8 de setembro de 2023

Lula enfrenta climão de aliados e "independência" do centrão após reforma

Republicanos diz que, mesmo com ministério para integrante do partido, segue independente

Marianna Holanda
Renato Machado
Matheus Teixeira
Julia Chaib,
João Gabriel

Folha de S.Paulo

A reforma ministerial anunciada por Lula (PT) na noite desta quarta-feira (6) motivou críticas diretas e indiretas de aliados e levou ministros a saírem a campo para tentar minimizar as reclamações pelo fato de o presidente ter demitido mais uma mulher e realocado um apoiador de primeira hora para acomodar partidos do centrão que estiveram com Jair Bolsonaro (PL).

O "climão" pôde ser notado no desfile de 7 de Setembro na Esplanada dos Ministérios, que contou com a presença de vários ministros.

O ministro Paulo Pimenta (Secom) e o presidente Lula no palanque do desfile de 7 de Setembro - Pedro Ladeira/Folhapress

O saldo das trocas para tentar atrair Republicanos e PP preservou o PT, partido do presidente, e teve a ministra Ana Moser (Esporte) demitida e substituída por um homem.

Com isso, Lula perde o recorde de mulheres no primeiro escalão, tão alardeado durante a transição de governo. No começo, eram 11 em 37 pastas. Agora, são 9 em 38. O maior patamar até então era o de Dilma Rousseff (PT), que teve 10 em 37 ministérios.

Além disso, Márcio França (PSB), titular de Portos e Aeroportos, foi deslocado para o novo Ministério das Micro e Pequenas Empresas. Ele resistia à ideia por achar a nova pasta muito pequena. Defendeu turbinar o ministério, o que o Planalto acabou acatando.

O PSB, porém, manifesta nos bastidores o discurso de insatisfação e de que está sendo prejudicado apesar de ter sido aliado de primeira hora.

André Fufuca (PP-MA) assumirá o Ministério do Esporte e Silvio Costa Filho (Republicanos-PE), o de Portos e Aeroportos.

Há a expectativa de que o PP também receba o comando da Caixa Econômica Federal. Essa troca deve ser oficializada num segundo momento. A atual presidente da Caixa, Rita Serrano, foi indicada por quadros do PT.

O maior risco corrido pelo PT no primeiro escalão foi em relação ao Ministério do Desenvolvimento Social, chefiado por Wellington Dias.

O PP fez uma ofensiva para assumir a pasta e, em determinado momento, as conversas chegaram a envolver um possível fatiamento do ministério. Por esse cenário, o centrão poderia indicar o ministro, mas o Bolsa Família seria retirado da estrutura para permanecer sob a tutela de um petista.

O PT reagiu e o Planalto recuou. A avaliação foi a de que a pasta era muito central para o governo. Enquanto Dias sofria um processo de fritura, a primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, chegou a dizer que o Desenvolvimento Social era o "coração do governo".

Há outros 11 petistas na Esplanada.

Apesar do rearranjo ministerial, ainda é incerto o grau de apoio que PP e Republicanos darão ao governo no Congresso.

O PP é presidido por um dos principais críticos a Lula no momento, o senador e ex-ministro de Bolsonaro Ciro Nogueira (PI).

Já o Republicanos reafirmou em nota nesta quinta-feira (7) o que seus dirigentes já vinham dizendo antes, que a indicação de Costa Filho é uma escolha "pessoal" de Lula e que o partido segue independente em relação ao governo.

Ligado à Igreja Universal do Reino de Deus, o partido esteve fortemente vinculado a Bolsonaro e até hoje mantém em seus quadros, por exemplos, os senadores bolsonaristas Hamilton Mourão (RS), Damares Alves (DF) e Cleitinho (MG).

A sigla também abriga o governador e ex-ministro de Bolsonaro Tarcísio de Freitas, cotado para ser adversário de Lula na eleição de 2026.

Tendo sido realocado para dar abrigo ao Republicanos, o ministro Márcio França falou sobre isso após o desfile de 7 de Setembro, ocasião em que ficou relativamente distante de Lula e dos demais colegas de governo.

Ele disse que postagem que fez nas redes sociais —"Saúdo o @LulaOficial por trazer p/ o Gov @tarcisiogdf e seu partido p/ nos apoiar"— não era uma ironia, mas um chamado à responsabilidade do governador por agora seu partido ser da base do governo Lula.

Após ser demitida, Ana Moser citou publicamente sua "tristeza e consternação" pela perda do cargo, tendo recebido o apoio de atletas, de entidades esportivas e inclusive de Janja.

"Eu também não estou feliz", escreveu a primeira-dama em rede social, ao comentar a publicação de um usuário que lamentava a saída de Ana Moser.

A agora ex-ministra não tinha ligações políticas. Ela é ex-jogadora de vôlei e medalhista olímpica. Além disso, tem um histórico de dedicação a projetos de gestão e a políticas públicas na área. Sua nomeação contou com apoio de ONGs, atletas e também de confederações esportivas.

Ela fez parte de um grupo de atletas que durante a campanha atuou pela eleição do petista. Na transição, participou do grupo de trabalho do tema.

Ministros de Lula buscaram minimizar as insatisfações com a tentativa de atração de Republicanos e PP, o que é essencial para Lula ter uma margem de apoio confortável no Congresso.

Alexandre Padilha (Relações Institucionais) disse nesta quinta que a reforma ministerial para abrir espaço no governo Lula ao centrão é uma forma de "valorização da política".

Padilha minimizou a ausência de Lula na foto que oficializou a entrada de André Fufuca e Silvio Costa Filho no governo.

Ele e o ministro Paulo Pimenta (Comunicação Social) também negaram mal-estar com as trocas ministeriais e o fato de Ana Moser não ter sido mencionada na nota da Presidência que comunicou as mudanças.

Padilha também relativizou o fato de PP e Republicanos seguirem com discurso de que são independentes do governo apesar de terem assumido ministérios na Esplanada. Ele afirmou que as nomeações devem melhorar a relação com as bancadas das siglas na Câmara.

O ministro não comentou a participação ativa das legendas no governo Bolsonaro, cuja pregação golpista a atual gestão costuma ressaltar. Ele preferiu dizer que ambos os partidos criticaram os atos de vandalismo de 8 de janeiro por parte de bolsonaristas.

"Compromisso que tivemos é que aquilo que a bancada já vem garantindo de aprovação dos projetos fundamentais, permitindo retomar o crescimento econômico, a recriação de programa sociais e rechaçar o golpismo de 8 de janeiro continue", disse.

Padilha também afirmou que Lula agradeceu pessoalmente a Ana Moser pela participação no governo, apesar de na nota oficial do governo que comunicou a troca não constar um tópico nesse sentido.

Disse, ainda, que a "grande manifestação de carinho, afeto e compromisso" é que o novo ministro, indicado pelo centrão, seguirá a política pública de esporte prometida por Lula na campanha e durante o começo do governo.

"O último período em que se tentou criminalizar ou desvalorizar a política levou à aventura golpista de 8 de janeiro. Então, esse desfecho valoriza a política", completou.

Pimenta, por sua vez, evitou responder sobre eventual mal-estar criado com Ana Moser e Márcio França.

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