Bernardo Jurema
No entanto, enquanto outros países amazônicos como Equador e Colômbia tomaram medidas concretas para controlar o capital fóssil, o Brasil — o sétimo maior emissor do mundo, com um setor de petróleo e gás que responde por 10% do seu PIB — continua a lavar as mãos. Apesar de fazer algum progresso em iniciativas verdes, Lula ainda parece determinado a usar recursos fósseis para impulsionar o desenvolvimento, na esperança de consolidar seu apoio entre o subproletariado e manter o bolsonarismo sob controle. Com base nisso, ele está apoiando uma proposta da estatal petrolífera, Petrobras, para empreender exploração de petróleo na Margem Equatorial, a 500 quilômetros da foz do Rio Amazonas: uma área que poderia conter até 5,6 bilhões de barris de petróleo e aumentar as reservas do Brasil em 37%. Ele também apoiou uma série de megaprojetos de infraestrutura: uma linha ferroviária que poderia acelerar o desmatamento em terras indígenas, uma rodovia cortando a floresta tropical intocada e uma licença renovada para uma grande barragem hidrelétrica. Questionado sobre o impacto ambiental de tais medidas, Lula insistiu que “não vamos desperdiçar nenhuma oportunidade de crescer”.
Como devemos entender essa lacuna entre a retórica verde do presidente e a realidade? Interesses comerciais e políticas nacionalistas há muito tempo estão unidos em apoio à indústria brasileira de combustíveis fósseis. Em 1939, a descoberta de petróleo na Bahia provocou um influxo de empresas estrangeiras e um clamor da população nacional, que viu suas atividades como uma violação da soberania brasileira. Isso levou à campanha nacionalista O petróleo é nosso!, liderada pelo presidente Getúlio Vargas, que culminou na criação da Petrobras em 1953. Nas duas décadas seguintes, a exploração offshore foi uma parte fundamental do esforço do país para reduzir sua dependência de combustível estrangeiro, com o governo estabelecendo uma meta de produzir 500.000 barris por dia até 1985. Uma série de grandes depósitos foram eventualmente descobertos na plataforma continental, primeiro em Sergipe e depois na Bacia de Campos, transformando o Brasil no maior produtor da região.
Em 1997, o monopólio estatal do petróleo do Brasil foi desmantelado e a Agência Nacional do Petróleo foi criada como um órgão federal para supervisionar o setor. O estado continuou sendo o acionista majoritário da Petrobras, mas a empresa agora tinha que competir em igualdade de condições com empresas privadas em processos de licitação, em linha com o programa neoliberal do presidente Fernando Henrique Cardoso. Foi essa estrutura que o Partido dos Trabalhadores (PT) de Lula decidiu desafiar durante seus quatorze anos no cargo (2003-2016), aumentando o investimento e desenvolvendo novas reservas extensas. No final desse período, a produção nacional de petróleo havia disparado para mais de 2,6 milhões de barris por dia, 78% dos quais foram produzidos pela Petrobras. O desenvolvimento industrial foi consistentemente priorizado em detrimento das preocupações ecológicas. O estado financiou a expansão da indústria de carne bovina na Amazônia — um grande impulsionador do desmatamento — enquanto supervisionava o lançamento de vários novos projetos de barragens, incluindo a Belo Monte, que aumentou os níveis de pobreza local e causou invasão urbana na floresta. A repressão era frequentemente usada para lidar com as consequências sociais, com repressões a protestos e mobilizações militares em áreas pobres.
Hoje, Lula frequentemente enquadra a indústria do petróleo como uma ferramenta de justiça econômica, afirmando que "Aqueles que vivem na Amazônia têm direito aos bens materiais que todos os outros têm" - embora quando se trata da destruição e miséria que ela pode infligir às populações locais, ele seja notavelmente menos vocal. O histórico de acidentes do setor na grande Amazônia e em outros lugares, incluindo 62 vazamentos de óleo somente em 2022, é alarmante para dizer o mínimo. E a disputa por petróleo na Margem Equatorial já parece estar causando migração externa de áreas próximas, mesmo antes do primeiro poço ter sido perfurado. A agência ambiental estadual, Ibama, negou o primeiro pedido de exploração da Petrobras, alegando que não havia dado garantias suficientes sobre possíveis vazamentos de óleo nem considerado o impacto em terras indígenas. Outro pedido está agora sob análise.
No entanto, o nacional-desenvolvimentismo não é o único fator que inibe políticas climáticas mais robustas. A poderosa indústria do agronegócio do Brasil também se mobilizou contra elas a todo momento, usando sua influência para minar proteções ambientais, direitos indígenas e regulamentações de pesticidas. O governo também enfrenta pressão sustentada da Petrobras, que está determinada a se tornar a terceira maior produtora do mundo até 2030, e de políticos que buscam atrair mais empregos e receitas para suas regiões. O resultado é uma economia extrativista típica assolada por déficits comerciais e dependência estrangeira. Embora o primeiro governo de Lula tenha conseguido gerar superávits graças ao aumento dos preços das commodities na década de 2000, isso foi impossível de sustentar quando eles caíram na década de 2010. Agora está claro que, enquanto o país resistir a uma transição verde significativa, terá que continuar produzindo bens e serviços para o Norte Global às custas de sua ecologia doméstica. Isso, somado a termos comerciais desfavoráveis e tarifas impostas pelos países avançados, prenderá o Brasil em um ciclo vicioso: depender de suas indústrias extrativas para financiar suas importações e dívidas.
Apesar da necessidade de mudar de rumo, o mais recente plano de negócios da Petrobras aloca 72% de seu investimento total para os setores de petróleo e gás e apenas 11% para iniciativas de "baixo carbono" nos próximos cinco anos. Ela gastará apenas US$ 7 bilhões em fontes de energia não fósseis, como eólica, solar e biocombustíveis, embora as condições para a transição para uma energia mais limpa sejam relativamente favoráveis. O principal cliente de petróleo do Brasil, a China, planeja atingir o pico de consumo antes de 2030 e reduzir sua dependência de combustível importado em meio a tensões com os Estados Unidos. Nesse contexto, ter uma empresa pública como a Petrobras, bem como propriedade pública sobre os recursos naturais, deve permitir que o estado se adapte a esse cenário econômico em mudança: priorizando investimentos estratégicos de longo prazo em vez de imperativos de mercado de curto prazo. Mas ainda não há sinal disso.
Entre os muitos contrastes entre o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e seu antecessor Jair Bolsonaro está sua abordagem diferente ao meio ambiente. Enquanto Bolsonaro descreve o aquecimento global como uma "conspiração marxista", Lula prometeu transformar seu país em uma "potência ambiental" de classe mundial. O primeiro afrouxou as regulamentações sobre empresas madeireiras, autorizou a exploração de petróleo em áreas de rara biodiversidade e enfraqueceu as agências ambientais estaduais. O último, desde que retornou ao cargo para um terceiro mandato em janeiro de 2023, impôs restrições mais rígidas ao desmatamento, que caiu 68% na Amazônia naquele ano. Ele reverteu certas atividades de mineração, usou os serviços de segurança para reprimir práticas comerciais ecologicamente destrutivas, financiou parques nacionais e locais de conservação e renomeou o antigo Ministério do Meio Ambiente para dar destaque às mudanças climáticas.
No entanto, enquanto outros países amazônicos como Equador e Colômbia tomaram medidas concretas para controlar o capital fóssil, o Brasil — o sétimo maior emissor do mundo, com um setor de petróleo e gás que responde por 10% do seu PIB — continua a lavar as mãos. Apesar de fazer algum progresso em iniciativas verdes, Lula ainda parece determinado a usar recursos fósseis para impulsionar o desenvolvimento, na esperança de consolidar seu apoio entre o subproletariado e manter o bolsonarismo sob controle. Com base nisso, ele está apoiando uma proposta da estatal petrolífera, Petrobras, para empreender exploração de petróleo na Margem Equatorial, a 500 quilômetros da foz do Rio Amazonas: uma área que poderia conter até 5,6 bilhões de barris de petróleo e aumentar as reservas do Brasil em 37%. Ele também apoiou uma série de megaprojetos de infraestrutura: uma linha ferroviária que poderia acelerar o desmatamento em terras indígenas, uma rodovia cortando a floresta tropical intocada e uma licença renovada para uma grande barragem hidrelétrica. Questionado sobre o impacto ambiental de tais medidas, Lula insistiu que “não vamos desperdiçar nenhuma oportunidade de crescer”.
Como devemos entender essa lacuna entre a retórica verde do presidente e a realidade? Interesses comerciais e políticas nacionalistas há muito tempo estão unidos em apoio à indústria brasileira de combustíveis fósseis. Em 1939, a descoberta de petróleo na Bahia provocou um influxo de empresas estrangeiras e um clamor da população nacional, que viu suas atividades como uma violação da soberania brasileira. Isso levou à campanha nacionalista O petróleo é nosso!, liderada pelo presidente Getúlio Vargas, que culminou na criação da Petrobras em 1953. Nas duas décadas seguintes, a exploração offshore foi uma parte fundamental do esforço do país para reduzir sua dependência de combustível estrangeiro, com o governo estabelecendo uma meta de produzir 500.000 barris por dia até 1985. Uma série de grandes depósitos foram eventualmente descobertos na plataforma continental, primeiro em Sergipe e depois na Bacia de Campos, transformando o Brasil no maior produtor da região.
Em 1997, o monopólio estatal do petróleo do Brasil foi desmantelado e a Agência Nacional do Petróleo foi criada como um órgão federal para supervisionar o setor. O estado continuou sendo o acionista majoritário da Petrobras, mas a empresa agora tinha que competir em igualdade de condições com empresas privadas em processos de licitação, em linha com o programa neoliberal do presidente Fernando Henrique Cardoso. Foi essa estrutura que o Partido dos Trabalhadores (PT) de Lula decidiu desafiar durante seus quatorze anos no cargo (2003-2016), aumentando o investimento e desenvolvendo novas reservas extensas. No final desse período, a produção nacional de petróleo havia disparado para mais de 2,6 milhões de barris por dia, 78% dos quais foram produzidos pela Petrobras. O desenvolvimento industrial foi consistentemente priorizado em detrimento das preocupações ecológicas. O estado financiou a expansão da indústria de carne bovina na Amazônia — um grande impulsionador do desmatamento — enquanto supervisionava o lançamento de vários novos projetos de barragens, incluindo a Belo Monte, que aumentou os níveis de pobreza local e causou invasão urbana na floresta. A repressão era frequentemente usada para lidar com as consequências sociais, com repressões a protestos e mobilizações militares em áreas pobres.
Hoje, Lula frequentemente enquadra a indústria do petróleo como uma ferramenta de justiça econômica, afirmando que "Aqueles que vivem na Amazônia têm direito aos bens materiais que todos os outros têm" - embora quando se trata da destruição e miséria que ela pode infligir às populações locais, ele seja notavelmente menos vocal. O histórico de acidentes do setor na grande Amazônia e em outros lugares, incluindo 62 vazamentos de óleo somente em 2022, é alarmante para dizer o mínimo. E a disputa por petróleo na Margem Equatorial já parece estar causando migração externa de áreas próximas, mesmo antes do primeiro poço ter sido perfurado. A agência ambiental estadual, Ibama, negou o primeiro pedido de exploração da Petrobras, alegando que não havia dado garantias suficientes sobre possíveis vazamentos de óleo nem considerado o impacto em terras indígenas. Outro pedido está agora sob análise.
No entanto, o nacional-desenvolvimentismo não é o único fator que inibe políticas climáticas mais robustas. A poderosa indústria do agronegócio do Brasil também se mobilizou contra elas a todo momento, usando sua influência para minar proteções ambientais, direitos indígenas e regulamentações de pesticidas. O governo também enfrenta pressão sustentada da Petrobras, que está determinada a se tornar a terceira maior produtora do mundo até 2030, e de políticos que buscam atrair mais empregos e receitas para suas regiões. O resultado é uma economia extrativista típica assolada por déficits comerciais e dependência estrangeira. Embora o primeiro governo de Lula tenha conseguido gerar superávits graças ao aumento dos preços das commodities na década de 2000, isso foi impossível de sustentar quando eles caíram na década de 2010. Agora está claro que, enquanto o país resistir a uma transição verde significativa, terá que continuar produzindo bens e serviços para o Norte Global às custas de sua ecologia doméstica. Isso, somado a termos comerciais desfavoráveis e tarifas impostas pelos países avançados, prenderá o Brasil em um ciclo vicioso: depender de suas indústrias extrativas para financiar suas importações e dívidas.
Apesar da necessidade de mudar de rumo, o mais recente plano de negócios da Petrobras aloca 72% de seu investimento total para os setores de petróleo e gás e apenas 11% para iniciativas de "baixo carbono" nos próximos cinco anos. Ela gastará apenas US$ 7 bilhões em fontes de energia não fósseis, como eólica, solar e biocombustíveis, embora as condições para a transição para uma energia mais limpa sejam relativamente favoráveis. O principal cliente de petróleo do Brasil, a China, planeja atingir o pico de consumo antes de 2030 e reduzir sua dependência de combustível importado em meio a tensões com os Estados Unidos. Nesse contexto, ter uma empresa pública como a Petrobras, bem como propriedade pública sobre os recursos naturais, deve permitir que o estado se adapte a esse cenário econômico em mudança: priorizando investimentos estratégicos de longo prazo em vez de imperativos de mercado de curto prazo. Mas ainda não há sinal disso.
Por meio de suas tentativas retóricas de equilibrar "sustentabilidade" e "desenvolvimento", Lula pode ter comprado tempo suficiente para evitar um desastre de relações públicas quando sediar a COP30 na cidade amazônica de Belém do Pará no ano que vem. Mas logo ele perceberá que não pode quadrar esse círculo. No verão passado, houve ondas de calor recordes no Peru, Paraguai e Bolívia, e temperaturas acima de 40°C em partes do Brasil. Um estudo recente prevê que o centro-oeste, nordeste, norte e sudeste do país podem ficar inabitáveis em cinquenta anos. Enquanto isso, estima-se que entre 10% e 47% da floresta amazônica sofrerá maior estresse hídrico, potencialmente empurrando o ecossistema para além de um ponto crítico e arriscando um colapso irreversível. Dada a inação do governo, caberá aos movimentos sociais do Brasil desafiar o domínio do capital fóssil e do agronegócio — pressionando pela proibição da exploração de petróleo e pela regeneração da floresta tropical. Este é um conflito em que não há meio termo. Lula terá que escolher de que lado está.
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