18 de abril de 2017

Votar ou reinventar a política

Em um artigo no "Le Monde", o filósofo acredita que o voto só reforça o conservadorismo. Em vez disso, ele defende "reinventar o comunismo."

Alain Badiou

Le Monde


Tradução / Muitos eleitores ainda estão indecisos sobre a iminente eleição presidencial. Eu consigo entender o porquê. Não é tanto que os programas dos candidatos considerados elegíveis sejam obscuros ou confusos. Não é tanto – para usar uma formulação que usei certa vez com Sarkozy e que gozou de certo sucesso – que precisemos nos perguntar “em nome do que eles falam.” Na verdade, tudo isso está bastante evidente.

Marine Le Pen é a versão modernizada – e portanto feminizada – do que a extrema-direita francesa sempre foi, dévouée au capitalisme et à la propriété privée sur le fond, mais démagogiquement populiste, nationaliste à la petite semaine, xénophobe et boutiquière.

François Fillon é o burguês provincial católico intolerante, totalmente inconsciente do que é viver fora de seu ambiente rançoso, e cuja filosofia, ou orçamento pessoal, equivale a "poupar cada centavo". Sinon qu’il n’est pas regardant sur la provenance de ses propres sous, et par contre d’une intransigeance et d’une avarice sordides quand il s’agit des dépenses budgétaires, et donc des sous des autres, et surtout des sous des pauvres. Benoît Hamon est le représentant timide, quelque peu étriqué, du « socialisme de gauche », détermination qui a toujours existé, bien qu’elle soit plus difficile à identifier et découvrir que l’Arlésienne, sinon par sa différence in-différente d’avec le socialisme colonial et musclé des Lacoste ou des Valls.

Jean-Luc Mélenchon – certamente o menos desagradável – é no entanto a expressão parlamentar do que chamamos hoje de esquerda “radical”, na fronteira precária entre o velho socialismo fracassado e um comunismo espectral, misant sur l’éloquence « à la Jaurès » et sur une énergie partagée à la bonne franquette pour masquer qu’au pouvoir, il ne ferait que ce qui est déclaré possible par nos vrais maîtres, et donc presque rien de ce qu’il annonce à son de trompe.

Emmanuel Macron, lui, est une créature sortie du néant par eux, nos vrais maîtres, les plus récents, ceux qui ont acheté, par précaution, tous les journaux, les capitalistes de la dernière vague, ceux de la mesquine « révolution » informatique et de ses bas-côtés. Il porte beau, ce faux jeune, et s’il croit et dit que la Guyane est une île ou que le Pirée est un homme, ce n’est que parce qu’il sait que parler n’a jamais engagé personne dans le camp qui est le sien, et que, comme on disait dans le Midi du vieux socialisme de cassoulet, « il est bien pôvre, celui qui ne peut pas promettre ».

Alors, obscurément, ceux qui hésitent sentent que dans ce théâtre de rôles anciens et connus, la conviction politique, la révolte, la demande populaire, une dangereuse situation mondiale presque au bord de la guerre, le malheur planétaire de centaines de millions de gens, que tout cela ne compte guère, ou n’est qu’un prétexte pour de fallacieux effets de manche.

Por isso, é útil começar pela seguinte questão: o que é política? E o que é uma política identificável, declarada?

Uma política sempre pode ser definida a partir de três elementos. Primeiro, a massa de pessoas comuns, com o que pensam e fazem. Chamemos isso de “o povo.” Em seguida, as várias formações coletivas: associações, sindicatos e partidos – em suma, todos os grupos capazes de ação coletiva. Finalmente, os órgãos do poder estatal – congressistas, governo, exército, polícia – mas também os órgãos do poder econômico e midiático (uma diferença que se tornou quase imperceptível), ou tudo o que chamamos hoje – com um termo ao mesmo tempo pitoresco e opressor – “aqueles que decidem”.

Uma política sempre consiste em perseguir objetivos pela articulação destes três elementos. Assim, podemos ver que no mundo moderno – de modo geral – há quatro orientações políticas fundamentais: fascista, conservadora, reformista e comunista.

As orientações conservadoras e reformistas constituem o bloco parlamentar central nas sociedades capitalistas avançadas: a esquerda e a direita na França, os republicanos e democratas nos Estados Unidos, conservadores e trabalhistas no Reino Unido, democratas-cristãos e social-democratas na Alemanha, etc. O que essas duas orientações têm em comum é que afirmam que o conflito entre elas – especificamente a articulação desses três elementos – pode e deve permanecer nos limites constitucionais aceitos por ambas. Em outras palavras, o poder de alternância de um após o outro da tendência central é o modo de perpetuação, com pequenas alterações nas nuances de um consenso de base.

O que as duas outras orientações – fascista e comunista – tem em comum, apesar da radical oposição entre seus objetivos, é que elas defendem que o conflito entre os diferentes partidos sobre a questão do poder estatal é tendencialmente irreconciliável: não pode se restringir a um consenso constitucional. Eles se recusam a integrar na sua concepção de sociedade e do Estado os seus objetivos conflitantes ou apenas diferentes do seu.

Bien entendu, les objectifs de ces deux tendances sont – contrairement à ce qui règle le duo conservatisme/réformisme – totalement opposés. Le fascisme est un capitalisme d’Etat greffé sur le mythe d’une identité collective, raciale, nationale religieuse, culturelle, supérieure à toute autre. Le communisme entend, lui, briser le droit bourgeois, limiter de façon drastique la propriété privée des moyens de production, et s’adresse, hors identité fermée, à l’humanité tout entière. Mais l’un et l’autre s’opposent, au sein des opinions répandues dans le peuple, au bloc consensuel central.

Pode ser chamado de “parlamentarismo” a forma dominante do Estado no que é comumente chamado de Ocidente, a organização do poder que assegura a conservadores e reformistas uma hegemonia compartilhada – mediada pela máquina eleitoral, os partidos e sua clientela – que elimina em todos os lugares qualquer perspectiva séria dos fascistas ou comunistas tomarem o poder do estado.

Isto implica que existe um terceiro termo, uma poderosa base contratual comum, ao mesmo tempo externa e interna às duas orientações principais. É claro que em nossas sociedades, esta base é o capitalismo liberal. Liberdade ilimitada de empresa e enriquecimento, respeito absoluto da propriedade privada – garantida pelo sistema judiciário e pela polícia – confiança nos bancos, educação dos jovens sob o disfarce de “democratizar” a concorrência, apetite de “sucesso”, afirmações repetidas do caráter nocivo e utópico da igualdade: tal é a matriz das liberdades consensualmente estabelecidas. Estas são as liberdades que os tais partidos dominantes mais ou menos tacitamente se comprometem a garantir perpetuamente.

O desenvolvimento do capitalismo pode trazer algumas incertezas quanto ao valor do consenso parlamentar, e à confiança atribuída – durante o ritual eleitoral – aos “grandes” partidos conservadores ou reformistas. Isso é especialmente verdadeiro no caso da pequena-burguesia que tem seu status social ameaçado, ou em regiões de classe trabalhadora devastadas pela desindustrialização. Este é o caso no Ocidente - Estados Unidos e Europa, onde podemos observar uma espécie de decadência em face do poder ascendente dos países asiáticos. Essa crise subjetiva atual favorece sem dúvida orientações fascistas, nacionalistas, religiosas, islamofóbicas, e beligerantes, porque o medo é um mau conselheiro, e essas subjetividades marcadas pela crise são tentadas a se apegar a mitos identitários. Sobretudo, porque a hipótese comunista emergiu terrivelmente enfraquecida do fracasso histórico de todas as suas versões estatizantes, especialmente a URSS e a República Popular da China.

Les tenants intellectuels du consensus parlementaire, tant les conservateurs éclairés que les réformistes réalistes, tout ce qui va de Fillon à Mélenchon en passant par Macron et Hamon, nous supplient de voter « utile » pour barrer la route au proto-fascisme désormais installé dans le paysage. Mais qui a ouvert cette route ? Qui, par des campagnes ignorantes, acharnées, persécutrices, s’est employé à identifier l’orientation communiste à un crime ? Qui nous a enjoint de penser qu’une Idée égalitaire, le motif d’une émancipation de l’humanité toute entière, rompant avec une dizaine de millénaires de dictature de la propriété privée, pouvaient et devaient être jugés sur soixante ans d’expérimentations étatiques localisées, entre 1917 (révolution russe) et 1976 (échec définitif de la révolution culturelle chinoise) ?

Parlons de la répression de l’insurrection au Cameroun, avec les têtes des victimes exposées au seuil des villages. N’oublions pas les trente mille ouvriers morts sur le pavé de Paris lors de la répression de la Commune par ces parfaits démocrates qu’étaient messieurs Jules Ferry et Jules Favre. Et qu’on n’oublie surtout pas non plus que la seule première guerre mondiale, à partir des seuls Etats occidentaux et démocratiques, et pour des enjeux répugnants de rivalité impériale, créa l’époque où les morts à la guerre devaient désormais se compter par dizaines de millions. Qu’on se souvienne des atroces listes de jeune mortspour-rien qui composent de sinistres monuments dans le moindre de nos villages.

Oui, comparons, concluons. Le fléau de la balance ira invinciblement du côté de l’expérience communiste, laquelle, contre l’oligarchie minuscule qui cumule des profits extorqués, annonce, depuis très peu de temps, et dans la première grande vision étayée sur le réel, une libération de l’humanité tout entière. Quelques décennies de tentatives, brutalement encerclées et attaquées, ne peuvent convaincre quelqu’un de bonne foi qu’elles suffisent à annuler cette promesse et nous contraignent à y renoncer pour toujours.

Alors, voter ? Soyons, sur le fond, indifférent à cette demande de l’Etat et de ses organisations. On peut voter pour le moins pire, on peut ne pas voter par principe : c’est l’indifférence qui est en tout cas la bonne subjectivité. Car nous devrions désormais tous le savoir : voter, ce n’est jamais que renforcer, contre une autre, une des orientations conservatrices du système existant. Ainsi, ramené à son contenu réel, le vote est une cérémonie qui dépolitise les peuples. Analisado em seus reais conteúdos, o voto é uma cerimônia que despolitiza o povo. Devemos começar por re-estabelecer em todos os lugares a visão comunista do futuro. Militantes convictos devem discutir seus princípios em todos os contextos populares do mundo. Como propôs Mao, devemos “dar ao povo, em sua especificidade, o que ele nos dá em meio à confusão.” Oui, recommençons le communisme, au ras de la fusion entre son Idée et l’existence populaire. Ou seja, fazer política.

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