John Cassidy
Esta é a oitava de uma série de entrevistas com economistas da Escola de Chicago. Leia “Depois da Explosão”, a história de John Cassidy sobre os economistas de Chicago e a crise financeira.
Tradução / Thaler, um dos fundadores da economia comportamental, estava fora da cidade quando visitei Chicago. Posteriormente, falei com ele ao telefone e comecei por lhe perguntar o que restava da hipótese dos mercados eficientes, que ele desde há muito tempo questiona.
Richard Thaler
Bem, sublinho sempre que a teoria tem duas componentes. Primeiro, o preço de mercado está sempre correto. Segundo, não há almoços grátis: não se pode vencer o mercado sem assumir mais riscos. A componente “não há almoços grátis” continua a ser sólida e não foi de modo algum abalada pelos acontecimentos recentes: na verdade, pode ter sido reforçada. Algumas pessoas pensavam que podiam ganhar muito dinheiro sem correr mais riscos e, na verdade, não podiam. Portanto, ou não se consegue vencer o mercado, ou vencê-lo é uma coisa muito difícil – toda a gente concorda com isso. A minha opinião é que se pode [vencer o mercado], mas é difícil.
A questão de saber se os preços dos ativos estão corretos é uma questão que suscita muita controvérsia. Gene [Fama] não gosta de falar muito sobre isso, mas é crucial do ponto de vista político. Tivemos duas enormes bolhas na última década, com enormes consequências para a afetação de recursos.
Quando falei com Fama (ver aqui e aqui), ele disse que não sabia o que era uma bolha - ele nem sequer gosta do termo.
Eu acho que nós sabemos o que é uma bolha. Não é que possamos prever bolhas – se pudéssemos, seríamos ricos. Mas podemos certamente ter um sistema de alerta de bolhas. Podemos olhar para coisas como os rácios cotações/lucros e preço casa cotação/aluguer de casa. Estas coisas estavam a contar-nos histórias sintomáticas, e a história que pareciam estar a contar era verdadeira.
Então, quais são as implicações políticas? O que é que o governo deve fazer para evitar que as bolhas se dilatem, no mercado da habitação, por exemplo?
Várias coisas. Penso que a Fannie Mae e a Freddie Mac deveriam aumentar os requisitos de empréstimo em certas áreas que parecem espumosas. Deus não disse que se devia poder pedir emprestado cem por cento do preço de uma casa.
Qual foi a causa final da crise financeira? Má regulamentação? A ganância? Maus sinais do mercado? A fragilidade humana?
A alavancagem causou a crise - e eu diria que esta é uma afirmação bastante incontroversa. A fragilidade humana entra em jogo a dois níveis. O primeiro: as pessoas que estavam a contrair os empréstimos hipotecários de alto risco, muitas delas não percebiam o que estavam a fazer. O segundo: os CEOs não percebiam claramente o que os seus operadores estavam a fazer. Chamo a isto o problema do "diretor burro".
Percorram a lista – A.I.G., Citigroup, Bear Stearns, Lehman Brothers. Estas empresas foram destruídas ou devastadas por uma pequena parte da empresa que estava a avançar e a pôr em risco toda a empresa. Os responsáveis eram gananciosos ou estúpidos, ou possivelmente ambas as coisas.
E a hipótese das expectativas racionais, outra teoria de Chicago? O que é que resta dessa?
TH: (risos) Há alguém que acredite realmente na equivalência ricardiana? É uma ideia absurda. Pergunto-me se consegue encontrar alguém, para além de, possivelmente, [John] Cochrane e [Robert] Barro, que tenha feito o cálculo do impacto que a despesa pública terá nos seus impostos e heranças futuras. As pessoas também não agem “como se” estivessem a fazer isso. Estão a ignorá-lo.
Falei com Cochrane (ver aqui e aqui). Ele disse que o problema da economia comportamental é que é demasiado flexível – pode ser utilizada para explicar qualquer coisa. Também referiu que Robert Shiller tem vindo a apelar à incorporação de conhecimentos psicológicos na economia há trinta anos, mas pouco progresso tem sido feito.
(Ao responder a esta pergunta, Thaler referiu a bolha das ações da Internet, durante a qual as acções da Palm, a empresa de computadores portáteis, valiam mais do que toda a capitalização bolsista da empresa-mãe da Palm, a 3Com.)
TH: Cochrane tem um modelo que explica porque é que, durante a bolha da Internet, os preços da Palm e da 3Com eram racionais. Os modelos racionais são cem por cento flexíveis. Se permitirmos taxas de desconto variáveis no tempo, não há qualquer disciplina. Se olharmos para o que aconteceu com as ações tecnológicas e depois com o imobiliário, e dissermos que talvez não tenha havido uma bolha – onde está a disciplina nisso?
Penso que é justo dizer que a economia comportamental não resolveu tudo. Isso é verdade. Mas dizer que o Shiller e eu andamos a fazer isto há trinta anos – éramos só eu e ele. Agora temos alguns jovens recrutas. Não estamos em desvantagem de mil para um. Mas há trabalho a fazer.
Acha que a crise financeira virá a ser vista como um ponto de viragem para a economia comportamental – um momento em que se tornou mainstream, ou mesmo dominante?
TH: Penso que é visto como um ponto de viragem, mas já tivemos muitos pontos de viragem. Outubro de 1987 foi um ponto de viragem. A bolha de ações da Internet foi igualmente um ponto de viragem. Agora tivemos outro. Qual é a velha frase – que a ciência progride de funeral em funeral? Ninguém muda de ideias.
O que vai acontecer é que os economistas [na casa dos trinta e quarenta anos] estão bastante abertos a estas ideias. Não acham que sejam muito controversas. É aí que a economia vai estar daqui a dez anos. Eles estarão a gerir o assunto. Pessoas como Posner, Becker, Fama, Lucas e eu – nós faremos parte da história.
Mas não acha que a crise financeira e a recessão vão causar uma revolução intelectual na economia, como aconteceu nos anos trinta?
TH: Não. Nada vai acontecer rapidamente. Mas a próxima geração de economistas, é seguro dizê-lo, estará mais aberta a modelos alternativos de comportamento humano e menos confiante de que os mercados funcionam na perfeição.
Considera que a economia de Chicago da velha escola perdeu algum do seu encanto?
TH: Não, não vejo nenhuma perda mensurável de arrogância. Posner vai contra a corrente. Ele é provavelmente o contraexemplo da teoria de que ninguém aprende nada. Becker, Lucas, etc. – esse grupo pensa provavelmente que ele perdeu o juízo.
Isto leva-nos ao renascimento do keynesianismo e à disputa sobre o pacote de estímulo da Administração Obama. Qual é a sua opinião sobre isso?
TH: A Teoria Geral – qualquer pessoa que volte atrás e leia esse livro não pode deixar de ficar impressionada. Contém muitos conhecimentos, incluindo muitos que anteciparam as finanças comportamentais. Quanto ao estímulo, não sei onde estaríamos agora se não tivesse havido um pacote de estímulo.
Voltando aos assuntos de Chicago. Diz que não vê muito menos arrogância, mas ouvi dizer que tem havido muita discussão interna e debate sobre o que aconteceu. Isso não é verdade?
TH: Sim. Tem havido muita discussão na sala de almoço. Durante seis meses, era a única coisa de que se falava. O que posso dizer sobre os meus colegas é que estavam muito empenhados no que se estava a passar. O que tenho de bom a dizer sobre a Escola de Chicago é que sempre teve a ver com o mundo, não com o abstrato. Isso continua. Pessoas como Kevin Murphy só querem perceber como é que o mundo funciona.
A tradição da teoria dos preços de Chicago é uma boa tradição e é uma metodologia de baixa tecnologia que tenta aplicar uma teoria económica simples ao mundo. Steve Levitt é uma ilustração perfeita disso. De certa forma, também eu me enquadro nessa definição da Escola de Chicago.
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