27 de setembro de 2012

Entre os alauítas

Nir Rosen relata da Síria

Nir Rosen



Tradução / O que define o coração da Síria alawita são as cerimônias fúnebres, os funerais. Em Qirdaha, na montanhosa província da Latakia, terra natal da família Assad, vi dois policiais, com motocicletas adornadas com flâmulas com a imagem de Bashar-al-Assad, que subiam uma ladeira. Faziam a escolta de uma ambulância que conduzia o corpo de um tenente-coronel do Exército Sírio. Homens postados na calçada, ao meu lado, davam tiros de metralhadora para o alto, homenagem ao morto. Meus anfitriões e intérpretes locais davam sinais de embaraço. Prefeririam que eu não assistisse àquelas manifestações; disseram que era primeira vez que acontecia. “É o enterro de um mártir”, disse um deles. – “Então, para nós, é como um casamento”. Crianças com uniformes escolares e professores também postados nas calçadas, jogavam arroz e pétalas de flores na direção do cortejo. Cantavam “Só há um Deus e Deus ama os mártires”. Centenas de pessoas vestidas de negro andavam pelas ruas da cidade na direção do santuário local, para a cerimônia fúnebre. De todos os lados, ouviam-se cânticos de “Bem-vindo, oh mártir. Queremos Assad! Todos queremos Assad!”

Era abril, sexto mês de minha viagem pela Síria. Depois que saímos dali, chegaram notícias de outro funeral, ali perto, na vila de Ras al-Ayn, perto da costa. Uma vila de 700 habitantes já tinha então sete mártires, soldados do Exército Sírio; seis desaparecidos ou capturados; e muitos feridos.

“Todos os dias enterramos mártires”, diz um oficial. “Sacrificaram-se pela Síria”. Um homem, ao lado, falou sobre “os crimes deles”; “eles” mataram o soldado porque o soldado era alawita. Um dos meus guias reclama. Diz que não deve usar termos sectários sobre o conflito. “A oposição não nos deixou escolha” – diz um soldado. “Em matéria de negociação, só querem matar”.

Os alawitas – a seita xiita ortodoxa que é a religião dos Assads, cujos crentes permanecem na maioria fiéis ao presidente e ao governo – são cerca de 10% da população. A maioria dos sírios – cerca de 65% – são árabes sunitas. Os alawitas são uma das várias minorias, como os curdos sunitas e cristãos, os drusos, os xiitas não alawitas e os ismailis. Mas os alawitas sempre foram vistos como caso especial.

Os alawitas pouco conhecem dos fundamentos teológicos da própria religião, que é assunto de estudo só por especialistas iniciados. Mas a crença na transmigração das almas, na reencarnação, e na divindade de Ali, primo do Profeta – numa trindade constituída de Ali, Maomé e um de seus companheiros, Salman al Farisi – põem os alawitas em ponto bem distante do centro da curva do Islã dominante. Para muitos alawitas, a religião é menos uma fé rigorosa e impositiva, que uma expressão da própria cultura do grupo.

A identidade alawita gera algum complexo de inferioridade e medo da dominação sunita. Os alawitas gostam de reencenar a história da própria opressão. “O destino dos alawitas jamais foi invejável” – escreveu a historiadora palestina Hanna Batatu. – “Sob os otomanos, foram abusados, vilipendiados e degradados por vários tipos de exclusão; não poucas vezes, suas mulheres e crianças foram capturadas e oferecidas à venda”. Foram praticamente servos dos senhores feudais sunitas que os otomanos impuseram. Só em 1920, quando começou o mandato francês, o poder da elite sunita foi reduzido, e as minorias, entre as quais os alawitas, começaram a gozar de alguma precária mobilidade social. Os alawitas muito reivindicaram, sem sucesso, que os franceses lhes dessem estado à parte, que os protegeria do domínio dos sunitas.

Para os alawitas, a doutrina pan-arabista do Partido Ba’ath, que tomou o poder mediante um golpe, em 1963, foi o meio que encontraram para superar uma identidade sectária. O exército e os empregos no funcionalismo público deram-lhe meios para escapar das vilas empobrecidas. Rapidamente, pessoas de todos os tipos, emigrados do campo para as cidades, mas, sobretudo, alawitas, passaram a dominar os escalões iniciais do exército, os corpos de oficiais e as academias militares. Em 1971, Hafez al-Assad, alawita e ex-piloto da força aérea, já então Ministro da Defesa da Síria, comandou um golpe contra um rival Ba’athista. Quando Hafez morreu em 2000, depois de permanecer trinta anos no poder, seu filho Bashar foi empossado na presidência. Naquele momento, os alawitas haviam-se convertido, de minoria perseguida e marginalizada, em grupo protegido pelo Estado; e o Estado, por sua vez, havia-se convertido em núcleo da identidade alawita.

“Estímulo poderoso para tentar construir a coesão na atual conjuntura, é o grave temor, entre os alawitas de todos os níveis e escalões da sociedade, de que os alawitas sofrerão consequências muito graves, se o atual regime entrar em colapso” – escreveu a historiadora Batatu, em 1981.

Historicamente, os alawitas sempre se mantiveram à margem do Islã que Assad-pai teve de insuflar na Síria, na “islamização” indispensável para que a maioria sunita o aceitasse como presidente da Síria. Os alawitas veem-se como mais “liberais” e mais seculares que os muçulmanos em geral. Podem consumir bebidas alcoólicas; homens e mulheres usam roupas ocidentais; e homens e mulheres interagem livremente em todos os espaços públicos. Não raras vezes, suas opiniões divergem completamente da opinião dos sunitas, mais conservadores. Os alawitas lembram o levante da Fraternidade Muçulmana nos anos 1980s como tempo de violência, quando o regime lutou contra terroristas, até esmagá-los; para os sunitas, foi tempo em que o regime perseguiu brutalmente os sunitas, coletivamente. Naqueles dias, era difícil encontrar um sunita, membro da oposição, que não tivesse perdido um tio, ou que não tivesse pai ou avô na cadeia, preso durante a repressão que se seguiu ao levante coordenado pela Fraternidade Muçulmana. Até agora, a oposição nada disse sobre o que será feito das centenas de milhares de prisioneiros que permanecem nas prisões, no caso de o regime de Assad cair. Os alawitas entendem que têm bons motivos para ter medo.

Na província litorânea de Tartus e em outras partes da região em que vivem os alawitas, foram instalados incontáveis novos postos de controle e revista, comandados por grupos leais a Assad, pelo Exército Sírio ou por membros paramilitares de comitês de resistência popular, em que se misturam uniformes militares e trajes civis. O interior da região armou a própria defesa.

Estive em maio na cidade de Xeique Badr, nas montanhas da província de Tartus. Ali haviam sido mortos 43 membros da resistência local; sete haviam sido capturados, ou eram dados como desaparecidos. Quando eu entrevistava o prefeito, em seu gabinete, veio a notícia de que acabava de chegar mais um soldado ferido. O primeiro mártir da cidade de Xeique Badr foi morto em Daraa, em abril de 2011, um mês depois de iniciado o levante. O mais recente, um coronel morto em Damasco, havia sido enterrado dois dias antes da minha chegada.

A cidade é conhecida por ser terra natal do Xeique Saleh al-Ali, herói da luta anticolonial, que lutou contra os franceses. “Num famoso discurso, ele rejeitou a ideia de estado alawita independente, porque amava a Síria” – disse-me o prefeito, citando de memória partes daquele discurso; ao lado, Abu Haidar, homem da segurança, ouvia. “Não acreditamos em Hafez al-Assad porque fosse alawita, mas porque foi grande patriota” – disse ele. – “Que governo permaneceria no poder por 40 anos, sem o consentimento do povo?”. O prefeito reagiu estremeceu, quando lhe perguntai como responderia a novo presidente que a Síria viesse a ter. Como a maioria dos alawitas que encontrei, não conseguem sequer imaginar governo na Síria, sem algum Assad. Um dos homens que assistia à entrevista perguntou como era possível que – na Líbia, na Tunísia, no Egito, na Arábia Saudita e em toda a parte – o ocidente apoiasse islamistas em vez de “movimentos mais seculares e mais avançados”?

O prefeito, como muitos apoiadores do regime de Assad, acredita que esteja em curso na Síria uma conspiração de fundamentalistas islamistas.

Para eles, os levantes na Tunísia, no Egito e na Líbia não foram irrupções espontâneas de protesto popular, mas conspiração organizada para a qual se uniram os EUA, a Fraternidade Muçulmana e os países do Golfo Árabe. “Não é movimento popular. É movimento salafista” – disse um deles. “O que conseguiram, afinal, as revoluções na Tunísia, Líbia e Egito?” – perguntou Abu Haidar. A ascensão de islamistas ao poder naqueles três países tornou os alawitas sírios ainda mais desconfiados de que o fim do governo Assad venha, algum dia, a significar qualquer tipo de mudança para melhor.

Perguntei a Abu Haidar, o homem da segurança, por que Bashar só começara suas (tímidas) reformas depois que começaram os protestos na Síria em março de 2011. Respondeu-me como respondem os apoiadores do regime, que os eventos de 2003 (invasão do Iraque), 2005 (assassinato do Primeiro-Ministro libanês Rafiq al-Hariri e retirada dos sírios do Líbano), 2006 (guerra de Israel contra o Líbano), 2008 (disputas internas no Líbano) “nos tiraram a liberdade para promover reformas”. Perguntei então se as forças de segurança não haviam atirado contra manifestantes desarmados. Todos responderam que não e insistiram em que o regime proibiu o uso de armas contra manifestantes. Não sei se proibiu ou não, mas sei que houve tiros contra manifestantes. Em seis meses na Síria, estive presente em mais de uma centena de manifestações da oposição. Atiraram contra mim em várias daquelas manifestações. Uma vez, um jovem que estava ao meu lado e atirara uma pedra, recebeu tiros no abdômen e morreu na calçada.

Para viajar em segurança por áreas alawitas, contratei, para me acompanhar, um sargento do exército, dispensado do serviço ativo, de nome Abu Laith, nascido em Rabia, cidade na área rural de Hama. No ano que o conheci jamais o vi comer, mas fumava narguilé cada vez que tinha uma chance; falava constantemente ao telefone, em negociações de seu segundo emprego, como contrabandista de cigarros. Seu salário era de 17 mil liras mensais, cerca de £160. “Não temos conexões no Estado”, contou-me. Por isso, não conseguia emprego no funcionalismo civil: “os únicos empregos que nos restam são o Exército ou serviços de segurança”. Na venda de cigarros contrabandeados, conseguia ganhar 1.000-1.500 liras extras por dia. Vários de seus irmãos estavam ou no Exército ou na Polícia. Dirigindo por áreas que não conhecia, várias vezes perguntou às pessoas como fazer para evitar áreas sunitas. Em alguns pontos, os locais abriram estradas alternativas através de cidades alawitas e cristãs; pelas paredes, viam-se setas pintadas nas paredes, indicando o caminho, para que ônibus e outros carros pudessem evitar os pontos ocupados pela oposição. Quando nos aproximávamos de áreas sunitas, Abu Laith carregava a pistola Makarov. “Vou sair-lhes caro” – explicou. “A coisa mais importante é não morrer sem dar-lhes trabalho”. Falou-me sobre a centena de homens de sua força de segurança regional que haviam sido mortos. Outros duzentos foram feridos. Cinco de seus primos foram mortos.

A maioria dos homens de Rabia servem no Exército ou em forças de segurança em outras partes do país. Muitos vivem em complexos de hospedagem para militares, ou arranjaram casa e família na periferia da grande Damasco onde vivem operários alawitas. Qudsaya, subúrbio sunita de Damasco, inclui dois “enclaves” alawitas: Wurud e “Guarda Republicana”, nome que homenageia os soldados que ganharam casas ali. As duas áreas são contíguas a bairros de operários sunitas; desde o início do levante, começaram os conflitos entre as duas comunidades. Muitos dos prédios foram construídos ilegalmente e às pressas, em terras do Estado. As autoridades fingem que não veem esses acordos informais, porque os moradores são elementos chave das forças de segurança. Aqui, como nas vilas de onde vieram os moradores, há poucas estradas pavimentadas e praticamente não há serviços públicos. Apesar do abandono, são fiéis apoiadores do regime, a guarda pretoriana que se vê nas ruas. Os homens da segurança que nos cercavam argumentaram que a pobreza em que vivem é prova de que os alawitas não extraem qualquer benefício do regime. “Nunca pedimos coisa alguma e nada queremos, além de viver em segurança”.

Quando Abu Laith levou à sua cidade, Rabia, notícias sobre nossa chegada espalharam-se rapidamente. Milhares de moradores organizaram manifestação que pareceu instantânea, espontânea e sincera, de apoio ao regime, no centro da vila, ao lado de uma estátua de Hafez al-Assad segurando um ramo de oliveira e uma espada. A estátua, paga pelos moradores, foi erigida depois do início do levante. Por trás da estátua, um gigantesco pôster com uma foto de Hafez e Bashar. Sobre o pôster, alguém escrevera “Rabia é a toca do leão”, jogo de palavras com assad, que significa “leão”. Fui levado de casa em casa, para que todos pudessem falar dos parentes mortos e feridos, e dos 42 mártires de Rabia. Disse a um grupo de homens da cidade que, quando visitara cidades onde havia bases operacionais da oposição, como Baba Amr em Homs, também ouvira contar de pais e filhos que haviam sido martirizados. “Nossos filhos estavam simplesmente indo trabalhar” – respondeu um coronel do Exército cujo sobrinho foi morto em Idlib. “Há grande diferença entre matar um homem que saiu de casa para ir trabalhar para o Estado, e matar alguém armado que atira contra o Estado. Pode-se dizer que cinco soldados assassinados num posto de passagem foram assassinados por manifestantes pacíficos?”.

Ao longo do ano que passou, os alawitas de Rabia tiveram vários conflitos com moradores sunitas das vilas próximas. No verão, os alunos da cidade não puderam viajar até Hama para os exames escolares, porque a oposição bloqueara a estrada. Cerca de trinta famílias alawitas que viviam em vila próxima, de maioria sunita, mudaram-se para Rabia, sentindo que já não estariam seguros onde viviam antes. As famílias desalojadas de onde viviam sentiram-se frustrados com a resposta que receberam do governo. “Não tínhamos armas. Tivéssemos, teríamos ficado e lutado” – disse-me um velho. “Deveriam ter-nos mandado tanques. Mas a oposição bloqueou todas as estradas. Queremos que o Estado resolva nossos problemas e que o Exército nos devolva às nossas casas. O Exército tem de entrar nessas vilas. Mas estão ocupados, agora, em Hama. Por que o Estado move-se tão devagar?”. O pai de Abu Laith, soldado aposentado, concordou. “Só o Exército poderá resolver isso” – disse ele. “Se respondermos nós mesmos, será visto como violência sectária e as outras vilas sunitas unem-se contra nós. Estamos em menor número”.

De Rabia, parti para o noroeste, na direção de Aziziya, uma remota vila alawita que lutou contra os sunitas da vila vizinha de Tamana. Como em muitas vilas alawitas, a maioria dos homens trabalha ou no Exército ou na segurança. Os sunitas vizinhos apoiam, todos, a oposição; e houve operações de milícias sunitas na área, desde a primavera. Salhab, a vila mais próxima, de tamanho significativo, está acolhendo centenas de mães e crianças alawitas que fugiram de suas casas. A luta entre Aziziya e Tamana não dá sinais de estar amainando. Encontrei várias famílias em estado bem próximo da histeria. Uma mulher recém-chegada a Salhab gritava: “Saímos de lá sob fogo! Nossa dignidade é preciosa! Nosso líder é respeitável. Os sunitas são traidores. Tudo por Bashar!”

“Pedimos reforços ao Estado” – outra queixa várias vezes repetida – “mas não mandaram reforços.” Todos concordam que as relações com os vizinhos sunitas sempre foram amistosas e próximas, até o levante. “Éramos vizinhos” – disse-me uma das mães. – “Comíamos juntos, nos visitávamos, uns as casas dos outros. Houve incitamento sectário. De repente, havia gente nas ruas, gritando, praguejando.” Apesar da frustração com o regime que não os está protegendo – crítica que se ouve em muitas comunidades alawitas –, querem mostrar que sua devoção a Bashar não diminuiu. “Eles podem matar todos nós” – disse uma mulher. “Mas se um de nós restar vivo, continuará a apoiar o presidente.” Há aí uma contradição intrigante. Os alawitas veem-se eles mesmos como os cidadãos mais pobres do país, originários de vilas pobres, negligenciados por Damasco. Mesmo assim, se declaram dispostos a deixar-se matar pelo Estado que, segundo eles mesmos, não os está protegendo.

No início do levante, conheci o Dr. Yahya al-Ahmad, figura influente das áreas de alawitas de classe média de Homs. Naquele momento, sua principal preocupação era trabalhar junto aos seus amigos sunitas para reduzir as tensões sectárias. Eu estava sentado sobre a laje de sua casa durante uma daquelas reuniões, quando atiradores escondidos, de repente, abriram fogo contra nós. Ninguém foi ferido. O Dr. Al-Ahmad e seus amigos suspeitaram de que os atiradores não fossem membros da oposição, mas extremistas leais ao regime. Quando nos encontramos novamente, no início de 2012, as coisas haviam-se deteriorado – a casa havia sido atacada duas vezes com morteiros pela oposição; e o Dr. Al-Ahmad tivera de mudar-se e passava quase todo o tempo numa cidade próxima. Em torno da casa, praticamente todas as lojas estavam fechadas. O Dr. Al-Ahmad contou que alguns alawitas haviam sido sequestrados; e que outros alawitas haviam retaliado. Perguntei quantos alawitas haviam sido mortos. “Mortos? Você quer números? Paramos de contar. Os números deixaram de ter importância”. Meus amigos na oposição várias vezes disseram praticamente a mesma coisa sobre seus mortos.

“Homens armados controlam as coisas” – Yahya continuou. – “Estou armado. É uma resposta. Se o Estado não nos dá segurança, então é conosco. Como alawita, você não pode depender só do Estado. E se os homens que fazem a vigilância caem no sono?” A posição de Yahya mudou. “Há um ano, se você me perguntasse quem poderia substituir Bashar al-Assad eu teria pensado num ou noutro nome. Pergunte hoje, e lhe direi que só aceito Bashar al-Assad”. Mas há nele a mesma ambivalência que se vê em muitos alawitas. “Bashar enfraqueceu a segurança na vida diária. Aí está uma das causas do que se vê hoje”. Tentei que ele reconhecesse o número inadmissível de civis mortos nos ataques do governo contra o povo. “Gente inocente é morta todos os dias” – respondeu ele. “Ninguém pode distinguir, ante um homem armado contra você, se ele é culpado ou inocente. Que governo, no mundo inteiro, aceitaria não se defender?”.

Um alto dirigente do Exército, responsável por Homs, dentre outras cidades, disse-me que 80 oficiais com comandos e sem estão presos por “erros” – abusos, atrocidades, tortura – e que pelo menos dez devem esperar sentenças de 15 anos. A asserção pareceu sem sentido, face à violência do regime contra civis. (Se o Exército Sírio fez qualquer tentativa para disciplinar seu pessoal, não foi divulgada.) Os alawitas não erram, ao sentir que, se se considera a fúria da repressão, o estado sírio está perdido, sem saber o que fazer para protegê-los. Esse sentimento, sobretudo, é o que levou ao crescimento de milícias leais ao Estado, cada dia mais fortes e cada dia mais independentes, que agem em plena impunidade e não raras vezes criam problemas para o governo de Assad. As milícias foram responsáveis por vários massacres em Homs e Hama, mas Bashar não está em posição que lhe permita controlar seus seguidores mais renitentes.

Um engenheiro em Homs, alawita que se aliou à oposição, disse-me que a primeira vez que viu milícias legalistas em ação foi em março de 2011. “Não tinham qualquer comando ou organização. Não eram organizados por ninguém, além deles mesmos” – disse ele. Mas em julho já estavam organizados. E hoje operam por conta própria... Nada mais perigoso numa guerra civil que a gente que vive dela e depende financeiramente dela. Vi acontecer no Líbano. Em Homs o que temos é aberta guerra civil”.

Nos tempos de Hafez al-Assad, a expressão shabiha, que significa “fantasmas”, designava os criminosos e contrabandistas organizados que cooperavam com as forças de segurança. Alguns eram do clã Assad – o irmão de Bashar é famoso por ter esmagado elementos da shabiha Assad que escaparam ao seu controle – mas nunca, em momento algum, foram alawitas. Contudo, quando o levante começou, a palavra shabiha muito rapidamente passou a aplicar-se a milícias legalistas; com o tempo, já designava qualquer força leal ao governo de Assad. Em seguida já se ouviam, nas manifestações pró-regime, cantos dirigidos à oposição e que diziam: “Somos a shabiha! Deem adeus à liberdade! Shabiha para sempre!”.

Um oficial de segurança disse-me que há milhares de shabiha – comitês populares – nas áreas periféricas alawitas de Homs. Não são milícias pagas, disse ele; mas continuam a receber os salários de funcionários públicos que recebiam antes, embora já não compareçam aos locais de trabalho. Reportam-se aos prefeitos locais. “Podem prender qualquer um, de Khaldiyeh ou Bayada [dois bairros sunitas, em Homs]” – disse ele. – E entregam o prisioneiro ao Exército. Trabalham coordenados com o Exército”.

O engenheiro de oposição em Homs foi mais claro: “Shabih é gente que ama Bashar mais do que Bashar se ama ele mesmo. Shabih é uma cultura, não uma pessoa. Eles se sentem acima da lei, sentem que são a lei... Por hora, o estado ainda pode controlá-los, mas não sei se conseguirão controlá-los no futuro. Atualmente, o estado está usando os shabih. O estado criou essa gente”. Os alawitas que se unem à oposição, acrescentou, são vistos como traidores da seita. Alguns alawitas ativos na oposição em Homs, como ele, já morreram nas mãos dessas milícias legalistas: em abril de 2011, numa das principais praças de Homs, uma manifestação pacífica da oposição, da qual participaram até alguns alawitas, terminou num massacre cometido por homens dos comitês populares de apoio a Bashar e do Exército.

O que será dos alawitas, se o regime cair, e o que será da base de apoio popular que está com Assad, são perguntas diferentes. Entre os que apoiam Bashar há outras minorias, além dos alawitas – para nem falar dos muitos sunitas que o apoiam. Desde o início o governo apresentou a oposição como motivada por sectarismo – acusação que estimula ainda mais o sectarismo que parece deplorar. Mas o governo cuidou atentamente de não manifestar qualquer tipo de preferência sectária – o que deixou os alawitas ainda mais desamparados, apesar de sua manifesta solidariedade. Os que defendem Bashar dizem que há diversidade em seu campo; e que a oposição é quase completamente sunita. Mas oficiais e soldados sunitas sempre estiveram lado a lado em unidades de elite do exército, como a 4ª Divisão e a Guarda Republicana. E muitos intelectuais da oposição já admitiram abertamente que, se a base de apoio ao governo de Bashar fosse composta só de alawitas, o regime já teria caído há muito tempo. Se se tratasse exclusivamente de conflito entre sunitas e alawitas, Bashar perderia o apoio que os sunitas sempre lhe garantiram na Síria; e estaria reduzido ao apoio de 10% da população, mais alguns grupos de outras minorias.

Quando perguntei a Abu Rateb, líder do conselho militar de Homs, o que aconteceria ao Exército e aos comitês populares da shabiha, e às centenas de milhares de alawitas armadas, se o governo de Bashar caísse, ele respondeu que eu estava exagerando nos números. Previu o que chamou de “chacina”, mas sentia que uma alternativa para Bashar acabaria por emergir de dentro do sistema e levaria a um acordo. “Bashar é a figura central para ales. Sem Bashar, ficam sem espinha dorsal e perdem a motivação”. Depois de uma transição difícil, pode nascer uma nova Síria, “uma Síria livre, justa e democrática”. Um dos líderes da guerrilha anti-Bashar em Duma, o principal bairro dos subúrbios de Damasco, disse-me que muito se preocupa com combates entre sunitas e alawitas em vilas como Aziziya e Tamana. “Não podemos dizer que nós temos direito de viver aqui, e eles não” – disse ele. Mas “depois da revolução os alawitas voltarão ao lugar natural deles. Quando já não tiverem qualquer autoridade”.

Evidentemente não se sabe qual seria o tal “lugar natural”. Terão de deixar as cidades e voltar para suas áreas rurais étnicas tradicionais? Uma nova geração de especialistas em Síria ativos pelos jornais ocidentais já está discutindo a possibilidade de criar-se um estado alawita à parte. Mas nada ouvi sobre isso dos próprios alawitas. Há muito tempo a Síria é o principal projeto desses alawitas; o modo pelo qual se envolveram foi deixar as vilas tradicionais e mudar-se para uma versão de modernidade.

É possível que terminem cercados em alguma espécie de enclave autônomo, como resultado de uma guerra civil que venha a ser vencida pela oposição. Mas esse não é desejo dos alawitas. Estão convencidos de que combatem hoje pelos velhos ideais do Partido Ba’ath, do nacionalismo sírio e árabe.

De qualquer modo, nenhum estado alawita seria jamais viável: o território tradicional dos alawitas jamais ofereceu o mínimo necessário para que os alawitas ali permanecessem; ali não há serviços nem empregos; e a comunidade seria integralmente dependente de diferentes tipos de apoios externos. É possível que a “revolução síria” acabe nisso. Mas esse jamais foi o objetivo de ninguém.

24 de setembro de 2012

A fábrica de mentiras

Como a política se tornou um negócio

Jill Lepore

The New Yorker

O campo de consultoria política era desconhecido antes que Leone Baxter e Clem Whitaker fundassem Campaigns, Inc., em 1933.

“Eu, Governador da Califórnia, e Como Erradiquei a Pobreza”, livro de Upton Sinclair, é provavelmente a mais excitante peça de campanha eleitoral jamais escrita. Em vez do vazio de sempre, Sinclair, autor de 47 romances, entre os quais, e mais famoso, “A Selva” [The Jungle] escreveu... um romance, uma peça de ficção. “Eu, Governador da Califórnia”, publicado em 1933, anunciava a candidatura de Sinclair sob a forma de uma história ‘no futuro’, na qual Sinclair é eleito governador em 1934 e, já em 1938 havia erradicado a pobreza. “Que me conste”, o autor observava, “é a primeira vez que um romancista decidiu tornar realidade a própria ficção”.

O livro tinha apenas 64 páginas, mas vendeu 150 mil exemplares em quatro meses. Capítulo 1: “Numa noite, em agosto de 1933, cinco membros do Comitê Central do Partido Democrata no Condado reuniram-se para a 16ª Assembleia Distrital do Estado da Califórnia”. Pode não parecer grande coisa, se você esqueceu que, naquele momento, a Califórnia era estado de partido único: em 1931, praticamente todas as 120 cadeiras na Assembleia estadual eram ocupadas por Republicanos; nenhum representante Democrata tinha comitê de alcance estadual na Califórnia. Vale lembrar também que o desemprego, no estado, estava em 29%. Voltando àquela reunião, em agosto de 1933: “O objetivo da reunião era discutir com Upton Sinclair a possibilidade de registrar-se como membro do Partido Democrata e, nessa condição, apresentar-se como candidato ao Governo da Califórnia”. E se Sinclair, socialista conhecido, uma vida inteira dedicada ao socialismo, concorresse como Democrata? Que magnífica virada na trama!

A coisa realmente esquenta depois que Sinclair adota, como slogan de campanha, a frase “END POVERTY IN CALIFÓRNIA” [Erradicar a pobreza na Califórnia] (“Alguém lembrou que com as iniciais dessas palavras podia-se escrever “EPIC” [épico]”); como emblema de campanha, atropela a águia e o falcão (“pessoalmente, não tenho nenhuma simpatia por aves de rapina” – o candidato repete) em favor de uma abelhinha trabalhadeira (“abelhas trabalham duro e, melhor que isso, são muito bem equipadas para a autodefesa”); expõe seu programa de fábricas e fazendas em cooperativa que implementaria sua filosofia de “produção para o uso”, não para o lucro; propõe acabar com os impostos sobre produtos comprados e criar um imposto sobre a renda, algo como 30% sobre tudo que alguém ganhe acima de 50 mil dólares/ano; e promete, não só abrir as portas do Inferno, mas, sobretudo, ser eleito.

Seja como for, foi terrível choque para praticamente todo o mundo quando, em agosto de 1934, Sinclair obteve a indicação do Partido Democrata, com mais votos do que qualquer candidato em qualquer primária na Califórnia jamais obtivera. Acontece assim também no romance – que é o que torna a leitura tão excitante (ou, para muita gente, tão apavorante): constatar que aconteceu, passo a passo, o que Sinclair imaginara que aconteceria. Capítulo 4: “Notícias de que os eleitores Democratas da Califórnia associaram o Partido ao plano EPIC causaram furor em todo o país.” É verdade! “Resultou em ampla discussão do plano em revistas nacionais, o que levou à constituição de um Comitê EPIC Nacional.” Na prática, foi isso! “Declaração de apoio a Sinclair para Governador, assinada por uma centena de grandes autores, e grupos de intelectuais, por todo o país, recomendando a adoção do plano EPIC para outros estados e municípios. Grupo de economistas de visão apoiaram o plano e cartas chegavam, de grande grupo de senadores dos EUA e de cerca de 50 deputados”. O.K., essa parte nunca aconteceu.

Em 1934, Sinclair explicou o que acontecera naquele ano eleitoral, numa continuação não ficcional do romance, que levou o título de “Eu, Candidato a Governador, e Como Fui Detonado” [“I, Candidate for Governor, and How I Got Licked]. “Quando eu era menino, o presidente da Universidade de Harvard escreveu sobre “o intelectual na política” – Sinclair começou. “Narro aqui como um intelectual entrou na política e o que lhe aconteceu”. “Como fui Detonado” foi publicado em capítulos em 50 jornais. No relato, Sinclair conta como, imediatamente depois da Convenção Democrata, o Los Angeles Times passou a publicar, na primeira página, um Box com frases de autoria de Upton Sinclair; e continuou, sem parar, todos os dias, por seis semanas, até a abertura das urnas. “Lendo aquilo, todos os dias” – Sinclair escreveu – “compreendi que a eleição estava perdida”.

Sinclair foi detonado – escreveu ele mesmo – porque a oposição montou o que Sinclair chamou de “uma fábrica de mentiras”. “Contaram-me que havia uma dúzia de jornalistas vasculhando bibliotecas e copiando cada palavra que eu algum dia publicara.” Acharam frases que escreveu em romances, falas de personagens de ficção, e publicavam, todos os dias, como se o próprio Sinclair as tivesse dito. “Tinham uma legião de especialistas em química política, fabricando venenos para lançar nos ares da Califórnia todos os dias, um por dia, por cem dias”. Na verdade, naquele momento, foram apenas dois jornalistas. E a empresa não se chamava Fábrica de Mentiras. Chamava-se Campaigns Inc. (Campanhas e Cia. Ltda.).

***

Campaigns, Inc. foi a primeira empresa de consultoria política da história universal, fundada em 1933 por Clem Whitaker e Leone Baxter. Whitaker, 34 anos, começara a vida como jornalista júnior, bem júnior, de fato: começou a trabalhar como repórter aos 13 anos. Aos 19, já era editor de Cidade, no jornal Sacramento Union; poucos anos depois, colunista de Política do San Francisco Examiner. Era extrovertido e enturmável, tinha orelhas enormes, fumava muito e jamais parava de falar e datilografava só com os dedos indicadores. Criou uma agência de distribuição de notícias por telégrafo, Capitol News Bureau, e distribuía matérias para 80 jornais. Em 1930, vendeu sua empresa para a United Press. Três anos depois, foi contratado, por seu engenho político, por, dentre outros, Sheridan Downey, Democrata proeminente, para ajudá-lo a derrotar um referendum patrocinado pela empresa Pacific Gas and Electric. Downey também contratou Baxter, viúva, 36 anos, que escrevera para o Portland Oregonian, e sugeriu que se unissem as forças, dela e de Whitaker.

Baxter era mignonne, rosto bonito, cabelo ruivo, elegante. Costumava dizer “Oh, ele foi tão fofo” – de quem gostava. Whitaker usava ternos sempre maiores ou menores que ele; os vestidos de Baxter caíam nela como cairiam em Audrey Hepburn. Whitaker e Baxter começaram os negócios da empresa Campaigns, Inc.. Derrotaram o referendo. Whitaker divorciou-se. Em 1938, casou com Baxter. Viviam em Marin County, em casa com piscina aquecida. Começavam o dia com um café da manhã de duas horas, para planejar o dia. Ela às vezes o chamava de Clem; ele sempre a chamou de Baxter.

Em 1934, quando Sinclair ganhou a indicação como candidato dos Democratas, escolheu Downey como candidato a vice-governador (“Uppie and Downey” era o apelido da dupla.) Trabalhar para o Democrata Downey fora uma aberração para Whitaker e Baxter, gente que, como se dizia, “só trabalha à direita da rua”. A empresa Campaigns, Inc., especializara-se em campanhas políticas para empresas, sobretudo para monopólios do tamanho da Standard Oil e Pacific Telephone & Telegraph. A Pacific Gas & Electric ficou tão impressionada, que contratou Campaigns, Inc. com exclusividade.

A consultoria política é quase sempre vista como descendente da indústria da publicidade. Melhor será dizer que a indústria da publicidade é que nasceu como modalidade da consultoria política. Como o cientista político Stanley Kelley explicou certa vez, quando a moderna publicidade nasceu, os grandes clientes tinham tanto interesse em promover uma agenda política quanto uma agenda comercial. Monopólios como Standard Oil e DuPont tinham péssima imagem junto ao grande público: eram vistos como gananciosos e cruéis e, no caso da empresa DuPont, que fabricava munição, sinistra. Então, contrataram empresas de publicidade para encher a opinião pública com ideias positivas sobre “grandes corporações” e, não por acaso, também para apressar a aprovação de leis pró-business. É esse tipo de coisa que Sinclair estava falando quando ele disse que a história americana era uma batalha entre negócios e democracia, e "Até agora", ele escreveu, "o Big Business ganhou todas as escaramuças".

Como muitos Republicanos da Califórnia, Clem Whitaker e Leone Baxter, que eram propagandistas a soldo da Liga Californiana Contra o Sinclairismo, ficaram horrorizados ante a possibilidade de ter Sinclair no governo do estado. Tinham de trabalhar rápido. Foram contratados apenas dois meses antes das eleições, por George Hatfield, candidato a vice-governador numa chapa Republicana que levava, na cabeça, o governador então no cargo, Frank Merriam. Mas não foram contratados para eleger ninguém. Foram contratados para destruir Sinclair. Começaram por trancarem-se, os dois, numa sala, por três dias, com tudo que Sinclair algum dia publicara. “Upton foi derrotado” – disse Whitaker mais tarde, “porque escrevera livros. Daí nasceram os boxes diários no L.A. Times. Um deles, por exemplo:

SINCLAIR SOBRE O MATRIMÔNIO: 
A santidade do casamento. ... Eu tive tanta crença ... não tenho mais.

A frase, como Sinclair explicou em “Como Fui Detonado”, foi tirada de uma passagem, em seu romance de 1911, “Love’s Pilgrimage”, na qual um dos personagens escreve carta de absoluta depressão a um homem que estava tendo um caso com sua mulher. (A novela, detalhe que, adiante, gerou terrível embaraço para Sinclair, é relato autobiográfico de um desastrado primeiro casamento, que terminara em 1912, quando Sinclair pediu o divórcio e citou um evento de adultério. Em 1913, casou-se com sua segunda esposa e viveram juntos até a morte dela, em 1961.) “Claro que as citações não tinham importância alguma” – Baxter disse mais tarde. “Mas só tínhamos um interesse: impedir que ele chegasse ao governo do estado”.

Sinclair perdeu. Provavelmente, teria sido péssimo governador. Mas não é disso, absolutamente, que se trata.

***

Nenhum desenvolvimento único alterou o funcionamento da democracia americana no último século, tanto quanto a consultoria política, uma indústria desconhecida antes da Campaigns, Inc. Nas décadas intermediárias do século XX, os consultores políticos substituíram os chefes partidários quando o direito de exercer o poder político foram obtidos não por votos, mas por dinheiro. Whitaker e Baxter foram as primeiras pessoas a fazer da política um negócio. “Um eleitor, um consumidor” ouvia-se ainda há pouco tempo, como mantra repetido por uma dessas empresas de consultoria política. A frase também foi criada por Campaigns Inc. O “gerenciamento” político de campanhas eleitorais é hoje indústria diversificada, de muitos bilhões de dólares, com “coordenadores” de campanha, redatores de discursos, “pesquisadores”, jornalistas e publicitários que têm papel definitório em tudo, da campanha para eleger o presidente dos EUA às campanhas para eleger o Comitê financeiro da escola do quarteirão. (Atualmente, as campanhas nunca terminam. E os consultores não têm de se ocupar só das campanhas: eles também têm de governar! Mitt Romney, perguntado pelo corpo editorial do Wall Street Journal sobre como selecionaria os membros de seu Gabinete, disse que, provavelmente, contrataria McKinsey para decidir). Mas, por muitos anos, Whitaker e Baxter não tiveram concorrentes, razão pela qual, entre os anos de 1933 a 1955, venceram 70 das 75 campanhas nas quais trabalharam. As campanhas para as quais trabalharam, porque escolheram trabalhar nessas, não em outras, e o modo como conduziram as campanhas modelaram a história do estado da Califórnia e a história dos EUA. De fato, Campaigns, Inc. continua, até hoje, a modelar a política nos EUA.

Em 1934, Upton Sinclair foi detonado, mas muitos candidatos da linha “EPIC” de “Erradicar a Pobreza na Califórnia” foram eleitos, pelo Partido Democrata. A Califórnia tornou-se estado de dois partidos. 24 candidatos pró-EPIC, entre os quais um advogado de Los Angeles de nome Culbert Olson, assumiram como deputados na Assembleia estadual e, quatro anos depois, Olson, já líder da bancada EPIC no estado, foi eleito governador. Olson nomeou Carey McWilliams, também advogado em Los Angeles, além de jornalista e autor de livros, para dirigir a Divisão Estadual na Califórnia para Imigração e Moradia.

Em 1938, McWilliams, amigo de Sinclair, fizera campanha pró-Olson enquanto escrevia “Factories in the Field: The Story of Migratory Farm Labor in Califórnia” – que é como versão não ficcional, de “As vinhas da Ira”. Os dois livros foram publicados em 1939. O de Steinbeck foi proibido, e os Republicanos da assembleia estadual da Califórnia tentaram extinguir a Divisão Estadual na Califórnia para Imigração e Moradia, exclusivamente para conseguir a demissão de McWilliams.

Em 1942, os Republicanos que apoiavam a candidatura do Advogado Geral do Estado, Earl Warren, no esforço para tirar Olson do governo do Estado, convenceram Warren a contratar Whitaker e Baxter para dirigir sua campanha eleitoral. Warren aceitou, meio relutante. Nos anos posteriores à detonação do sinclairismo, Whitaker e Baxter haviam incorporado algumas novas ferramentas à sua caixa de ferramentas de campanha eleitoral. Em 1939, com panfletos como “Enganando os Famintos”, a empresa Campaigns, Inc. havia liderado o esforço para derrotar um projeto de lei estadual, para a Califórnia, a “Proposition 1”, objeto de referendo conhecido como “Ovos com presunto”, que teria criado um imposto de 3% para assegurar pensão de 30 dólares por semana a todos os cidadãos com mais de 50 anos: “ovos com presunto às quintas-feiras”. (Adiante, Harper noticiou: “Em ação típica de campanha de propaganda, imprimiram dez milhões de panfletos; enviaram 50 mil cartas para “indivíduos e funcionários chaves de grupos organizados”; compraram 70 mil polegadas de espaço publicitário em 700 jornais; produziram 3.000 spots de propaganda que distribuíram por 109 estações de rádio; spots filmados e curtas-metragens para exibir em salas de 160 cinemas; 1.000 cartazes gigantes e 18-20 mil cartazes menores.”). Em 1940, produziram material para a campanha presidencial do Republicano Wendell Willkie, que incluía um manual para oradores, com instruções sobre como enfrentar Democratas que houvesse entre o público: “em vez de referir-se ao oponente como “Partido Democrata” ou “Governo do New Deal”, repita sempre, exclusivamente, o nome do candidato”.

Whitaker e Baxter trabalhavam como uma só cabeça, sem falhas. Respondiam junto ao telefone. Liam a correspondência um do outro. Anualmente trocavam de postos: um ano, o presidente era Whitaker, com Baxter vice-presidente da empresa; ano seguinte, o contrário. Ganharam montanhas de dinheiro. Cobravam, por exemplo, para uma campanha de referendo, algo entre 25 mil e 75 mil dólares. Exigiam controle completo sobre o orçamento, para despesas de campanha. (Uma de suas regras: reserve sempre 75% do orçamento que haja para o último mês antes da votação.) A empresa lucrava algo próximo de 250 mil dólares por ano. E Campaigns, Inc. era só uma parte do império. Whitaker e Baxter também comandavam uma agência de publicidade, Clem Whitaker Advertising Agency, que cobrava de cada cliente comissão de 15% por anúncio veiculado. Tinham um serviço de distribuição de releases por telégrafo,Califórnia Feature Service, que distribuía um clipping de noticiário político semanal, a 1.500 “formadores de opinião”, além de charges, editoriais e artigos para 300 jornais. Pequenos jornais do interior do estado viviam praticamente de reproduzir o que quer que recebessem da Agência Califórnia Feature Service; publicavam tudo, quase sempre press releases mal disfarçados como material de editoria, sempre a favor da posição política e do político que Campaigns, Inc. estivesse sendo paga para promover. O truque era distribuir clippings suficientemente disfarçados para passar pelo controle de editores cansados, que nem viam que usavam, como se fosse matéria jornalística, o que não passava de material de propaganda. Um editor de jornal californiano costumava aplicar um teste aos seus jornalistas: “Onde está a ‘pegadinha’?” Lia o material que recebia da Feature Service e os jornalistas tinham de detectar a frase de propaganda.

Whitaker e Baxter não estavam apenas inventando novas técnicas; estavam escrevendo um manual de operação para usuários. Jamais gaste dinheiro em lobby: enrole os eleitores. “Nossa concepção de política prática é que se você constrói um caso suficientemente sólido para convencer ‘o pessoal lá em casa’, não é preciso ter o senador na gaveta,” Baxter explicou. Seja pessoal: é mais fácil vender gente [o candidato], que causas. Se você não tem oposição, se o seu candidato não tem opositor, invente uma oposição, um opositor. Uma vez, trabalhando numa campanha para evitar que o prefeito de San Francisco fosse intimado para depor à Polícia, Whitaker e Baxter construíram toda a campanha contra “O homem sem cara” – ideia de Baxter – que assumiria a prefeitura, no caso de o prefeito sofrer impeachment. Baxter desenhou numa toalha de mesa um homem gordo, fumando um charuto, que se via por baixo de um chapéu que encobria o rosto; e fez reproduzir o desenho em milhares de cartazes pela cidade, com a pergunta: “Quem se esconde por trás da intimação ao Prefeito?”.

Finja que você é a Voz do Povo. Whitaker e Baxter compraram tempo em rádios, patrocinado por um “Comitê Contra a Convocação”. Uma voz cavernosa dizia “A verdade é que a Prefeitura será destruída, trancada, chaveada, cercada, para uso exclusivo do homem sem cara.” O prefeito não foi intimado a depor. Ataque, ataque, ataque, ataque. Whitaker dizia sempre: “Ninguém vence com campanha de defesa”.

Jamais subestime a oposição. A primeira coisa que Whitaker e Baxter sempre fizeram, ao assumir uma campanha, era ‘hibernar’ por uma semana, para escrever um Plano de Campanha. Depois, escreviam o Plano de Campanha da Oposição, no qual antecipavam os movimentos de reação à campanha deles. Não há campanha sem “mote”. O “mote” tem de ser bem simples. Se rimar, melhor. (“For Jimmy and me, vote ‘yes’ on 3”). Não dê explicações. “Quanto mais você se explica, mais difícil arrancar o voto” – dizia Whitaker. Repita sempre a mesma coisa, repita e repita. “Calculamos que se tenha de atrair sete vezes a atenção do eleitor, para fechar uma venda”. (Whitaker) Sutilezas jogam contra. “Palavras curtas, que colam na cabeça: é o que conta.” (Baxter). “Eles têm de morder a isca”. Simplifique, simplifique, simplifique. “Ergue-se uma muralha” – Whitaker advertiu –, “se você inventa de fazer o Sr. e a Sra. Eleitor Norte-americano Médio trabalharem ou pensarem”.

Se há faísca, assopre. “Esse país precisa de partidarismo” – disse Whitaker. Nunca fuja da controvérsia. Ao contrário, crie controvérsias, incendeie as controvérsias. “O norte-americano médio não quer que o eduquem; não quer ser conscientizado; sequer deseja aplicar algum esforço, mínimo que seja, para ser um bom cidadão” – saberes de Whitaker. “Mas há dois meios pelos quais você pode fazê-lo interessar-se na campanha. Só dois, que já comprovamos que funcionam.” Invente uma guerra (“eles gostam de uma boa briga, socos, pancadaria”), ou, então, invente um show (“eles gostam de filmes, gostam de mistérios, gostam de fogos de artifício e desfiles”): “Assim, se não se pode brigar, que seja o show. Se você armar um circo, um bom show de circo, o Sr. e Sra. Norte-americano Médio sairão para olhar”.

Ao vencedor, tudo. “Se você é contratado para lançar um novo modelo de carro” – disse Whitaker – “o cliente não espera que, no primeiro ano, ele seja o primeiro em vendas no país. Mas, em campanhas políticas, ninguém paga placê, não interessam o segundo colocado nem a beleza do show. É vencer ou vencer. Se quiser continuar no ramo, vença”.

Em 1942, o problema com Earl Warren era a seriedade. Baxter disse que, para conseguir o voto das mulheres, ele e a esposa teriam de permitir fotografias de toda a família, com vasta divulgação. A esposa de Warren, Nina, proibiu. “Não queria explorar a família” – contou Baxter. “Mas nós sabíamos que, sem a família, adeus eleição”. A foto foi feita – Earl, Nina e seis filhos. Pareciam o coral da Família Von Trapp de “A noviça rebelde”. Campaigns, Inc., distribuiu três milhões de fotos pelo país.

Mesmo assim, a imagem de Warren, solene, sem jamais sorrir, não ajudava. Vamos usar, então, a seriedade, se é só o que temos. Baxter passou a dizer que a Califórnia precisava, isso sim, de um homem sério, resoluto, em tempos de guerra. “Em tempos de guerra, o eleitor vota anormalmente, movido ainda muito mais pelas emoções” – Whitaker escreveu. “Nessa campanha, os eleitores terão de ouvir o rufar dos tambores e o explodir das bombas da guerra... O tema da campanha tem de ser “Convocação às armas, em defesa da Califórnia!”.

Warren parecia homem “de defesa”, em parte porque, como advogado geral do estado, defendera o confinamento, em campos de concentração, dos japoneses-americanos. “Se os Japs forem soltos”, dizia ele, “ninguém nunca saberá se está diante de um Jap normal ou de um Jap sabotador”. (Warren adiante, manifestou profundo remorso por essa política e, em entrevista que deu em 1972, até chorou). Carey McWilliams era das raras vozes dentro do governo que se opunha aos campos de concentração para japoneses em território dos EUA. Em campanha, Warren jurou que, se eleito, seu primeiro ato no governo seria demitir McWilliams.

Nos últimos 30 dias antes da eleição, Whitaker e Baxter anunciaram em 400 jornais impressos e em 500 rádios. Congestionaram o espaço. Puseram caminhões de som nas ruas, para fazer barulho de buzinas e motores. Atacaram as políticas econômicas de Olson. Redigiram um manual para discursos a favor de Warren; incluía roteiro para “Fala de seis minutos” e “Fala de 15 minutos”. (E um conselho: procure nunca falar mais que 15 minutos – as pessoas ficam entediadas – e em nenhum caso fale mais que meia hora).

Warren ganhou, mas ele não gostou do jeito que ele ganhou. Pouco antes das eleições, depois que Whitaker e Baxter emitiram um comunicado de imprensa sem a aprovação, ele os demitiu. Eles nunca o perdoaram.

***

No outono de 1944, Warren foi acometido de uma grave infecção renal. A doença o fez pensar sobre os altos custos do atendimento médico, sempre em alta, e os efeitos catastróficos que uma doença repentina teria sobre uma família menos provida de recursos que a dele. “Cheguei à conclusão de que o único modo de remediar essa situação é criar uma espécie de seguro-saúde” – escreveu em suas memórias. Mandou sua equipe desenvolver uma proposta. “Concluímos que o seguro-saúde deveria ser recolhido pelo Sistema de Seguridade Social. Depois de alguns estudos, decidiu-se que empregados e empregadores no SSS teriam de contribuir com 1% e 1,5% do valor dos salários recebidos e pagos”. Depois de reunião com a Associação Médica da Califórnia, Warren não esperava oposição dos médicos. Assim, em janeiro de 1945, no discurso de início de ano, de relatório de feitos e perspectivas para o futuro do estado do Estado da Califórnia, ele anunciou sua proposta, de criar um seguro-saúde abrangente e compulsório.

Earl Warren iniciou sua carreira política como conservador e terminou como esquerdista, um dos mais odiados da história dos EUA. O que houve? Uma das respostas é: Whitaker e Baxter.

Contratados pela Associação Médica da Califórnia com remuneração anual de 25 mil dólares, para combater o plano do governador Warren, Whitaker e Baxter tomaram uma peça de lei que todos tinham apreciado muito e ensinou a população da Califórnia a odiá-la. “Não se pode bater em alguém, sem porrete” – a dupla gostava de dizer. Lançaram uma campanha a favor de os californianos comprarem, privadamente, cada cidadão, o seu próprio seguro-saúde. Inventaram uma Semana da Compra do Seguro-Saúde Voluntário, movida a 40 mil polegadas de publicidade pelos jornais em mais de 400 jornais. A semana aconteceu em 53 dos 58 condados do estado da Califórnia. Whitaker e Baxter distribuíram pelo país mais de 9 mil médicos, todos com discursos preparados. Criaram um slogan: “Medicina politizada não é boa medicina”.

Dessa vez, fizeram lobby direto sobre os editores de jornais. Whitaker se jactava de que “nosso pessoal telefonou pessoalmente para mais de 500 redações de jornais”, para convencer os editores a mudar de lado. Muitos daqueles jornais viviam dos anunciantes que lhes chegavam pela Campaigns, Inc., e recebiam centenas de artigos gratuitos, semanalmente, enviados pela Agência California Feature Service. “Em três anos” – Whitaker contabilizou – “o números de jornais que apoiavam a medicina do Estado caiu, de 50 para 20. O número de jornais que se opunham ao seguro-saúde compulsório saltou, de cerca de 100, para 432”.

Inventaram um inimigo. Enviaram 27 mil cópias de um panfleto intitulado “A Questão da Saúde”, em que se via um homem, uma mulher e uma criança numa selva – “uma floresta de medo” – ameaçados por esqueletos que tinham na boca, em vez de dentes, a palavra “LEI”. Whitaker e Baxter distribuíram 2,5 milhões de outro panfleto, intitulado “Medicina Politicamente Controlada”. Imprimiram cartões postais para que os eleitores enviassem pelo Correio aos senadores:

Prezado Senador: 
Por favor, vote contra todas as propostas de lei que visem a criar o Seguro Compulsório de Saúde. Há leis demais nesse país. Ninguém tem qualquer interesse em ouvir opinião de algum “médico do Estado”, nem de pagar a ele mesmo sem estar doente. Esse sistema foi inventado na Alemanha – é um dos pilares da monstruosidade contra a qual os nossos rapazes lutam em terras distantes. Não podemos permitir aqui a mesma monstruosidade.

Em 1945, a proposta de lei de Warren foi derrotada, por apenas um voto de diferença. Biógrafo de Warren, G. Edward White anotou: “O desmonte de seu plano de saúde foi uma confirmação, para Warren da natureza do processo político, onde quem advogue a favor de programas sociais e humanos, é atropelado pelos interesses mais mesquinhos, mais baixos, mais vingativos”. Warren reapresentou o mesmo projeto de lei. Outra vez Whitaker e Baxter o derrotaram. “Invadiram como um tufão a Assembleia estadual” – Warren escreveu adiante. – “Minha lei não mereceu, sequer, enterro decente”. Foi a mais avassaladora vitória da publicidade política, que o país jamais vira. Evidentemente, não foi a última.


Em 1945, meses depois de Earl Warren ter apresentado a proposta de seguro-saúde obrigatório na Califórnia, Harry Truman propôs um programa nacional público de saúde. “A saúde das crianças norte-americanas, como a educação, têm de ser reconhecidas como responsabilidade pública bem clara” – disse o presidente. Quando os Republicanos assumiram o controle do Congresso em 1946, o programa de seguro-saúde federal de Truman, o qual, como o de Warren, recebia recursos de imposto a ser cobrado sobre os salários, empacou. No seu discurso do Estado da União em 1948, ano de eleições, Truman pediu urgência na aprovação de seu plano – que contava com amplo apoio popular.Em novembro, Truman venceu as eleições. Dias depois, a Associação Médica Americana telefonou para a sede, em San Francisco, da empresa Campaigns, Inc. A Associação Médica Americana contratou Whitaker e Baxter, ao custo de 100 mil dólares anuais, e com orçamento anual de mais de um milhão de dólares, para detonar o plano de Truman. Para pagar tudo isso, a Associação Médica Americana passou a recolher contribuição anual de 25 dólares de todos os médicos associados.

No início de 1949, Whitaker e Baxter, diretores da Campanha Nacional de Educação da Associação Médica Americana, avançaram para a política nacional, instalando o quartel-general da empresa em Chicago, com equipe de 37 profissionais. “Essa campanha terá de despertar e alertar o povo americano, em todas as circunstâncias da vida, até gerar uma cruzada pública e luta fundamental pela liberdade” – lia-se na abertura do plano da campanha. – “Qualquer outro plano de ação, se se considera a deriva mundial rumo ao socialismo e ao despotismo, nos arrastará ao desastre”. Mas quando Whitaker disse à imprensa de Washington, num almoço, que o FBI estava aterrorizando a Associação Médica Americana, o Washington Post reagiu: melhor que a Associação dos Médicos e os paus-mandados de Whitaker e Baxter parem, isso sim, de se “autoflagelar em campanha neurótica, tentando aterrorizar a opinião pública dos EUA, cada vez que o governo propõe algum plano nacional de Saúde ou uma Secretaria de Bem-estar Social”.

Whitaker e Baxter foram a Washington e convenceram 100 congressistas a permitir que lessem as cartas que recebiam dos eleitores. No início da campanha, Whitaker contou, as cartas chegavam “na proporção de 4,5 cartas a favor, para uma carta contra” o plano de Truman. Whitaker e Baxter puseram mãos à obra. “Nove meses mais tarde, a proporção era de 4 cartas contra, para uma a favor”.

Nessa altura, a empresa Campaigns, Inc. já era vista, pelo menos por um punhado de críticos, como empreendimento nebuloso e nefando. “Mas não há mistério algum” – Whitaker insistiu. Em manobra brilhante, Whitaker redigiu um “Esboço Simplificado da Campanha Contra o Seguro Compulsório de Saúde” e distribuiu – centenas de milhares de exemplares – a repórteres e editores, dentre outros ‘formadores de opinião, e a todos os deputados e senadores.

Dentro do quartel-general de Campaigns, Inc. circulava outro Plano de Campanha, muito mais detalhado, datilografado e marcado “CONFIDENCIAL. NÃO DEVE SER PUBLICADO” (Esse plano está hoje arquivado, como outros documentos da empresa, nos Arquivos do Estado da Califórnia, em Sacramento.) Ali se lê, dentre outras coisas:

1. O objetivo imediato é derrotar o programa compulsório de seguro-saúde a ser votado no Congresso. 2. O objetivo de longo prazo é por fim, para sempre, na agitação a favor da medicina socializada nesse país, pelos seguintes meios: acordar o povo norte-americano para o perigo que é um sistema de saúde pública, politicamente controlado e regulado pelo governo; convencer o povo, mediante campanha nacional ampla de educação, das superiores vantagens da medicina privada como é hoje praticada nos EUA, se comparada aos sistemas médicos dominados pelo Estado em outros países; e estimular o crescimento de sistemas de seguro-saúde privados, de adesão voluntária, para separar doença e choque econômico e aumentar a oferta de atenção médica para o povo dos EUA.

Como Whitaker e Baxter escreveram, numa versão prévia do plano: A questão básica é se continuaremos a ser nação livre, na qual o indivíduo pode traçar o próprio destino, ou se daremos os poucos passos que faltam na direção de nos converter em Estado Socialista ou Comunista. Temos de pintar o quadro, com palavras vívidas, que absolutamente todos entendam, de Alemanha, Rússia – e no final, de Inglaterra. Definiram o slogan “Mantenha a política fora da medicina”. E decidiram reutilizar o golpe que já funcionara contra o plano de Warren: passaram a chamar o plano de Truman de “medicina socializada”.

No esforço para doutrinar todos os médicos, enfermeiras e farmacêuticos nos EUA sobre os perigos da medicina socializada, puseram o pé na estrada. Whitaker, falando num encontro com 200 médicos do Conselho das Associações Médicas da Nova Inglaterra, disse:

Hitler e Stalin e os governos socialistas da Grã-Bretanha todos usaram o ópio da medicina socializada para suprimir a dor da liberdade perdida e induzir o povo à passividade e a não resistência. Se permitirmos que o contágio da medicina socializada que vem do Velho Mundo atinja o Novo Mundo, será o começo do fim de todas as instituições livres nos EUA. Será simples questão de tempo, até que todas as estradas de ferro, fábricas de aço, indústrias de energia, bancos, fazendas e outras propriedades sejam também estatizadas.

A propaganda política, disse ele, era a derradeira esperança de salvar a democracia: "Vamos levar a julgamento os inimigos da saúde dos norte-americanos, ante o tribunal da opinião pública. E o povo decidirá."

Para esse objetivo, a Campanha de Educação Nacional distribuiu milhões de mensagens por Correio. Nem sempre foram bem recebidas. “RECEBI SUA CARTA PARA ME METER MEDO. RIDÍCULA. DÁ PENA.” – respondeu um irado farmacêutico de Stamford, New York. – “ESPERO QUE O PRESIDENTE TRUMAN CONSIGA O QUE DESEJA. BOA SORTE AO PRESIDENTE TRUMAN”.

Whitaker e Baxter gostavam de referir-se ao trabalho que faziam como “campanhas de base”. Nesse caso, falavam da luta contra a medicina socializada: “A Associação Médica Americana nessa campanha está levando a discussão até o povo dos EUA, numa cruzada de base que esperamos que, com a ajuda de vocês e de dezenas de milhares de outros, chegará a cada esquina desse país.” Nem todos estavam convencidos de que uma agência de publicidade, nababescamente remunerada para distribuir 7,5 milhões de panfletos intitulados “O Voluntariado é o American Way” pelos consultórios médicos dos EUA seria exatamente “movimento de base”. “Prezados senhores” – um médico escreveu de volta –, “Quanto, mesmo, vocês têm para gastar nesse “lobby de base” de vocês: 2,5 ou 3,5 milhões de dólares?”.

A campanha de Whitaker e Baxter contra o projeto de seguro-saúde nacional custou à Associação Médica Americana quase cinco milhões de dólares e durou mais de três anos. Mas, sim, converteu a reforma necessária, sensível, popular da saúde pública nos EUA, em espantalho tão assustador que, mesmo hoje, milhões de americanos ainda têm medo dela.

Truman estava furioso. Sobre o que, em seu projeto, pudesse ser apresentado como “medicina socializada”, Truman disse à imprensa, em 1952, que não fazia nem alguma remota ideia do que fosse. E tinha mais um comentário a fazer: “Nada, nesse projeto de lei, é mais parecido com socialismo do que o dinheiro que a Associação Médica Americana paga à empresa de Whitaker e Baxter para desmantelar, falsificar e expor à população o meu programa de saúde, pelo que ele não é”.

***

Carey McWilliams jamais tirara os olhos de Whitaker e Baxter, desde “Uppie and Downey”, desde “Ovos com presunto”, desde Earl Warren. Escreveu o plano de uma matéria para The Nation, sobre Whitaker e Baxter. Seu editor, Harold Field, quis publicar imediatamente, mas McWilliams discordou. Disse que precisava ira a San Francisco e “escavar os fatos”.

Escreveu para Whitaker e Baxter, solicitando uma entrevista. “As perguntas são a sério, sem arame farpado e sem truques” – prometeu. “Não tenho intenções ocultas: estou apenas curioso.” E encontrou-se com o casal. E gostou deles. Não concordava com a agenda política deles e, mais grave, entendia que o negócio deles era péssimo para a democracia. Redigiu a matéria e, em maio de 1950, enviou um rascunho para Whitaker e Baxter. Eles leram e devolveram ao autor, com pequenas mudanças, correções de detalhes factuais. Mas o texto que revisaram os deixou muito desapontados.

“Não somos os tipos diabólicos que você descreveu” – Whitaker escreveu a McWilliams. “Estou desapontado por vocês terem ficado desapontados” – McWilliams respondeu. “Vocês não acham que o máximo que se pode esperar nesse assunto é o máximo de abertura e boa vontade, acuidade factual e respeito aos fundamentos do fair play?”.

A matéria “O governo de Whitaker e Baxter” foi publicada em The Nation, dividida em três partes, em abril e maio de 1951. Whitaker e Baxter escreveram a McWilliams: “Parece a nós dois que, apesar de você não nos ter poupado de afirmações pesadas, nos pontos em que supunha que estivesse fazendo o maior bem, você, com certeza, não fez qualquer injúria pessoal a Whitaker e Baxter. Tudo considerado, pode ser até um reforço. Agradecemos por tudo, Carey, profundamente”.

McWilliams, como Whitaker e Baxter com certeza logo perceberam, jogara por regras diferentes das suas. Não foi ingênuo nem simplório. Não os agrediu. Explicou demorada e detalhadamente o que havia a explicar. Não construiu um inimigo. Não tirou de contexto o que a dupla lhe disse. Não inventou frases. Nenhuma mentira.

“Nos círculos sindicais e de esquerda na Califórnia as pessoas têm calafrios quando se menciona os nomes de Whitaker e Baxter” – escreveu em The Nation – “mas é preciso reconhecer que eles sabem como falar ao povo. Sim, tem quantidades monstro de dinheiro para gastar; mas não se pode dizer que seus opositores sejam pés-rapados”. Falou, por exemplo, das quantidades de dinheiro também monstro com que contam os sindicatos, por exemplo. Mas McWilliams, isso sim, estava convencido de que Whitaker e Baxter tinham excessivo poder. No caso da Associação Médica Americana, por exemplo, disse McWilliams, “a dupla escreveu um roteiro político do qual os médicos, originalmente considerados peso-pesados na defesa de interesses de uma específica indústria, emergem como cruzados da saúde do povo”. Inacreditável. E muito perigoso. “Trata-se de gerenciamento de alta especialização, da política: somos governados por Whitaker e Baxter”. Vivemos exatamente assim, hoje.

A matéria não passou totalmente despercebida. Em 1952, muitos médicos desligaram-se da Associação Médica Americana. James H. Means, professor de Medicina, na cátedra Jackson, de Harvard, e médico-chefe do Massachusetts General Hospital, explicou que não queria continuar a pagar contribuições que haviam sido usadas para apoiar uma atividade que ele considerava “contrária ao bem-estar público e indigna, como profissão”.

Naquele outono, a Associação Média Americana dispensou os serviços de Whitaker e Baxter, explicando que os manter sob contrato comprometeria ostatus não partidário da Associação. Whitaker e Baxter não se incomodaram: foram imediatamente contratados pela campanha presidencial de Eisenhower-Nixon.

***

Em 1952, a televisão foi usada, pela primeira vez, numa campanha presidencial. Em 1948, menos de 3% dos lares norte-americanos tinham aparelho de televisão; em 1952, a proporção aproximava-se rapidamente dos 50%. Naquele ano, os Republicanos gastaram $1,5 milhão em anúncios de televisão; os Democratas, $77 mil. Na televisão, viam-se spots a favor de Eisenhower – “I Like Ike” e “The Man from Abilene”, temas baseados em pesquisa de George Gallup, apresentadas como documentários. Eram semelhantes aos noticiários de “March of Time”.

Eisenhower era tão pouco habituado a equipamentos de gravação, que uma vez, frente a um microfone ligado, rugiu: “Como funciona essa merda?” Mas, como todos os candidatos que concorreram a presidência depois dele, foi ensinado, treinado, adestrado, empoado e polido. E deu certo. Num spot de TV intitulado “Eisenhower Responde aos EUA”, um jovem negro diz: “General, os Democratas me dizem que as coisas nunca andaram tão bem...” Eisenhower responde “E como poderia ser verdade, se os EUA têm um déficit de milhões, e ainda há combates na Coreia? Nossa realidade é trágica”. Então, olha reto, firme, direto para a câmera. “É mais que hora de mudança”.

Em 1953, Earl Warren tornou-se Procurador Geral de Justiça dos EUA. A campanha “Impeach Earl Warren” começou quase imediatamente depois de Warren ter redigido seu voto no caso Brown vs. Comitê de Educação, em 1954. O voto declarava inconstitucional a segregação racial nas escolas. Em 1955, Carey McWilliams assumiu o posto de editor-chefe de The Nation. Em 1956, Whitaker e Baxter trabalharam nas Relações Públicas para a Convenção Republicana de Indicação do candidato, em San Francisco. Antes disso, foram ouvidos numa Comissão Especial do Senado de Investigação de Atividades Políticas, Lobbyinge Contribuições de Campanha. Whitaker disse à Comissão que se opunha ao financiamento público de campanhas eleitorais e era favorável a que se suspendessem todas as restrições que pesavam sobre doações de grandes corporações a campanhas eleitorais. A comissão não sabia como classificar os ‘consultores políticos’ de campanhas eleitorais. Deveriam ser definidos comolobbyists? Como Comitês de Ação Política? A atividade deveria ser regulada? Whitaker insistiu que o trabalho que sua empresa fazia era, sim, “organização de base” e não deveria ser cerceado por nenhum tipo de regulação.

Adiante, ainda em 1953, Whitaker e Baxter, trabalhando com a empresa californiana Baus and Ross, fez campanha a favor da “Proposition 4”, uma lei que favorecia a indústria do petróleo e lhe dava novas possibilidades de perfuração. O projeto de lei fora redigido pelos advogados da Standard Oil. Whitaker e Baxter venceram. A intervenção considerada decisiva, naquele caso, foi terem modificado o nome da lei: passou a chamar-se Lei de Preservação para Petróleo e Gás.

Em 1958, o filho mais velho, do primeiro casamento de Whitaker, Clem Whitaker Jr., com dois sócios, compraram a empresa Campaigns, Inc. Em 1960, quando Nixon concorreu à presidência, a Campaigns, Inc., coordenou sua campanha na Califórnia. “É indispensável partir para a ofensiva – e atacar” – um dos sócios de Whitaker Jr. aconselhou. Melhor esquecer “os Democratas de esquerda que não votarão em Nixon nem que recebesse apoio pessoal direto de Jesus Cristo e Karl Marx, que baixassem numa das sessões espíritas de Eleanor Roosevelt”. Nixon venceu na Califórnia, mas não se elegeu presidente. Era horrível na televisão. “A televisão, mais que qualquer outra coisa, fez virar a maré” – disse Kennedy. Naquele momento, os Democratas começavam, eles também, a contratar empresas de “consultoria política” para eleições. Todos contrataram. Foi uma corrida armamentista.

Clem Whitaker Pai morreu de enfisema em 1961. Quatro anos depois, quando Ronald Reagan concorreu ao governo da Califórnia, contratou outra empresa californiana, Spencer-Roberts. Spencer-Roberts seguia à risca o livro de regras de Whitaker e Baxter. “Quer saber de uma coisa, Stu?” – Reagan disse a Stuart Spencer em 1966. “Política é como show business... A abertura tem de ser grandiosa. Depois, você se segura como pode. E no fim, encerramento apoteótico”.

Upton Sinclair morreu num asilo, em New Jersey, em 1968. Naquele ano, H. R. Haldeman deixou o emprego de gerente em Los Angeles da agência de publicidade J. Walter Thompson, para dirigir a campanha presidencial de Nixon. Haldeman oferecera seus serviços a Eisenhower-Nixon em 1952, e trabalhara para a campanha do vice-presidente em 1956. Aprendera o ofício com o melhor dos melhores. “Whitaker e Baxter eram os grandes das velhas campanhas” – disse uma vez, relembrando o passado. – “O vovô”.

“Eleitores são basicamente preguiçosos, basicamente desinteressados de fazer qualquer esforço para compreender do que estamos falando” – William Gavin, conselheiro político de Nixon escreveu num memorando. “Raciocinar exige grau mais alto de disciplina, de concentração; a impressão é mais fácil” – escreveu noutro memorando. “A razão puxa o eleitor para trás, assalta-o, exige que ele se manifeste, que concorde ou discorde. A impressão o envolve, convida-o, sem fazer nenhuma exigência intelectual. (...) Quando argumentamos com o eleitor, exigimos que ele faça o esforço de responder. Tentamos capturar a inteligência dele e, para muita gente, pensar inteligentemente é o trabalho mais difícil e cansativo que há. As emoções acordam mais facilmente, estão mais próximas da superfície, são mais maleáveis”.

A campanha de Nixon analisou filmes do candidato na televisão. Falta emoção. “Ele usa os braços muito ‘previsivelmente’ e sacode-se demais” – disse Roger Ailes, conselheiro-chefe da equipe de Richard Nixon para televisão, em 1968. “Mas melhor nem comentar, para não inibi-lo”. Ailes é hoje presidente da rede Fox News.

Depois da morte de Clem Whitaker, Leone Baxter continuou a dirigir empresa só sua, Whitaker and Baxter International. Morava numa cobertura no Fairmont Hotel em San Francisco. Gostava de trabalhar nos bastidores. Só muito raramente, em toda sua vida – morreu em 2001, aos 95 anos – deu entrevistas. Nos anos 1960s abriu uma exceção. Foi-lhe perguntado se “Os procedimentos que a senhora inventou no início desse jogo, e utilizou com tanto sucesso ao longo dos anos, ainda funcionam hoje? Ou a senhora achou necessário alterá-los?”.

“Eu diria que as regras básicas, absolutamente não mudaram” – ela respondeu. – “As estratégias não mudaram”. Houve a televisão, claro. “Mas diria que a filosofia das campanhas políticas absolutamente não mudou, nem uma linha. As ferramentas mudaram. A filosofia, não”.

Também lhe perguntaram se “as Relações Públicas políticas realmente transferem o poder político para os especialistas, os RP, que fazem Relações Públicas?”.

“Pode acontecer, sem dúvida, e aconteceu, em alguns casos” – disse ela, cautelosa. “Nessa profissão de comandar a mente dos homens, aí está a razão pela qual sinto que o poder tem de estar sempre nas mãos dos mais éticos, dos que tenham melhores princípios, de gente que realmente se preocupa com o mundo em que vive. Não sendo assim, o poder acabará nas mãos de gente que não tem qualquer interesse pelo mundo em que vive. Nesse caso, sim, pode ser coisa de alto, alto poder destrutivo”.

15 de setembro de 2012

A resposta revolucionária para o problema do negro nos Estados Unidos

Um relatório entregue por C. L. R. James ao apresentar o projeto de resolução sobre a Questão do Negro à Décima Terceira Convenção do Partido Socialista dos Trabalhadores (EUA), 5 de julho de 1948

C.L.R. James



Introdução por Scott McLemee

ORIGINALLY PRESENTED as a speech to an audience of socialists in the early days of the Cold War, “The Revolutionary Answer to the Negro Problem in the United States” is undoubtedly one of the best-known writings by C. L. R. James from his long study of American politics and culture. It appeared almost exactly ten years after the publication of his book The Black Jacobins: Toussaint L’Ouverture and the San Domingo Revolution (1938). And like that great account of the Haitian liberation struggle, it has earned its place in the classical Marxist tradition as a forceful and incisive treatment of racial oppression, mass action, and revolutionary social change.

But few readers who encountered “Revolutionary answer” in the December 1948 issue of Fourth International magazine had any way to know that James was its author. It appeared under the byline “J. Meyers”—one of several pseudonyms James used to sign the pamphlets and articles he wrote for American radical organizations.

An author’s scattered publications are sometimes called his “fugitive” writings—and “Revolutionary answer” certainly qualifies on that score. But it counts as a fugitive work in another, more concrete sense. Born in Trinidad, then a British colony, James had arrived in the United States in 1938 and overstayed his residency permit. After the Second World War, the Immigration and Naturalization Service and the Federal Bureau of Investigation (FBI) joined forces to locate and expel him as an undesirable (that is, left-wing) alien. They caught up with him during the last two weeks of 1947, though it took six more years before he was deported.

That biographical detail is worth keeping in mind while reading “The revolutionary answer to the Negro problem in the United States”—because when it was delivered at the Socialist Workers Party convention in July 1948, James had J. Edgar Hoover breathing down the back of his neck.

The following year, someone at the FBI prepared a detailed report on James that included an account of his recent articles for the left-wing press. (Evidently the pseudonyms hadn’t done much good.) Surveillance files on “subversives” are notoriously unreliable—often filled with rumor, guesswork, and outright bullshit. But the memo on James was surprisingly accurate. It was the work of someone who could recognize and comprehend the most important points of an argument. And so which article by C. L. R. James did this clear-sighted guardian of the capitalist social order decide needed the longest and most thorough treatment? “The revolutionary answer to the Negro problem in the United States.”

James begins by situating his talk in the “tremendous battle for the minds of the Negro people and for the minds of the population in the United States as a whole over the Negro question.” This was more than a rhetorical gesture. For all the celebration of an “American Century” then underway, the ideological moorings of US power were under great strain.

Years of mobilizing the entire country against Hitler’s racist regime, followed by a massive and ever more strident propaganda offensive against the Soviet police state, left the ruling class in a vulnerable position. It was bad enough for a self-described capitalist democracy that one-tenth of its population was descended from slave laborers who had been exploited and brutalized in an archipelago of concentration camps called “plantations.” That most African Americans remained subject to systematic racial oppression that was fully sanctioned by the state through the force of law was more than hypocrisy; it was a fault line running through the entire structure’s foundation.

A growing awareness of the contradictions was reflected in works that straddled the line between literature and popular culture. At the start of his talk, for example, James makes a joking allusion to Lillian Smith’s Strange Fruit, a controversial and best-selling novel about interracial romance published in 1944. (Its title was borrowed from Billie Holiday’s haunting 1939 song about lynching.) James began a close friendship with Richard Wright as the novelist was finishing the autobiographical manuscript that became Black Boy in 1945—another best seller, like Native Son a few years earlier.

Even the now rather dated formulation “the Negro problem” in James’s title carries overtones of a specific element in the public awareness of race during and just after the war. Marxists had been theorizing about “the Negro question” for decades—and James’s presentation is a concentrated synthesis of perspectives developed by V. I. Lenin, Leon Trotsky, and W. E. B. Du Bois, among others. But in presenting his “Revolutionary answer,” James gives a nod to the subtitle of Gunnar Myrdal’s sociological study An American Dilemma: The Negro Problem and Modern Democracy (1944).

It, too, was a best-seller, though at more than a thousand pages in length (not counting appendices and notes), it was no doubt more often debated than actually read. The great interest in Myrdal’s treatise was driven in large part by pressures from below—including the national march on Washington called by African American labor organizers in 1941 to demand desegregation. President Roosevelt had been too preoccupied with other matters to give serious attention to earlier lobbying efforts, but the prospect of some 100,000 Black demonstrators surrounding the White House seems to have wonderfully concentrated his mind long enough to issue the executive order creating the Fair Employment Practices Committee.

With that concession won, the organizers called off the protest. But a march on Washington movement continued for several years, demanding—in the words of its manifesto from 1942—“an end to Jim Crow in education, in housing, in transportation, and in every other social, economic, and political privilege.” Meanwhile, amid the war effort, racial tensions were building up. In June 1943, Detroit exploded into three days of violence, and riots in Harlem came a few weeks later when a policeman shot an African American soldier.

Writing under the name “W. F. Carleton” in the New International, a Trotskyist journal, James noted that the authorities had been ignoring repeated assaults by white gangs on African American communities, while the police in Detroit went a step further by openly taking sides with white rioters. The lesson was clear:

If Negroes depend on the government, they are going to be dragged from trolleys and beaten up; they and their wives and children will be shot down by rioters and police; and their homes will be wrecked and burned. ... Every school, every street, every church group, can organize for self-defense where official authority has failed them, as it now has.

Membership in the National Association for the Advancement of Colored People (NAACP) grew rapidly at the end of the war—a development James saw as significant quite apart from the criticisms a Marxist might make of the NAACP’s program or leadership. When hundreds of thousands of African Americans rush to join “an organization aiming at the destruction of Negro oppression and discrimination,” he wrote in 1947, “that becomes an indication of a tremendous social ferment in the nation as a whole…. [which] drives them towards unifying their forces for struggle. They are impelled toward the search for solidarity because they realize that all the great problems of the nation and of the Negro minority are now being posed. They gird themselves for a solution of their own.”

At an important but easily misunderstood turn of the argument in “Revolutionary answer,” James cites Lenin’s idea on national self-determination as a key to understanding the tremendous and disproportionate impact of the African American liberation struggle on the whole of American society. It is sometimes construed as evidence that James, for all his anti-Stalinism, accepted something akin to the Black Belt thesis put forward by the Communist International in 1928. (This called for the creation of a new and independent republic for people of African descent, its territory occupying most of the old Confederacy.)

At the very least, the reference to Lenin’s work is taken to mean that he was a Black nationalist—a characterization that James himself rejected unambiguously. In “The historical development of the Negroes in American society” (a major theoretical document from 1943, written within months of the summer’s upheavals) James was quite explicit:

The Negroes... are and have been for many centuries in every sense of the word, Americans. They are not separated from their oppressors by differences of culture, differences of religion, differences of language, as the inhabitants of India or Africa. They are not even regionally separated from the rest of the community as national groups in Russia, Spain, or Yugoslavia. 
The Negroes are for the most part proletarian or semi-proletarian and therefore the struggle of the Negroes is fundamentally a class question. 
The Negroes do not constitute a nation, but, owing to their special situation, their segregation; economic, social, and political oppression; the difference in color which singles them out so easily from the rest of the community; their problems become the problem of a national minority.


The punctuation of that last sentence is certainly a bit problematic, but its thrust is clear: their history and position within the United States makes African Americans an oppressed minority within a multiracial nation-state dominated by capitalism.

James goes on to say that the revolutionary socialist movement must wage “a merciless war against the Negro nationalist movements”—exposing “their fantastic and reactionary proposals for Negro emancipation,” which he calls “magic-carpet programs of salvation.” At the same time, given the overwhelmingly working-class composition of any African American mass movement, it is necessary “to differentiate between the Negro nationalist leaders and their sincere but misguided followers”—just as with the reformist liberalism of the NAACP.

What James has taken from Lenin, then, is not a set of formulas or schemas but a sense of revolutionary method. That means combining close attention to the force and direction of specific forms of struggle against oppression (class or otherwise) with participation in mass movements that have the potential for creating wider forms of solidarity among the victims of capitalism’s constant, self-generated crises.

“The revolutionary answer to the Negro problem in the United States” offers a highly concentrated lesson in that method. Indeed, it has come to overshadow the very resolution on behalf of which James was speaking: the document “Negro liberation through revolutionary socialism,” adopted by the Socialist Workers Party and published in the February 1950 issue of Fourth International. (Like the other material cited here, “Negro liberation” can be readily found online thanks to the Marxist Internet Archive, although the MIA archivists do not identify James as its primary author.)

Even Ahmed Shawki, whose book Black Liberation and Socialism is invaluable for anyone grappling with the issues discussed here, makes the mistake of assuming “Revolutionary answer” itself was the resolution James presented to the convention in 1948. James’s speech is undoubtedly the more powerful document—but one passage in “Negro liberation” is worth pointing out to anyone reading James for the first time:

The government and the bourgeoisie have never underestimated the potential force of the Negro movement and its threat to the capitalist system. The forms and rapidity of its progress will be determined to a large degree by the strength and resolute participation of the party in its struggles and experiences, and its concentration upon promoting the economic and social interests of the Negro masses. We must support this mass movement, develop it, and make it a politically conscious and definitely class movement. In marching hand in hand with it to the end we are marching far beyond its initial goal; we are marching to the very end of the division of society into classes.

It has a special significance in the age of Obama—when lip service to democracy and equality is so much easier to come by than even the slightest improvement in our condition.

A resposta revolucionária para o problema do negro nos Estados Unidos

Camaradas, nosso partido, com esta resolução, está se preparando para fazer uma entrada poderosa em uma capítulo da luta de classes que agora está sendo travada nos Estados Unidos. A decadência do capitalismo em escala mundial, a ascensão do CIO nos Estados Unidos e a luta do povo negro precipitaram uma tremenda batalha pelas mentes do povo negro e pelas mentes da população dos EUA como um todo sobre a questão racial. Nos últimos anos, certos setores da burguesia, reconhecendo a importância dessa questão, fizeram uma poderosa demonstração teórica de sua posição, que apareceu na obra: Um Dilema Americano de Gunnar Myrdal, uma publicação que custou 250 mil dólares. Determinados setores da pequena burguesia sentimental produziram os seus porta-vozes, uma das quais é Lillian Smith. Isso produziu alguns frutos muito estranhos, o que resultou em um livro que vendeu cerca de meio milhão de cópias nos últimos dois anos. A pequena burguesia negra, radical e preocupada com o comunismo, também apresentou sua aposta na pessoa de Richard Wright, cujos livros venderam mais de um milhão de cópias. Quando livros sobre uma questão tão controversa como a questão dos negros chegam ao estágio de vender meio milhão de cópias, isso significa que eles deixaram a esfera da literatura e agora entraram na esfera da política.

O Presidente Harry Truman fez sua declaração literária e teórica no relatório do Comitê de Direitos Civis e também apresentou sua declaração política em suas recomendações ao Congresso para aceitar as propostas desse comitê. O Partido Comunista está fazendo o máximo possível no mesmo campo e declarou em uma de suas plenárias recentes que o teste e o parâmetro de avaliação do trabalho do partido, de sua maturidade nos Estados Unidos, é o trabalho que ele fez e faz sobre a questão do negro.

É nessa batalha que agora nos propomos a entrar, de uma forma mais elaborada, mais consistente e mais militante do que entramos no passado. Esse é o primeiro significado desta resolução. Não é apenas um guia para as ações do partido; sua mera apresentação ao público significará que as políticas do genuíno bolchevismo estão agora prontas para competir totalmente armadas na enorme batalha que está sendo travada sobre a questão dos negros nos Estados Unidos.

Agora, o que temos a dizer que é novo? Em certo sentido – e cito –, “nada é novo”. O que dizemos nesta resolução estava “implícito”, foi uma “concepção subjacente” de nossa atividade no passado. Apareceu em muitas discussões de Trotsky e em vários artigos e discursos. Mas, no entanto, não apareceu de forma consistente, elaborada e finalizada, como nos propomos a fazer nesta resolução.

Podemos comparar o que temos a dizer que é novo, nesse sentido, comparando-o com posições anteriores sobre a questão dos negros no movimento socialista. O proletariado, como sabemos, deve liderar as lutas de todos os oprimidos e de todos os que são perseguidos pelo capitalismo. Mas isso foi interpretado no passado – inclusive por alguns socialistas muito bons – no seguinte sentido: “As lutas independentes do povo negro não têm muito mais que um valor episódico e, de fato, podem constituir um grande perigo não apenas para os próprios negros, mas para o movimento operário organizado. A verdadeira liderança da luta dos negros deve estar nas mãos do trabalho organizado e do partido marxista. Sem isso, a luta dos negros não é apenas fraca, mas provavelmente causará dificuldades aos negros e perigos ao trabalho organizado.” Essa, como eu digo, é a posição mantida por muitos socialistas no passado. Alguns grandes socialistas dos Estados Unidos foram associados a essa atitude.

Nosso ponto de vista

Nós, por outro lado, dizemos algo completamente diferente.

Dizemos, primeiramente, que a luta dos negros, a luta independente dos negros, tem uma vitalidade e validade própria; que tem profundas raízes históricas no passado dos Estados Unidos e nas lutas atuais; possui uma perspectiva política orgânica, pela qual viaja, em um grau ou outro, e tudo mostra que, atualmente, está viajando com grande velocidade e vigor.

Dizemos, em segundo lugar, que esse movimento negro independente é capaz de intervir com uma força extraordinária na vida social e política geral da nação, apesar de ser realizado sob a bandeira dos direitos democráticos e não ser liderado necessariamente pelo movimento trabalhista organizado ou pelo partido marxista.

Dizemos, em terceiro lugar, e isso é o mais importante, que é capaz de exercer uma poderosa influência sobre o proletariado revolucionário, que tem uma grande contribuição a dar ao desenvolvimento do proletariado nos Estados Unidos, e que é em si uma parte constituinte da luta pelo socialismo.

Deste modo, desafiamos diretamente qualquer tentativa de subordinar ou secundarizar o significado social e político da luta negra independente por direitos democráticos. Essa é a nossa posição. Era a posição de Lenin trinta anos atrás. Foi a posição de Trotsky, pela qual ele lutou por muitos anos. Isso foi concretizado pela luta de classes em geral nos Estados Unidos e pelas formidáveis lutas do povo negro. Foi aprimorada e refinada pela controvérsia política em nosso movimento e, o melhor de tudo, teve o benefício de três ou quatro anos de aplicação prática na luta dos negros e na luta de classes pelo Partido dos Trabalhadores Socialistas nos últimos anos.

Agora, se essa posição atingiu o estágio em que podemos apresentá-la da forma que propomos, isso significa que entendê-la atualmente deve ser mais simples do que antes; e simplesmente observando a questão dos negros, o povo negro, ou melhor, as lutas que eles mantiveram e suas idéias, somos capazes de ver as raízes dessa posição de uma maneira que era difícil de ver há dez ou quinze anos atrás. Dizemos que o povo negro, com base em suas próprias experiências, se aproxima das conclusões do marxismo. E terei que ilustrar brevemente isso, como foi mostrado na resolução.

Primeiramente, sobre a questão da guerra imperialista. O povo negro não acredita que as duas últimas guerras e a que pode nos alcançar sejam resultado da necessidade de lutar pela democracia, pela liberdade dos povos perseguidos pela burguesia americana. Eles não podem acreditar nisso.

Sobre a questão do Estado, qual negro, particularmente abaixo da linha Mason-Dixon, acredita que o estado burguês é um estado acima de todas as classes, que atende às necessidades de todo o povo? Eles podem não formular sua crença em termos marxistas, mas sua experiência os leva a rejeitar essa porcaria da democracia burguesa.

Sobre a questão do que é chamado de processo democrático, os negros não acreditam que as queixas, as dificuldades de setores da população sejam resolvidas através de discussões, do voto, de telegramas ao Congresso, do que é conhecido como “caminho americano”.

Finalmente, sobre a questão da ação política. A burguesia americana prega que a providência divina, em sua sabedoria decretou que deveria haver dois partidos políticos nos Estados Unidos, não um, nem três, nem quatro, apenas dois; e também por sua gentileza, a providência divina mostrou que esses dois partidos deveriam ser um, o Partido Democrata, e o outro, o Republicano, para durar a partir de agora até o fim dos tempos.

Isso está sendo desafiado pelo aumento da população nos Estados Unidos. Mas os negros mais do que nunca mostraram – e qualquer conhecimento de sua imprensa e de suas atividades nos diz – que estão dispostos a romper completamente com essa concepção.

Lutas negras recentes

Muitas são as ideias que estão se movendo entre o povo negro. E não se trata apenas de abordar as conclusões do marxismo, à sua maneira instintiva, sob a bandeira dos direitos democráticos. Nos últimos dez ou quinze anos, vimos que o povo negro enfrentou tremendas lutas, significativas em si mesmas, mas ainda mais significativas como um sinal das possibilidades do que está por vir. Nós os vimos revoltar e irromper no Harlem1 em 1935. Vimos isso novamente em 1940, quando a “Marcha sobre Washington” explodiu e abalou a burguesia americana, particularmente o governo Roosevelt. Vimos também em Detroit e em várias outras cidades em 1943 e mais tarde. Vimos explodir recentemente na extraordinária ousadia do movimento Randolph-Reynolds2. E, finalmente e mais importante, no momento em que a burguesia americana apresentou sua organização mais poderosa e impôs sua força sobre o povo americano durante a guerra por meio da máquina militar burguesa americana, vimos indivíduos negros, grupos de negros, massas de negros atirando-se contra essa máquina com um desrespeito imprudente à sua segurança e situação pessoal, o que mostra as potencialidades revolucionárias que estão fervendo entre o povo negro.

Assim, nossa posição teórica, nossa análise da situação entre o povo negro – o que eles estão pensando – está embasada em evidências do que o povo negro tem feito.

Agora, podemos tirar disso uma das primeiras conclusões importantes. O movimento Randolph-Reynolds, a mera declaração de Reynolds e Randolph, causou uma enorme confusão nas fileiras da burguesia. Isso interrompeu a propaganda de mobilização da nação para entrar na guerra. Vocês também viram que isso atrapalhou seriamente a aprovação do importante projeto de lei no Congresso. E se não o que Randolph diz e o que Randolph propõe, mas se o que Randolph expressa pode encontrar a expressão organizacional que esperamos que encontre, então é certo que sob a bandeira dos direitos democráticos dos negros, pedindo apenas por um exército que não pratique a segregação , o povo negro terá um impacto fantástico, nacional e internacional, nos preparativos da burguesia americana para a guerra. É impossível negar isso.

Em segundo lugar, se olharmos para o que aconteceu após a “Marcha sobre Washington” e se olharmos novamente para o que ocorreu no Harlem após o levante de 1943, veremos que o povo negro, por sua atividade de massa independente e por sua determinação em obter seus direitos, deu fortes golpes em um ponto específico do Partido Democrata, a ligação entre o movimento trabalhista organizado e os reacionários do Sul.

Quando a história do Partido Democrata vier a ser escrita, e particularmente a história da dissolução do Partido Democrata, será visto que a luta dos negros independentes, o vigor com que os negros estão protestando, sua determinação em ganhar seus direitos sob a democracia burguesa americana, tem sido um dos meios mais poderosos de romper essa aliança antinatural entre o setor mais avançada da população – o movimento trabalhista organizado – e os reacionários do sul.

Um fator já poderoso

Sob a bandeira dos direitos democráticos dos negros, lutando puramente pelo que parecem ser objetivos limitados, o movimento negro independente está contribuindo para a libertação do proletariado da estrangulação do Partido Democrata e dando a ele uma oportunidade e a possibilidade de emergir como uma força política independente.

Esta é a nossa posição básica. Pode ser concretizada e terá que ser desenvolvida. Mas é evidente que não podemos considerar o movimento negro independente como episódico ou de pouca importância. Faz parte da vida política do país e, mais importante, é de fundamental importância para o desenvolvimento político do proletariado.

Porém, quando isso é dito – temos poucas dúvidas de que será aceito – surge para nós um problema muito importante.

Como bolcheviques, somos ciumentos não apenas teoricamente, mas na prática do papel central do movimento operário organizado em todas as lutas fundamentais contra o capitalismo. É por isso que, durante muitos anos no passado, essa posição sobre a questão racial teve certa dificuldade em ser completamente aceita, particularmente no movimento revolucionário, porque existe essa dificuldade – qual é a relação entre esse movimento e o papel principal do proletariado – sobretudo em razão de muitos negros, e os setores mais disciplinados, fortalecidos, treinados e altamente desenvolvidos dos negros, estarem hoje no movimento trabalhista organizado.

Proposições fundamentais

Agora, notemos primeiro que a resolução não vacila em um único grau sobre as proposições fundamentais. Afirma, por exemplo, que as lutas negras no sul não são meramente uma questão de lutas negras, por mais importantes que sejam. É uma questão de reorganização de todo o sistema agrícola nos Estados Unidos e, portanto, questão da revolução proletária e da reorganização da sociedade sobre bases socialistas.

Em segundo lugar, dizemos no sul que, embora a unidade embrionária entre brancos e negros no movimento trabalhista possa parecer pequena e haja dificuldades nos sindicatos, tal é a decadência da sociedade do sul e tal é o significado fundamental do proletariado, particularmente quando organizado em sindicatos, que este pequeno movimento deve desempenhar o papel decisivo nas inevitáveis lutas revolucionárias.

Em terceiro lugar, a resolução presta muito cuidado e atenção ao fato de que existem pelo menos 1 milhão e 25 mil negros no movimento trabalhista organizado.

Nessas posições fundamentais, não nos movemos uma única polegada. Não apenas não nos movemos, nós as fortalecemos.

Mas ainda resta a pergunta: qual é a relação do movimento de massas negra independente com o movimento trabalhista organizado? E aqui chegamos imediatamente ao que tem sido e será um aspecto muito intrigante, a menos que tenhamos evidente nossa posição fundamental.

Aqueles que acreditam que a questão dos negros é na realidade, pura e simplesmente, ou de forma decisiva, apenas uma questão de classe, apontaram com alegria o tremendo crescimento da quantidade de negros no movimento trabalhista organizado. Em poucos anos, cresceu de trezentos mil para um milhão; agora é um milhão e meio. Mas, para surpresa deles, em vez de diminuir e enfraquecer a luta do movimento negro independente, quanto mais os negros entraram no movimento trabalhista, quanto mais o capitalismo os incorporou na indústria, mais eles foram aceitos no movimento sindical. É durante esse período, desde 1940, que o movimento de massas independente eclodiu com uma força maior do que jamais havia mostrado antes.

Esse é o problema que temos que enfrentar, que temos que entender. Não podemos seguir em frente e não podemos nos explicar a menos que tenhamos isso muito evidente. E eu sei que há dificuldade com isso. Eu pretendo dedicar algum tempo a isso, porque se isso for resolvido, tudo estará resolvido. As outras dificuldades são incidentais. Se, no entanto, isso não estiver claro, estaremos continuamente enfrentando dificuldades que sem dúvida resolveremos a tempo, mas das quais deve ser função desta Convenção tentar nos livrar de uma vez.

Lenin lidou com esse problema e, na resolução, o citamos. Ele diz que a dialética da história é tal que pequenas nações independentes, pequenas nacionalidades, que são impotentes – entenda a palavra, por favor, impotentes – na luta contra o imperialismo, podem, no entanto, atuar como um dos fermentos que pode trazer à cena o real poder contra o imperialismo – o proletariado socialista.

Deixe-me repetir, por favor. Pequenos grupos, nações, nacionalidades, eles sozinhos impotentes contra o imperialismo, podem, no entanto, atuar como um dos fermentos que trará à cena a verdadeira força fundamental contra o capitalismo – o proletariado socialista.

Em outras palavras, como tantas vezes acontece do ponto de vista marxista, do ponto de vista da dialética, essa questão da liderança é muito complicada.

O que Lenin está dizendo é que, embora a força fundamental seja o proletariado, embora esses grupos sejam impotentes, embora o proletariado tenha que liderá-los, isso não significa que eles não possam fazer nada até que o proletariado realmente se apresentar para liderá-los. Ele diz exatamente o oposto.

Eles, por sua agitação, resistência e desenvolvimentos políticos que podem iniciar, podem ser os meios pelos quais o proletariado é trazido à cena.

Nem sempre, e nem toda vez, não é o único meio, mas um dos meios. É isso que precisamos elucidar.

Our task

Now it is very well to see it from the point of view of Marxism which developed these ideas upon the basis of European and Oriental experiences. Lenin and Trotsky applied this principle to the Negro question in the United States. What we have to do is to make it concrete, and one of the best means of doing so is to dig into the history of the Negro people in the United States, and to see the relationship that has developed between them and revolutionary elements in past revolutionary struggles.

For us the center must be the Civil War in the United Slates and I intend briefly now to make some sharp conclusions and see if they can help us arrive at a clearer perspective. Not for historical knowledge, but to watch the movement as it develops before us, helping us to arrive at a clearer perspective as to this difficult relationship between the independent Negro movement and the revolutionary proletariat. The Civil War was a conflict between the revolutionary bourgeoisie and the Southern plantocracy. That we know. That conflict was inevitable.

But for twenty to twenty-five years before the Civil War actually broke out, the masses of the Negroes in the South, through the underground railroad, through revolts, as Aptheker has told us, and by the tremendous support and impetus that they gave to the revolutionary elements among the Abolitionists, absolutely prevented the reactionary bourgeoisie—(revolutionary later)—absolutely prevented the bourgeoisie and the plantocracy from coming to terms as they wanted to do.

In 1850 these two made a great attempt at a compromise. What broke that compromise? It was the Fugitive Slave Act. They could prevent everything else for the time being, but they could not prevent the slaves from coming, and the revolutionaries in the North from assisting them. So that we find that here in the history of the United States such is the situation of the masses of the Negro people and their readiness to revolt at the slightest opportunity, that as far back as the Civil War, in relation to the American bourgeoisie, they formed a force which initiated and stimulated and acted as a ferment.

That is point number one.

Point number two. The Civil War takes its course as it is bound to do. Many Negroes and their leaders make an attempt to get incorporated into the Republican Party and to get their cause embraced by the bourgeoisie. And what happens? The bourgeoisie refuses. It doesn’t want to have Negroes emancipated.

Point number three. As the struggle develops, such is the situation of the Negroes in the United States, that the emancipation of the slaves becomes an absolute necessity, politically, organizationally and from a military point of view.

The Negroes are incorporated into the battle against the South. Not only are they incorporated here, but later they are incorporated also into the military government which smashes down the remnants of resistance in the Southern states.

But, when this is done, the Negroes are deserted by the bourgeoisie, and there falls upon them a very terrible repression.

That is the course of development in the central episode of American history.

Historical anticipations

Now if it is so in the Civil War, we have the right to look to see what happened in the War of Independence. It is likely—it is not always certain—but it is likely that we shall see there some anticipations of the logical development which appeared in the Civil War. They are there.

The Negroes begin by demanding their rights. They say if you are asking that the British free you, then we should have our rights and, furthermore, slavery should be abolished. The American bourgeoisie didn’t react very well to that. The Negroes insisted—those Negroes who were in the North—insisted that they should be allowed to join the Army of Independence. They were refused.

But later Washington found that it was imperative to have them, and four thousand of them fought among the thirty thousand soldiers of Washington. They gained certain rights after independence was achieved. Then sections of the bourgeoisie who were with them deserted them. And the Negro movement collapsed.

We see exactly the same thing but more intensified in the Populist movement. There is a powerful movement of one and one quarter of a million Negroes in the South (the Southern Tenant Farmers Association). They joined the Populist movement and were in the extreme left wing of this movement, when Populism was discussing whether it should go on with the Democratic Party or make the campaign as a third party. The Negroes voted for the third party and for all the most radical planks in the platform.

They fought with the Populist movement. But when Populism was defeated, there fell upon the Negroes between 1896 and about 1910 the desperate, legalized repression and persecution of the Southern states.

Some of us think it is fairly clear that the Garvey movement came and looked to Africa because there was no proletarian movement in the United States to give it a lead, to do for this great eruption of the Negroes what the Civil War and the Populist movement had done for the insurgent Negroes of those days.

And now what can we see today? Today the Negroes in the United States are organized as never before. There are more than half a million in the NAACP and, in addition to that, there are all sorts of Negro groups and organizations—the churches in particular—every single one of which is dominated by the idea that each organization must in some manner or another contribute to the emancipation of the Negroes from capitalist humiliation and from capitalist oppression. So that the independent Negro movement that we see today and which we see growing before our eyes—is nothing strange. It is nothing new. It is something that has always appeared in the American movement at the first serious sign of social crisis.

A sign of the times

It represents a climax to the Negro movements that we have seen in the past. From what we have seen in the past, we would expect it to have its face turned towards the labor movement. And not only from a historical point of view but today concrete experience tells us that the masses of the Negro people today look upon the CIO with a respect and consideration that they give to no other social or political force in the country. To anyone who knows the Negro people, who reads their press—and I am not speaking here specially of the Negro workers—if you watch the Negro petty bourgeoisie—reactionary, reformist types as some of them are, in all their propaganda, in all their agitation—whenever they are in any difficulties, you can see them leaning toward the labor movement. As for the masses of Negroes, they are increasingly pro-labor every day. So that it is not only Marxist ideas; it is not only a question of Bolshevik-Marxist analysis. It is not only a question of the history of Negroes in the US.

The actual concrete facts before us show us, and anyone who wants to see, this important conclusion, that the Negro movement logically and historically and concretely is headed for the proletariat. That is the road it has always taken in the past, the road to the revolutionary forces. Today the proletariat is that force. And if these ideas that we have traced in American revolutionary crises have shown some power in the past, such is the state of the class struggle today, such the antagonisms between bourgeoisie and proletariat, such, too, the impetus of the Negro movements toward the proletariat, that it is clear that the Negro movement toward the revolutionary forces, which we have traced in the past is stronger today than ever before. So that we can look upon this Negro movement not only for what it has been and what it has been able to do—we are able to know as Marxists by our own theory and our examination of American history that it is headed for the proletarian movement, that it must go there. There is nowhere else for it to go.

And further we can see that if it doesn’t go there, the difficulties that the Negroes have suffered in the past when they were deserted by the revolutionary forces, those will be ten, one hundred, ten thousand times as great as in the past. The independent Negro movement, which is boiling and moving, must find its way to the proletariat. If the proletariat is not able to support it, the repression of past times when the revolutionary forces failed the Negroes will be infinitely, I repeat, infinitely, more terrible today.

Therefore our consideration of the independent Negro movement does not lessen the significance of the proletarian—the essentially proletarian—leadership. Not at all. It includes it. We are able to see that the mere existence of the CIO, its mere existence, despite the fakery of the labor leadership on the Negro question, as on all other questions, is a protection and a stimulus to the Negroes.

Penalty of defeat

We are able to see and I will show in a minute that the Negroes are able by their activity to draw the revolutionary elements and more powerful elements in the proletariat to their side. We are coming to that. But we have to draw and emphasize again and again this important conclusion. If—and we have to take these theoretical questions into consideration—if the proletariat is defeated, if the CIO is destroyed, then there will fall upon the Negro people in the US such a repression, such a persecution, comparable to nothing that they have seen in the past. We have seen in Germany and elsewhere the barbarism that capitalism is capable of in its death agony. The Negro people in the US offer a similar opportunity to the American bourgeoisie. The American bourgeoisie have shown their understanding of the opportunity the Negro question gives them to disrupt and to attempt to corrupt and destroy the labor movement.

But the development of capitalism itself has not only given the independent Negro movement this fundamental and sharp relation with the proletariat. It has created Negro proletarians and placed them as proletarians in what were once the most oppressed and exploited masses. But in auto, steel, and coal, for example, these proletarians have now become the vanguard of the workers’ struggle and have brought a substantial number of Negroes to a position of primacy in the struggle against capitalism. The backwardness and humiliation of the Negroes that shoved them into these industries is the very thing which today is bringing them forward, and they are in the very vanguard of the proletarian movement from the very nature of the proletarian struggle itself. Now, how does this complicated interrelationship, this “Leninist” interrelationship express itself? Henry Ford could write a very good thesis on that if he were so inclined.

The Ford experience

The Negroes in the Ford plant were incorporated by Ford: first of all he wanted them for the hard, rough work. I am also informed by the comrades from Detroit he was very anxious to play a paternalistic role with the Negro petty bourgeoisie. He wanted to show them that he was not the person that these people said he was—look! He was giving Negroes opportunities in his plant.

Number three, he was able thus to create divisions between whites and Negroes that allowed him to pursue his anti-union, reactionary way.

What has happened within the last few years that is changed? The mass of the Negroes in the River Rouge plant, I am told, are one of the most powerful sections of the Detroit proletariat. They are leaders in the proletarian struggle, not the stooges Ford intended them to be.

Not only that, they act as leaders not only in the labor movement as a whole but in the Negro community. It is what they say that is decisive there. Which is very sad for Henry. And the Negro petty bourgeois have followed the proletariat. They are now going along with the labor movement; they have left Ford, too. It is said that he has recognized it at last and that he is not going to employ any more Negroes. He thinks he will do better with women. But they will disappoint him, too.

The case of Negro women

Now there we have a movement, essentially proletarian, proletarianized Negroes, Negroes who are part of the organized labor movement and who dominate the Negro community.

Here it would seem is a place where the independent Negro movement should play a strictly subordinate role. But history takes its own course.

Let us look at what happened in Detroit in 1943.

The struggle began over the Sojourner Truth housing development for Negroes. Isn’t that so? It continued by the activity and hostility of the Negro people to being pushed around, and finally the general dissatisfaction burst out in the rioting.

At this stage the organized labor movement had to intervene; absolutely had to intervene. In other words, owing to the activity and conflict of the Negro people, the proletariat begins to get some education in its responsibilities not only for the demands and needs of labor, but for other sections of the population. But it didn’t stay there, it didn’t stay there.

When the municipal election came up, the Negroes wanted to run a candidate. They put up a Negro clergyman (one of those petty bourgeois whom Ford thought he had won over).

Now the revolution sometimes needs the whip of the counter-revolution. Frankensteen, then a CIO leader, was running for Mayor. Mayor Jeffreys and the rest thought they saw an opportunity to discredit Frankensteen’s campaign by calling him a Negro lover and flooding Detroit with information that the victory of Frankensteen would mean that whites and Negroes would have to live in the same houses, and so on.

Naturally Frankensteen (in great difficulty, and sweating no doubt), had to play a peculiar course. He had to remember that the Negroes played a certain role in the labor movement, that he couldn’t afford to antagonize them, that on the whole he had to be careful not to antagonize Negroes in general, and had to preserve the honor of the labor movement; and yet he did not want to give the impression that he was a Negro lover. It was difficult but that is his difficulty; not ours.

What we have to look at is what happened. In spite of themselves the Negro masses found themselves pushed up against the organized labor movement, and though with a lot of confusion, the organized labor movement found itself compelled to take over, so to speak, the leadership of the Negro community. It was very confused and hesitant; but the general line was clear.

Most remarkable of all, this Negro clergyman in the Negro community ran on the CIO ticket. This made Jeffreys say that the Negroes and the labor unions were planning to run Detroit. He was a little bit premature but nevertheless it showed that he could recognize these possibilities.

Beginnings of a great alliance

The movement has fallen off since, but we have seen enough to know this: That the struggle which began by Negro militants in the Negro community fighting purely for Negro rights—a simple matter of housing, and resisting people who pushed them around, resulted ultimately in—let us put it mildly—the beginnings of an alliance, a political alliance between the Negro community and the organized labor movement in Detroit.

I give you this as an example of how complicated the relationships can be between the Negro community and the organized labor movement even in a city where the Negro community is dominated by proletarians of a very high quality who have their first allegiance to the organized labor movement.

If we can reflect on that, if we can constantly be on the alert to see these possibilities, the leadership, the fundamental leadership that organized labor can give to the Negro movement, the basic dependence of the Negro movement upon organized labor; but we can at the same time see the kind of leadership, the kind of stimulus, the kind of impetus, the kind of anticipation that the Negro Movement can give to organized labor, then we shall be able to deal with all problems, not only the general problems outside, but the specific problems that the party will have to face.

Now if all this is true from a theoretical point of view, and if it is true also from a historical point of view, and if we are able to see the signs of it—not too clearly but nevertheless sufficiently for us to draw some tentative conclusions in Detroit—then we, as a party, having participated in Negro work, having taken part in it for the last three or four years, should be able to see this general movement reflected in party life and in the activity of the party. We have been able to see it.

What fundamentally has been the history of the party as I have seen it, as it has been explained, as we have heard it in discussion? The party in 1946 embarked on the task, consciously and deliberately to transform itself from a propaganda group (that is to say, a group that more or less puts over the whole program) into a mass party, in other words, a party which would draw workers not on the basis of general socialist conceptions, but on the basis of concrete activity and readiness to help them on basic problems that were immediately troubling them and which, as far as they could see, required, if not an immediate solution, at least immediate activity. It was the Negroes in the crisis of ’43, ’44, and ’45, who came first to the party and offered the party for the first time the opportunity to draw masses on the basis of agitation and with the perspective of concrete activity. Our general analysis shows that this experience of the party was no accident. It took place this way because of this peculiar relationship of the Negro mass movement to the general struggle. Our first opportunity, our first experience, really to become a mass party was given to us by the Negroes.

Recent party experiences

Now the fact remains that a great number of Negroes who came into the party left. First of all, the most fundamental reason which has been given to me and which I see no reason to disagree with, is that the party was not quite ready to handle these tremendous problems. It could handle a specific case like the Fontana case. It could handle a case like the Hickman case and carry it through to a brilliant conclusion. But the actual day-to-day struggles against the bourgeoisie, and the Negro organizations, and the inertia of the labor movement, we simply were not powerful enough to handle.

And we come to another very important conclusion here for our practical activity. If the vitality of the independent Negro movement depends in the last analysis upon the power and response of the proletariat, then life and activity, the strength of the party’s Negro work must depend also—American society being what it is—upon the strength the party has in the organized labor movement and as a Marxist organization.

You see the pattern continues. It is impossible to be able to do Negro work in the sense that the party at this stage wants to do it, in mass activity, meeting the demands of the Negroes, transformation from a propaganda organization to a mass party, without great strength and power in the organized labor movement. That the convention has dealt with. It is to be remembered that this is a report on the Negro Resolution, but we must never lose sight of that; that was our experience. And in fact, I have been told that the best work has been done and the best Negro cadres have remained where our party was strongest in the labor movement. That must guide us in the coming period.

In addition to these, there were certain subordinate reasons for our difficulties. The Negro militants who came to us came in revolt from the NAACP and these other organizations which were, as usual, like the labor bureaucracy, talking but doing little or nothing. When they came to us, we were not able, under our own banner, as I have said, to carry on a sustained mass activity on these questions.

The correct road for these Negro militants was back into the Negro mass organizations and there to do solid, patient, fraction work as we do in the union movement. But they had just come from there. It was very difficult, it was very difficult for them to understand that they had come from there, to us, only to learn that they had to go back there again.

And, not at all to be forgotten, I am informed that the party didn’t have trained, experienced personnel to be able to lead this work in the way that it should be done. So that we have been more successful with the Negro comrades in the unions, who could work in one of our fractions in the labor movement. That is good, but it is not sufficient.

Now we hope upon the basis of the experience that we have had, upon the fact that certain solid Negro cadres remain, upon the basis of the work that we intend to do with this Resolution, upon the basis of the impetus to thinking, study, penetration in the Negro movement, and observation of the Negroes in the trade union movement, which we hope will come from this Convention and the six months’ discussion, we hope that those opportunities which were presented to us, from which we have gained some capital, we hope that we can begin again, we hope that when opportunities will be presented—we are absolutely sure they will be—then the party will be able to undertake that task and lay a solid foundation in its Negro work.

A permanent feature of activity

And therefore our policy is that a clear consideration of all theoretical issues involved in what is a very difficult, very complicated, and at times can be a very exasperating question, our party proposes to you that we make a permanent, fundamental feature of our work, the work in the Negro organizations.

We say that whatever these Negro organizations are today, they represent the channel whereby the Negro people today or tomorrow will express themselves in the way we have outlined. We make our main orientation the NAACP. That is the most powerful Negro organization. Today it may look to be petty bourgeois, reformist, or whatever you think; that is not the issue.

Behind this organization, or liable to flow into it, or to create an organization which can destroy it at a future date, is the tremendous revolutionary potentiality of the Negro people that we have outlined.

We have to be there, we have to devote ourselves to this work and in much the same way that for us the trade union is the basic place where we can work, whatever may be the position of the labor bureaucracy. We concentrate on the Negro organizations and for the time being as a general rule, the NAACP is the place where we are going to work, because we are confident that the Negro movement has these great potentialities both for itself and in regard to revolutionary developments.

But as the Resolution states clearly, we go into those movements, into that movement, as we go into all others, as revolutionists.

I have been talking to one or two Negro comrades, not as many as possible but I have been talking to some, and one of them says that he gets an impression that this insistence upon the significance of the Negro struggle for democratic rights gives him the feeling that when we go into the Negro movement, we may go there concerned only with a democratic program, when in reality, he says, there are many Negro militants who want Marxism. We can assure you that in saying many Negro militants want Marxism he is absolutely correct. We go there as revolutionists seeking to make those organizations into class organizations, seeking to inculcate proletarian methods of struggle, seeking to clear out the petty-bourgeois reformist leadership and substitute the leadership of organized labor or of revolutionary militants. But we do more than that.

If our analysis of the Negro people is correct, if what they think about fundamental questions approaches empirically the conclusions of Marxism, if we believe that the Negro movement is heading toward the proletarian revolution led by the proletariat, then it is absolutely imperative that we carry into those Negro organizations the fundamental doctrines of Marxism not only on the Negro question but on all the political questions of the day. We are not going into those movements to limit ourselves to the Negro struggle for democratic rights and the particular methods which may appear to be used by the majority of the Negroes in those organizations at that time. Not at all. If our analysis is sound and if we grasp its significance, we gain two things. We gain, one, the conviction to be able to stay in these movements and to work patiently under the most difficult conditions. But we gain something else. We gain a conviction of the necessity that our Marxist ideas, Marxist propaganda, our struggle for the labor party and our struggle for the proletarian revolution must meet some important response from the Negro militants in those organizations, and with the necessary discretion we have a fruitful field for party recruitment and the development of the general Marxist movement.

Racial prejudices

Now there are only one or two things more that I would like to say. There is the question—and I hope you will allow me a minute or two extra—there is the question of racial prejudice. I am not talking here about going out to dinner with Negroes or having Negroes at your house or any of those things. When the party gets larger and rank-and-file Negro and white workers and others come into it, rank-and-file white workers will bring their prejudices. Negroes will bring their suspicions, and in my opinion, absolutely justified suspicions, and there will be difficulties created of a certain kind. But the party is a Bolshevik organization and on the basis of a fundamental political line and its general socialist aspirations, will be able to settle the crudest forms of those to the extent that they appear. The cadre by and large today is sound on these matters. But bourgeois race prejudice against the Negroes in the United States is something extraordinarily powerful and of a range and subtlety that it takes years to understand and only the proletarian revolution and the break-up of the bourgeoisie will make the proletariat fully understand. Such is the tremendous power which racial prejudice exercises in the United States, at every stage, wherever the races meet. In the Resolution we select one series of examples.

Undoubtedly this Resolution is breaking a new stage in the organized form in which we are bringing forward Negro work and our conception of the Negro contribution, bringing it forward before the country and before the organized labor movement. We can accept it. We can feel that we shall do everything we can to carry it through. But bourgeois race prejudice isn’t going to let it pass so easily. No. We have pointed out (and this has been the experience of many and particularly in the old Communist Party), that you will find many high-class unionists who accept a sound policy on the Negro question, genuinely mean to carry it out. Then they find themselves in a certain situation in the union, maybe a union of predominantly white workers, and the constant hammering home by the party of the importance of the Negro question and the significance of the Negro question in the party press and in the party propaganda and agitation begins to affect the work. There are problems created.

A problem arises and these unionists ask, couldn’t we in this particular situation, not on the whole but in this crisis, couldn’t we play down the Negro angle a bit. Sometimes, in fact, we have to. But you can find, and it is possible that as we expand, you will find this tendency to push the Negro question back a bit. Not for any reactionary reasons but with the genuine intention to advance what looms as more important, the role of the party in the organized labor movement at large. If we have time, maybe tonight, I will tell you many instances that have been given to me. This is not an individual aberration, it is not a personal weakness of a comrade. If it were, it wouldn’t find a place in the Resolution. It is the pressure of bourgeois race prejudice that will penetrate into the party and impede the development of Negro work to the stage that we want to place it.

Problems facing Negro militants

There are other examples. You find a Negro unionist who for thirty years of his life has been bothered with chauvinism and the problem of where the Negro people are going to find some salvation. And at last he gets into the union movement, a progressive union. He meets other unionists, he sees what the union signifies, he grasps the question of the class struggle. Good. Now he has a perspective. He comes to the revolutionary party, and there he sees in embryo, despite certain difficulties, he catches a glimpse, of the perspectives of a new society, and he is reinforced in his fundamental conceptions. When we now begin, when the party now begins to insist upon the significance and vitality of the independent Negro movement, this is a shock to him.

He doesn’t understand it too well. He thinks that we may be taking a step back. He doesn’t quite see it. And you will find that he may align himself with those (I have seen this) who are finding some sort of objection to the projection forward of the Negro work. That is only another aspect of bourgeois race prejudice. It isn’t that the Negro unionist is prejudiced. Don’t misunderstand it. It is the impact of prejudice that affects us at every turn.

There are others, there are plenty of others besides those that are mentioned here. There are petty-bourgeois Negroes who more than most Negro groups suffer terribly in a personal way from the persecutions and humiliations of bourgeois society. When they come into a fairly large party, there they are able to work genuinely for the revolution and at the same time find a social milieu in which they can be comfortable and are saved from the merciless repression and savage attacks that bourgeois society subjects them to. I have seen, I have been told, and we shall undoubtedly see, you will find, if not today, tomorrow, some of these who, also using as argument the basis of “the class struggle” tend to push the Negro question back, so to speak, into a sort of obscurity. It seems to be forcing forward what they have gotten away from. This again, is the influence of the prejudice of bourgeois society.

Thus, inside the party, you get certain tendencies which are likely to stand in the way of our work. Nothing can check this but a clear fundamental theoretical line and the education of the party not abstractly, not “black and white unite and fight” (that is a very crude example) and not “the Negroes must follow the whites and the proletariat must lead them”—not at all. No. We need a careful systematic building up of historical, economic, political, literary ideas, knowledge and information, on the Negro question inside the party. Because it is only where you have Bolshevik ideas, Marxist ideas, Marxist knowledge, Marxist history, Marxist perspectives, that you are certain to drive out bourgeois ideas, bourgeois history, bourgeois perspectives which are so powerful on the question of the races in the United States. That is what we must do.

Inescapable difficulties

We will have, we have had difficulties in the party. We cannot escape them. I have been hearing of some. I hope the Negro comrades in the party will express themselves freely and fully. But all these difficulties assume importance and in the last analysis can be traced directly to, both on the part (and I am speaking now of the party), both on the part of the white comrades and on the part of the Negro comrades, can be traced to the fact that we have not thoroughly grasped to the fullest extent the difficulties that the party faced when it was placed before masses of Negroes coming into the party and having to deal with them as a mass party when it was still a propaganda group.

It is the settled opinion of the most experienced comrades and certainly it is mine—I have a wide experience on the Negro question—that a basic fundamental understanding, a clear understanding (within the limitations of the party and the objective situation), a clear historical and theoretical grasp of perspectives is the only cure for those difficulties that are bound to arise, and if they don’t turn up today, they are bound to turn up tomorrow. Because we are not creating them. It is the tremendous power of bourgeois society which tries to stop and tries to prevent a complete coordination and pushes itself into the party at all times. That is what is taking place. It is an aspect of the struggle between the bourgeoisie and the proletarian movement. And we have to learn to meet it in a proletarian way.

Comrades, in bringing forward this Resolution, the Political Committee is telling the party now, in a manner more serious, more concentrated, more organized than ever before, not to consider ourselves merely as the champions of Negro rights, but to make it our special business to advocate to the Negroes, to the organized labor movement, and to the country at large the role which these persecuted, humiliated, despised people are going to play in the destruction of bourgeois society. The moment you say that in this American bourgeois structure, ridden with race prejudice, hatred and contempt of the Negroes, the moment we push forward what the Negroes can and will do, we shall find ourselves represented not merely as the champions of Negro rights, but as mortal enemies of the whole bourgeois structure.

The revolutionary potential

Let us not forget that in the Negro people, there sleep and are now awakening passions of a violence exceeding, perhaps, as far as these things can be compared, anything among the tremendous forces that capitalism has created. Anyone who knows them, who knows their history, is able to talk to them intimately, watches them at their own theatres, watches them at their dances, watches them in their churches, reads their press with a discerning eye, must recognize that although their social force may not be able to compare with the social force of a corresponding number of organized workers, the hatred of bourgeois society and the readiness to destroy it when the opportunity should present itself, rests among them to a degree greater than in any other section of the population in the United States. That we must know, and must know that in this Resolution here, behind its sober, disciplined words, there is contained a clear recognition of this immense revolutionary potentiality.

When we go to the Negro movement we are preparing one of the important channels of the proletarian revolution. And we must do this not with the idea that it is for some distant future and we have a long period for theoretical preparation. No. In 1943 the miners revolted in their own way against the domination of the American bourgeoisie. The Negroes in Harlem did the same. Today the American bourgeoisie prepares for war. Once more the miners, that oppressed section, express their defiance. Randolph and Reynolds open up for the Negroes. It is a repetition on a higher scale of what took place in the midst of the war. In the period that is facing us, these two currents are bound to join. It is our task to effect that unification. Nobody else can do that but ourselves. When that unification is effected, the floodgates will be opened but we are not afraid. We shall rule the wind and the whirlwind, too. We will be able to deal with any passions, forces, that are developed once we can direct them plainly and simply to the overthrow of bourgeois society. But to do this requires sober, patient, painstaking work and preparation. This is what the Resolution attempts to prepare us for. And that is why we recommend it to you for your careful study and acceptance.

Guia essencial para a Jacobin

A Jacobin tem divulgado conteúdo socialista em ritmo acelerado desde 2010. Eis aqui um guia prático para algumas das obras mais importantes ...