Plínio de Arruda Sampaio Jr.
Jacobin
Polícia durante uma greve geral em São Paulo, Brasil, em 28 de abril de 2017. Mídia NINJA / Flickr |
A condenação de Lula foi mais um ato da crise terminal da democracia brasileira. No entanto, a narrativa de que Lula é vítima de uma conspiração entre o imperialismo norte-americano e setores do Judiciário e que uma "eleição sem Lula é um golpe" não ajuda a entender a grave crise institucional que sacode a vida nacional. Mesmo reconhecendo que a justiça brasileira opera de acordo com a norma "Para amigos, tudo; para os inimigos, a Lei", como no resto do aparato estatal, a participação de Lula na eleição de 2018 não teria o poder de resgatar a legitimidade de um sistema político podre. O jubileu da corrupção não pode moralizar um processo eleitoral estruturalmente falho.
A corrupção generalizada que afeta todos os partidos de ordem é apenas um aspecto da grave crise que abala a Nova República do Brasil. As Jornadas de Junho de 2013 foram uma outra expressão dessa crise, revelada pela vontade dos jovens que saíram às ruas contra a agenda de ajuste do grande capital, que já havia começado durante os governos do PT. Para os oprimidos, a crise da Nova República se manifesta na impermeabilidade do Estado às demandas populares. Para os de cima, a crise é revelada pela necessidade de purgar as escassas conquistas democráticas do povo brasileiro e redefinir a hierarquia de comando entre os capitalistas.
A resposta da burguesia a essa crise assumiu a forma de uma cruzada moralista contra a corrupção. As investigações judiciais provaram o que todos sabiam: a corrupção é um elemento estrutural do capitalismo brasileiro e os políticos funcionam como agentes de interesses privados no aparato estatal.
Os chamados “paladinos da moralização” nunca chegam à raiz do problema, uma vez que a cruzada moralista serve apenas para preparar o caminho para uma “modernização” a serviço do capital. É por isso que a corrupção é reduzida a uma questão moral de um fórum individual e se limita a casos específicos, com investigações seletivas, e isenta seu maior culpado: o grande capital.
No entanto, mesmo que essa cruzada esteja historicamente condenada, é provável que sua agonia seja lenta, arrastando-se indefinidamente. Há uma coalizão que une o Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) de centro-direita e o próprio Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) de Michel Temer em torno do interesse comum de anistiar a corrupção e evitar a instabilidade política que pode comprometer a continuidade do ajuste neoliberal e intensificar a luta de classes.
A condenação de Lula não contribuirá para a moralização da política, assim como a presença de Lula na eleição de 2018 nada faz para impedir a crise terminal da Nova República. Estamos no pântano. Associar a defesa da democracia à defesa de Lula é um sofisma que só beneficia o próprio Lula. Lula faz parte do problema. O futuro da democracia depende de tumultos maciços dos trabalhadores em toda a nação.
A sociedade brasileira, ao passar por um processo de reversão neocolonial, polariza-se entre projetos inconciliáveis: a reciclagem da contrarrevolução cristalizada em 1964, que hoje tem a face de uma regressão à civilização do século XIX; e a revolução dos pobres e oprimidos latente nas placas tectônicas que mobilizam a história do Brasil. Colocado em perspectiva da longue durée, a escolha real é entre socialismo ou barbárie.
Colaborador
Plínio de Arruda Sampaio Jr é professor de economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Brasil, e pré-candidato presidencial pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).
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