27 de maio de 2023

Congresso reclama de emendas travadas, apesar de ritmo ligeiramente maior sob Lula

Governo autorizou verbas individuais, mas líderes pedem previsão do dinheiro que Planalto herdou após fim das emendas de relator

Thiago Resende
Mateus Vargas


Deputados e senadores apontam o atraso na liberação de emendas como um dos motivos para as dificuldades do governo Lula (PT) na relação com o Congresso Nacional.

Líderes do centrão demonstram ainda insatisfação com a falta de perspectiva para que o Palácio do Planalto destrave a verba que herdou após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre o fim das emendas de relator –principal mecanismo de negociação política no governo de Jair Bolsonaro (PL).

Apesar das reclamações sobre o ritmo das emendas, os dados do Congresso Nacional mostram que a execução desses recursos tem sido ligeiramente superior ao início da gestão Bolsonaro e ao terceiro ano do mandato do ex-presidente.

Deputados aliados do governo, líder do governo e o relator da proposta celebram a aprovação do novo arcabouço fiscal ao redor do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) - Pedro Ladeira-23.mai.23/Folhapress

De fato, Lula tem dado um fluxo menor, até maio, em relação a 2022 e 2020. Por serem anos eleitorais, há restrições para a liberação de emendas a partir de julho. Por isso, é dada mais celeridade no começo do ano.

Além disso, interlocutores do presidente afirmam que é natural que, no primeiro ano de um novo governo, seja necessário um período para a máquina pública engatar.

A Secretaria de Relações Institucionais, comandada pelo ministro Alexandre Padilha (PT), declarou que "o ritmo de liberação de emendas segue os trâmites ordinários de execução de despesa, de acordo com a execução dos projetos dentro das políticas setoriais de cada ministério".

O governo autorizou, até o momento, R$ 2,7 bilhões em emendas individuais –aquelas que todo deputado ou senador tem direito e que são de execução obrigatória, ou seja, o Planalto precisa autorizar até o fim do ano.

No primeiro ano de Bolsonaro, foram menos de R$ 200 milhões liberados para essas emendas. Porém, em 2022, ano eleitoral, fora mais de R$ 8 bilhões autorizados de janeiro a maio.

Neste primeiro semestre, a articulação política de Lula tem adotado a estratégia de priorizar aliados nas emendas individuais e realizar repasses de emendas que Bolsonaro ainda não quitou.

Nos últimos anos, o Congresso pulverizou bilhões de emendas com tratores, asfalto e repasses para a saúde sem observar critérios técnicos e prioridades regionais.

Como emendas bancam obras e projetos de parlamentares nas bases eleitorais, a execução completa da ação pode demorar mais de um ano. Isso deixa o pagamento da fatura para períodos posteriores.

Integrantes do centrão dizem que o efeito político desses pagamentos de emendas antigas é baixo. Além disso, contestam a burocracia de órgãos do governo Lula, como a Caixa, para aprovação dos projetos de novas emendas.

As novas emendas de 2023 liberadas por Lula até agora são concentradas no Ministério da Saúde, cujo processo para despachá-las é mais simples –repasses são feitos para os municípios.

Desde março, integrantes do centrão questionam como funcionará a distribuição dos R$ 9,8 bilhões de recursos que Lula recebeu após o fim das emendas de relator e que articuladores do Planalto prometem usar como moeda de troca com o Congresso.

O presidente Lula e os ministros Alexandre Padilha (SRI) e Rui Costa (Casa Civil) - Lucio Tavora-10.mar.23/ Xinhua

Os principais ministérios elaboraram regras para tentar manter o controle sobre parte desse orçamento. Mas, segundo auxiliares do Planalto, ainda não há previsão para o início dos repasses dessa verba, pois a ideia é dar transparência de quais parlamentares e prefeitos foram beneficiados.

Essa quantia de R$ 9,8 bilhões é uma das fatias mais cobiçadas por parlamentares por não colocar um teto de indicações por deputado ou senador.

Apesar de o STF ter decidido que essa verba não deveria se tornar uma moeda de troca nas negociações por apoio ao governo, a gestão petista já prometeu a entrega de uma parte do dinheiro herdado das emendas de relator para ampliar sua base de apoio.

A pasta da Saúde tem a maior fatia (R$ 3 bilhões) do recurso remanescente da verba declarada inconstitucional. Em portaria publicada no dia 4 de maio, o ministério definiu uma série de prioridades.

Técnicos da Saúde afirmam que essa portaria foi editada para tentar não afrouxar o controle sobre a verba.

Para o custeio da atenção primária, por exemplo, a Saúde coloca como prioridades destinar recursos para compra de equipamentos médicos-assistenciais, equipamentos de consultório odontológico, reformas de unidades básicas, entre outras ações.

Os gestores de estados, municípios e do Distrito Federal devem apresentar as propostas de emendas em site montado pelo governo federal.

O Ministério dos Esportes também definiu critérios para liberação dos R$ 200 milhões reservados para a pasta da verba herdada das emendas de relator.

O valor é pequeno comparado ao que está disponível para a Saúde, mas representa quase metade da verba discricionária (que não é usada para pagar salários e outras obrigações) da pasta comandada pela ministra Ana Moser.

Durante a gestão Bolsonaro, as negociações entre Congresso e o governo federal fizeram explodir o valor das emendas parlamentares.

Em 2018, havia cerca de R$ 11 bilhões disponíveis para todos os tipos de indicações de deputados e senadores, valor que subiu para patamar próximo de R$ 40 bilhões por ano durante o mandato de Bolsonaro —quantia que ficou ainda mais elevada no governo Lula 3.

Um dos reflexos dessa alteração é o acúmulo dos chamados "restos a pagar", ou seja, de verbas empenhadas, mas que não foram pagas durante o ano, e sobram para o orçamento seguinte.

Há R$ 32,2 bilhões inscritos nestas sobras de emendas. A decisão do STF sobre as emendas de relator também criou insegurança sobre os restos a pagar do extinto mecanismo de Bolsonaro.

A Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) paralisou diversas obras no fim do ano passado por não saber como usar o recurso que foi classificado como inconstitucional pelo Supremo.

A estatal passou a descongelar essas obras nos últimos dias, depois de o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional publicar uma portaria colocando regras para retomada dessas ações.

Pelo documento, a continuidade das obras depende de uma análise sobre a "conformidade dos contratos".

Os órgãos vinculados ao ministério, como a Codevasf, só podem voltar a executar as emendas que consideram prioridades regionais e que tenham impactos em temas como a segurança hídrica, defesa civil e desenvolvimento territorial.

Entre os contratos descongelados pela Codevasf, estão os de pavimentação executados pela Construservice, empreiteira suspeita de corrupção justamente com verbas da estatal.

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