25 de fevereiro de 2023

A história da I Internacional através de seus congressos e programas

Quase 160 anos após a fundação da Associação Internacional dos Trabalhadores, Marcello Musto analisa suas discussões e vigência, destacando o papel fundamental de Marx. Um passeio por esta Primeira Internacional que era terror para a burguesia e esperança para a classe trabalhadora.

Marcello Musto



Este texto é um trecho da introdução do volume Trabalhadores do mundo, uni-vos!: Antologia Política da Primeira Internacional (Boitempo, 2014)

O início do caminho

Tradução / Em 28 de setembro de 1864, a sala do St. Martin’s Hall, um edifício localizado no coração de Londres, estava cheio de gente. Para preenchê-la, cerca de 2.000 trabalhadores tinham concorrido para ouvir o comício de alguns líderes sindicais ingleses e de um pequeno grupo de trabalhadores do continente.

Os organizadores de tal iniciativa não imaginavam o que esta, a partir desse momento, iria gerar em breve. Eles aspiravam à construção de um local de discussão internacional onde fosse possível examinar os principais problemas relacionados com os trabalhadores. Eles não consideraram a hipótese de fundar uma organização verdadeira e própria, como instrumento de coordenação da iniciativa sindical e política da classe trabalhadora.

Da mesma forma, sua ideologia foi marcada no início mais por reivindicações ético-humanitárias, como a igualdade entre os povos e a paz mundial, do que pelo conflito entre classes e por objetivos políticos concretos. No entanto, a partir dela foi formado o ponto de referência para todas as organizações sucessivas do movimento operário, no qual tanto os reformistas como os revolucionários se sentiriam imediatamente representados: a Associação Internacional dos Trabalhadores.

Em um curto espaço de tempo, suscitou paixões em toda a Europa. Fez da solidariedade de classe um ideal compartilhado e despertou as consciências de uma grande massa de mulheres e homens. Graças à Internacional, o movimento operário conseguiu compreender com mais clareza os mecanismos de funcionamento do modo de produção capitalista, conseguiu adquirir maior consciência da sua própria força e desenvolver novas e mais avançadas formas de luta. Como contrapartida, nas classes dominantes, a notícia sobre a fundação da Internacional provocou horror. O pensamento sobre a possibilidade de que os trabalhadores também reivindicassem um papel ativo na história gerou desgosto e foram numerosos os governos que invocaram a sua eliminação e que a perseguiram com todos os meios de que podiam dispor.

As organizações operárias que fundaram a Internacional eram muito diferentes umas das outras. O centro motor foi o sindicalismo inglês. E seus líderes, quase todos reformistas, estavam interessados principalmente em questões de carácter econômico. Eles lutavam pela melhoria das condições dos trabalhadores sem colocar em discussão o capitalismo. Assim, conceberam a Internacional como um instrumento que poderia colaborar na consecução do seu objetivo, impedindo a importação de mão-de-obra externa durante as greves.

Outro ramo significativo da organização, por muito tempo dominante na França, foi o dos mutualistas. Seguidores das teorias de Pierre-Joseph Proudhon, eles se opunham a qualquer tipo de participação política e eram contra a greve como instrumento de luta. Defensores de um sistema cooperativo sobre uma base federal, argumentaram que era possível modificar o capitalismo através de um acesso equitativo ao crédito. Por estas razões, representaram a ala direita da Internacional.

Ao lado destas duas tendências, numericamente majoritárias, o terceiro grupo, por ordem de importância, eram os comunistas, reunidos em torno da figura de Karl Marx, e ativos, com pequenos agrupamentos numa esfera de influência muito circunscrita, em algumas cidades alemãs ou suíças, bem como em Londres. Anticapitalistas, opunham-se ao sistema de produção existente e reivindicavam a necessidade de ação política para o reverter.

Entre as fileiras da Internacional, na altura da sua fundação, havia também outros componentes que não mantinham qualquer relação com a tradição socialista.

Entre eles estavam alguns núcleos de exilados dos países da Europa Oriental, inspirados por concepções vagamente democráticas, e os partidários do pensamento interclassista de Giuseppe Mazzini. Completavam o quadro da organização, gerando um equilíbrio ainda mais complexo, os diversos grupos de trabalhadores franceses, belgas e suíços que aderiram à Internacional, trazendo as teorias mais diferentes e confusas, incluindo algumas inspiradas no utopismo.

A ação política que conseguiu fazer conviver todas essas almas na mesma organização e, além disso, com um programa muito distante das posições iniciais de cada uma delas, foi indiscutivelmente obra de Marx. Os seus dons políticos permitiram-lhe conciliar o que parecia irreconciliável e asseguraram um futuro para a Internacional, que, sem o seu protagonismo, teria rapidamente afundado no esquecimento, tal como o resto das numerosas associações operárias que a precederam. Foi Marx quem deu uma finalidade clara à Internacional. Foi Marx quem compreendeu um programa político não excludente, embora firmemente de classe, com a garantia de uma organização que aspirava a ser massiva e não sectária. A alma política de seu Conselho Geral foi sempre Marx, que redigiu quase todas as resoluções principais e compilou quase todos os relatórios preparatórios para os congressos. Ele foi “o homem certo no momento certo”, como escreveu o líder operário alemão Georg Eccarius.

A formação da Internacional

A discordância temporal entre os principais eventos organizacionais e políticos da Internacional torna complexa a reconstrução cronológica da sua história. Do ponto de vista organizacional, as fases mais importantes atravessadas pela Associação foram: I) o seu nascimento (1864-1866), ou seja, desde a fundação até ao primeiro congresso (Genebra, 1866); II) a sua expansão (1866-1870); III) o seu giro revolucionário e a repressão que se seguiu à Comuna de Paris (1871-1872); e IV) a divisão e a crise (1872-1877). Do ponto de vista da luta política interna, por outro lado, as fases principais da Internacional foram: I) o debate inicial entre os vários componentes e a construção de seus fundamentos teóricos (1864-1865); II) o conflito pela hegemonia entre coletivos e mutualistas (1866-1869); e III) o choque entre centralistas e autonomistas (1870-1877).

A Inglaterra foi o primeiro país a fazer pedidos de adesão à Internacional. Em fevereiro de 1865, 4.000 membros da Sociedade de Pedreiros aderiram. Pouco depois, grupos de trabalhadores da construção e sapateiros se juntaram. No decorrer de seu primeiro ano de vida, o Conselho Geral realizou uma prolífica atividade de divulgação dos princípios políticos da Internacional que contribuiu para ampliar o horizonte da Associação acima da esfera de questões meramente econômicas, como demonstra sua presença entre as organizações que participaram da Reform League, o movimento para a reforma eleitoral nascido em fevereiro de 1865.

Na França, a Internacional começou a tomar forma em janeiro de 1865, data em que sua primeira seção foi fundada em Paris. A influência ideológica exercida pela Associação foi fraca e suas relações de força limitadas, somadas à escassa determinação política, impediram a fundação de uma federação nacional. Não obstante estes limites, os franceses formaram o segundo grupo mais consistente da Internacional durante a primeira conferência da organização realizada em Londres. Esta foi realizada entre 25 e 29 de setembro, com a presença de 30 delegados da Inglaterra, França, Suíça e Bélgica e de algumas outras representações da Alemanha, Polônia e Itália. Cada um deles forneceu notícias, sobretudo de natureza organizacional, sobre os primeiros passos que a Internacional tinha começado a dar nos seus respectivos países. Nesta sede foi convocado, para o ano seguinte, o primeiro Congresso Geral.

No período entre estes dois congressos, a Internacional seguiu o seu processo de expansão na Europa. Começou a construir seus primeiros núcleos importantes na Bélgica e na Suíça francesa. As «Leis Prussianas de Associação», que impediam os grupos políticos alemães de estabelecer relações estruturadas com organizações de outros países, não permitiram abrir secções da Internacional no que era, na época, a Confederação Germânica.

Nesta fase inicial, a atividade realizada pelo Conselho Geral na Inglaterra contribuiu enormemente para a consolidação da Internacional. Apoiando as greves dos Alfaiates Unificados de Londres, no decorrer da primavera de 1866, a organização participou pela primeira vez ativamente de uma luta operária. Após a vitória da greve, cinco pequenas sociedades de alfaiates, de cerca de 500 trabalhadores cada, decidiram aderir à Internacional. A conclusão positiva de outras vertentes atraiu vários pequenos sindicatos, a tal ponto que, no momento do seu primeiro congresso, as organizações sindicais afiliadas já eram 17, com um total de mais de 25.000 aderentes.

Entre 3 e 8 de setembro de 1866, a cidade de Genebra acolheu o primeiro congresso da Internacional. Participaram 60 delegados da Inglaterra, França, Alemanha e Suíça. A organização chegou a este encontro com um balanço muito positivo, depois de ter reunido sob a sua bandeira, apenas dois anos após a sua fundação, mais de uma centena de pequenos sindicatos e organizações políticas. Os participantes da conferência foram divididos em dois blocos principais. O primeiro, que era composto por delegados britânicos, pelos poucos alemães presentes e pela maioria dos suíços, seguiu as diretrizes do Conselho Geral redigidas por Marx, que esteve ausente em Genebra. O segundo bloco, do qual faziam parte os franceses e os suíços de língua francesa, estava integrado pelos mutualistas.

Nessa altura, a Internacional era uma organização em que prevaleciam as posições moderadas. Os mutualistas, de fato, liderados pelo parisiense Henri Tolain, prefiguravam uma sociedade em que o trabalhador seria ao mesmo tempo produtor, capitalista e consumidor. Na sua opinião, a concessão de crédito gratuito era a medida decisiva para transformar a sociedade; eles se opunham ao trabalho feminino, condenado do ponto de vista moral e social; e também se opunham a qualquer interferência do Estado em matéria de relações de trabalho (incluindo a redução legal do dia de trabalho para oito horas), pois estavam convencidos de que colocaria em risco as relações privadas entre o trabalhador e o patrão, e que isso fortaleceria o sistema existente.

Apesar da força numérica dos franceses, os líderes do Conselho Geral presentes no congresso conseguiram frear os mutualistas e construir, com base nas proposições elaboradas por Marx, alguns resultados favoráveis em relação à importância do sindicato e da intervenção do Estado.

As greves, a expansão e a derrota dos mutualistas

No final de 1866, as greves intensificaram-se em muitos países europeus. Organizadas por grandes massas de trabalhadores, contribuíram para que eles tomassem consciência das condições em que eram forçados a viver e se tornaram o motor de uma nova e importante temporada de lutas. Em contraste com o argumento apresentado por alguns governos da época, que apontava a propaganda da Internacional como responsável pelas greves, a maioria dos trabalhadores que participaram nelas nem sequer estava ciente da sua existência. Os protestos se originaram devido às dramáticas condições de trabalho e de vida que os trabalhadores foram forçados a suportar. Estas mobilizações representaram o primeiro momento de encontro e de coordenação com a Internacional, que as apoiou com proclamações e apelos de solidariedade, organizou coletas de dinheiro para os grevistas e promoveu reuniões para bloquear as tentativas dos empregadores de enfraquecer a resistência.

Foi precisamente devido ao papel concreto que a Internacional desempenhou que os trabalhadores começaram a reconhecê-la como um lugar de defesa dos seus interesses comuns e a querer filiar-se a ela. A primeira grande batalha vencida graças ao seu apoio foi a travada pelos trabalhadores do bronze em Paris, cuja greve durou de fevereiro a março de 1867. Também tiveram sucesso as greves dos trabalhadores do ferro em Marchienne, em fevereiro de 1867; a dos trabalhadores da bacia mineira em Provence, que começou em abril de 1867 e terminou em fevereiro de 1868; a dos mineiros em Charleroi e a dos pedreiros em Genebra, ambas durante a primavera de 1868. Em cada uma delas, o roteiro foi repetido de forma idêntica: foi feita uma coleta de dinheiro em apoio aos grevistas, impulsionada pelos trabalhadores de outros países, com o acordo de que estes últimos não aceitassem um trabalho que os degradasse à condição de mercenários. Tudo isso forçou os empregadores a chegar a um acordo e a aceitar muitas das demandas dos trabalhadores. Após o sucesso destas lutas, centenas de novos membros juntaramse à Internacional nas cidades onde tinham sido realizadas as greves. Como afirmou o membro do Conselho Geral Eugène Dupont: "não é a Associação Internacional dos Trabalhadores que empurra [os trabalhadores] para a greve, mas [é] a greve que os empurra para os braços da Associação Internacional dos Trabalhadores".

Assim, apesar das complicações decorrentes da diversidade de países, línguas e culturas políticas, a Internacional conseguiu reunir e coordenar as muitas organizações e as numerosas lutas que nasceram espontaneamente. O seu maior mérito foi ter sido capaz de apontar a absoluta necessidade da solidariedade de classe e da cooperação internacional, transformando de forma irreversível o carácter parcial dos objetivos e das estratégias do movimento operário. A partir de 1867, fortalecida por essas conquistas, bem como pelo aumento do número de militantes e por uma estrutura organizacional mais eficiente, a Internacional avançou em todo o continente. Esse ano foi marcado pelo notável progresso da Associação, especialmente na França. As adesões multiplicaram-se também na Bélgica, por efeito das greves, e na Suíça, onde ligas operárias, cooperativas e sociedades políticas aderiram com entusiasmo.

Este foi o cenário que precedeu o congresso de 1867. Foi realizado novamente na Suíça, mas desta vez na cidade de Lausanne, de 2 a 8 de setembro. Participaram 64 delegados de 6 países (nesta ocasião também estiveram presentes representantes da Bélgica e da Itália). Entre eles estava uma forte presença dos mutualistas, que impuseram na agenda do congresso temas típicos proudhonianos, tais como o debate sobre o movimento cooperativo e sobre o uso alternativo do crédito. A sua oposição à socialização da propriedade da terra continuou a ser inquestionável e a discussão mais aprofundada sobre o assunto foi adiada para o congresso seguinte. Os mutualistas foram durante quatro anos a parte mais moderada da Internacional. Os sindicalistas ingleses, mesmo não compartilhando as posições anticapitalistas de Marx, não tiveram o comportamento dos seguidores de Proudhon em relação às escolhas políticas da organização. Em 1868, por exemplo, ainda eram muitos os setores da Internacional de tendência mutualista que se opunham à prática da greve.

Agora, antes de Marx, aqueles que tornaram marginal a doutrina de Proudhon na Internacional foram os próprios trabalhadores. Foi, acima de tudo, a proliferação de greves que convenceu os mutualistas de quão erradas eram as suas concepções. Foram as lutas proletárias que lhes mostraram que a greve era a resposta imediata e necessária para melhorar as condições existentes, e também, ao mesmo tempo, para fortalecer a consciência de classe indispensável para construir a sociedade do futuro. Foram as mulheres e os homens de carne e osso que pararam a produção capitalista exigindo direitos e justiça social; foram eles que mudaram o equilíbrio de poder na Internacional e, o que é mais significativo, na sociedade. Foram os trabalhadores do bronze de Paris, os trabalhadores têxteis de Rouen e de Lyon, os mineiros de St. Etienne que, com uma força superior a qualquer discussão teórica, convenceram os líderes internacionalistas franceses sobre a necessidade de socializar a terra e a indústria. Foi, em última análise, o movimento operário que demonstrou, contradizendo Proudhon, que era impossível separar a questão econômico-social da questão política.

O Congresso de Bruxelas, realizado entre 6 e 13 de setembro de 1868, com a presença de 99 delegados da França, Inglaterra, Suíça, Alemanha, Espanha e Bélgica (com 55 representantes), sancionou a redução dos mutualistas. O momento culminante foi o pronunciamento a favor da proposta, feita por César De Paepe, de socializar os meios de produção. A resolução votada representou um passo decisivo no processo de definição das bases econômicas do socialismo. Isso constituiu uma vitória importante do Conselho Geral e pela primeira vez princípios socialistas foram incluídos no programa político de uma grande organização do movimento operário. Se o Congresso de Bruxelas foi a base da qual partiu a reviravolta coletivista da Internacional, o do ano seguinte, realizado entre 5 e 12 de setembro em Basileia, terminou de confirmar. Os participantes do congresso foram 78. Eles não vieram apenas da França, Suíça, Alemanha, Inglaterra e Bélgica, mas, como resultado da expansão da organização, também da Espanha, Itália e Áustria, e até mesmo contou com a presença de um representante do Sindicato Nacional do Trabalho dos Estados Unidos. As resoluções sobre a propriedade da terra, apresentadas em Bruxelas no ano anterior, foram confirmadas em uma nova votação e aprovadas por 54 delegados, com apenas 4 votos contra e 13 abstenções. O novo texto declarava que "a sociedade tem o direito de abolir a propriedade individual da terra e dá-la à comunidade" e foi também aprovado pelos delegados franceses.

O Congresso de Basileia também teve outro fato interessante: a participação do deputado Mikhail Bakunin. Não tendo conseguido ganhar a liderança da Liga da Paz, Bakunin tinha da Democracia Socialista em setembro de 1868; uma organização que em dezembro solicitou a adesão à Internacional. Finalmente, depois de ter derrotado os mutualistas e o fantasma de Proudhon, Marx viu-se, a partir desse momento, na situação de enfrentar um rival ainda mais duro; um que formou uma nova tendência dentro da organização — o anarquismo coletivista — e que aspirava conquistá-la.

O desenvolvimento em toda a Europa e a Comuna de Paris

O período entre o final dos anos sessenta e o início dos anos setenta foi o cenário de numerosos conflitos sociais. Durante esta fase, muitos dos trabalhadores que participaram dos protestos exigiram o apoio da Internacional, que estava ganhando cada vez mais fama. Apesar das limitações de meios e recursos, o Conselho Geral nunca deixou de responder aos pedidos que lhe chegavam, ativando-se, de vez em quando, através da elaboração de chamadas à solidariedade dirigidas a todas as suas seções na Europa e organizando coletas de fundos.

O ano de 1869 foi para a Internacional um período de expansão significativa em toda a Europa. Na França, após a dura repressão de 1868, a Associação ressurgiu. Em Paris, o número de membros atingiu aproximadamente 10.000, a maioria dos quais aderiu à Internacional através de sociedades cooperativas, câmaras sindicais de ofício e sociedades de resistência. Na cidade de Lyon, onde em setembro de 1870, após uma revolta, foi proclamada uma Comuna Popular, depois violentamente reprimida, os cálculos mais rigorosos estimaram uma adesão de 3.000 trabalhadores. Estima-se que o número total de membros em todo o território nacional tenha sido entre 30.000 e 40.000. Esta Internacional era muito diferente da fundada em 1865 por Tolain e Friburg. Em 1870, os eixos da organização na França foram a intervenção nos conflitos sociais e a atividade política. Na Bélgica, o período que se seguiu ao congresso de 1868 foi caracterizado pelo nascimento do sindicato, pelo êxito vitorioso das greves e pela adesão à Internacional de numerosas organizações operárias.

O número de membros atingiu o seu pico no início dos anos setenta, quando eram contabilizados em dezenas de milhares, superando provavelmente o total alcançado na França.

Durante esta fase, a tendência positiva da Internacional também se manifestou na Suíça. Em 1870, o número total de seus militantes chegou a 6.000. Na cidade de Genebra havia 34 seções, para um total de 2.000 membros; enquanto na região do Jura havia cerca de 800. A consolidação da Federação do Jura (na qual Bakunin estava inscrito) representou uma etapa importante na construção de uma corrente anarquista-federalista no interior da Internacional. Sua principal figura foi o jovem James Guillaume, que teve um papel fundamental no confronto com Londres. Nesta fase, as ideias de Bakunin começaram a se espalhar em muitas cidades, especialmente no sul da Europa. O país em que obtiveram o consenso mais rápido foi a Espanha.

Na Confederação Germânica do Norte, desenvolveu-se uma situação completamente diversa. Apesar de o movimento operário daquele país já ter duas organizações políticas, a Associação Geral dos Trabalhadores Alemães, de tendência lassalleana, e o Partido dos Trabalhadores SocialDemocratas da Alemanha, de orientação marxista, o entusiasmo que ali se manifestou pela Internacional foi mínimo, assim como foram muito poucos os pedidos de adesão.

Como compensação pela situação decepcionante na Alemanha, houve dois eventos positivos. Em maio de 1869, outras seções da Internacional foram fundadas em um novo país, a Holanda, e a organização começou a se desenvolver lentamente em Amsterdã e na Frísia. Pouco depois, também renasceu na Itália, país onde estava presente desde antes, mas com apenas alguns grupos dispersos e desconectados entre eles.

Ainda mais significativo, pelo menos pelo seu caráter simbólico, foi a chegada da Internacional do outro lado do oceano. Na verdade, a partir de 1869, e por iniciativa de alguns imigrantes que tinham chegado nos anos anteriores, as primeiras seções foram formadas nos Estados Unidos da América. No entanto, a organização foi marcada, desde o seu início, por duas limitações que nunca foram ultrapassadas. Ele não foi capaz de reduzir o caráter nacionalista de vários grupos que se juntaram a ela e também não conseguiu envolver os trabalhadores locais.

Neste cenário de expansão universal, embora marcada por contradições óbvias e pelo avanço desigual de desenvolvimento nos diferentes países, a Internacional estava pronta a realizar o seu quinto congresso em Setembro de 1870. A Guerra Franco-Prussiana que eclodiu em 19 de julho de 1870 obrigou, no entanto, a suspender o congresso. O início de uma guerra no centro da Europa impôs à Internacional uma prioridade absoluta: ajudar o movimento operário a expressar uma posição independente e distante da retórica nacionalista da época.

Após a captura de Bonaparte, derrotado pelos alemães em Sedan em 4 de setembro de 1870, a Terceira República foi proclamada na França. Seguiu-se um armistício baseado nas condições impostas por Bismarck, que desencadeou o apelo às eleições e a subsequente nomeação de Adolphe Thiers a cargo do poder executivo, com o apoio de uma ampla maioria legitimista e orleanista. A clara perspectiva de um governo que não realizaria nenhuma reforma social provocou a revolta dos parisienses. Esta terminou com a expulsão de Thiers e o nascimento, em 18 de março, da Comuna de Paris, o evento político mais importante na história do movimento operário do século XIX.

Apesar da defesa apaixonada e convincente de Marx em A Guerra Civil na França, a Internacional não exortou os parisienses à insurreição, nem exerceu uma influência decisiva na Comuna de Paris. A partir desse momento, no entanto, esteve no olho da tempestade. A reviravolta violenta que sofrida pela Comuna de Paris, e a fúria da brutal repressão desencadeada por todos os governos europeus, não impediram a Internacional de aumentar suas próprias forças. Embora tenha sido frequentemente atacada pelas calúnias que os seus adversários escreviam contra ela, a "Internacional" tornou-se, neste período, uma palavra conhecida por todos. Nas bocas dos capitalistas e da classe burguesa, foi sinônimo de ameaça à ordem estabelecida; mas, para as operárias e os operários, significou a esperança de um mundo sem exploração e sem injustiça. A confiança de que era possível alcançá-lo aumentou depois da Comuna de Paris. Ela deu vitalidade ao movimento operário, exortou-o a tomar posições mais radicais e a intensificar a militância. Paris mostrou que a revolução era possível, que o objetivo poderia e deveria ser a construção de uma sociedade radicalmente diferente da capitalista e também que, para conseguir isso, os trabalhadores teriam que dar vida a formas de associação política estáveis e bem organizadas.

A crise da Internacional

Neste cenário que não favoreceu a convocação de um novo Congresso, a quase dois anos do último, o Conselho Geral decidiu organizar uma conferência na cidade de Londres. Ocorreu entre 17 e 23 de setembro e contou com a presença de 22 delegados que vieram da Inglaterra, Irlanda, Bélgica, Suíça e Espanha, aos quais se juntaram também os exilados franceses.

A decisão mais importante tomada durante o congresso, e pela qual é lembrado, foi a aprovação da resolução sobre "a ação política da classe trabalhadora" (resolução IX). No texto aprovado em Londres afirmava-se: que a classe trabalhadora, contra este poder coletivo das classes possuidoras, só pode atuar como classe quando se constitui como um partido político autônomo, contraposto a todas as velhas formações partidárias das classes possuidoras; que esta construção da classe trabalhadora em partido político é indispensável para o triunfo da revolução social e do seu fim último: a abolição das classes.

Se o Congresso de Genebra de 1866 tinha apontado a importância do sindicato, a Conferência de Londres de 1871 definiu a outra ferramenta de luta fundamental do movimento operário: o partido político. Marx estava convencido de que as resoluções adotadas em Londres teriam recebido a aprovação de quase todas as principais federações e seções locais. No entanto, logo teve que mudar de ideia.

Se a posição crítica da Federação do Jura tinha sido tomada em consideração, Marx ficou surpreso quando, em 1872, surgiram de muitas frentes sinais de descontentamento e de rebelião contra sua linha política. Em muitos países, as decisões tomadas em Londres foram consideradas uma grave interferência na autonomia na política local e, portanto, uma imposição inaceitável. A federação belga, que durante a conferência tinha tentado construir uma mediação entre as partes, começou a tomar uma posição muito crítica em relação a Londres. Posteriormente, os holandeses também tomaram distância. Ainda mais duras foram as reações no sul da Europa, onde a oposição alcançou, rapidamente, um consenso notável.

As acusações contra o Conselho Geral foram de diferentes tipos e motivadas, muitas vezes, apenas por razões de natureza pessoal. Foi assim que ocorreu uma estranha alquimia que tornou a gestão da organização ainda mais problemática. O principal adversário da mudança que desencadeou a resolução IX foi um ambiente que ainda não estava preparado para receber o salto qualitativo proposto por Marx. Apesar das declarações de flexibilidade que o acompanharam, a mudança iniciada em Londres foi percebida por muitos como uma grande imposição. O princípio da autonomia das várias realidades que compunham a Internacional era considerado como uma das pedras angulares da Associação, não só pelo grupo mais ligado a Bakunin, mas também pela maior parte das federações e secções locais. Este foi o erro de análise que Marx cometeu e que precipitou a crise da Internacional.

A batalha final foi desencadeada no final do verão de 1872. Após os acontecimentos que durante três anos alteraram o curso da sua história - a Guerra Franco-Prussiana, a violenta repressão que se seguiu à Comuna de Paris e os numerosos conflitos internos - a Internacional pôde finalmente realizar outro congresso. O seu quinto Congresso Geral teve lugar em Haia, entre 2 e 7 de Setembro. Participaram 65 delegados representando mais de 14 países (França, Alemanha, Bélgica, Inglaterra, Espanha, Suíça, Holanda, Áustria-Hungria, Dinamarca, Irlanda, Hungria, Polônia, Portugal e Austrália). Embora os internacionalistas italianos não tenham enviado seus 7 delegados em protesto contra as decisões tomadas no ano anterior em Londres, o congresso de 1872 foi sem dúvida o mais representativo da história da Internacional. A importância decisiva do evento levou Marx a assistir pessoalmente.

A decisão mais importante tomada em Haia foi a inclusão da resolução IX do Congresso de Londres nos estatutos da Associação. A luta política foi finalmente considerada uma ferramenta necessária para a transformação da sociedade: "uma vez que os senhores da terra e do capital fazem uso dos seus privilégios políticos para defender e perpetuar o seu monopólio econômico e escravizar o trabalho, a conquista do poder político torna-se o grande dever do proletariado". Em 1872, a Internacional era, portanto, muito diferente do que tinha sido no momento da sua fundação. Os componentes democrático-radicais tinham deixado a Associação, depois de terem sido deslocados. Os mutualistas tinham sido derrotados e suas forças drasticamente reduzidas. Os reformistas já não constituíam a parte predominante da organização (exceto na Inglaterra) e o anticapitalismo tinha-se tornado a linha política de toda a Internacional, mesmo das novas tendências — como a anarco-coletivista — que se tinham formado ao longo dos últimos anos. Embora durante a existência da Internacional a Europa tivesse sido atravessada por um período de grande prosperidade econômica, os trabalhadores tinham cada vez mais claro que sua situação só mudaria realmente quando a exploração do homem pelo homem acabasse, e não por reivindicações econômicas destinadas a alcançar paliativos às condições existentes.

O cenário, por outro lado, tinha mudado radicalmente também fora da organização. A unificação da Alemanha, que ocorreu em 1871, marcou o início de uma nova era, na qual o Estado-nação se afirmou definitivamente como uma forma de identidade política, jurídica e territorial. O novo contexto tornava pouco plausível a continuidade de um organismo supranacional ao qual as organizações de diferentes países, mesmo que conservassem a sua autonomia, tivessem de ceder uma parte significativa da condução política.

A configuração inicial da Internacional tinha sido ultrapassada e a sua missão original tinha terminado. Já não se tratava de procurar predisposição e de coordenar iniciativas de solidariedade em apoio às greves na Europa, nem de realizar congressos para discutir a utilidade das organizações sindicais ou a necessidade de socializar a terra e os meios de produção. Estas questões tinham-se tornado o patrimônio coletivo de todos os componentes da organização. Depois da Comuna de Paris, o verdadeiro desafio para o movimento operário era a revolução, ou como organizar-se para por fim ao modo de produção capitalista e derrubar as instituições do mundo burguês.

Durante o Congresso de Haia, ocorreram várias votações, que despertaram fortes controvérsias. A expulsão de Bakunin e Guillaume foi sancionada e a transferência da sede do Conselho Geral para Nova York foi aprovada. Foram muitos, mesmo nas fileiras da maioria, a votar contra esta moção, compreendendo que tal decisão marcaria o fim da Internacional como estrutura operacional. Para Marx, no entanto, era melhor renunciar à Internacional (a partir de então já não fazia parte do Conselho Geral) do que vê-la cair nas mãos de seus adversários e testemunhar sua mutação em uma organização sectária. A morte da Internacional era altamente preferível à perspectiva de uma luta fratricida lenta e dispendiosa. No entanto, o argumento de muitos especialistas ainda não é convincente, segundo o qual o crepúsculo da Internacional se originou no conflito de suas duas correntes principais; ou o que é ainda mais improvável, entre duas figuras históricas, por mais que fossem da grandeza de Marx e Bakunin. As razões para o seu fim devem ser procuradas noutro lugar. O que tornou a Internacional obsoleta foram as grandes mudanças que ocorreram fora dela. O crescimento e a transformação das organizações do movimento operário, o fortalecimento dos Estados nacionais, a expansão da Internacional em países como Espanha e Itália, caracterizados por condições econômicas e sociais muito diferentes das da Inglaterra e França (onde a Associação tinha nascido), a definitiva reviravolta moderada do sindicalismo inglês e a repressão que se seguiu à queda da Comuna de Paris: todos estes fatores agiram de forma concomitante para transformar a configuração original da Internacional em uma inadequada face às condições históricas em mutação.

A nova Internacional

Em 1872, a Internacional que nasceu em 1864 deixou de existir. A grande organização que durante oito anos tinha sustentado com sucesso numerosas greves e lutas, forjado um programa teórico anticapitalista e ramificado a sua presença em todos os países europeus, implodiu após o Congresso de Haia. No entanto, sua história não acabou com a partida de Marx. Em vez disso, surgiram dois reagrupamentos de forças, mas menores e sem a capacidade de projeto ou a ambição política da Internacional. O primeiro era composto pelos "centralistas", ou do último congresso, que lutava por uma organização dirigida politicamente por um Conselho Geral. O segundo era formado pelos "autonomistas", ou a minoria, que considerava que as seções gozavam de absoluta autonomia na tomada de decisões.

A organização "centralista" permaneceu operacional apenas em alguns poucos países, sua vida foi curta e não produziu nenhuma elaboração teórica; os autonomistas, pelo contrário, continuaram sendo por alguns anos, uma realidade concreta e sem dúvida mais ativa. Seu último congresso foi realizado em Verviers, em setembro de 1877, com a presença de 22 delegados. No entanto, todos eles pertenciam à tendência anarquista. O resto das correntes reuniu-se na cidade de Ghent por ocasião do Congresso Socialista Universal, o maior encontro já realizado entre as organizações do movimento operário. Mesmo a Internacional autonomista, que só tinha mantido uma base popular na Espanha, também havia concluído seu ciclo. Superou a crescente tomada de consciência, que se espalhou em quase todo o movimento operário europeu, sobre a importância absoluta de participar na luta política com organizações partidárias. O fim da experiência autonomista também selou o crepúsculo da relação entre anarquistas e socialistas, que, a partir desse momento, viram seus caminhos se separarem definitivamente.

Nas décadas seguintes, o movimento operário adotou um programa socialista, expandiu-se primeiro na Europa e depois em todos os cantos do mundo e construiu novas estruturas de coordenação supranacional. Cada uma delas, além de manter o nome (por exemplo, a Segunda Internacional de 1889-1916 ou a Terceira Internacional de 1919-1943), manteve os princípios e os ensinamentos da "primeira" Internacional. Desta forma, a sua mensagem revolucionária revelou a sua extraordinária fertilidade, gerando com o passar do tempo resultados ainda melhores do que os alcançados durante a sua existência.

A Internacional deixou impressa nas consciências dos proletários a convicção de que a libertação do trabalho em relação ao jugo do capital não poderia ser alcançada dentro dos limites de um único país, mas que se tratava de uma questão global. Além disso, graças à Internacional, os operários entenderam que sua emancipação só poderia ser conquistada por eles mesmos, por sua capacidade de organização, e que não deveria ser delegada a outros. Finalmente, a Internacional espalhou entre os trabalhadores a consciência de que a sua escravidão cessaria apenas com a superação do modo de produção capitalista e do trabalho assalariado, uma vez que as melhorias internas ao sistema vigente, que no entanto se reivindicavam, não teriam modificado a dependência econômica em relação às oligarquias patronais.

Um abismo separa as esperanças daquele tempo da falta de confiança que existe no presente; a determinação anti-sistêmica daquelas lutas e a subordinação ideológica contemporânea; a solidariedade que construiu o movimento operário de então e o individualismo atual, produto das privações e da concorrência do mercado; a paixão pela política dos trabalhadores que se reuniram em Londres em 1864 e a resignação e a apatia que hoje prevalecem. No entanto, numa época em que o mundo do trabalho é forçado a suportar condições de exploração semelhantes às do século XIX, o projeto da Internacional recupera agora uma importância extraordinária. Atrás de cada injustiça social, em cada lugar onde os direitos dos trabalhadores são pisoteados, a semente da nova Internacional germina.

A barbárie da "ordem mundial" atual, os desastres ecológicos produzidos pelo modo de produção vigente, a lacuna inaceitável entre a riqueza de uma minoria de exploradores e o estado de indigência em que estão mergulhados setores cada vez mais amplos da população, a opressão de gênero, os novos ventos de guerra, o racismo e o chovinismo exigem ao movimento de trabalhadores e trabalhadoras que se reorganize com urgência a partir de duas características da Internacional: a versatilidade de sua estrutura e o radicalismo dos objetivos a alcançar. Os objetivos da organização nascida em Londres, há mais de 150 anos, são hoje mais atuais do que nunca. Para estar à altura dos desafios do presente, no entanto, a nova internacional não poderá prescindir de dois requisitos fundamentais: ser plural e anticapitalista.

Colaborador

Marcello Musto é catedrático de Sociologia na Universidade de York (Toronto). Seus escritos tem sido traduzidos para vinte e cinco idiomas e estão disponíveis em www.marcellomusto.org.

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