailandesa de lesa-majestade é severa e vaga, dando ampla discrição às autoridades e aos tribunais para definir o delito de forma ampla e levou à detenção, indiciamento e punição de mais de 270 pessoas desde 2020, muitas das quais receberam longas sentenças consecutivas pelos tribunais.
Paul Chambers não é o primeiro estrangeiro a ser acusado de insultar a monarquia, mas é o mais notório a ser preso e acusado até hoje.
Chambers dedicou a maior parte de sua carreira a estudos críticos da aliança política entre a liderança militar tailandesa e a Dinastia Chakri, desde 1782 até o presente. No entanto, estas acusações específicas se concentram em uma breve descrição online de um webinar de outubro de 2024 patrocinado pelo ISEAS: Instituto Yusof Ishak, uma das organizações acadêmicas mais prestigiadas de Singapura.
O texto promocional do evento, “Reorganizações Militares e Policiais da Tailândia em 2024: O que Significam?”, apareceu em inglês no site de Singapura, mas foi editado desde então. Supostamente, descrevia o rei da Tailândia como tendo autoridade para decidir sobre mudanças na liderança militar, uma observação política que, aparentemente, os acadêmicos poderiam comprovar com evidências. Os advogados que representam Chambers sustentam que ele não escreveu o texto em questão.
Solidariedade contra o autoritarismo
Descrito como “tranquilo, empático e entusiasmado” pelo venerável Clube de Correspondentes Estrangeiros da Tailândia, Chambers leciona ciência política na Universidade Naresuan e é especialista em política tailandesa, particularmente no papel das forças armadas e da família real. Ele também atua como consultor especial para assuntos internacionais no Centro de Estudos Comunitários da ASEAN da Universidade Naresuan. É um intelectual público renomado no Sudeste Asiático. Fluente em tailandês e casado com uma tailandesa, Chambers tem cerca de trinta anos de experiência na Tailândia.
Chambers tem uma reputação internacional impecável como um acadêmico sério e politicamente engajado. Doutor pelo prestigiado Centro de Estudos do Sudeste Asiático da Northern Illinois University, Chambers é respeitado internacionalmente por seus anos de pesquisa sobre as relações civis-militares no Sudeste Asiático. Ele desenvolveu a noção de “forças armadas monarquizadas” para teorizar sobre uma força armada nacional cuja legitimidade, autoridade e poder são inseparáveis da monarquia que jurou proteger. Chambers argumenta que, nesses casos, a lealdade do exército ao monarca supera seu apoio ao direito constitucional, à democracia e ao governo civil.
Além de seu trabalho na Tailândia, Chambers ocupou cargos no Instituto de Pesquisa da Paz de Frankfurt, no Centro de Excelência Alemão-Sudeste Asiático para Políticas Públicas e Boa Governança, no Instituto Cambojano de Cooperação e Paz, na Universidade de Heidelberg e no Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais de Hamburgo. Trabalhou como consultor do Fórum Democrático do Sul da Ásia, tendo prestado depoimento ao Parlamento Europeu em 2017.
Suas extensas publicações incluem inúmeros periódicos acadêmicos e diversos livros importantes. Em 2017, Chambers e Napisa Waitoolkiat editaram Khaki Capital: The Political Economy of the Military in Southeast Asia [O Capital Cáqui: A Economia Política dos Militares no Sudeste Asiático], uma coletânea de ensaios que demonstrava como o poder econômico pode fluir do cano de uma arma.
Seu livro “Pretorian Kingdom: A History of Military Ascendancy in Thailand”[Reino Pretoriano: Uma História da Ascensão Militar na Tailândia], de 2024, é indiscutivelmente a história crítica mais detalhada de como as forças armadas e a monarquia se tornaram as instituições mais poderosas da Tailândia. Em “Beer in East Asia: A Political Economy” [Cerveja no Leste Asiático: Uma Economia Política], de 2023, coeditado com Nithi Nư̄angčhamnong, ele explorou a história do imperialismo e do capitalismo na Ásia, a maior região produtora e consumidora de cerveja do mundo. Claramente, foram seus estudos sobre a aliança antidemocrática entre militares e a monarquia que levaram à sua prisão.
Até o Departamento de Estado de Marco Rubio se declarou “alarmado” com a prisão de Chambers:
Este caso reforça nossas preocupações de longa data sobre o uso de leis de lesa-majestade na Tailândia. Continuamos a instar as autoridades tailandesas a respeitarem a liberdade de expressão e a garantirem que as leis não sejam usadas para reprimi-la.
Acadêmicos internacionais imediatamente se uniram em defesa de Chambers. Mark S. Cogan, professor associado de estudos de paz e conflitoa na Universidade Kansai Gaidai, no Japão, organizou uma petição online para pressionar por sua libertação. O acadêmico tailandês exilado Pavin Chachavalpongpun continua sendo um dos maiores opositores da Seção 112.
Devemos analisar o caso de Paul Chambers no contexto da prisão de acadêmicos em universidades estadunidenses, do silenciamento de intelectuais na Alemanha, do ataque a acadêmicos pelo governo de Paul Kagame em Ruanda e da intimidação de professores da Indonésia à Turquia. Nesta era de crescente autoritarismo global, a solidariedade internacional com suas vítimas é essencial.
Colaborador
Michael G. Vann é professor de história na Universidade Estadual de Sacramento e autor, com Liz Clarke, de The Great Hanoi Rat Hunt: Empire, Disease, and Modernity in French Colonial Vietnam.
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