Ben Tarnoff
Jacobin
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O que deveríamos fazer com o Google, Facebook e Amazon? Até agora, relativamente poucas respostas vieram da esquerda socialista. Pelo menos nos Estados Unidos, a vanguarda do debate sobre a regulamentação de plataformas tem sido dominada por liberais antitruste, talvez melhor representados pelo Open Markets Institute.
Eles têm boas idéias e falam sério sobre enfrentar o poder corporativo, mas eles vêm da tradição de reformismo brandeisiano. Seu horizonte é um capitalismo menos consolidado: mercados mais competitivos, empresas menores e propriedade amplamente dispersa.
Para aqueles entre nós que mantém o olhar em um horizonte diferente, para além do capitalismo, essa abordagem não é muito satisfatória. Existem elementos do kit de ferramentas antitruste que podem ser aplicados de maneira muito construtiva à tarefa de reduzir o poder da Big Tech e restaurar algum grau de controle democrático sobre nossas infraestruturas digitais. No entanto, os liberais antitruste querem que os mercados funcionem melhor. Em contraste, uma política de esquerda para a tecnologia deve ter como objetivo fazer com que os mercados tenham menos controle sobre nossas vidas – para torná-los menos centrais à nossa sobrevivência e prosperidade.
Isso geralmente é chamado de desmercadificação e está intimamente relacionado a outro princípio essencial, a democratização. O capitalismo é impulsionado pela acumulação contínua, e a acumulação contínua requer a mercadificação de tantas coisas e atividades quanto possível. A desmercadificação tenta reverter esse processo, retirando certas coisas e atividades para fora do mercado.
Isso nos permite fazer duas coisas: a primeira é fornecer a todos os recursos (materiais e de outros tipos) necessários para a sua sobrevivência e florescimento – por uma questão de direito, não como uma mercadoria: as pessoas conseguem o que precisam, não apenas aquilo que conseguem pagar. A segunda é oferecer a todos o poder de participar das decisões que os impactam. Quando removemos do mercado certas esferas da vida, podemos encontrar maneiras diferentes de determinar como os recursos associados a elas são alocados.
Esses princípios oferecem um ponto de partida útil para pensarmos uma política tecnológica de esquerda. Ainda assim, eles são muito abstratos. Qual poderia ser seu aspecto na prática?
Passo um: Tornar a internet acessível
Primeiramente, a parte fácil.
Uma boa parte da Internet é dedicada à transferência de pacotes de dados de um lugar para outro, e consiste em vários itens físicos: cabos de fibra ótica, switches, roteadores, pontos de troca de Internet e assim por diante. Também consiste em empresas grandes e pequenas (principalmente grandes) que gerenciam tudo isso, desde os provedores de banda larga que vendem o serviço de internet domiciliar que contratamos até os provedores de “espinha dorsal” (ou “backbone”) que lidam com o “encanamento” mais profundo da Internet.
Todo esse sistema é um bom candidato para a propriedade pública. Dependendo das circunstâncias, pode fazer sentido termos tipos diferentes de entidades públicas como responsáveis por partes diferentes do sistema: provedores de banda larga pertencentes ao município em coordenação com um backbone de propriedade nacional, por exemplo.
No entanto, a operação dos “canos” da Internet como uma empresa pública deve ser bastante direto, uma vez que a mecânica básica não é tão diferente do fornecimento de gás ou de água. Esse foi um dos pontos que apresentei em uma matéria que escrevi para o Tribune sobre o os plano do Partido Trabalhista (enquanto o partido ainda estava sob a liderança de Corbyn) para o lançamento de uma rede pública para oferecer banda larga gratuita a todos no Reino Unido. É uma medida politicamente boa e, melhor ainda, funciona.
Redes de propriedade pública podem fornecer um melhor serviço a um custo menor e também podem priorizar imperativos sociais, como melhorar o serviço para comunidades pobres e rurais com falta de cobertura de conexão. Para quem quiser se aprofundar em uma das experiências mais bem-sucedidas sobre banda larga municipal nos Estados Unidos, recomendo muito o artigo de Evan Malmgren, “Os novos socialistas dos esgotos“, na revista Logic.
Passo dois: Taxonomizar a internet
Mais acima na pilha de estruturas estão as chamadas plataformas. É aí que está a maior parte do poder e onde está centrada a maior parte da discussão pública; é também aí que encontramos mais dificuldades ao pensarmos sobre como desmercadificar e democratizar.
Parte do problema está no nome: “plataformas”. Nenhuma de nossas metáforas é perfeita, mas acho que talvez seja hora de desistir dessa. Não é apenas útil para elas – permitindo que um serviço como o Facebook projete uma impressão enganosa de abertura e neutralidade, como argumenta Tarleton Gillespie – mas também impreciso. Não existe uma coisa de significado único que possa ser chamada de plataforma. Não somos capazes de descobrir o que fazer com as plataformas porque não existem “plataformas”.
Antes de começarmos a montar uma política de esquerda para a tecnologia, portanto, precisamos criar uma taxonomia melhor para as coisas que estamos tentando desmercadificar e democratizar. Podemos começar analisando alguns dos serviços que atualmente são chamados de plataformas e tentando discernir as principais características que distinguem umas das outras:
- Primeiro, o tamanho. Quantos usuários o serviço possui? Às vezes, essa é uma pergunta fácil de responder; outras vezes não, porque a maneira como definimos “usuário” varia e essas diferenças podem ser substanciais:
- Às vezes, o que significa ser um usuário não é tão complicado. É fácil calcular o número de usuários ativos mensais do Facebook, do conjunto de produtos do Google ou do Amazon Web Services (AWS).
- Mas e quanto a um serviço como Uber ou Instacart, onde você tem tanto funcionários (“motoristas”, “compradores”) quanto consumidores? Ambos são usuários, mas estão usando diferentes partes do serviço. Portanto, provavelmente faz sentido incluir ambos na contagem geral de usuários.
- E quanto a um serviço que tem um público alvo que não é exatamente de usuários? Em uma newsletter de algum tempo atrás, falei sobre a plataforma de policiamento Axon, que permite às agências policiais conectar vários dispositivos e serviços – câmeras corporais, tasers, câmeras veiculares, um sistema de gerenciamento de evidências digitais, aplicativos para smartphone etc. – em um único portal integrado. Os usuários desta plataforma são policiais. O público são os indivíduos cujas informações estão sendo registradas e processadas pela plataforma. Eles devem ser incluídos na conta geral de usuários, mesmo que não sejam realmente usuários? Se nosso objetivo for medir o impacto geral do serviço, a resposta é sim.
- A segunda linha divisória é a função. O que o serviço faz? Nick Srnicek, em seu inestimável livro “Capitalismo de Plataforma” (Platform Capitalism), usa essa abordagem para definir cinco tipos diferentes de “plataformas”, embora eu esteja mais inclinado a usar a palavra “serviços”:
- Serviços de publicidade como Google e Facebook que acumulam dados pessoais e que os monetizam com a venda de anúncios direcionados.
- Serviços em nuvem, como AWS e Salesforce, que vendem vários produtos baseados em nuvem em um modelo “como serviço” para clientes corporativos, desde infraestrutura como serviço (IaaS) a plataforma como serviço (PaaS) e gerenciamento de relacionamento com cliente (CRM).
- Serviços industriais como o Predix, projetados para dar suporte a aplicativos de “internet industrial”, como conectar uma fábrica com dispositivos de Internet das Coisas (IoT) e usar os dados que fluem deles para otimizar a eficiência.
- Serviços de produtos como a Rolls Royce e o Spotify, que “transformam um bem tradicional em um serviço”. A Rolls Royce agora está alugando motores a jato para as companhias aéreas, fazendo com que elas paguem pelo equipamento de uma vez na compra, e usando sensores e análise de dados para otimizar a manutenção. O Spotify está transformando álbuns em streams. O modelo de negócios é a taxa de assinatura.
- Serviços “enxutos” (“lean”), como Uber e Airbnb, que combinam compradores e vendedores, minimizando a sua propriedade de ativos próprios. No entanto, essa combinação não é tudo o que eles fazem: serviços de trabalho como o Uber também estão no negócio de gerenciar e disciplinar algoritmicamente seus motoristas.
Pode-se pensar em mais tipos de plataformas, e posso achar discutíveis algumas das opções de categorias de Srnicek – será que faz sentido colocar o Uber e o Airbnb no mesmo saco? Porém, se quisermos diferenciar serviços por função, essa lista é um bom ponto de partida.
- A terceira maneira de dividir os serviços é pelo tipo de poder que eles exercem. K. Sabeel Rahman escreveu um artigo interessante para a revista Logic chamado “O Novo Polvo”, que identifica três tipos de poder tecnológico:
- Poder de transmissão, que é “a capacidade de uma empresa de controlar o fluxo de dados ou de bens”. Ele dá o exemplo da enorme infraestrutura de transporte e logística da Amazon que controla os “conduítes para o comércio”, bem como os provedores de serviços de Internet que controlam os “canais de transmissão de dados”. Também podemos adicionar a AWS e outros grandes provedores de nuvem. Um serviço como o AWS S3 é essencial para o fluxo de dados na Internet moderna.
- Poder de “porteiro” (ou “gatekeeper”), onde a empresa “controla a entrada para uma paisagem que, de outra maneira, seria descentralizada e difusa”. Ele dá o exemplo do Feed de notícias do Facebook ou da Pesquisa do Google, que medeiam o acesso ao conteúdo online. Aqui, o poder é mantido no “ponto de entrada” e não em toda a infraestrutura de transmissão.
- Poder de pontuação, que é “exercido por sistemas de classificação, índices e bancos de dados de classificação”. Isso inclui sistemas automatizados para triagem de candidatos a empregos, por exemplo, ou para informar sentenças e decisões de fiança.
Passo três: Coletivizar a internet
Poderíamos gastar muito mais tempo ajustando nossa taxonomia, mas vamos deixá-la como está e retornar à questão de como podemos desmercadificar e democratizar nossas infraestruturas digitais. Dada a ampla gama de serviços de que estamos falando, segue-se que os métodos que teremos de usar para desmercadificá-los e democratizá-los também vão variar. O objetivo em se desenvolver uma taxonomia razoavelmente precisa é ajudar a informar quais métodos poderemos usar para cada tipo de serviço.
Essa é a lógica por trás do argumento de Jason Prado em sua newsletter Venture Commune, “Taxonomizando as plataformas para escalar a regulação“. Prado defende que devemos diferenciar os serviços pelo número de usuários que possuem e, em seguida, implementar regulações diferentes para tamanhos diferentes. Entre 0 e 5 milhões de usuários, por exemplo, um serviço “deve estar sujeito apenas a regulações básicas sobre privacidade”. Entre 20 e 50 milhões, eles deveriam publicar “relatórios de transparência sobre quais dados são coletados e sobre como exatamente são usados”. Acima de 100 milhões, um serviço se torna “indistinguível do Estado” e, portanto, precisa ser governado democraticamente, talvez por um “conselho de administração composto por proprietários, representantes eleitos, desenvolvedores/trabalhadores da plataforma e usuários”.
Gosto dessa abordagem básica, mas eu a expandiria. O tamanho é uma consideração importante, mas não é a única. A função do serviço e o tipo de poder que exerce também são fatores significativos. Poderíamos mapear cada característica (tamanho, função e tipo de potência) em um eixo – x, y e z – e, em seguida, plotar cada serviço como um ponto em algum lugar ao longo desses três eixos. Então, dependendo de onde o serviço ficar em nosso espaço tridimensional (ou n-dimensional, se refinarmos nossa taxonomia e aumentarmos o número de características), poderemos selecionar um método de desmercadificação e democratização que seja especificamente adequado ao serviço.
Quais seriam alguns desses métodos possíveis? Aqui listo quatro:
Propriedade pública
Nesse caso, uma entidade estatal assume a responsabilidade pela operação de um serviço. Essas entidades podem ser estruturadas de muitas maneiras e existir em diferentes níveis, do municipal até o nacional. Os serviços que exercem poder de transmissão (Rahman) ou aqueles que envolvem a nuvem (Srnicek) são candidatos especialmente adequados para essa abordagem. Nesse sentido, Jimi Cullen escreveu uma proposta interessante para um provedor de nuvem de propriedade pública chamado “Precisamos de uma plataforma estatal para a Internet moderna“. Provavelmente a propriedade pública também seja a mais adequada para os serviços em uma certa escala. No maior tamanho, porém, a governança não pode mais ser alcançada no nível do Estado-nação – momento a partir do qual precisamos pensar em formas transnacionais de propriedade pública.
As entidades públicas também podem ficar no negócio de gerenciar ativos, ao invés da operação de um serviço. Por exemplo, elas podem assumir a forma de instituições de “guarda de dados” (“data trusts”) ou “bens comuns de dados” (“data commons”), mantendo um conjunto específico de dados e aplicando certos termos de acesso quando outras entidades desejam processar esses dados: exigir regras de privacidade, por exemplo, ou cobrar uma taxa . Rosie Collington escreveu uma reportagem interessante sobre como esse arranjo pode funcionar para dados já mantidos pelo setor público, chamado “Ativos públicos digitais: repensando o valor, o acesso e o controle dos dados do setor público na era da plataforma“.
Propriedade co-operativa
Esta opção envolve a operação de serviços de forma cooperativa, sob propriedade e gestão por alguma combinação de trabalhadores e usuários. A comunidade do cooperativismo de plataforma vem realizando experimentos nesse sentido há anos, com alguns resultados interessantes.
O que Srnicek chama de serviços “enxutos” se prestariam à cooperativização. Um Uber sob propriedade dos trabalhadores seria muito viável, por exemplo. E existem vários tipos de instrumentos de políticas públicas que os governos poderiam usar para incentivar a formação de tais cooperativas: subsídios, empréstimos, contratos públicos, tratamento tributário preferencial, códigos regulatórios municipais que apenas permitam o serviço compartilhamento de corridas por empresas pertencentes a trabalhadores. É possível, porém, que as cooperativas funcionem melhor em uma escala menor – talvez fosse melhor montar um monte de Ubers específicos das cidades em vez de um Uber nacional – nesse caso, o kit de ferramentas antitruste pode ser útil, pois precisaríamos dividir uma grande empresa antes de transformar em cooperativas as suas partes constituintes.
Também poderíamos pensar em guardas de dados ou em bens comuns de dados sob propriedade cooperativa, em vez de propriedade pública. É isso que Evan Malmgren recomenda em seu artigo “Mídia Socializada”: uma instituição de guarda de dados de propriedade cooperativa que emite quotas de voto para seus membros, que por sua vez elegem uma liderança com poderes para negociar os termos de uso dos dados com outras entidades.
Não-propriedade
Em alguns casos, os serviços simplesmente não precisam estar sob propriedade de ninguém. Em vez disso, suas funções podem ser executadas por software livre e de código aberto.
Há muitas razões para ser cético em relação ao código aberto como uma ideologia – “A Liberdade Não é Gratuita”, de Wendy Liu, é uma leitura essencial nessa frente – mas o software livre tem potencial para desmercadificação, mesmo que esse potencial esteja suprimido no momento por sua quase completa captura por interesses corporativos.
Esse é outro domínio no qual o kit de ferramentas antitruste pode ser útil. Em 1949, o Departamento de Justiça dos EUA entrou com uma ação antitruste contra a AT&T. Como parte do acordo, sete anos depois, a empresa foi forçada a abrir seu cofre de patentes e licenciá-las a “todas as partes interessadas”. Poderíamos imaginar algo semelhante com os gigantes da tecnologia, fazendo com que eles abrissem seu código-fonte para que as pessoas possam desenvolver alternativas gratuitas a esses serviços. Prado sugere que um serviço deveria ser forçado a abrir os repositórios de código dentro de seis meses após atingir entre 50 e 100 milhões de usuários.
Além de serviços maiores, eu também argumentaria que os serviços cujo modelo de negócios é baseado em publicidade (Srnicek) e aqueles que exercem poder de guarda (Rahman) seriam bons candidatos para o código aberto. Pode-se imaginar alternativas gratuitas e de código aberto à Pesquisa do Google, por exemplo, ou aos serviços de redes sociais existentes.
Outra idéia útil extraída do kit de ferramentas antitruste que poderia ajudar a promover o código aberto seria a interoperabilidade forçada. Matt Stoller e Barry Lynn, do Open Markets Institute, tem solicitado à Federal Trade Commission (FTC) que faça o Facebook adotar “padrões abertos e transparentes”. Isso possibilitaria que alternativas de código aberto funcionassem de forma interoperável com o Facebook. Isso não retiraria nossos dados dos servidores do Facebook, mas começaria a corroer o poder da empresa, oferecendo às pessoas vários clientes (sem anúncios) que poderiam acessar esses dados e apresentá-los de maneira diferente. Se essas interfaces funcionassem, o Facebook não seria mais capaz de vender anúncios e seus negócios acabariam colapsando. Nesse ponto, ele poderia ser remodelado em um guarda de dados de propriedade pública ou cooperativa fornecendo dados a uma variedade de serviços de redes sociais de código aberto, talvez eles mesmos federados no modelo da Mastodon.
Abolição
Certos serviços não devem ser desmercadificados e democratizados, mas abolidos por completo
Os governos implantam uma variedade de sistemas automatizados para fins de controle social. Isso inclui tecnologias carcerárias, como algoritmos de policiamento preditivo que intensificam o policiamento de bairros da classe trabalhadora negra. (Esse também é um exemplo do que Rahman chama de poder de pontuação). Pesquisadores como Ruha Benjamin e organizações comunitárias como a coalizão pelo fim da espionagem digital pela polícia de Los Angeles estão aplicando o ferramental abolicionista a esses tipos de tecnologias, exigindo sua eliminação total: em seu novo livro “A raça após a tecnologia” (Race After Technology), Benjamin fala sobre a necessidade de desenvolver “ferramentas abolicionistas para o Novo Código Jim” (“Jim Code”), em um trocadilho com as leis de segregação racial que ficaram conhecidas como “Jim Crow”.
Outro conjunto de sistemas dignos de eliminação são as formas de austeridade algorítmica documentadas por Virginia Eubanks em seu livro “Automatizando a desigualdade” (Automating Inequality). Nos Estados Unidos e por todo o mundo, funcionários públicos estão usando software para reduzir o estado de bem-estar social. Isso priva as pessoas de dignidade e autodeterminação de uma maneira que é fundamentalmente incompatível com os valores democráticos.
Há também o reconhecimento facial, que pode ser implantado por entidades públicas ou privadas. O crescente movimento pela proibição do reconhecimento facial, uma demanda promovida por várias organizações e agora abraçada por Bernie Sanders, é um bom exemplo da abolição em ação.
Uma observação final que vale a pena mencionar: embora o objetivo de uma política pública de esquerda para a tecnologia deva ser atingir a raiz do poder privado, por meio da transformação de como funciona a propriedade de nossas infraestruturas digitais, também precisaremos de regras legislativas e administrativas para governar como essas infraestruturas terão permissão para operar. Isso pode assumir a forma de marcos regulatórios sobre a coleta e processamento de dados, medidas destinadas a reduzir a radicalização de direita nas redes ou vários mandatos de transparência e prestação de contas via algoritmos. Essas regras deverão ser aplicadas em todos os setores, independentemente do tipo de propriedade ou organização de cada entidade.
Nossa hora vai chegar – e precisamos estar preparados
Oacima exposto é um apenas um esboço provisório, com muitos furos e arestas. A plotagem de todos os principais serviços em três eixos, de acordo com suas características, pode se revelar impossível – e, mesmo que seja possível, corre o risco de nos prender a um modelo excessivamente rígido para a formulação de políticas. De maneira mais ampla, existem limites severos para esse tipo de pensamento programático, que pode facilmente se inclinar em uma direção tecnocrática.
Ainda assim, espero que esses pensamentos possam ajudar no desenvolvimento de uma política pública de esquerda para a tecnologia que adote os princípios básicos de desmercadificação e democratização e que tente aplicá-los à nossa esfera digital realmente existente. Neste momento, há relativamente pouco espaço político para essa agenda na maioria dos países, mas pode chegar um momento em que mais espaço esteja disponível – seria bom estarmos preparados.
Sobre o autor
Ben Tarnoff é fundador e editor da revista Logic.