20 de outubro de 2018

O que está em jogo no próximo dia 28

Candidatura de Bolsonaro não faz parte da rotineira alternância que caracteriza a democracia

André Singer


O candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL) usa chapéu de cangaceiro durante coletiva de imprensa no Rio de Janeiro Mauro Pimentel. AFP

De modo geral, procuro utilizar o espaço que me foi facultado pela Folha para analisar o quadro político de maneira objetiva. Tenho posições, que não escondo, porém entendo ser meu papel mais o de procurar compreender e explicar.

Hoje, porém, dada a excepcionalidade das circunstâncias, peço licença para mudar de tom e tomar uma posição clara e incontornável.

O levantamento do Datafolha publicado nesta sexta (19) aponta para a vitória de Jair Bolsonaro (PSL) no segundo turno.

A fulgurante onda que, em cerca de uma semana antes do primeiro escrutínio, deu ao candidato da extrema direita a inesperada condição de chegar ao poder, parece ter, por ora, se estabilizado.

Note-se, contudo, que bastaria, levando-se em conta o total de votos, mudar o sufrágio daqueles que decidiram digitar 17 na última hora, isto é, no dia da eleição, para reverter o resultado.

Conforme procurei mostrar na última coluna, a julgar pelos dados de pesquisa, cerca de 6,5 milhões de eleitores optaram pelo capitão reformado no próprio momento de votar. Até o sábado (6), ele tinha 40% dos votos válidos. Na noite seguinte, apareceu com 46%.

A análise do que levou tantos brasileiros à estranha decisão de arriscar um radical de direita levará tempo.

Qual foi a influência dos ilegais pacotes de WhatsApp comprados por empresas para favorecer o deputado (18/10)? O quanto possíveis mudanças sociológicas profundas, como um eventual “aburguesamento de valores”, assinalado por Mauro Paulino e Alessandro Janoni (19/10), estariam em curso?

Perguntas difíceis, cujas respostas devem ser imbricadas e complementares, implicam longa elaboração. No curto prazo, deve-se esclarecer o eleitorado sobre o risco que corre.

É mister mostrar que a candidatura de Bolsonaro não faz parte da rotineira alternância que caracteriza a democracia moderna. Conforme Steven Levitsky, coautor do recente livro “Como as Democracias Morrem”, um postulante que elogia a ditadura, aprova a tortura, encoraja execuções extrajudiciais, nega a legitimidade dos seus oponentes e promete tratar movimentos sociais como terroristas é “autoritário” (31/8).

Em outras palavras, Levitsky, da Universidade Harvard e palestrante na Fundação Fernando Henrique Cardoso, diz que Bolsonaro ameaça a continuidade da democracia.

Não acredito que a maioria dos brasileiros seja a favor da ditadura. Segundo o Datafolha (5/10), apenas 12% concordam que uma ditadura seria, em certas circunstâncias, melhor do que a democracia. Trata-se, portanto, de uma obrigação de quem opina avisar os outros 88% sobre o que estará em jogo no domingo 28 de outubro de 2018.

Sobre o autor


Professor de ciência política da USP, ex-secretário de Imprensa da Presidência (2003-2007). É autor de “O Lulismo em Crise”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Guia essencial para a Jacobin

A Jacobin tem divulgado conteúdo socialista em ritmo acelerado desde 2010. Eis aqui um guia prático para algumas das obras mais importantes ...